18 outubro 2012

OS TENTÁCULOS DO PODER EM MOÇAMBIQUE: POLÍTICA E NEGÓCIOS DE MÃOS DADAS[1]

OS TENTÁCULOS DO PODER EM MOÇAMBIQUE: POLÍTICA E NEGÓCIOS DE MÃOS DADAS[1]

Na última edição do Boletim Informativo do Centro de Integridade Pública, o jornalista Milton Machel assina uma peça que nos dá conta de que o Conselho de Ministros aprovou uma série de Concessões Empresariais, Parcerias Público-Privadas e regulamentação específica que beneficiam directamente interesses económicos da Nomenklatura. O artigo apresenta uma visão panorâmica da imensidão e profundidade da captura do Estado moçambicano por interesses político-partidários.
O Conselho de Ministros aprovou, nos últimos quatro anos, uma série de Concessões Empresariais, Parcerias Público-Privadas e regulamentação específica que beneficiam directamente interesses económicos da Nomenklatura. Regra geral, estes negócios revelam uma fuga estratégica à Lei do Procurement Público e foram antecedentes à vigência da Lei das Parcerias Público-Privadas (PPP), Concessões Empresariais (CE) e Projectos de Grande Dimensão. O crescente número de PPP e CE aprovadas pelo Governo de Moçambique é fonte de preocupação por duas razões fundamentais:
- A primeira é que o Executivo tende a ignorar tanto a chamada Lei do Procurement Público (Regulamento de Contratação de Empreitada de Obras Públicas, Fornecimento de Bens e Prestação de Serviços ao Estado) como a recém-aprovada Lei das Parcerias Público-Privadas, Concessões Empresariais e Projectos de Grande Dimensão. Tradução: esses contratos não foram negociados ou concedidos através de concursos públicos ou processos competitivos, mas por via de negociação ou adjudicação directa;
- A segunda prende-se ao facto de grande parte dos beneficiários ou parceiros do Estado coincidirem com grupos empresariais ligados à Nomenklatura – como é conhecido o conjunto de famílias e figuras históricas que dominam as altas fileiras do Partido Frelimo _ ou empresas/consórcios estrangeiros associados de alguma forma a essa mesma elite político-económica. Esta investigação permite identificar como e com quem o Governo privilegia realizar grandes negócios do Estado.

CASO 1: AFRODRILL DO SR. PARAYANKEN E DA SPI
A África Drilling Company, Limitada, (AFRODRILL, Lda) está envolvida, desde os anos noventa, na criação e desenvolvimento de fontes de água no Moçambique rural. Ela executa mais de sessenta por cento do plano do Governo de desenvolvimento de recursos de água potável nas zonas rurais – de acordo com o portal da sua empresa-mãe, a Mozambique Holdings (http://mozambiqueholdings.com/ companies/).
A 12 de Março de 2008, a Comissão de Relações Económicas Externas do Conselho de Ministros decidiu aprovar a adjudicação das Obras de Construção de 1600 Furos Mecânicos de Água nas Províncias de Nampula e Zambézia, no valor de USD 20 000 000,00 (vinte milhões de Dólares Americanos), excluindo o IVA, à empresa África Drilling Company, Lda (AFRODRILL, Limitada) de origem moçambicana. Estamos a citar a Decisão n.º 4/2008, de 11 de Junho, tomada numa altura em que era ainda Primeira- Ministra Luísa Dias Diogo.
Os fundos para este Projecto de Abastecimento de Água às Províncias de Nampula e Zambézia (Fase de Extensão) foram financiados pelo Governo da Índia através do Export-Import (EXIM) Bank of India, no âmbito do Programa de Abastecimento de Água às Zonas Rurais.
A AFRODRILL, Lda é maioritariamente detida pela Mozambique Holdings, Limitada, grupo empresarial criado em 1993 pelo indiano José Parayanken. De acordo com a publicação Indiana The Economy Times, Parayanken chegou pela primeira vez a Moçambique em 1986 como representante do EXIM Bank da Índia e decidiu abandonar este grande financiador do Governo de Moçambique para se estabelecer como empresário no país.
Outra accionista da AFRODRILL é a SPI – Gestão & Investimentos, S.A.R.L., a holding do partido Frelimo oficialmente registada como empresa de membros influentes do partido Frelimo, como sejam: os deputados na Assembleia da República Teodoro Andrade Waty e Manuel Tomé, e o PCA do Instituto Nacional de Turismo, José Augusto Tomo Psico.
Detentora de uma parte da AFRODRILL é igualmente a ANFRENA, S.A.R.L. que antes de ser privatizada constituía a Empresa Estatal Agência Nacional de Frete e Navegação. A ANFRENA foi adquirida precisamente pela Mozambique Holdings.
É também accionista desta companhia a Lindex, Limitada, formada em 1997 por um grupo de associados de que se destaca o ex-Vice Ministro dos Transportes e Comunicações e ex-Ministro da Indústria e Comércio, António Fernando, e do qual passou a fazer parte em 2011 o quadro sénior do Ministério dos Transportes e Comunicações, António Francisco Sefane.

CASO 2: A PPP DAS ESTRADAS DO ZAMBEZE
Em 2010, depois da inauguração da ponte sobre o Rio Zambeze, baptizada com o nome do actual Presidente da República, Armando Emílio Guebuza, o Governo aprovou os termos da Concessão da nova Ponte de Tete sobre o Rio Zambeze e estradas à empresa Estradas do Zambeze, SA.
De acordo com o Decreto n.º 25/2010, de 14 de Julho, sobre esta concessão: “a precariedade da estrada Cuchamano _ Tete _ Zóbuè, da Ponte Samora Machel e o desenvolvimento da Província de Tete justificam a reabilitação da referida estrada e a construção de uma travessia alternativa do Rio Zambeze entre a localidade de Benga e a Cidade de Tete, sendo a Parceria Público-Privada a opção que se mostra viável para assegurar uma gestão eficiente e a sua preservação, através da manutenção daquelas Infra-Estruturas.”
Foi nesses termos que, socorrendo-se de uma série de dispositivos legais, o Conselho de Ministros cedeu o negócio ao consórcio constituído pelas empresas Ascendi Concessões de Transporte, SGPS, S.A., Soares da Costa Concessões, SGPS, SA., ambas com quarenta por cento das acções, bem como pela Infra Engineering Mozambique, SA., com vinte por cento.
A 12 de Janeiro de 2010 este consórcio constituiu a Operadora das Estradas do Zambeze, S.A., com a finalidade principal de proceder a “prestação de serviços de operação e manutenção das vias que constituem o objecto da concessão da nova ponte de Tete atribuída à sociedade Estradas do Zambeze, S.A., incluindo os nós de ligação, os troços das estradas e as obras de arte que os completarem, e, ainda, o desenvolvimento de todas as actividades subsidiárias, complementares ou conexas e a prestação de todos e quaisquer serviços relacionados com as actividades atrás mencionadas.” (BR nº 6, III Série, Supl., de 11 de Fevereiro de 2010 _ pág. 124-(20) a 8).
Destacam-se nesta sociedade anónima as ligações político-empresariais portuguesas da grande empreiteira Mota Engil, de que faz parte a Ascendi – Concessões de Transportes, SBPS, S.A.; e a Infra Engineering Mozambique, S.A.R.L., onde, segundo a Agência de Informação de Moçambique (AIM), dividem interesses o actual Ministro do Turismo, Fernando Sumbana, o antigo Ministro da Defesa e cunhado de Armando Emílio Guebuza, Tobias Dai, e o general Raimundo Pachinuapa. (Vide http://www.poptel.org.uk/mozambique-news/newsletter/aim406.pdf).
Esta concessão foi considerada de custo zero para o Estado, uma vez que todas as obras serão realizadas à conta e risco da Operadora Estradas do Zambeze, a qual irá reaver o seu investimento basicamente pela portagem que passa a cobrar a partir do dia 1 de Agosto de 2012.
Segundo estimativas do então Presidente do Conselho de Administração (PCA) do Fundo de Estradas e actual Vice-Ministro das Obras Públicas e Habitação, Francisco Pereira, o consórcio devolverá 306 milhões de dólares em taxas e impostos para o Estado. (Report nº 406, 27th July 2010, Mozambique News Agency AIM Reports).

CASO 3: A CENTRAL DE GERAÇÃO DE ENERGIA “DA INTELEC”
Em 2004, quando arrancou a construção do gasoduto Ressano Garcia/Matola, a Matola Gas Company (MGC) propôs ao Governo moçambicano a construção de uma central de geração de energia eléctrica através do gás natural.
Com o decorrer dos anos, as moçambicanas Eagle Holding e Electrotec e a sul-africana Gigajoule, accionistas da MGC, deram curso ao projecto através da disponibilização da infra-estrutura e realização de estudos que culminaram com a constituição da Gigawatt Moçambique, S.A.
A 23 de Dezembro de 2010, o Conselho de Ministros aprovou uma concessão à Gigawatt de 25 anos para a geração de 100 MW de energia eléctrica, em Ressano Garcia.
Esta central, cuja primeira pedra foi lançada pelo Primeiro-Ministro Aires Bonifácio Baptista Ali, em 2010, foi recentemente inaugurada pelo Chefe de Estado. Opera numa primeira fase à responsabilidade das subcontratadas AGGREKO (britânica) e Shanduka, grupo empresarial sul-africano liderado pelo ex-candidato à Presidência do ANC, Cyril Ramaphosa.
Na estrutura accionista do empreendimento, para além da Sul-Africana Gigajoule Power (Pty) Ltd, detentora de quarenta e dois por cento, surgem a Eagle Holding, S.A. com 32 % e a Intelec Holdings com 26 %.
A Eagle Holding é o grupo empresarial da família do falecido engenheiro Carlos Morgado, ex-Ministro da Indústria e Comércio, enquanto a Intelec Holdings conglomera parte dos interesses empresariais de Salimo Abdula e Armando Emílio Guebuza. A Intelec entrou na Gigawatt através da sua participada Electrotec.

CASO 4: FAMÍLIA EMPRESARIAL GUEBUZA NOS JOGOS DE CASINOS
Ano de vários negócios do Estado, 2010 começou com a entrada em vigor da Lei 1/2010, concernente às concessões relativas à exploração de Jogos de Fortuna ou Azar e terminou com o Governo a aprovar o Regulamento específico desta lei através do Decreto nº 64/2010 de 31 de Dezembro de 2010.
A nova lei autoriza a construção de casinos em qualquer ponto do país, possibilita a colocação de máquinas de jogo ou slot-machines fora dos casinos e facilita mesmo o jogo online. O investimento mínimo para explorar casinos foi reduzido de 15 para 8 milhões de dólares e a fasquia também baixada quanto à capacidade mínima de ocupação e a classificação dos hotéis associados.
Até então o jogo era, e continua a ser, operado por três monopólios em três lugares distintos, designadamente: na Cidade de Maputo pelo Casino Polana; na Província de Maputo, pelo Sol Libombos no distrito da Namaacha; e na cidade de Pemba pelo Nautilus Hotel & Casino ligado ao empresário Humberto Rasse Monteiro.
O primeiro a beneficiar-se desta nova Lei dos Casinos foi precisamente o grupo que mais se opunha a esta liberalização, o do Casino Hotéis Polana, liderado pelo General na reserva Jacinto Veloso, que se expandiu para a Cidade da Matola com uma sala de slot machines e projecta construir um Casino em Tete.
Todavia, o PCA do Instituto de Promoção das Exportações (IPEX), João Macaringue, já disse publicamente que interesses da zona administrativa especial de Macau pretendiam estabelecer-se em Marracuene, na Feira Internacional de Maputo (FACIM).
Particularmente interessado nos casinos está a empresa Editores e Livreiros, Limitada, participada pela holding da família empresarial Guebuza, Focus 21 _ Gestão e Desenvolvimento, Limitada, e a empresa de origem portuguesa Santos Gouveia, Limitada.
Esta sociedade foi criada em 2007, ano em que coincidentemente iniciou o processo de revisão da Lei de Jogos de Fortuna ou Azar. A Focus 21 é uma holding familiar de Armando Emílio Guebuza e três de seus quatro filhos, Armando Ndambi Guebuza, Valentina da Luz Guebuza e Norah Armando Guebuza.
Coligada a interesses chineses, franceses e portugueses, a Focus 21 tem negócios prósperos e lucrativos em diversas áreas como a televisão digital terrestre, a navegação marítima, estaleiros navais e transitários, construção civil, consultoria em Infra-Estruturas públicas e privadas.

CASO 5: MPHANDA NKUWA DA INSITEC DE CELSO CORREIA
Ainda a terminar o marcante ano de 2010 das PPP, o Governo aprovou, através do Decreto nº 68/2010, de 31 de Dezembro de 2010, os Termos e Condições do Contrato de Concessão do empreendimento hidroeléctrico de Mphanda Nkuwa.
Mphanda Nkuwa é um projecto que teima em sair do papel devido à indefinição da principal viabilizadora/cliente, a empresa pública de energia eléctrica Sul-Africana ESKOM, que está na encruzilhada entre mais esta fonte de energia hidroeléctrica vinda de Moçambique, o projecto de uma termonuclear do Governo Sul-Africano e o projecto da Barragem de Grande Inga na República Democrática do Congo – este último tido como endossado pela própria ESKOM.
Mphanda Nkuwa constitui um investimento de 2,4 mil milhões de Dólares num consórcio liderado pela firma Insitec, com quarenta por cento; participado em igual percentagem pela brasileira Camargo Corrêa; e em vinte por cento pela empresa pública Electricidade de Moçambique (EDM). O financiamento está há muito prometido pelo EXIM Bank da China.
Se, por um lado, a barragem se vê na quase inviabilidade económica perante a falta de clareza da ESKOM, por outro lado, é também considerada pelos ambientalistas como potenciadora de eventuais riscos sísmicos, de entre outros impactos negativos não esclarecidos pelo contestado Estudo de Impacto Ambiental (EIA).
Enquanto a Insitec insiste na sua habitual agressividade sem par nos negócios, persiste uma vaga de fundo que desconfia seriamente da muito falada mas nunca provada ligação entre o empresário Armando Emílio Guebuza e o jovem Celso Correia, accionista maioritário neste grupo de que são ainda sócios seus pais e seus irmãos. Segundo fontes dentro do Partido Frelimo, Celso Correia e Egídio Leite, PCA da Hidroeléctrica de Mphanda Nkuwa, S.A., emergiram em 2003 num grupo de assessores económicos do então Secretário-Geral da Frelimo, Armando Guebuza.

CASO 6: A MINEIRA JINDAL DA CONEXÃO INDIANA
Ainda em 2010, o Governo aprovou os Termos do Contrato Mineiro para a Mina de Carvão no Distrito de Changara, na Província de Tete, a celebrar com a empresa JSPL Mozambique Minerais, Limitada, na qualidade de Concessionário Mineiro. Através do Decreto nº 69/2010, de 31 de Dezembro de 2010, o Executivo cedeu 21.540 hectares para exploração de carvão, num contrato com a duração de 25 anos, e num negócio em que ao Estado foi reservada uma participação de 10 por cento.
O Estado espera ter um encaixe, nos primeiros 28 anos de vigência do projecto, de cerca de 440.97 milhões de Dólares americanos, após a JSPL ter orçado o seu investimento em 180 milhões na primeira fase, num projecto de que o Estado estima amealhar 440 milhões de Dólares de Imposto de Rendimento de Pessoas Colectivas (IRPC) nos primeiros 28 anos.
A JSPL Mozambique Minerais, Lda., um gigante que já atravessa três gerações da dinástica família Jindal, tem no indiano Manoj Kumar Gupta o seu director geral, igualmente responsável pelos interesses da Jindal Africa na África Austral. Com mais de 22 anos de experiência em várias posições técnicas e de gestão, antes de ingressar no grupo Jindal, Gupta serviu o Grupo Tata de automóveis e maquinaria agro-industrial.
Manoj Gupta foi a interface entre os interesses da Tata indiana e da sua filial Tata Moçambique, onde se salientam os interesses de Armando Guebuza e do actual Ministro na Presidência, António Correia Sumbana, irmão mais velho de Fernando Sumbana Jr.
Engenheiro Mecânico formado em uma technikon indiana, Manoj Gupta foi Director Executivo da Cometal, S.A.R.L., ex-empresa estatal adquirida pela Tata Moçambique aquando das privatizações nos anos noventa.
A Tata Moçambique esteve nos últimos dois anos no centro de uma controvérsia, quando o jornal Canal de Moçambique publicou matérias dando conta que o Ministro dos Transportes e Comunicações, Paulo Zucula aprovou a adjudicação directa a esta empresa participada pelo empresário que é seu Chefe no Executivo, da compra e manutenção de uma frota de autocarros para os Transportes Públicos de Maputo – Empresa Pública.
Parte desses autocarros, comprados à Tata-mãe na Índia, acabou avariada e estacionada no parque da Tata Moçambique à espera de manutenção, paga pelo próprio Governo. Alguns acabaram parados de vez para prejuízo do público utente dos TPM e do erário público.

CASOS 7 e 8: PORTO DE TECHOBANINE, A PPP À MARGEM DA LEI
Se todas estas concessões e PPP se puderam valer da inexistência de uma Lei que as regulasse, já a parceria público-privada que beneficiou a empresa do Partido Frelimo, SPI – Gestão & Investimentos ocorreu numa altura em que já estava em vigor a Lei número 15/2011 que estabelece as normas orientadoras do processo de contratação, implementação e monitoria de empreendimentos de parcerias público-privadas, de projectos de grande dimensão e de concessões empresariais.
A PPP, de que tratamos nas linhas a seguir, é relativa à exploração de uma linha ferroviária e um porto em Techobanine, no distrito de Matutuíne, na província de Maputo. Pretendendo ligar directamente Moçambique e Botswana nessa área de transportes e comércio, o Projecto Integrado Porto de Techobanine foi viabilizado pelo Decreto nº 57/2010 de 01 de Dezembro de 2010, através do qual o Conselho de Ministros criou uma Zona de Protecção Parcial para a sua implementação.
O principal activo do Estado Moçambicano nesta área, a empresa pública Portos e Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM), constituira, três anos antes, o consórcio que viria a ficar com este projecto.
Associados à Salamanga Investimentos, os CFM realizaram um capital de dois milhões e seiscentos mil Meticais e criaram em Julho de 2007 a Belavista Holdings, S.A., uma sociedade anónima com o seguinte objecto social: “a promoção, desenvolvimento e exploração de infra-estruturas portuárias, nomeadamente portos-cais acostáveis, infra-estruturas para manuseamento de combustíveis e óleos, actividades turísticas bem como a exploração de actividades conexas e complementares ao objecto principal.”
A Salamanga Investimentos, SA é uma sociedade anónima criada em Abril de 2007 pelos cidadãos José Manuel Martins da Rocha Antunes e Janete Custer de Oliveira Amaral em associação com a J.V. Consultores do General Jacinto Soares Veloso e sua família.
De acordo com o seu pacto social, “a sociedade tem por objecto o desenvolvimento e exploração de projectos a realizar no distrito de Matutuíne ou outros pontos de Moçambique, no que refere a actividades portuárias, turísticas, comerciais, industriais ou outras actividades conexas e complementares ao objecto principal.”
A SPI – Gestão & Investimentos, S.A.R.L, só viria a ingressar na sociedade a 31 de Agosto de 2009, ficando com quinze por cento do capital social, contra vinte por cento da J.V. Consultores e sessenta e cinco por cento dos CFM.
Através da Resolução nº 53/2011, de 04 de Novembro de 2011, o Conselho de Ministros autorizou “a negociação do empreendimento, na forma de parceria público-privada, com a sociedade Bela Vista Holdings, SA, composta pelos CFM, E.P., Salamanga Investimentos, SA e SPI _ Gestão e Investimentos para, em regime de concessão, executar os trabalhos de construção, operação e manutenção da Linha Ferroviária de Techobanine, da Ponta Techobanine, na Província de Maputo, a Botswana, e a Linha da Swazilândia a ser efectuada pelo Governo da República de Moçambique na sua qualidade de Concedente Ferroviário.”
A SPI voltava assim, pela via desta PPP, aos grandes negócios, depois de em 2007 ser contemplada no consórcio Kudumba Investments, Lda com a vitória no concurso público para a provisão de serviços de inspecção não-intrusiva a mercadorias nas Alfândegas de Moçambique através de scanners e em 2010 com a vitória no concurso público para a selecção da terceira operadora, aqui representada duplamente no consórcio Movitel.
No mesmo dia 4 de Novembro, pela Resolução nº 54/2011, o Governo autorizou a negociação do empreendimento, na forma de PPP, com a sociedade a ser constituída pela Bela Vista Holdings, SA para, “em regime de concessão, executar, quer em terra, quer em plano de água, os trabalhos de construção e manutenção de Infra-Estruturas portuárias do Terminal Portuário de Carvão de Techobanine, na Ponta Techobanine, no Distrito de Matutuíne, na Província de Maputo, a ser efectuada pelo Governo da República de Moçambique na sua qualidade de Concedente Portuário.”
O Terminal Portuário de Carvão de Techobanine é visto por ambientalistas como uma ameaça a biodiversidade entre a Reserva Natural de Elefantes de Maputo e a Reserva Especial Marinha da Ponta d´Ouro, tudo porque um porto de águas profundas na Ponta de Techobanine pode perigar um dos maiores recifes de corais do mundo ali localizados.
Mas esse não é o único senão. Se tivermos em conta que a Lei 15/2011 entrou em vigor a 10 de Agosto de 2011, o Governo não aprovou esta PPP com base nesta lei que, segundo o seu Artigo 3, determina: “A presente Lei aplica-se a todos os empreendimentos de PPP, PGD e CE levados a cabo no País, sob a iniciativa ou decisão e controlo, quer de entidades de nível central, provincial e distrital, quer das Autarquias Locais”.
No seu Artigo 13, sobre o “Regime Jurídico de Contratação de PPP”, estabelece-se no ponto 1 que o regime jurídico geral de contratação de empreendimentos de PPP é o de concurso público, aplicando-se, subsidiariamente, as regras que regem as contratações públicas.
O ponto 2 diz mais: “Atendendo ao interesse público e reunidos os requisitos legalmente previstos, a contratação de PPP pode revestir a modalidade de concursos com prévia qualificação ou de concursos em duas etapas”. Só em situações ponderosas e devidamente fundamentadas e “como medida de último recurso sujeita a prévia autorização expressa do Governo, a contratação do empreendimento de PP pode, excepcionalmente, assumir a forma de negociação e ajuste directo” (ponto 3).
O ponto 4 cava mais fundo quanto aos fundamentos para que o Executivo tome uma decisão semelhante a que tomou sobre o empreendimento da Bela Vista Holdings, S.A. no Porto de Techobanine:
“Caso não apareça concorrente, ou o vencedor desista de desenvolver a parceria público privada, projecto de grande dimensão ou concessão empresarial, a contratação do empreendimento pode assumir, excepcionalmente, a forma de negociação e ajuste directo, nos termos a regulamentar”. A regulamentação da Lei de PPP, PGD e CE só viria a ser aprovada pelo Decreto 16/2012, de 4 de Junho.
Para se perceber como a aprovação pelo Conselho de Ministros pode ferir a Lei 15/2011, atente-se ao ponto 6 do seu Artigo 13, quando diz que “em qualquer das modalidades de contratação de PPP devem ser observados os princípios de legalidade, finalidade, razoabilidade, proporcionalidade, prossecução de interesse público, transparência, publicidade, boa-fé, estabilidade, motivação, integridade e idoneidade, responsabilidade, boa gestão económico-financeira, celeridade e os demais princípios de Direito Público aplicáveis.”
Fora o interesse público em jogo, nos próximos anos saberemos que impactos económicos e sociais estas decisões terão para o Estado Moçambicano, pois a maioria delas ainda não está em fase de exploração, logo de reversão dos primeiros ganhos para o País.

In: @Verdade, 17 de Setembro de 2012 ou clica no link http://www.cip.org.mz/cipdoc/153_CIP%20Newsletter_16.pdf





[1] Título adaptado pelo Blog

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