DEVEMOS AO FUTURO UMA PAZ MAIS DURADOIRA
Maputo
(Canalmoz) - O facto de o líder da Renamo, Sr. Afonso Dhlakama, ter
recentemente fixado residência em Gorongosa, depois de ter mudado de Maputo
para Nampula, desafia-nos a pensar um pouco mais acerca da nossa vida política
como um país.
Para
alguns, à guisa de tentativas proféticas ou não, a situação abre a
possibilidade de muitos cenários no nosso futuro comum não muito longínquo.
Quanto a mim sou de opinião que temos que pensar o que devemos legar ao futuro
e para isso proponho olharmos para alguns aspectos que acho serem de alguma
importância considerar.
O
primeiro aspecto é o silêncio do Governo que, por sua vez, também pode ser
interpretado de várias formas, mas a minha esperança é que seja um silêncio em
que se esteja a procurar formas de solucionar a situação pela via pacífica e
não com recurso à violência (se as alegações, por parte de alguns membros
seniores da Renamo, de que há movimentações de mercenários para atacar
Gorongosa forem verídicas), pois isso abriria espaço para um conflito mais aberto
e com consequências incalculáveis. Também espero que não seja um simples
ignorar como se nada estivesse a acontecer. O nosso país já tem muitas
situações de conflitualidade social latente (e para isso há já muitas vozes,
sobretudo de académicos e líderes religiosos, que chamam a nossa atenção para
milhões de moçambicanos e moçambicanas que estão longe de ver resultados
palpáveis nas suas vidas como fruto do muito proclamado crescimento económico
do país e dos investimentos que se têm feito há já um bom número de anos), por
isso não podemos permitir que um silêncio destes dê lugar a uma divisão aberta
entre moçambicanas e moçambicanos. E aqui o provérbio popular “antes prevenir
que remediar” pode nos ajudar a pensar que não é só a ciência médica que nos
ensina a importância de acções e medidas profiláticas contra várias endemias,
mas também a ciência política deve ensinar-nos quão sábio é tomar medidas
profiláticas contra cóleras políticas, para dar lugar a uma sociedade
politicamente mais sadia.
Olhando
para alguma imprensa da nossa região, SADC, há opiniões sobre a decisão do
líder da Renamo em fixar-se em Gorongosa que sugerem que alguns estão à espera
de ver o nosso país cair na desgraça de um conflito aberto (com isso não quero
sugerir que estariam contentes com a desgraça alheia), um regresso ao pesadelo
dos anos sombrios da nossa guerra civil e isso provaria, para eles, que 20 anos
depois afinal a nossa paz foi nada mais que artificial, uma ilusão apenas, que
somos incapazes de conviver pacificamente, ou pelo menos de resolver de forma
pacífica as nossas diferenças. E que diriam de nós se tivéssemos que voltar a
ser refugiados nos países vizinhos, passarmos pela humilhação de quem não tem
onde ir e de sermos ‘acolhidos’ em terra estrangeira não tanto porque somos
‘amigos’, mas por força do direito internacional de nos acolherem como
refugiados? Já temos uma geração de moçambicanas e moçambicanos que tem a
felicidade e o privilégio de não conhecer o que é uma guerra e o país está de
parabéns por ter esta geração e é sobre e com esta geração que devemos edificar
um futuro mais pacífico para a geração seguinte. Temos a obrigação de legar
para o futuro o melhor de nós e o melhor que podemos dar ao futuro é uma paz
mais duradoira.
Em
segundo lugar é a lição que muitas vezes os nossos políticos e governantes
teimam em não aprender. A nossa história política tem muitas e boas lições que
nos permitiriam evitar situações como esta. Somos muito bons em inculcar nos
jovens e crianças em idade escolar uma certa história do nosso passado comum,
mas somos incapazes de nós mesmos aprender algo para a nossa forma de governar.
Os nossos políticos estão rodeados de muitos historiadores como assessores,
conselheiros, etc., mas não são capazes de tirar lições de muitas histórias
políticas do mundo e da nossa própria história política. Evidentemente a
inteligência calculadora é uma das maiores características de um ‘bom’
político: nunca dar um passo sem medir o resultado. No entanto, penso que não
seria tão mal temperar isso com um pouco de sabedoria, que em vez de calcular,
é capaz de compreender e até abraçar o estranho. A maior lição que devíamos ter
aprendido é que a paz não é um dado adquirido de uma vez por todas, mas que é
uma conquista diária não com calculismos, mas com compreensão e, até me arrisco
a dizer, com perdão.
Finalmente,
considero que esta situação oferece à Frelimo, enquanto partido governante, uma
oportunidade de mostrar não apenas a sua maturidade de 50 anos de existência,
mas também a sua responsabilidade política para com o presente e o futuro do
nosso país. E esta responsabilidade é dupla para o Presidente Armando Guebuza:
enquanto Chefe de Estado e enquanto Negociador-Chefe, por parte da Frelimo, dos
Acordos de Paz celebrados há 20 anos em Roma. Nesta dupla responsabilidade ele
tem a oportunidade de escrever pelo menos duas vezes a história deste país,
algo raro para o comum dos nossos políticos. Embora tenha sido incumbido pelo
governo de então a missão de chefiar a delegação da Frelimo nas negociações,
temos que lhe reconhecer o mérito pessoal de ter conseguido chefiar a delegação
de forma sábia e de ter levado a missão a bom termo. O facto de algumas das
reivindicações do líder da Renamo não terem sido satisfeitas durante a
presidência que lhe antecedeu, isso não lhe iliba da responsabilidade política
como Chefe de Estado e da responsabilidade moral como um dos autores mais
fundamentais da paz que o país alcançou. Esta é uma oportunidade para ele
redobrar o zelo com que se dedicou nas negociações de Roma para preservar o que
com muito sacrifício e paciência conseguiu para todos nós. E essa
responsabilidade passa necessariamente pelo diálogo. Não acredito que pelo
facto de ter acedido à mais alta magistratura da República perdeu a sua
capacidade de dialogar. É certo que com tempo mudamos a nossa forma de pensar e
de ser, mas também acredito que precisamente por ser o mais alto magistrado é
capaz de reactivar as qualidades de negociador que mostrou e provou em Roma e
isso dar-lhe-ia mais credenciais (que nenhuma campanha eleitoral pode conferir)
como alto magistrado e presidente de todos os moçambicanos e todas as
moçambicanas. Como Chefe de Estado, isso significa trazer ao convívio político
as moçambicanas e moçambicanos, que por uma ou outra razão, estão desavindos.
Qual pai não faria tudo para trazer um filho ou uma filha amuada ao convívio do
resto dos irmãos? Quanto mais quando se trata de reivindicações com “alguma
legitimidade”, segundo o Prof. Dr. Lourenço do Rosário!
Apenas
o diálogo é o veículo mais apropriado através do qual podemos e devemos
presentear o futuro com uma paz cada vez mais sólida e o diálogo é como o
perdão: não só não diminui em nada quem toma iniciativa, mas também não
significa que por tomar iniciativa se esteja a reconhecer uma falta cometida, e
sobretudo significa que apreciamos as nossas relações e queremos continuar a
conviver em paz. (CanalMoz- 31 de Outubro de 2012-Adelino Chissale)
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