10 setembro 2012

ACORDO DE CESSAR-FOGO ENTRE A FRELIMO E O ESTADO PORTUGUÊS EM 7 DE SETEMBRO DE 1974


ACORDO DE CESSAR-FOGO ENTRE A FRELIMO E O ESTADO PORTUGUÊS EM 7 DE SETEMBRO 1974

AFINAL MOÇAMBIQUE DEIXOU DE FAZER PARTE DE PORTUGAL EM 7 DE SETEMBRO DE 1974?



PREÂMBULO:
Tendo o Estado Por­tuguês reconhecido o di­reito à Independência de Moçambique e aceite por acordo com a Frente de Liberta­ção de Moçambique transferir os poderes que detém para o povo Moçambicano, o Estado Portu­guês e a Frente do Libertação de Moçambique acordam em celebrar o presente acordo de cessar-fogo com vista ao estabelecimento da paz correspondendo assim às aspirações profundas dos povos Moçambicano e Por­tuguês.
O presente acordo visa pôr termo aos actos de guerra no conjunto do território do Mo­çambique entre o Exército Por­tuguês e as Forças Populares de Libertação de Moçambique, estabelecer o calendário da eva­cuação das Forças Armadas Portuguesas e transferir para a Frente de Libertação de Moçam­bique as instalações militares sob o controlo português. Durante o período de vigência do presente acordo, a Frente de Libertação de Moçambique continuará a desenvolver as suas forças armadas de modo a assumir plenamente as responsabilidades de defesa de Moçambique independente.
Título I - do Cessar - Fogo:
Artigo 1- A Frente de Li­bertação de Moçambique e o Estado Português acordam em proclamar o cessar-fogo sobre todo o território, incluindo águas territoriais e espaço aéreo que entrará em vigor às zero horas de 8 de Setembro de 1974 (hora de Moçambique).
Para este efeito, ambas as partes darão as necessárias instruções às suas respectivas forças combatentes.
Titulo II - da Comissão Militar Mista:
Artigo 2 - A Comissão Militar Mista criada pelo acordo entre o Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique nesta data e de que este documento faz parte integrante, será constituída por 3 membros em representação de cada uma das partes.
As suas funções são especi­ficadas no titulo VI do presente Protocolo.
Artigo 3 - A Comissão Mi­litar Mista terá a sua sede em Lourenço Marques e criará sub­comissões paritárias ao nível pro­vincial e outros níveis que sob sua direcção supervisarão localmente a execução do presente acordo.
Título III - da evacuação das Forças Armadas Portuguesas
Artigo 4 - O Estado Portu­guês iniciará imediatamente a evacuação das suas forças arma­das que terminará o mais tardar às zero horas do dia 25 de Junho de 1975, dia da proclamação da Independência de Moçambique.
Artigo 5 - O Processo de evacuação das forças armadas portugueses far-se-á gradual­mente e de forma regular, de­vendo a Comissão Militar Mista estabelecer:
Os locais de «grupamento final das Forças Armadas Por­tuguesas a partir dos quais elas deixarão definitivamente o terri­tório moçambicano.
Os locais de agrupamento provisório ao nível de cada pro­víncia onde se concentrarão as Forças Armadas Portuguesas antes de atingirem os locais mencionados na alínea anterior.
Os itinerários terrestres, aéreos e marítimos a seguir pelas Forças Armadas Portuguesas no percurso de evacuação.
Artigo 6 - As Forças Armadas Portuguesas, enquanto perma­necerem no território de Mo­çambique, terão como funções em colaboração com as forças armadas da Frente de Libertação de Moçambique:
-Defender a integridade ter­ritorial de Moçambique contra qualquer agressão exterior:
-Proceder à desminagem e desactivação de engenhos, à demolição e remoção doutros obstáculos perigosos à livre cir­culação das populações;
-Continuar as obras em curso, reparar as vias de comunica­ção e proceder a outros trabalhos de reconstrução relacionados com a normalização da vida das populações,
- Intervir em caso de força maior, no restabelecimento da ordem interna, nos termos de­terminados no Acordo entre o Estado Português e a Frente de Libertação de Moçambique.
A Comissão Militar Mista estudará a composição, orga­nização e ordenamento destas forças a fim de as habilitar a desempenhar eficazmente as suas funções.
Artigo 7 - As forças em curso de evacuação serão consi­deradas forças transportadas não operacionais.
Artigo 8 - O Estado Por­tuguês entregará à Frente de Libertação de Moçambique as instalações militares que evacuar e o respectivo equipamento, e material e diligenciará para que se não proceda a actos destruição total ou parcial.
Título IV - Da neutralização de organizações e actividades perturbadora da ordem pública
Artigo 9 - O Estado Portu­guês desarmará imediatamente todos os corpos de milícias, OPVDC, milícias privadas, Fle­chas e outras organizações si­milares, entregando à Frente de Libertação de Moçambique as armas não pertencentes ao Exército Português.
Artigo 10 - O Estado Por­tuguês e a Frente de Libertação de Moçambique cooperarão na detecção e neutralização de todos os agentes reaccionários e subversivos e nomeadamente os ex-agentes da PIDE- DGS.
Artigo 11- O Estado Por­tuguês e as forças Armadas Portuguesas tomam medidas para impedir que os seus nacio­nais se envolvam, individual ou colectivamente, em actividades de colaboração militar com os governos da África do Sul e da Rodésia.
Título V - Dos moçambi­canos nas forças Armadas Portuguesas
Artigo 12 - Com a assina­tura do presente acordo cessa a incorporação de moçambicanos nas Forças Armadas Portuguesas.
Artigo 13 - O Estado Portu­guês desmobilizará os moçam­bicanos actualmente em serviço nas Forças Armadas Portuguesas dentro do território moçambica­no, os quais serão reintegrados na sociedade moçambicana, sob a responsabilidade da Frente de Libertação de Moçambique, a fim de evitar perturbações da ordem pública, as forças especiais como os GEP e Comandos, serão ime­diatamente desarmadas.
Artigo 14 - O Estado Por­tuguês compromete-se a des­mobilizar os moçambicanos actualmente em serviço nas Forças Armadas Portuguesas fora do território de Moçambique que assim o requeiram e deste facto notificará a Frente de Libertação de Moçambique.
Artigo 15 - As duas partes procederão, o mais tardar até ao dia 11 Setembro de 1974, à libertação dos prisioneiros que se encontrem em seu poder, obrigando-se a dar mutuamente as mais amplas informações julgadas necessárias.
Artigo 16 - O Estado Portu­guês compromete-se a amnistiar todos os militares portugueses que se encontram detidos ou con­denados por actividades contra a guerra colonial em Moçambique e em favor da Frente de Libertação de Moçambique, que não tenham sido cobertos por amnistias anteriores.
Título VI - Controlo da execução do presente acordo:
Artigo 17 - Caberá à Co­missão Militar Mista velar pela aplicação do presente acordo.
Compete-lhe nomeadamen­te:
Determinar os locais e itinerá­rios de evacuação da Forças Ar­madas Portuguesas e supervisar as operações de evacuação assim como a entrega de instalações militares à Frente de Libertação de Moçambique.
Supervisar o desmantelamen­to dos dispositivos militares dos alimentos.(Suponho que seja “aldeamentos” *)
Supervisar o desarme do corpo de milícias, da OPVDC, e outras organizações similares, assim como neutralizar activi­dades militares, individuais ou colectivas, de colaboração com os governos de África do Sul e Rodésia.
Supervisar a desmobilização dos militares moçambicanos em serviço nas forças Armadas Portugueses em Moçambique os quais serão reintegrados na sociedade moçambicana, sob responsabilidade da Frente de Libertação de Moçambique.
Organizar a libertação dos prisioneiros de guerra de ambas as partes.
Estabelecer as listas de todos os prisioneiros de guerra de ambas as partes detidos desde o inicio do conflito e esclarecer o seu destino, apurando eventuais responsabilidades.
Resolver eventuais litígios, violações e todos os problemas que possam surgir entre as For­ças Armadas de ambas as partes na execução do presente acordo.
Título VII
Artigo 18 - Durante o período de transição o financiamento o abastecimento das Forças Armadas Portuguesas estarão a cargo do Estado Português.
Ao Governo de Transição caberá o financiamento e abas­tecimento das Forças Populares de Libertação de Moçambique.
As Forças Armadas Portugue­sas comprometem-se a efectuar o pagamento integral das dívidas contraídas em Moçambique.

Lusaka, aos 7 de Setembro de 1974



Pela Frente de Libertação de Moçambique:
Samora Moisés Machel
(Presidente)

Pelo Estado Português:
Ernesto Augusto Melo Antu­nes (Ministro sem Pasta).
Mário Soares (Ministro dos Negócios Estrangeiros).
António de Almeida Santos (Ministro da Coordenação Inter­territorial).
Victor Manuel Trigueiros Crespo (Conselheiro de Estado).
Antero Sobral (Secretário do Trabalho e Segurança Social do Governo
Provisório de Moçam­bique).
Nuno Alexandre Lousada (Tenente-Coronel de infantaria).
Vasco Fernando Leote de Almeida e Costa (Capitão-Tenente da Armada).
Luís António de Moura Casanova Ferreira (Major de infantaria).

In: Jornal DOMINGO - 09.09.2012

Nota do blog: 

Para quem leu atentamente este Acordo, poderá chegar às seguintes conclusões:
1 – Portugal deu cobertura e o apoio logístico para as maiores barbaridades cometidas pela Frelimo, para conquistar um poder que não tinha implantação no terreno nem nas cides do País;
2 – A perseguição encetada pela Frelimo aos seus opositores foi apoiada pelo MFA, que, por sua vez prendeu militares portugueses que, sem qualquer culpa, se viram envolvidos em lutas entre fações rivais da sociedade moçambicana (Ex. Capitão Luís Fernandes);
3 – Os aviões das FAP serviram para o transporte para os famigerados  “Campos de Reeducação” de todo o tipo de pessoas que não serviriam para os seus interesses;
4 – Os militares portugueses colaboraram na prisão de patriotas moçambicanos que, embora lutassem politicamente pela independência de Moçambique, não se reviam no projeto da Frelimo;
 5 – À Frelimo foi concedido todo o poder para aprisionar os seus opositores políticos e transportá-los para Nashigwea (Tanzânia), onde foram julgados sem qualquer hipótese de defesa em simulacros de tribunais, obrigados a confessarem crimes que nunca cometeram e queimados vivos em valas comuns, depois de terem passado os tratamentos mais atrozes no Campo de Concentração de Metelela (Niassa);

6 – Recordo aqui nomes de patriotas que desapareceram nessas circunstâncias, como Uria Simango, Celina Simango, Mateus Gwengere, Lázaro Kavandame, Paulo Gumane, Júlio Razão e tantos outros que entraram em Metelela, cerca de 1.800 e menos de 100 escaparam à morte. As suas memórias nunca foram reabilitadas e os seus restos humanos continuam perdidos no mato do Niassa;

 7 – Por último, enquanto este acordo foi assinado, em nome de Portugal, por ministros e representantes do MFA, pela Frelimo foi assinado somente por Samora Machel o que já denotava o carácter ditatorial do seu líder, que continuou no governo de Moçambique , e que acabou no providencial acidente de viação, em 1986.

Ovar, 3 de Dezembro de 2012

Álvaro Teixeira (GE)


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