ELIMINAM-SE OS MITOS SOBRE A ORIGEM
DA MARRABENTA
O segundo “workshop” sobre a origem e a evolução da
Marrabenta, entre 1930 e 2012, que no dia 21 de Junho juntou estudiosos sobre o
assunto, na cidade de Maputo, afasta, por completo, a possibilidade de esse
género de música ter sido criado por Dilon Djindje como ele, reiteradas vezes,
reivindicou. As pesquisas não revelam fundadores, mas dão conta de que houve
precursores e promotores.
Uma mostra documental do director do Instituto de
Investigação Sociocultural, o pesquisador João Vilanculo, explica que na
segunda metade do século 19, a cidade de Lourenço Marques, actual Maputo,
regista um desenvolvimento económico, ao mesmo tempo que se configura um
importante centro político-administrativo.
Nessa época, entre 1950 e 1960, criam-se os primeiros dois
planos de fomento económico que promoveram a migração de cidadãos portugueses
para a colónia de Moçambique, incluindo a realização de investimentos para a
pequena indústria alimentar, as fábricas têxteis, de utensílios domésticos e no
campo dos Portos e Caminhos-de-ferro.
Mas antes, ao longo da década de 1930, o franco investimento
na urbanização, além de estimular o êxodo rural, a deslocação de populações do
campo para a cidade, estimulou o surgimento dos bairros suburbanos de
Maxaquene, Munhuana, Mafalala, Chamanculo e Chinhambanine.
O assentamento das populações na cidade, como resultado do
sistema colonial, fez-se em função da cor e da raça da pessoa. Assim, os
bairros da Polana e Ponta Vermelha são, predominantemente, ocupados por
cidadãos europeus, enquanto o Central (que fazia a transição entre a zona da
elite, urbanizada e o subúrbio pobre em que habitavam os negros) era ocupada
por asiáticos.
Da convivência no mesmo espaço entre os negros moçambicanos,
asiáticos e europeus resultou uma mestiçagem que, de acordo com os
pesquisadores, contribuiu para o desenvolvimento e divulgação da Marrabenta. Na
altura, os fazedores desta música que utilizavam o Xigogogwani/ Xibavane, um
instrumento artesanal que nos recorda a viola, começaram a ter ferramentas
musicais modernas e sofisticadas, ao mesmo tempo que frequentavam os bailes e
as casas de pasto na cidade.
Sobre a mesma discussão, outro aporte é feito pelo
jornalista e escritor moçambicano, Samuel Matusse, citado por Vilanculo, que
refere que o nome do género provém do vigor (rebentar) que a dança insere. Em
conversa com o instrumentista Moisés Manjate, do Conjunto Djambo, o académico
Rui Laranjeira, mais uma vez, apurou que o nome Marrabenta tem a ver com a
maneira de dançar e de tocar a guitarra até arrebentar as cordas. Por exemplo,
Moisés Manjate afirma que enquanto decorriam os concertos, a dado momento,
podia-se ouvir dizer frases como “rebenta o fio”.
Comungam do mesmo argumento personalidades e artísticas como
o músico João Domingos que relaciona a origem do termo Marrabenta ao rebentar
das cordas da viola, em virtude da forma vigorosa com que se toca o
instrumento, bem como o escritor e professor de literatura Calane da Silva que
fala da mestiçagem cultural entre as línguas portuguesa e bantu para a formação
da palavra.
É importante notar que no “wokshop”, João Vilanculo explicou
que o músico Dilon Djindje assegura que o termo Marrabenta surgiu entre o
distrito de Marracuene e Bobole. Por outro lado, no seu estudo, o director do
Instituto de Investigação Sociocultural, João Vilanculo, propõe uma estrutura
hierárquica constituída por dois grupos de actores na história da origem e
evolução da Marrabenta.
Entre os precursores do género encontram-se Fani Mpfumo que
fez a primeira gravação musical entre 1947 e 1955 na África do Sul; Mahecuane
que registou o disco “Yi Xibalo Muni Makhandene”, na Gallo Recording, no mesmo
país, em 1945; Alexandre Langa, o autor das composições “Hoyo Hoyo Masseve” e
“Hosi ya Kandonga vai Khomile”; Dilon Djindje que criou a canção “Ni Djula
Maria va ni Khomba Tereza” e, por fim, os Conjuntos Djambo e João Domingos que,
a partir de 1950, interpretaram a composição “Elisa Gomara Saia”.
No segundo grupo, o dos promotores, mencionam-se o Grupo RM,
os músicos Wazimbo, Stewart Sukuma, Neyma Alfredo, entre outros.
Influências
estrangeiras
Em relação às influências que o dito género sofreu ao longo
dos anos, o escritor e músico Hortêncio Langa considera que a Marrabenta é um
fenómeno de migração sonora das zonas rurais para as cidades. Diz que o
Xigogogwane foi um instrumento com base no qual muitos tocadores dessa criação
musical iniciaram as suas carreiras em Gaza.
De acordo com Langa, a adopção de novos elementos musicais
por parte das comunidades rurais resulta do processo da aculturação, em que os
músicos mesclavam o seu canto, as suas melodias e ritmos tradicionais, com os
sons dos instrumentos assimilados. Por exemplo, a assimilação da guitarra no
campo proporcionou aos cantores novas formas de expressão artística na criação
da Majikha e a sua dança.
O compositor e intérprete da música “Lirhandzo”, Hortêncio
Langa, afirma que “com a migração das populações das zonas rurais do sul de
Moçambique para as grandes cidades em busca de oportunidades de trabalho ou
para cumprir o “Xibalo”, nas décadas de 1940/50, as canções, os ritmos e formas
de tocar dos músicos oriundos daquelas regiões fundiram-se às práticas musicais
urbanas”.
Nessa época a gravação de algumas composições do género
Majikha, sobretudo por parte dos moçambicanos que migraram para a África do
Sul, foi o factor que contribuiu para a sua difusão. De uma ou de outra forma,
a Marrabenta é um género musical que sofreu e sofre a influência da música
estrangeira.
Agnelo Navais, que se refere a músicos como Young Issufo,
Jazz Band, João Domingos, Orquestra Djambo, Conjunto Harmonia, cuja produção
musical tem tonalidades de blues, jazz, swing, rumba, samba, afirma que a outra
característica das músicas dessas bandas é o uso de instrumentos de sopro que
era muito típico na época, “o que nos dava a impressão de estar diante de uma
música de marcha, uma banda militar, onde se sente muito o rufar dos tambores e
a secção de sopro que era dominante”.
Além do mais o facto de o próprio Fani Mpfumo ter vivido na
África do Sul fez com que a sua música carregasse rastos dos géneros Kwella,
Simandjemandje e Jive entre outras músicas daquele país.
Nos dias actuais, a Marrabenta produzida pelo Projecto
Mabulo e por artistas como Stewart Sukuma, Mingas, Neyma Alfredo, Anita Macuácua,
Lorena Nhate e muitos outros inclui marcas da música Rap, Jazz e do Ragga.
De uma ou de outra forma, Agnelo Navais afirma que apesar
destas influências é importante notar aqui que “essas músicas não perderam a
sua base rítmica, principalmente, no que diz respeito ao toque ou ao compasso
dos instrumentos como a bateria e a viola-baixo, onde o ritmo do bombo é
contínuo, e a “caixa da ré” acentua em cima do quarto tempo”.
In: Jornal @VERDADE
– 27.06.201
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