31 outubro 2013

RISCOS DE NOVO CONFLITO INTERNO
 Pesquisa e análise
1. As previsões de evolução da situação interna em Moçambique, após a “escalada” da tomada por forças especiais do Exército/FIR da localidade de Sadjundira, onde Afonso Dhlakama se encontrava acantonado há 1 ano, apontam em geral para cenários de reacendimento de um conflito civil.
Factores chave em que as previsões se apoiam:
-  A Dhlakama e partidários retiraram a 19.Out, à noite, de forma reportada como voluntária e controlada; a área é considerada principal base de apoio e recrutamento da Renamo; a população que nos últimos meses se internara em Sadjundira, fora antes aconselhada a voltar às suas origens – o que aconteceu.
-  As forças do Exército/FIR que entraram na localidade, 21.Out, à tarde, encontraram-na deserta; apenas duas viaturas, uma das quais do SG, Manuel Bissopo.
-  Por meio de telefonemas do próprio a jornalistas, bem como de um comunicado da Renamo, foi disseminada a informação segundo a qual A. Dhlakama estava “a salvo e de boa saúde”; gesto aparentemente destinado a evitar fenómenos de esmorecimento na base de apoio da Renamo; segue-se a necessidade de “marcar presença”, no novo quadro de desvinculação de compromissos com o Governo.
Em 17/18.Outa “cabeça” da coluna motorizada Exército/FIR encontrava-se já num ponto próximo de Sadjundira. A “espera” até 21.Outpara se pôr em marcha terá sido ditada pela intenção de pressionar previamente A. Dhlakama a retirar, entrando só depois disso, de modo a evitar contacto directo.
A ordem para a entrada da coluna em Sadjundira foi dada apenas em 19. Ou pelo CEMG, Gen. Graça Chongo. Há indicações de que o momento escolhido se destinou a fazê-lo coincidir como início de uma “presidência aberta” do Presidente Armando Guebuza à província de Sofala. G Chongo é muito próximo (AM 771) do Presidente.
A ocupação da Sadjundira pelas forças governamentais, independentemente das circunstâncias em que ocorreu, deu à Renamo pretexto/oportunidade para recorrer à força como via para tentar fazer valer as exigências políticas que faz ao Governo e manter o respeito e lealdade da sua base de apoio.
O método que aparentemente está ao alcance das suas capacidades, acções de desgaste e usura que as forças governamentais terão grande dificuldade em prevenir/controlar devido a factores como a vastidão do território/descontentamento da população, alastrará a instabilidade a todo o país.
2 . Em meios diplomáticos e de intelligence atentos à situação prevalece a ideia de que o regime da Frelimo, embora agindo sempre de forma a culpar a Renamo, foi a parte que, de facto, desejou a presente ruptura, por associar à mesma virtualidades capazes de servir ocultos desígnios e interesses e políticos.
Na esteira de eventuais medidas de excepção justificadas pela necessidade de “lidar” com a emergência da instabilidade, a ala predominante do regime, conotada com A. Guebuza, pode, p. exemplo:
-  Restringir a democracia com o fito de apertar o controlo da sociedade; limitar direitos, liberdades e garantias.
-  Alterar a relação interna de forças na Frelimo, de modo a isolar/enfraquecer a influente ala histórica, que lhe é adversa.
- Impôr uma “solução presidencial” do interesse de A. Guebuza; alterar a constituição, aproveitando para tal uma revisão ainda em curso; adiar as eleições para além da data prevista de Out.2014 ou impôr um candidato de conveniência.
Análises anteriores (AM 779) acerca da crise política associavam o silêncio de A. Guebuza no que toca às eleições presidenciais (AM 784) a uma posição do próprio que consistia em condicionar uma decisão final sobre o assunto ao desfecho que a crise com a Renamo viesse a ter – não se sabendo ainda qual seria.
Várias passagens de um comunicado da embaixada dos EUA em Maputo, cuja tónica é a condenação do recurso à violência como via de resolução da crise, sugerem que o Governo é considerado principal responsável da presente situação. Países da União Europeia mais atentos à situação também perfilham esta ideia.
3. Na gestão política que o regime da Frelimo fez de toda a crise, está identificada uma “determinação firme” de não chegar a nenhum compromisso com a Renamo. Foi igualmente notado um esforço constante no sentido de fazer proliferar manifestações de boa vontade e compreensão – consideradas ilusórias.
Uma revisão da legislação eleitoral, nos termos propostos pela Renamo nas negociações com o Governo, equivaleria à perda por parte do regime do controlo que sempre teve da máquina eleitoral, expondo-se assim a riscos de desaires eleitorais, até agora evitados/mitigados com o recurso a fraudulências.
Os adversários internos de A. Guebuza criticaram-no especialmente pela “rigidez” identificada na sua atitude face às reclamações da Renamo. Associaram a essa linha a uma análise de A. Guebuza segundo a qual atender as reclamações da Renamo implicaria a sua fragilização perante a mesma, a sociedade em geral e eles próprios.
4. Num cenário de “deriva” militar, convincentemente remetida para a responsabilidade da Renamo, o regime julga que dispõe de condições (o poder do Estado, sob forma de influências e apoios) para gerir tal contingência à medida dos seus interesses. As novas perspectivas de exploração de recursos também reforçaram a sua capacidade de acção.
Há conhecimento de pontos de vista individuais, emitidos em meios da elite política local, segundo os quais uma eventual deterioração da actual situação não afectaria os planos de exploração do gás natural, cujo mercado natural é a Ásia (AM 758), devido ao facto de a mesma estar concentrada no mar, Bacia do Rovuma.
Este ponto de vista, descrito como mera “racionalização de desejos” inspirada numa realidade similar, Angola, é contrariado por advertências que se sabe estarem a ser feitas às autoridades moçambicanas tais como a de que, nas circunstâncias actuais, ninguém investiria num país que no passado esteve em guerra para a ela voltar.

AFRICA MONITOR – 22.10.2013

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