MATANDO A GALINHA DOS
    OVOS DE OURO 
  
Joseph Hanlon 
  
(Colectânea de textos
    publicados no Jornal  Metical) 
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Mais de 400 milhões de dólares
    desapareceram do sistema bancário na década de 90 em Moçambique. Carlos
    Cardoso e António Siba-Siba Macuácua foram provavelmente assassinados para
    impedir a verdade sobre isto e sobre a maneira como os roubos foram
    efectuados. 
Todos os países usam os bancos para fins políticos.
    Em Moçambique, os bancos foram usados para construir o socialismo, para
    manter o país a funcionar durante a guerra e depois, na nova era
    capitalista, para promover empresários locais e manter a economia livre de
    mãos estrangeiras.  
Porém, banqueiros e homens de negócios, nacionais e
    estrangeiros, apropriaram-se simplesmente de muito dinheiro e foram muitas
    as mãos que foram ao saco.  
Talvez haja uma diferença entre roubar dinheiro e
    promover uma nova elite. Mas os que mataram Cardoso e Siba-Siba tinham
    perfeitamente a noção de que nunca poderiam tirar dinheiro e justificá-lo
    publicamente - e que tinha sido tirado dinheiro suficiente para justificar
    duas mortes pelo menos.  
Talvez tenham conseguido garantir que os pormenores
    nunca venham a ser conhecidos. Mas isso faz com que ainda seja mais
    importante passar em revista aquilo que se sabe e colocá-lo em contexto.
    Este estudo baseia-se em entrevistas com banqueiros e pessoas que conhecem
    o cenário da banca moçambicana mas que deixaram de estar envolvidos quer com
    o BCM, quer com o Banco Austral. O Banco de Moçambique recusou falar
    connosco.  
Numa série de 11 artigos tentaremos mostrar: 
- como a criação do sistema bancário criou
         condições para a fraude e a corrupção; 
 
- como a nova elite conseguiu pilhar a banca antes
         da privatização; 
 
- como o FMI e o Banco Mundial "de
         facto" levaram o governo a aceitar a corrupção; 
 
- como as privatizações tiveram um cunho político
         e envolveram famílias importantes e ligadas a altas entidades do
         partido e do Estado; 
 
- como as duas privatizações de bancos foram
         dúbias e usadas por moçambicanos e seus associados estrangeiros para
         roubar ainda mais. 
 
 
A colectânea ou o ensaio está dividido em pedaços
    curtos de  11 partes:  
Não haverá revelações e poucas coisas são realmente
    novas. Mas juntando aquilo que já é conhecido, espero mostrar que a
    ganância crescente acabou por matar a galinha dos ovos de ouro. Ao fim e ao
    cabo a elite política perdeu o controlo dos bancos. E em vez de ter servido
    para reforçar o poder económico dos moçambicanos, o resultado foi o
    controlo estrangeiro sobre a banca moçambicana.  
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Quando o dinheiro não é importante 
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Na altura da Independência, bancos não eram prioridade para a Frelimo.
    O Banco de Moçambique  (BdM) foi estabelecido como o primeiro banco central
    em 17 de Maio de 1975, a partir da transformação do Banco Nacional
    Ultramarino, mas passaram-se mais de dois anos sem ser tomada qualquer
    medida.  
Os bancos privados eram hostis ao novo governo e facilitavam a fuga de
    capitais, particularmente a portugueses que tinham abandonado o país, tanto
    através de transferências directas de dinheiro como em forma de pagamento
    de mercadorias que nunca foram entregues.  
O governo acabou por nacionalizar
    todos os que restavam excepto um, em 31 de Dezembro de 1977.  Quatro bancos foram agregados ao BdM e dois passaram a formar o Banco
    Popular de Desenvolvimento (BPD). Só o Banco Standard Totta de Moçambique
    (BSTM) se manteve privado. O BdM tornou-se o único banco que podia lidar
    com divisas, era a tesouraria pública, o banco central, o controlador do
    plano estatal e além disso um banco comercial.  
A Frelimo assumiu que numa economia centralmente planificada,
    equilibram-se mercadorias com mercadorias e este é o principal método para
    fazer a alocação dos recursos, deixando o dinheirro de ser importante. O
    orçamento de Estado financiava as despesas públicas, enquanto o sistema
    bancário financiava os défices das empresas (privadas, estatais  ou
    intervencionadas).  
Nos primeiros cinco anos da Independência, a prioridade foi manter a
    produção a andar e não despedir trabalhadores, apesar da fuga dos gestores
    e técnicos portugueses; os bancos controlados pelo Estado recebiam
    instruções para financiar os défices das empresas e mantê-las a funcionar.  
Tal como Marc Wuyts esclarece na sua tese Money and Planning for
    Socialist Transition , isto era "o instrumento mais directo e
    eficaz no combate à sabotagem económica. Longe de ser  um factor
    desestabilizador, esta política era fundamental para estabilizar o emprego,
    evitar  mais colapsos na produção, e conservar os preços estáveis".  
Só que isto implicava dinheiro extra em circulação e por volta de 1980
    era evidente que havia grandes quantidades de notas nas mãos dos
    especuladores. Uma das razões para a reforma monetária de 1980, que
    substituiu o antigo escudo pelo metical , era destruir
    enormes quantidades de dinheiro que não tinham sido depositados em bancos.  
Mas com o início da guerra o quadro mudou. O governo fez imprimir notas
    para financiar a guerra e de novo os bancos começaram a fazer empréstimos
    para cobrir défices das empresas, neste caso causados cada vez mais pela
    guerra. A criação de dinheiro em excesso alimentou a candonga e o excesso
    de dinheiro circulava rápidamente para as mãos dos especuladores e de
    capital privado comercial.  
Os procedimentos bancários da primeira década da Independência não eram
    corruptos nem desonestos; eram mesmo altamente eficientes em manter a
    economia a funcionar apesar da sabotagem, da fuga dos portugueses e, nesta
    altura, da intensificação da guerra. Mas eram procedimentos irregulares no
    sentido normal da banca capitalista. Desde que isso estivesse de  acordo com
    o plano, os défices das companhias eram cobertos com empréstimos que não se
  esperava que fossem pagos.  
Era a total sobreposição do sistema bancário com tesouraria - quando
    Samora Machel ia viajar,  alguém da presidência telefonava simplesmente ao
    BdM ou ao BPD e pedia uns milhares de  dólares em dinheiro vivo, para a
    delegação. O sistema funcionou por causa da honestidade, integridade e boa
    vontade da maioria das pessoas no sistema bancário. Mas nos últimos tempos
    da era de Samora a extravagância já se instalava e delegações que iam ao
    estrangeiro  tiravam cada vez mais dinheiro dos bancos para fazer compras no
    estrangeiro.  
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A Banca pós-Samora 
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Em 1986, a guerra e a pressão dos doadores obrigaram o
  governo a liberalizar a economia. Em Abril de 1986 Abdul Magid Osman passou a
  Ministro das Finanças e Eneas da Conceição Comiche foi designado Governador
  do Banco de Moçambique (BdM). Em 19 de Outubro de  1986, Samora Machel foi
  morto. A 14 de Janeiro de 1987 Moçambique introduziu o Programa  de
  Reabilitação Económica, ou PRE.  
Abdul Magid Osman disse em 1990 que "Moçambique
  precisa de uma elite de empresários".  E a velha elite socialista
  acreditou que devia ser ajudada a tornar-se a nova elite capitalista. O PRE significou uma viragem para uma banca mais
  tradicional. Em 1987 o governo reconheceu 34% do portfolio do BdM -
  correspondendo a 40,6 mil milhões de Mt (correspondendo na altura a cerca de
  160 milhões de US$) como empréstimos a fundo perdido das empresas públicas. 
  Mas a guerra em curso significava que o crédito bancário continuava a ser
  importante para manter as empresas a funcionar. José Miguel Sequeira Braga,
  administrador no Banco Popular de Desenvolvimento (BPD) até se reformar em
  1995, disse "o governo deu instruções  para se injectar capital nestas
  empresas para lhes permitir continuar a funcionar e evitar o despedimento de
  dezenas de milhar de trabalhadores".  
Metade dos empréstimos do BPD não seriam reembolsados
  mas Sequeira Braga fez notar que "a má situação económica e financeira
  de praticamente todas as empresas, decorrente da guerra, que resultou na
  acumulação de dívidas para com o banco; a injecção e/ou aquisição de capital
  em empresas com dificuldades financeiras, por orientação do Governo, para permitir
  a continuação do seu funcionamento e impedir o despedimento de trabalhadores
 (dezenas de milhar). Na mesma situação ou mesmo pior estavam muitos bancos
  dos países europeus nos anos logo após a II Grande Guerra."  
Qualquer país - seja capitalista ou socialista - apoia
  os empresários da sua preferência.  Num Estado de planeamento centralizado
  estava certo canalizar o dinheiro de acordo com  as directivas do plano.  
Durante a guerra era essencial usar o dinheiro dos
  bancos para manter a economia a funcionar.  Num país hierarquizado como
  Moçambique, qualquer funcionário bancário seguiria as instruções do
  Presidente. E na nova economia de mercado o sistema bancário era essencial
para promover empresas e negócios moçambicanos. Tudo isto levou a empréstimos
  que poderiam não ser honrados e todavia não se devem considerar
  "corruptos".  
Mas a transição para a economia de mercado levou a
  práticas cada vez mais questionáveis.  Em 1988 a Caixa de Crédito Agrario e de
  Desenvolvimento Rural (CCADR) usou dinheiro dos fundos de contrapartida dos
  doadores para dar "empréstimos" a militares e membros do aparelho
  partidário, sabendo de antemão que os empréstimos não eram para pagos
  pelos beneficiários. A CCADR era gerida pelo BPD.  
A privatização tinha começado; os bancos emprestaram
  dinheiro a empresários moçambicanos  para comprar e reabilitar companhias
  estatais - e para os carros de luxo e as viagens ao estrangeiro que a nova
  elite exigia. O Ministro das Finanças, Magid Osman, avisava em 1990  contra
  "a actual tendência que leva à criação de uma classe baseada em negócios
  dúbios e  que exige várias gratificações e protecção do Estado".
  Funcionários bancários começavam  a aprovar empréstimos em troca de comissões
  de 10%, sabendo que os empréstimos nunca seriam pagos". Mesmo em 1986 havia já corrupção significativa entre os
  militares e ao mesmo tempo os comerciantes que tinham acumulado riqueza
  durante os dias da candonga se tornavam cada vez mais visivelmente poderosos.
  Uns tantos funcionários seniores do BdM eram corruptos e começaram a apoiar
  famílias de origem asiática nos seus negócios ilegais em divisas.
  Comerciantes houve que não se importaram de ser vistos a ir a casa de um alto
  funcionário do BdM com sacos de notas de Rand.  
Um melhor sistema de registo teria permitido apanhar
  alguma desta má conduta mas qualquer melhoria no sentido da eficiência era
  bloqueada por pessoas dentro dos bancos que precisavam da cobertura dos
  antigos sistemas.  
Com a "viragem ao Ocidente", a ajuda duplicou
  de 359 milhões de US$ em 1985 para 710 milhões em 1987. Havia corrupção a
  altos níveis em Ministérios e Secretarias de Estado. No começo dos anos 90,
  pelo menos duas figuras séniores da "nomenclatura" local tinham
  contas no estrangeiro superiores a 3 milhões de US$. E no final dos anos 80
  falava-se de pessoas próximas da presidência que já usavam dinheiro da ajuda
  para acumulação pessoal.  
Banqueiros idóneos contaram-nos de pessoas próximas do
  Presidente dando instruções para que fossem dados empréstimos a certas
  companhias ou dinheiro vivo a certas pessoas.  
O Projecto de Desenvolvimento de Pequenas e Médias
  Empresas do Banco Mundial, de 1989, emprestou 32,6 milhões de US$ através do
  Banco Comercial de Moçambique, BCM, do BdM. O avaliador do Banco Mundial,
  Luís Landau, escreveu em 1998 que 90% destes empréstimos nunca seriam pagos.
  E mais: "Diz-se que o Banco Mundial exerceu bastante pressão sobre a
  administração dos bancos para assegurar o desembolso expedito dos fundos do
  projecto; isso prejudicou ainda mais a qualidade do crédito dos
  sub-empréstimos." Por outras palavras, a pressão do Banco Mundial
  encorajou os empréstimos corruptos.  
O Projecto de Reestruturação das Empresas Industriais
  do Banco Mundial era parecido e emprestou cerca de 29 milhões de US$ a
  companhias estatais privatizadas. Poucos empréstimos foram feitos até 1995 e
  o período de graça, antes de começar o reembolso do empréstimo, é de 5 a 7
  anos, e por isso não é possível saber se estes empréstimos serão pagos. Mas
  como estão agora a começar a vencer, isso pode estar na origem das provisões
  adicionais para crédito mal parado pedidas pelo BCM e pelo Banco Austral.  
Numa entrevista a 13 de Julho de 2001, James Coates,
  Representante Residente do Banco Mundial, disse que não tinha nenhuma lista
  de pessoas a quem o dinheiro do Banco tinha sido emprestado. Disse que isso
  era da inteira responsabilidade do BdM que é também responsável pelo
  reembolso ao Banco Mundial e esse sim, deve ter a lista.  
Carlos Cardoso escreveu que a opinião pública via o BPD
  e o BCM como o "saco azul" para as altas entidades do governo e do
  partido Frelimo e fez notar que é convicção generalizada que os bancos
  financiaram a campanha para as eleições de 1994.  
  
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Privatização forçada 
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Os sectores comercial e central do Banco de Moçambique,
  BdM, começaram a ser separados em 1987. Adriano Afonso Maleiane tornou-se
  Vice-Governador do BdM em 1990. Em 1991, Eneias Comiche foi promovido a
  Ministro das Finanças e Adriano Maleiane substituiu-o como Governador do BdM.
  Dois meses após a sua nomeação, Maleiane passou regulamentos e nomeou
  directores para o sector comercial do BdM. A 25 de Fevereiro de 1992 o BdM
  foi formalmente dividido em dois e nasceu o Banco Comercial de Moçambique
  (BCM).  
Tanto Maleiane como os seus funcionários superiores
  recusaram falar connosco. Mas durante as entrevistas funcionários séniores de
  outros bancos deixaram claro que a prioridade de Maleiane era transformar o
  BdM num banco central eficiente e sério. Ao BCM foi dado o que tinha restado.
  Algum do pessoal do BdM era competente e honesto mas Maleiane conhecia os
  podres do seu banco e transferiu o pessoal corrupto, incompetente e
  preguiçoso para o BCM.  
As figuras-chave no BCM eram Augusto Cândida, PCA,
  Alberto Calú e o irmão de Eneias Comiche, Teotónio Comiche.  
Um estudo do Banco Mundial de 1991 sugeria que, estando
  o BCM e o BPD em tal barafunda, o melhor era fechá-los. Isto nunca chegou a
  ser uma opção a sério, mas Magid Osman, como Ministro das Finanças, queria-os
  privatizados - sentia que eles estavam demasiado corrompidos para continuarem
  a ser bancos do Estado e não era possível controlá-los. Mas outros opunham-se
  à privatização e queriam os bancos em ordem. O Ministro das Finanças Comiche
  e o Governador Maleiane do BdM receberam instruções políticas nesta matéria e
  inicialmente o objectivo era melhorar a eficiência do sector bancário e da
  capacidade regulatória do BdM. Maleiane anunciou finalmente que o BCM e o BPD
  seriam privatizados só em Março de 1995.  
A privatização do BCM era uma das sete "condições
  necessárias" da Estratégia de Assistência ao País, CAS, do Banco
  Mundial, em 7 de Novembro de 1995. Isto significava que se o BCM não fosse
  privatizado, o Banco Mundial podia terminar o seu programa e cortar a ajuda a
  Moçambique. (Acabar com a protecção à indústria do caju foi uma
  "condição necessária" muito mais controversa desse famoso CAS). O
  documento-quadro de política do FMI e Banco Mundial, de 11 de Abril de 1966,
  exigia a privatização de ambos os bancos em 1966.  
O Banco Mundial estava convencido de que haveria bancos
  internacionais interessados no BCM e no BPD. Houve interesse inicial em ambos
  os casos mas os potenciais compradores desistiram mal olharam para os livros.
  Havia demasiado caos e mau crédito, para além dos sistemas caóticos de
  contabilidade. Em 1996 o Ministro das Finanças Tomás Salomão admitiu que
  desde 1992 o governo já tinha metido 650 mil milhões de Mt no BCM, que na
  altura já era mais de 100 milhões de US$.  
Havia más relações entre o Banco Mundial e o BPD
  relativamente à questão da privatização. A tensão entre Firmino Santos, o
  elemento de coordenação do processo de privatização no BdM, e Simon Bell, o
  economista do Banco Mundial em Maputo, aumentou. Foi dito ao pessoal do Banco
  que estavam proibidos de falar directamente com Simon Bell e tinham de tratar
  com ele através do BdM.  
Mas o FMI e o Banco Mundial mantiveram a pressão. O BPD
  foi finalmente privatizado em meados de 1996, mas nenhum banco estrangeiro
  queria o BPD. No início de 1997 o FMI disse que a ajuda a Moçambique ia ser
  cortada se o BPD não estivesse privatizado no fim de Junho.  
Como vamos demonstrar nos próximos dois artigos, ambas
  as privatizações foram extremamente dúbias. Mas o facto é que Moçambique não
  tinha por onde escolher. O FMI e o Banco Mundial exigiam a privatização mesmo
  que ela fosse corrupta; e parte da elite moçambicana juntou-se a parceiros
  estrangeiros para tirar vantagens desta pressão.  
  
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BCM - de metalúrgico a banqueiro 
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Apesar do optimismo do Banco Mundial, havia pouco
  interesse pelo Banco Comercial de Moçambique, BCM. Enquanto subia a pressão
  do FMI e Banco Mundial, veio uma proposta de António Carlos de Almeida
  Simões, que pertencia a uma antiga família industrial portuguesa que fora
  proprietária de uma pequena companhia em Lourenço Marques, a Empresa
  Metalúrgica de Moçambique, EMM.  
Simões tinha-se proposto unificar e modernizar o sector
  metalúrgico e tinha ganho o apoio do então Ministro da Indústria, António
  Branco, e do Vice-ministro da Indústria Pesada, Octávio Filiano Muthemba, que
  mais tarde veio a substituir António Branco como ministro. Na altura Branco e
  Muthemba estavam determinados em promover o desenvolvimento do sector privado
  industrial e queriam estabelecer um banco de desenvolvimento industrial.  
Simões progrediu rapidamente. A EMM e o Estado
  estabeleceram conjuntamente a Companhia Siderúrgica de Moçambique, CSM,
  tomando conta da CIFEL e da Companhia Moçambicana de Trefilarias, Trefil.
  Inocêncio António Matavel era administrador da CSM. António Branco era
  administrador da Trefil por parte do Estado.  
A EMM também estabeleceu a Companhia Transporte
  Rodoviário de Maputo, Transmap, com Levy Filiano Muthemba, irmão de Octávio
  Muthemba. Inocêncio Matavel era um importante empresário ligado à Frelimo,
  proprietário da empresa Projectos, Investimento e Consultoria, Proinvest, que
  por sua vez é proprietária da Proinvest Câmbios.  
Em 1991 terminou o monopólio do Estado na indústria de
  seguros e em 1992 António Simões criou a Companhia Moçambicana de Seguros,
  Ímpar. Os accionistas principais eram Simões, Matavel, EMM, Proinvest, Madal
  (onde António Branco passou a administrador depois de sair de ministro) e o
  BPD (na altura dirigido por Hermenegildo Gamito). Os investidores portugueses
  incluiam a Companhia de Seguros Império, que era controlada pelo Banco Mello
  e que dava o apoio técnico.  
Com o apoio de Branco e Muthemba, Simões pediu dinheiro
  emprestado para importar equipamento, modernizar a CSM e desenvolver a Trefil.
  Entre 1992 e 1994 a CSM e a Trefil receberam 17 milhões de US$ em empréstimos
  altamente favoráveis e de longo prazo, com dinheiro da ajuda da Noruega,
  França, Alemanha, Suécia e Suiça. Além disto, as companhias de Simões deviam
  pelo menos 1 milhão de dólares ao BPD. Mas a indústria metalúrgica não foi
  revitalizada. O equipamento mostrou-se muito dispendioso e nunca foi
  instalado. A CSM só funcionou uns meses depois da privatização. Não tardou
  muito que Simões não tivesse dinheiro nem para importar matérias-primas nem
  para salários.  
Apesar disto, em 1996, Simões estava à frente de um
  consórcio para tomar conta do BCM. Na altura Carlos Cardoso escreveu:
  "Acontece que a CSM jamais se revitalizou e, reza a especulação de
  fontes informadas, Simões usou uma parte dos 20 milhões USD para, mais tarde,
  comprar o BCM." Nem o governo nem fontes do banco quiseram nunca dizer
  se os empréstimos alguma vez foram pagos.  
Os acordos para o empréstimo foram assinados por
  Ricardo David, Director Nacional do Tesouro e vários foram especificamente
  autorizados pelo vice-ministro das Finanças, na altura Boaventura Langa Cossa
  ou pelo ministro das Finanças, na altura Eneias Comiche. Do lado da companhia
  assinaram Simões, Branco e Matavel.  
Ricardo David foi trabalhar com António Simões,
  primeiro na Ímpar e depois como administrador do BCM. Comiche tornou-se PCA
  do BCM. Boaventura Cossa substituiu Hermenegildo Gamito como PCA do BPD e
  orientou a privatização nessa qualidade. Muthemba passou a PCA do BPD
  privatizado. Mário Machungo, Primeiro Ministro na altura, tornou-se PCA do
  seu próprio Banco, o BIM e em 2000 passou a PCA do BCM também, ficando
  Comiche como o seu Vice. Em 2000, Oldemiro Balói, Ministro da Indústria entre
  1995 e 1999, juntou-se ao conselho de administração do BCM com António Branco
  como presidente da assembleia geral.  
Havia realmente duas propostas para ficar com os 51% do
  BCM à venda. Uma era de um consórcio criado por António Simões que era 50%
  Ímpar, 35% National Merchant Banks of Zimbabwe, NMBZ, e o resto Banco Mello
  de Portugal. O outro concorrente era a Caixa Geral de Depósitos de Portugal.  
O NMBZ nunca asumiu um papel activo e um dos seus
  funcionários disse-nos muito abertamente que "eram uma frente para um
  grupo de pessoas de Moçambique" Acrescentou que o Ministério das
  Finanças lhes dava instruções quando vinham a Maputo para reuniões do BCM.
  Várias figuras seniores da banca insistiram connosco em que o NMBZ
  representava a família Chissano.  
Todo este proceso estava fortemente personalizado e
  politizado. O Banco Mello não tinha nenhum interesse em Moçambique mas Simões
  era amigo de Vasco de Mello, presidente do Banco Mello e este acabou por
  cobrir a proposta de Simões sem dar muito apoio prático.  
Entretanto, subitamente a Caixa Geral de Depósitos
  desistiu; várias outras fontes garantiram-nos que Simões usou das suas
  conexões políticas para convencer Almeida Santos, Presidente da Assembleia da
  República de Portugal, a persuadir a CGD que era politicamente insensato
  competir contra uma proposta de privatização que incluia o Presidente de
  Moçambique.  
Isto deixou portanto um só concorrente que era António
  Simões. Os funcionários do BdM, nomeadamente Firmino dos Santos, opuseram-se
  fortemente na base de que Simões já era considerado um mau pagador. Mas o
  Banco Mundial apoiou Simões presumindo que o BdM e a Frelimo estavam
  simplesmente a querer impedir a privatização e disseram ao Governador
  Maleiane que o BCM tinha de ser privatizado a favor do único concorrente que
  restava.  
A 26 de Julho o BCM era formalmente privatizado a favor
  do consórcio, que tinha oferecido 107 milhões de US$ por 51% do BCM - embora
  não seja claro quanto deste valor foi efectivamente pago.  
António Simões e o Banco Mello nomearam José Eduardo
  Lopes Palma como PCA. Dos cinco funcionários do topo do BCM, só dois
  permaneceram - Teotónio Comiche escolhido pelo governo e Alberto Calú,
  mantido pelos novos donos. Dentro do BCM, António Simões manteve-se discreto
  mas tomou conta do andar superior do edifício do BCM, incluindo o gabinete do
  antigo PCA do BCM, para escritórios das suas companhias metalúrgicas EMM, CSM
  e Trefil.  
Os novos donos do BCM nunca fizeram a devida auditoria
  ou due diligence do banco e por isso nunca houve uma imagem fiel de quanto
  tinha sido trazido em crédito mal parado. Um dos novos funcionários do BCM
  começou a olhar para os livros e encontrou uma série de fraudes. "O
  banco precisava de uma limpeza geral. Mas isso nunca aconteceu. Os
  accionistas disseram-nos para não fazer nada". De facto só em 1998 é que
  foram introduzidos controlos apropriados.  
António Simões tinha esperança de usar o seu novo banco
  para fazer empréstimos às suas companhias metalúrgicas. Mas Firmino dos
  Santos travou-o. Deu ordem a todos os bancos para reportarem semanalmente
  sobre o estado das contas de António Simões e para não lhe concederem crédito
  sem autorização.  
Não demorou que o BCM estivesse de novo com problemas,
  com grandes fraudes e défices. Funcionários moçambicanos começaram a
  pressionar o Banco Mello para assumir um papel mais activo. No início de 1998
  Simões vendeu as suas acções na Ímpar ao Banco Mello por 20 milhões de US$.
  Passou um ano até o governo e o BdM concordarem com a venda, em Fevereiro de
  1999. O novo PCA nomeado pelo Banco Mello, Manuel Ortigão Ramos, assumiu o
  cargo em Abril de 1999 e Alberto Calú saíu do banco.  
António Simões deixou Moçambique com uma indústria
  metalúrgica e um banco devastados atrás de si e ainda enormes dívidas. Mas
  aparentemente alguém beneficiou com o seu envolvimento.  
  
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BPD - mais amigos de família 
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Em 1997, o Banco Popular de Desenvolvimento, BPD, tinha
  120 milhões de US$ em depósitos domésticos e 17 milhões depositados no
  exterior, em 17 bancos diferentes. Mas a Deloitte & Touche avisou que o
  total de crédito mal parado era muito elevado e o BPD precisava de fazer
  provisões de 23 milhões de US$, o que significava 52% do total dos seus
  empréstimos. O Banco Português de Investimento, que estava a gerir a
  privatização, fez notar no seu memorando de venda que o controlo do crédito
  era muito frágil. O FMI insistia na privatização do BPD mas nenhum banco
  estrangeiro estava interessado.  
Em 1996 um grupo moçambicano organizou-se para criar o
  Invester. Era chefiado por Octávio Muthemba, antigo ministro da indústria e PCA
  do SPI, uma holding da Frelimo. Jamú Hassan disse que as cotas da Invester
  eram, em partes iguais, de Muthemba, Hassan e Álvaro Massingue. O Invester
  tentou, sem sucesso, encontrar um parceiro sul-africano para o BPD.  
O Presidente Joaquim Chissano fez uma visita de Estado
  à Malásia de 19 a 21 de Março de 1997 com Muthemba e Hassan como parte da
  delegação. Chissano solicitou ao primeiro-Ministro da Malásia, Mahatir
  Mohamed, que lhe arranjasse um parceiro para o Invester -- o Southern Bank
  Berhad (SBB). Isto foi antes da crise financeira da Ásia, quando a Malásia
  procurava envolver-se na África Austral e tentava difundir o conceito da
  "parceria inteligente".  
SBB tem ligações com o ex-ministro da Malásia, Daim
  Zainuddin. Em 1997 o banco tinha 1% do mercado da Malásia, mas acabava de ter
  um significativo aumento do seu capital social e procurava expandir-se. A
  crise asiática, que atingiu a Malásia em Julho de 1997, desencadeara uma
  crise bancária no país.  
A privatização do BPD consumou-se a 3 de Setembro de
  1997, ficando o estado com 40%, e uma holding chamada Investil com os
  restantes 60%. A Investil era constituida em 51% pelo SBB e pela Invester em
  49%. Os dois novos investidores deviam pagar 21 milhões de US$, mas destes
  mais de 2,5 milhões nunca foram pagos. O SBB devia participar com tecnologia
  e capital fresco; o banco passou a chamar-se Banco Austral. O SBB exigiu
  controlar o banco e inicialmente nomeou o seu próprio Director Executivo,
  Dato' Tan Teong Hean, como Director Executivo do Banco Austral. Mas nos
  finais de 1997 o Banco Austral passou a ter um Director Executivo exclusivo,
  K. Muganthan, que substituiu Dato' Tan Teong Hean. Octávio Muthemba passou a
  PCA.  
O Presidente Joaquim Chissano recusou sempre publicar a
  lista dos seus bens e a imprensa sempre assumiu, sem prova, que a família
  Chissano tinha ligações estreitas com o Banco Austral. Na altura da
  assinatura do acordo foi publicada uma fotografia de Nympine Chissano com os
  compradores malaios. Em Outubro de 1998 foi criada a empresa Locomotivas
  Económicas com os filhos dos dirigentes da Frelimo. O segundo nome depois de
  Muthemba é Nympine Chissano. Os filhos de Mondlane, Machel e Katchamila
  também fazem parte. Entretanto Levy Muthemba, irmão de Octávio, criou a MM
  Trading que passou para Nympine Chissano e os irmãos Nyeleti e Eduardo
  Mondlane. (Várias grafias do nome Nympine aparecem nos BR's). Nympine
  Chissano criou outra companhia, Afrasia, com homens de negócios malaios; esta
  companhia tentou estabelecer uma lotaria e em 2001 construir um prédio em
  frente ao Ministério da Defesa.  
Tal como com o BCM, não foi feita nenhuma auditoria due
  diligence ao BPD quando foi privatizado, e assim não é possível saber o que
  foi feito pela nova administração e o que foi feito pela anterior. Este era o
  primeiro investimento estrangeiro feito pelo SBB que, na Malásia, estava em
  posição vacilante por causa da crise financeira. Por isso nunca pôs no banco
  dinheiro ou apoio técnico. Havia entretanto batalhas políticas. Os malaios
  alegavam que Muthemba não estava autorizado a conceder créditos, mas fazia-o.
  Num artigo no Savana de 6 de Abril de 2001, uma fonte anónima do Banco
  Austral disse que os empréstimos eram dados a pessoas sem garantias, por
  vezes a troco de comissões de 10%. O MediaFax de 18 de Abril de 2001 alegava
  que o pessoal malaio também concedeu empréstimos sem garantias e falava da
  "generosidade" de K. Muganthan. No espaço de 18 meses o banco
  estava em crise e apareciam rumores na imprensa de falta de liquidez.  
Em 2000 o BdM interveio para restringir novos
  empréstimos e obrigar a uma auditoria. Esta foi levada a cabo pela KPMG e
  submetida a 15 de Janeiro de 2001. A auditoria mostrava que as provisões para
  crédito mal parado e outros problemas tinha sido subestimada em 50 milhões de
  US$. A KPMG registou que 31% dos empréstimos deviam ser considerados dívidas
  não pagas, em vez dos 11% assumidos pela administração do banco. O crédito
  mal parado anterior à privatização em Setembro de 1997 excedia os 200 mil
  milhões de Meticais - 13 milhões de US$ na altura da auditoria, mas que eram
  18 milhões na data da privatização. Mas a provisão para crédito vencido para
  os empréstimos após a privatização devia ser de 310 mil milhões de Mt - o que
  quer dizer que em apenas três anos o Banco Austral tinha feito empréstimos de
  20 milhões de US$ que não seriam reembolsados.  
A KPMG encontrou "diferenças irreconciliáveis
  entre o balancete e os detalhes de suporte" que exigiam riscar dívidas
  no valor astronómico de 69 mil milhões de Mt (4,3 milhões de US$). Também 7,7
  mil milhões de Mt (500 mil US$) em empréstimos a funcionários do banco não
  puderam ser recuperados. E no contexto da reconciliação de fraudes a ser
  discutido noutro artigo, a KPMG encontrou um buraco de 20,8 mil milhões de Mt
  (1,7 milhões de US$) nas contas de transacções entre a sede e os balcões, e
  um buraco de 27,7 mil milhões de Mt (1,7 milhões de US$) nas contas
  transitórias. Destes mais de 8 milhões de US$, só 1,6 vinham de antes da
  privatização, de acordo com a KPMG.  
A KPMG também recomendou que fossem riscados 66 mil
  milhões de Mt (4,1 milhões US$) da dívida contraída pela Southern Investments
  (Moçambique) Lda, resultante da aquisição de participações financeiras ao
  banco em 1998. A KPMG diz: "provisionámos este montante na totalidade
  por não haver indicação de que o banco irá recuperar esta dívida". A
  Southern Investments Moçambique só foi registada em Dezembro de 1999 e é
  propriedade de Koonjambu Muganthan, director do Banco Austral, e Jamú Suleman
  Hassan, um dos proprietários moçambicanos.  
Assim, o relatório da KPMG sugere que, do crédito mal
  parado, da má contabilidade, do roubo e da fraude, 15 milhões de US$ vinham
  de antes da privatização e 30 milhões de US$ incorreram em apenas 3 anos de
  gestão privada.  
  
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Colapso dos dois bancos 
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 Tanto o Banco
  Comercial de Moçambique, BCM, como o Banco Austral sofreram crises em 2000 e
  precisaram de uma reestruturação profunda.  
Em Janeiro de 2000, Jardim Gonçalves, patrão do Banco
  Comercial Português, BCP, ficou com o Grupo José de Mello o que lhe trouxe o
  controlo do BCM. Finalmente o BCM teve auditores a fazer as contas a sério.  
A 4 de Outubro de 2000 o BCM anunciou que um estudo dos
  seus auditores tinha mostrado a necessidade de uma provisão adicional de 114
  milhões de US$ para dívidas não pagas. Os accionistas teriam de meter 106
  milhões de capital extra. A cota do governo era de 52 milhões em forma de
  títulos.  
Numa declaração a 22 de Março de 2001, o BCM anunciou
  um prejuízo de 27 milhões de US$ para 2000. Dizia que 33% do total do portfolio
  de crédito era agora considerado vencido e que se precisava de mais uma
  provisão de 48 milhões para cobrir dívidas não pagas além de
  "diversos" - elevando para 162 milhões de US$ o total das provisões
  para crédito mal parado.  
O BCP já controlava o Banco Internacional de
  Moçambique, BIM. Havia a preocupação de que Gonçalves dominasse o sector
  financeiro e ele veio quatro vezes a Maputo para encontros com ministros e
  funcionários da banca. Finalmente, a 24 de Outubro de 2000, numa conferência
  de imprensa, disse que o governo tinha aceite que o BCP controlasse o BIM e o
  BCM. Em contrapartida o BCP metia os 54 milhões necessários para
  recapitalizar o BCM.  
Disse depois que sabia onde é que os prejuízos tinham
  ocorrido mas não ia dizê-lo à imprensa porque as perdas tinham ocorrido em
  1999 e mesmo antes, antes do BCP controlar o banco e não era portanto da sua
  responsabilidade. Gonçalves e o governo tinham chegado a um acordo - seria
  colocada uma pedra sobre o passado. Nada seria dito ou feito acerca dos prejuízos
  e fraudes acontecidas antes de 2000 e as duas partes simplesmente fechariam o
  buraco. Em troca Gonçalves podia dominar o sistema bancário.  
Entretanto, em Outubro de 2000, o conselho de
  administração do Banco Austral concordou com o BdM em aumentar o capital e
  começou a limpar o banco a 31 de Março de 2001. Mas o banco malaio, SBB, já
  tinha perdido o interesse. O governo da Malásia estava a reestruturar o seu
  sistema financeiro muito abalado e a 18 de Fevereiro de 2000 anunciou que os
  seus 58 bancos e sociedades financeiras iam ser integrados em 10
  "bancos-âncora". O SBB era um deles e não estava interessado em
  permanecer num banco difícil em África.  
Mas só na reunião do conselho de administração de 3 de
  Abril de 2001 é que a Investil anunciou que não estava preparada para meter
  mais capital e entregava as suas acções ao governo. O pessoal malaio do banco
  distribuiu um documento anónimo pelos jornais intitulado "Razões para a
  saída do SBB de Moçambique". Nele se dizia que os moçambicanos não
  tinham "uma cultura de pagamento das dívidas", particularmente a
  elite. "Se lhes negas um empréstimo, estás mal. Se lhes concedes
  empréstimo estás mal porque eles não pagam".  
O documento incluia uma lista de alegadas dívidas não
  honradas de nomes associados com a elite política. Os três donos da Invester
  tinham empréstimos superiores a 2 milhões de US$ do Banco Austral, de acordo
  com essa lista. O relatório da KPMG e a lista de maus pagadores publicada
  pela nova administração sugeriam que mais ou menos metade do total desses
  empréstimos estavam a ser reembolsados e outra metade estavam vencidos.  
A maior parte das figuras séniores ligadas ao governo
  queriam o Banco Austral liquidado, num processo semelhante ao do BCM, pondo
  uma pedra no assunto dos créditos corruptos.  
Surpreendentemente o Banco Mundial e a maior parte dos
  doadores estava de acordo, talvez porque estavam contra que se injectasse
  ainda mais dinheiro no banco. Mas o FMI e figuras-chave no Ministério do
  Plano e Finanças opunham-se à liquidação na base de que isso ia custar ainda
  mais caro além de destruir a confiança no sistema bancário.  
  
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Quem ia ficar com o Banco Austral? 
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Na sequência da contestada decisão de não fechar o
  Banco Austral, o banco central, BdM, interveio e tomou conta da operação,
  nomeando um novo Conselho de Administração. O novo presidente era António
  Siba-Siba Macuácua, director de supervisão bancária no BdM. Arlette Georgette
  Jonasse Patel, que vinha do anterior CA por parte do governo, manteve-se na
  posição.  
Siba-Siba era um economista muito respeitado. Mas
  pode-se argumentar que estas pessoas eram precisamente as que deviam ter
  exercido maior vigilância para garantir que a crise não acontecesse e que
  deviam ter actuado mais cedo.  
Adriano Maleiane disse numa conferência de imprensa a 3
  de Abril de 2001, que o Banco Austral precisava de uma recapitalização de 2
  800 mil milhões de Mt, correspondendo então a 150 milhões de US$. O PCA
  interino, António Siba-Siba, moveu-se rapidamente. A 19 de Junho o Banco
  Austral publicou no jornal Notícias uma lista de mais de 1000 indivíduos e
  companhias com empréstimos vencidos. Uma lista deste tipo nunca tinha sido
  publicada para o BCM. Mas a lista do Banco Austral não continha os nomes de
  qualquer figura importante, mesmo aqueles que constavam da lista da KPMG.  
O BdM fez saber que procurava um banco estrangeiro que
  ficasse com 80% do Banco Austral - portanto todo o banco excepto os 20%
  reservados aos trabalhadores - o que não deixava nada para o Estado ou os
  investidores moçambicanos. Os concorrentes foram o Amalgamated Banks of South
  Africa, ABSA, e o Banco Comercial e de Investimentos, BCI, presidido pelo
  antigo ministro das Finanças, Abdul Magid Osman, e com a maioria do capital
  pertencendo à Caixa Geral de Depósitos de Portugal. A CGD já tinha concorrido
  ao BCM.  
O Conselho de Ministros dividiu-se a este respeito, mas
  acabou por dar preferência ao ABSA, evitando assim que todo o sector
  financeiro em Moçambique fosse controlado pela banca portuguesa. O ABSA tem a
  experiência do Commercial Bank of Zimbabwe, CBZ, que tinha uma história
  semelhante à do Banco Austral, incluindo a necessidade de duplicar as
  provisões para crédito mal parado. Em 1998 o ABSA tornou-se accionista com 26%
  do capital e passou a dar apoio técnico. O governo do Zimbabwe detem 20% do
  banco e a International Finance Corporation 15%.  
O ABSA revolucionou o banco e a revista Euromoney por
  duas vezes elegeu o CBZ como o melhor banco do Zimbabwe. Mas o CBZ mantém
  relações muito estreitas com o Presidente Robert Mugabe. O administrador
  executivo do CBZ é Gideon Gono, que em Agosto disse que "o nosso papel
  como CBZ baseia-se em profundas raízes patrióticas". Gono é descrito
  pela Financial Gazette como a pessoa que resolve as situações difíceis ao
  governo. É reitor da Universidade do Zimbabwe, foi recentemente nomeado para
  o "Zimbabwe Broadcasting Corporation", está também no conselho de
  administração do "Zimbabwe Children's Rehabilitation Trust",
  fundado pela primeira-dama, Grace Mugabe.  
Nem o ABSA, nem o BCI se propuseram, de facto, a tomar
  conta de todo o banco no estado em que está. Nenhum deles queria o fardo de
  andar atrás dos devedores e ladrões do passado. O que propunham era apenas
  tomar conta dos depósitos, propriedade e pessoal, mas não de todo o portfolio
  de crédito. A questão é o que fazer com o restante. Os que roubaram o banco
  através de fraudes e empréstimos que nunca pagaram, obviamente que esperavam
  que o banco fosse fechado ou fosse feito o mesmo tipo de acordo que tinha
  sido feito para o BCM e que foi uma pedra sobre o passado, tapar o buraco e
  começar de novo. Mas Siba-Siba estava atrás dos devedores mais conhecidos que
  não figuravam na lista do Notícias.  
No sábado dia 11 de Agosto, António Siba-Siba Macuácua
  foi atirado pelo vão das escadas na sede do Banco Austral. Apesar disso o
  ABSA começou a fazer a sua auditoria due dilligence , na data prevista, na
  segunda-feira dia 13 de Agosto de 2001.  
Siba-Siba e o ABSA encontraram provas de corrupção a altos
  níveis no banco e havia rumores de possíveis queixas-crime em tribunal.
  Aparentemente as tentativas de Siba-Siba para limpar o banco tinham sido
  demasiado rigorosas e alguém ficou com medo de que ele afinal não estivesse
  disposto a pôr uma pedra no passado. Mas o que fazer com as novas provas
  recolhidas pelo ABSA?  
Parece ter havido corrupção de ambos os lados. Os
  registos mais importantes estavam guardados nos computadores do SBB na
  Malásia. Até ao princípio do ano 2001 o BdM ainda não tinha tido acesso a
  eles. Assim é impossivel fazer uma reconciliação de contas completa e havia
  boatos de que interesses malaios teriam escoado dinheiro para fora do banco.
  Do lado moçambicano, um antigo alto funcionário bancário disse-nos: "O
  Banco Austral era gerido politicamente. Havia crédito mal parado, letras de
  crédito sem cobertura, transferências de dinheiro para ministros e muitos
  favores pessoais. As decisões eram tomadas pelos funcionários fora do seu
  mandato, violando regras e procedimentos e possivelmente a lei".  
Além disto, "tanto no Banco Austral como no BCM, é
  impossível a administração não ter sabido das fraudes que havia. Trata-se de
  dinheiros públicos e existe responsabilidade criminal".  
  
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Contas transitórias 
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Nos capítulos anteriores fizémos notar que o dinheiro
  não desaparecia apenas através de crédito indevidamente concedido, mas também
  através de fraudes contabilísticas. Em Moçambique, as contas transitórias,
  contas internas e contas de regularização, que cobrem as transacções entre
  balcões, entre os balcões e a sede e entre Moçambique e os bancos
  estrangeiros, constituíam os pontos fracos e estavam na origem da maior parte
  das fraudes.  
Num banco, tudo tem de estar contabilizado em qualquer
  lado. Quando a transacção ainda não está terminada, o seu registo vai para
  uma conta transitória. Cheques não liquidados, por exemplo, são registados
  numa conta transitória até que chegue a confirmação da transferência, altura
  em que o dinheiro é creditado na conta do cliente.  
Nos termos duma prática bancária normal, incluindo as
  regras do BCM, nenhum registo devia permanecer numa conta transitória por
  mais de 45 dias - o tempo mais que suficiente para ser remetido dos balcões
  mais afastados. E as auditorias anuais devem verificar se não há registos
  antigos pendentes em contas suspensas. A prática normal é fazer uma
  reconciliação em que várias contas e livros são comparados para garantir que
  estão todos em conformidade. Em Moçambique isto não era feito.  
Um artigo no Savana de 7 de Abril de 2000, subscrito
  por "um ex-director do BCM", diz que o BCM tinha biliões de
  Meticais, tanto em moeda nacional como em divisas, que ficavam em contas
  suspensas durante anos e que isto era uma estratégia dos funcionários do BCM
  e do BdM, assim como dos auditores, para fazer de conta que havia dinheiro
  quando não havia. Vários funcionários bancários com quem falámos
  confirmaram-nos que não eram feitas reconciliações.  
Dissemos em artigos anteriores que, no caso do Banco
  Austral, a KPMG sugeriu a anulação de 1,3 milhões de US$ nas contas internas
  referentes a transacções entre os balcões e a sede e de 1,7 milhões de US$
  nas contas transitórias, e aparentemente acontecia o mesmo com o BPD e o
  Banco Austral.  
Contas transitórias e contas internas podem ser usadas
  para fraude desde que, intencionalmente, não se complete a transacção. Para a
  famosa fraude dos 144 mil milhões de Mt, cheques passados em Nampula e outros
  balcões, eram depositados em contas no balcão do Sommerschield em Maputo. O
  gerente, Vicente Ramaya, alegadamente teria autorizado o pagamento dos
  cheques, indo uma contra-entrada para a conta transitória e sendo em seguida
  destruído o cheque, em vez de ser enviado de volta ao balcão emissor (que
  nessa altura daria o cheque como não tendo cobertura). Asim, a entrada ficava
  simplesmente na conta transitória.  
Houve outras fraudes semelhantes. Em 1993 houve um
  desfalque envolvendo 4 mil milhões de Mt, nessa altura valendo mais de 1
  milhão de US$. Foi permitido a Pedro Pinto e a Júlio Tandane descontar
  cheques sem ter fundos para os cobrir. O BPD tomou conta das propriedades do
  Grupo Pinto e Umberto Fusaroli Casadei foi nomeado para as administrar. Mas a
  seguir Casadei foi baleado duas vezes, a 22 de Abril e a 12 de Maio de 1993. Casadei
  acusou o Grupo Pinto de tentativas de assassinato e a seguir abandonou
  Moçambique.  
Outra fraude semelhante aconteceu no norte do país, em
  finais de 2000, envolvendo 68 mil milhões de Mt (4 milhões de US$). Cheques
  passados sobre uma conta do Banco Austral numa cidade foram depositados em
  contas no BSTM e BIM noutra cidade e remetidos para o balcão do Banco Austral
  na mesma cidade, onde o gerente disse que não tinham cobertura. Mas não
  devolveu os cheques para o banco que os tinha emitido para serem recolhidos.
  Não foi feita nenhuma reconciliação destas contas pelo Banco Austral,
  violando assim os procedimentos normais.  
Outra sistema de fraude é a emissão de letras de
  crédito sem a adequada cobertura e quando estas são apresentadas é
  simplesmente tirado dinheiro da conta transitória - que passa assim a ser um
  saco que nunca esvazia. O "ex-Director do BCM" afirmou que entre
  1993 e 1996, foram roubados 40 milhões de US$ por este processo, "sob
  ordens vindas de cima".  
A maior parte das gerências de bancos tenta criar
  sistemas para prevenir desfalques. Em Moçambique, a computerização e os
  controlos apertados foram bloqueados a alto nível e adiados até muito depois
  da privatização. Mesmo assim, mesmo com um sistema mau, é difícil esconder
  milhões de dólares - a não ser que as pessoas façam vista grossa. O
  "ex-Director do BCM" argumentou que era completamente impossível um
  desfalque envolvendo contas transitórias e contas internas sem o conhecimento
  de um director ou administrador.  
Em relação à famosa fraude de 144 mil milhões de Mt no
  BCM, ocorrida no primeiro semestre de 1996, o BCM insistiu repetidas vezes em
  que ninguém hierarquicamente acima de Vicente Ramaya sabia o que estava a
  contecer. Mas outros, muitas vezes por causa de interesses próprios não declarados,
  vieram publicamente afirmar que tinham de estar envolvidos funcionários mais
  altos. O "ex-Director do BCM" escreveu que um director ou
  administrador, em particular o director responsável pela contabilidade, tinha
  "de ter permitido a realização da fraude".  
Na altura, o director responsável pela contabilidade
  era Teotónio Comiche, irmão mais novo de Eneias. Diamantino dos Santos, o
  Procurador da Cidade de Maputo, que impediu que o caso fosse investigado, deu
  uma série de entrevistas nas quais disse que Eneias Comiche estava a tentar
  proteger o irmão que estava "fortemente implicado". Diamantino dos
  Santos disse também que o director comercial do BCM, Alberto Calú, estava
  envolvido. Asslam Abdul Satar, em geral visto como o organizador da fraude
  dos 144 milhões de Mt, escreveu uma carta do Dubai, dirigida à Procuradoria,
  em 20 de Julho de 1999, admitindo o crime, mas afirmando que Calú e o PCA
  Augusto Candida também estavam envolvidos.  
A maior parte dos funcionários bancários com quem
  falámos afirmam que funcionários seniores deviam ter descoberto a fraude dos
  144 mil milhões de Mt e outras, mesmo com um fraco sistema de controlo. Não
  sendo assim, tinham de admitir incompetência ou corrupção. Argumentam que não
  era possível aparecerem subitamente 6,6 milhões de US$ em cheques num
  conjunto de contas de um balcão pequeno sem ninguém da sede reparar nisso.  
Um elemento importante em todas estas fraudes foi a
  falha dos novos proprietários em não terem feito uma auditoria due dilligence
  quando o BPD e o BCM foram privatizados - e a falha dos representantes
  moçambicanos nos conselhos de administração em requererem essas auditorias.
  Isto é um procedimento muito invulgar, precisamente porque os novos donos
  deviam querer conhecer, e excluir, todos os maus devedores e pontos duvidosos
  nas contas. Ao declinarem a auditoria, os novos compradores e os membros
  moçambicanos do conselho de administração estavam a dizer explicitamente que
  não pretendiam demarcar-se dos antigos maus comportamentos e queriam continuá-los.
   
  
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Lavagem de dinheiro 
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Lavagem de dinheiro é um importante aspecto da
  corrupção na banca em Moçambique, de acordo com todos os antigos funcionários
  bancários com quem falámos.  
"Lavagem" é a conversão de dinheiro
  "sujo" ou ilegal - subornos e "luvas", dinheiro subtraído
  a contratos da ajuda internacional, rendimentos não declarados para fugir aos
  impostos, lucros do tráfego de droga e dinheiro roubado de bancos - em
  dinheiro "limpo" ou legal, depositando-o numa conta bancária, de
  preferência no estrangeiro, onde ele possa ser usado.  
Actualmente, todo o lucro bancário em Moçambique vem de
  transacções em divisas, em parte geradas pelo grande fluxo contínuo da ajuda
  internacional. Mas há também transferências de dinheiro ilegal. A lavagem de
  dinheiro é um dos grandes problemas a nível internacional e os bancos devem
  em princípio conhecer sempre se a origem de vultuosos depósitos e
  transferências é legítima, antes de os aceitarem. Mas como nos disse um
  antigo funcionário bancário, em Maputo, "se alguém quer fazer um
  depósito, ninguém lhe pergunta de onde veio o dinheiro".  
Algum do dinheiro é inicialmente em numerário e assim
  passa através das casas de câmbio que são um importante foco de corrupção
  bancária. Moçambique importa 10 milhões de US$ por semana em notas de banco e
  algumas delas são exportadas na mesma forma, literalmente levadas em malas.
  Diamantino dos Santos, o Procurador de Maputo actualmente fugido à justiça em
  parte incerta, alegou que Alberto Calú vendia "substanciais quantidades
  de divisas a indivíduos, violando as leis de controlo de câmbios". Calú
  era o responsável pelo sector de moeda estrangeira no BCM antes da
  privatização e da "era Simões".  
Lavagem de dinheiro e transferências de dinheiro para o
  exterior têm sido um problema desde os meados dos anos 80. De acordo com um
  antigo funcionário bancário, uma das formas mais vulgares de lavagem de
  dinheiro é uma determinada companhia apresentar documentos de importação no
  valor, digamos, de 2 milhões de US$. A transferência desse dinheiro para o
  exterior é devidamente autorizada para pagar as facturas. Mas a troco duma
  comissão, o banco não carimba o documento original de importação e o
  "importador" pode ir com ele a outro banco pedir outra vez a mesma
  transferência e depois ainda pode ir a um terceiro banco. Houve um banco que
  questionou este tipo de transacção, pedida por uma conhecida empresa de
  'import-export' considerada próxima do partido Frelimo e o gabinete da Presidência
  interveio para resolver o problema, conta a mesma fonte bancária.  
Em artigo no Savana de 7 de Abril de 2000, um anónimo
  "ex-director do BCM" afirmava que no início dos anos 90, o BCM
  estava envolvido nisto. Outros bancários também apontam para o Banco Austral.
  O computador principal do banco era o computador do SBB, na Malásia. Tendo o
  computador principal fora do controlo das autoridades moçambicanas,
  facilitaria a lavagem de dinheiro.  
Mas foi a violência relacionada com o primeiro novo
  banco privado em Moçambique, o BIM, que em 1997 chamou a atenção para a
  importância deste problema. O BIM, que tinha aberto em 1995, pertence em 50%
  ao Banco Comercial Português, BCP, 25% à International Finance Corporation do
  Banco Mundial, 22,5% ao Estado moçambicano (dividido por Estado 8,75%; INSS
  7,5%; EMOSE, 6,25%), e os restantes 2,5% à Fundação para o Desenvolvimento da
  Comunidade, de Graça Machel. O PCA do BIM é o antigo primeiro-ministro Mário
  Machungo e o seu Director Executivo era, em 1997, José Alberto de Lima Félix,
  vindo do BCP. Fontes do banco dizem que, embora Machungo tivesse o controlo
  geral, a maior parte do trabalho-chave do dia a dia estava a cargo do pessoal
  português, nomeado pelo BCP.  
Jorge Correia Rijo era director de private banking para
  o BCP em Portugal, mas foi demitido em Março de 1997 e acusado de fraude em
  Agosto de 1997. Diz-se que desviou milhões de dólares, particularmente de
  angolanos, mas também de moçambicanos. Emitia o que parecia serem recibos do
  BCP, mas de facto ficava com o dinheiro para ele. O responsável de uma
  empresa moçambicana de 'import-export' diz que perdeu 5 milhões de US$.  
Surpreendentemente, Jorge Rijo fugiu para Moçambique
  onde parecia ter protecção. Em Outubro de 1997 esteve envolvido num acidente
  suspeito quando o carro em que viajava capotou perto de Xinavane. A
  ambulância que o transportava para o hospital em Maputo, envolveu-se por sua
  vez noutro acidente.  
O BIM começou rapidamente a atrair substanciais
  depósitos em moeda estrangeira, em parte porque foi o primeiro banco a
  permitir levantamentos em contas sem serem em meticais, sem aviso prévio. Mas
  o caso de Jorge Rijo levantou interrogações sobre a possibilidade de lavagem
  de dinheiro no BCP e no BIM. O Director nomeado pelo BCP, José de Lima Félix,
  começou a verificar com mais cuidado esta questão e no início de Dezembro
  encontrou coisas que o preocuparam. Foi alvejado e morto em frenta à casa de
  um amigo na Av. Armando Tivane, às 20:20 do dia 2 de Dezembro de 1997 - antes
  de poder contar a mais alguém o que tinha descoberto. Foram sentenciadas três
  pessoas pela sua morte que era atribuída a um assalto mal sucedido para
  roubar o carro. Amigos de Lima Félix e funcionários superiores bancários
  rejeitam isto completamente e dizem que o mataram porque ele tinha descoberto
  alguma coisa relacionada com lavagem de dinheiro.  
  
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Contas externas 
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Uma importante forma de fraude era tirar dinheiro das
  contas externas sem que isso fosse detectado nos registos em Maputo.  
Todos os bancos têm ligações com os chamados 'bancos
  correspondentes' em outros países e estes bancos executam transacções sob
  instruções do banco que inicia a transacção - pagando e cobrando cheques e
  outras transacções. Os bancos em países pequenos guardam as reservas
  estrangeiras em contas no exterior, habitualmente em bancos correspondentes
  ou nos bancos em que são filiados. Nos anos 80 e até meados dos anos 90,
  antes de ser vulgarizado a informatização bancária por computador, as
  transacções eram feitas por telex seguido das confirmações documentais. Quem
  lidou com transferências do exterior sabe que existe uma taxa alta de erro e
  há sempre um grande número de items em contas transitórias. A reconciliação é
  sempre uma dor de cabeça, por muito boa vontade que haja.  
Aqui a fraude básica é dar ordem de pagamento para uma
  conta externa - contra um telex, uma carta de crédito, um cheque, etc. - mas
  garantir que o pagamento não aparece nos livros em Maputo. Cresce assim a
  diferença entre a quantia uma pessoa julga que tem numa conta, digamos em
  Nova York, e a quantia que está de facto na conta. Mas se não houver uma
  auditoria ou reconciliação, ninguém fica a saber da diferença. Assim era
  importante que não fosse feita nenhuma auditoria quando o BCM e o BPD foram
  comprados inicialmente.  
O "ex-director do BCM" afirmava no Savana em
  Maio de 1995, que tinha detectado uma diferença de 12 milhões de dólares
  entre as contas no estrangeiro e os registos em Maputo, que a KPMG não tinha
  detectado porque havia uma contra-entrada na conta transitória. Outros
  funcionários bancários com quem falei sugerem que a diferença era ainda maior
  e há fortes suspeitas que na era de António Simões desapareceu mais dinheiro
  por este processo.  
Em 1997 o BCM permitiu que as suas reservas externas se
  esgotassem, pagando as contas em dólares das contas externas mas não
  comprando mais dólares para substituir os pagamentos feitos. O BCM acabou por
  não ter dólares suficientes no exterior para cobrir os depósitos em dólares
  em Moçambique.  
Poderia isto estar ainda a acontecer? De facto pode.
  Agora que o BCP detem o controlo total sobre o BCM e o BIM é impossível saber
  dos movimentos de dinheiro para dentro e para fora de Moçambique.  
O mais interessante é que aparentemente isto também
  pode ocorrer com o BdM, o banco central, que provavelmente tem contas no
  exterior. O BdM é auditado pela KPMG que devia fazer as reconciliações. Mas
  as auditorias só são dadas ao BdM e ao Governo e não são públicas. Até agora,
  tanto a KPMG como o BdM recusaram falar connosco. E notamos que se fala
  insistentemente em lacunas da KPMG nas contas do estrangeiro do BCM. Assim é
  perfeitamente possível que os activos do BdM no estrangeiro também tenham ido
  pelo cano.  
  
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Reflexões Finais 
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Admite-se que desapareceram do sistema bancário mais de
  400 milhões de US$ durante a década de 90. De 1992 a 1996 foram injectados no
  BCM 100 milhões de US$, 162 milhões foram provisões para crédito mal parado
  no BCM em 2000 e 2001, e foram precisos 150 milhões para recapitalizar o
  Banco Austral. As perdas todavia são provavelmente muito maiores.  
A corrupção embebeu todo o sistema bancário e ocorreu a
  alto nível. Um dos banqueiros entrevistados contou que outro alto funcionário
  da banca, notoriamente corrupto, dizia: "Se eu me afundo, muita gente se
  afunda comigo. Guardo todas as notas num cofre e posso provar que muita gente
  altamente colocada levou dinheiro. É a minha protecção".  
Mas a informação também pode ser perigosa. Os
  assassinatos de José Alberto de Lima Félix em 1997, de Carlos Cardoso em 2000
  e de António Siba-Siba Macuácua em 2001, aconteceram porque eles sabiam
  demais sobre fraude e corrupção no sistema bancário de Moçambique.  
Como dissemos em capítulo anterior, todos os sistemas
  bancários apoiam os seus empresários escolhidos. Não é de surpreender que os
  bancos tenham sido usados para apoiar uma nova burguesia nacional. Mas a
  linha que demarca este apoio do que é "corrupção", pode não ser bem
  definida. O que todavia é claro é que quem quer que ordenou os assassinatos
  de Cardoso e Siba-Siba sabia que os seus actos, se fossem expostos a público,
  seriam vistos dentro de Moçambique como corruptos. Não se trata de serem
  estrangeiros a definir o que é "corrupção", mas antes os próprios
  moçambicanos a reconhecerem que as suas actividades nunca seriam aceites
  pelos seus colegas e compatriotas. Tiveram de matar para tentar evitar que
  elas fossem do conhecimento público.  
Não se tratou simplesmente de empréstimos que não foram
  reembolsados, mas roubo manifesto, lavagem de dinheiro e negócios ilícitos
  com divisas. Muitas pessoas meteram a mão no "saco azul". Outros
  decidiram fazer vista grossa e são culpados de não executarem as suas tarefas
  no banco como deviam.  
Com a privatização dos bancos do Estado em 1996 e 1997,
  a apropriação indevida de fundos parece ter atingido níveis insustentáveis.
  Confrontada com a pressão das instituições financeiras internacionais para
  privatizar os dois bancos estatais numa altura em que não havia interessados,
  uma parte da elite moçambicana optou por um acordo tácito - as únicas
  privatizações possíveis terão de ser corruptas, por isso vamos garantir a
  nossa parte. Para ambos os bancos, nos dois primeiros anos, o dinheiro
  escorreu tanto para sócios estrangeiros como para nacionais.  
Os dois bancos foram privatizados a favor de grupos que
  envolviam importantes famílias ligadas a altas individualidades do partido e
  do Estado. Mas em 2001 eles já tinham perdido o controlo de ambos. Por
  excesso de ganância mataram a galinha dos ovos de ouro? Ou chegaram à
  conclusão que a oportunidade não ia durar muito e era preciso agarrar o
  máximo que pudessem o mais depressa possível?  
Neste momento a única preocupação é a de apagarem as
  pistas e esconderem o que foi feito. Alguns estarão dispostos a matar para
  garantir que os segredos ficam bem guardados. 
 
  
 
 Introdução - A 11
de Agosto de 2001, o jovem economista António Siba Siba Macuacua foi
brutalmente assassinado na sede do Banco Austral, para onde tinha sido
empurrado para ajudar a colocar o antigo banco estatal na ordem depois de uma
gestão comprovadamente danosa. Cinco anos depois, Siba Siba continua esquecido.
Ainda não há suspeitos...o Estado finge que investiga, mas muito do que poderia
ter sido feito judicialmente não foi feito. O seu corpo foi encontrado morto
nas instalações da sede do banco. O imaginário dos moçambicanos estava ainda
tragicamente fresco do sangue do jornalistaCarlos Cardoso, assassinado a 22 de
Novembro de 2000. 
 
 
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(Maputo) 1. Introdução - A 11 de Agosto de 2001, o
  jovem economista António Siba Siba Macuacua foi brutalmente assassinado na
  sede do Banco Austral, para onde tinha sido empurrado para ajudar a colocar o
  antigo banco estatal na ordem depois de uma gestão comprovadamente danosa.
  Cinco anos depois, Siba Siba continua esquecido. Ainda não há suspeitos...o
  Estado finge que investiga, mas muito do que poderia ter sido feito
  judicialmente não foi feito. O seu corpo foi encontrado morto nas instalações
  da sede do banco. O imaginário dos moçambicanos estava ainda tragicamente
  fresco do sangue do jornalistaCarlos Cardoso, assassinado a 22 de Novembro de
  2000. 
  
 
   
  Quando chegou ao Banco Austral, Siba Siba estabeleceu um vigoroso plano para
  a recuperação do crédito mal parado, tendo mesmo publicado uma lista de mais
  de 1200 devedores no jornal Notícias. 
   
  Ele também cancelou contratos que considerava irrelevantes para os interesses
  do BAU. Um desses contratos eram com Nyimpine Chissano, o filho mais velho do
  antigo Presidente moçambicano Joaquim Chissano. 
   
  Anterior à publicação da lista no Notícias, a empresa de consultoria KPMG deu
  conta de avultados créditos não honrados por figuras sonantes do Estado e
  antigos membros do Governo de Joaquim Chissano. Muitos desses devedores foram
  confrotados com a exigência imposta por Siba Siba para que pagassem as
  dívidas. 
  
2 - O que esperar da auditoria
  forense? 
  
 
  No passado mês de Março de 2006, a Procuradoria Geral da República (PGR)
  recebeu finalmente do Ministério das Finanças uma auditoria forense às contas
  do Banco Austral. A auditoria foi suscitada por círculos ligados a cooperação
  internacional depois de se ter tornado ensurdecedora a inexistência de uma
  investigação criminal sobre o caso. 
   
  Anthony Johnston, chefe da cooperação da Embaixada da Suécia, um dos países
  doadores que fizeram pressão para a realização da auditoria, disse recentemente
  ao jornal português Público que o objective da auditoria era o de clarificar
  as razões que levaram ao desfalque BAU.  
   
  ?O Governo informou-nos que entregou a auditoria à Procuradoria-Geral da
  República para que fossem tomadas medidas relativamente às suas conclusões?,
  disse Anthony Johnston, ressalvando que o conteúdo do documento foi mantido
  confidencial a pedido do Governo por ?haver pessoas implicadas no relatório?
  e o processo estar ?em segredo de justiça?. 
   
  A auditoria forense visava esclarecer os motivos do desfalque nos três anos
  que se seguiram à privatização do banco em 1997. E enquadrava-se numa das
  metas do Quadro de Avaliação de Desempenho (QAD) para o ano de 2005, um
  processo de revisão das políticas de reforma que parceiros de cooperação
  fazem em conjunto com o Governo. 
   
  Numa entrevista ao semanário Savana, publicada no passado dia 7 de Julho de
  2006, o Procurador Geral da República, Joaquim Madeira, disse que era difícil
  falar dos prazos que a investigação levará agora que a auditoria forense
  chegou-lhe às mãos. ?É preciso analisar meticulosamente o relatório?, disse,
  acrescentando que ?a pressa é inimiga da perfeição, mas não queremos com isso
  dizer que vamos dormir?. Terá havido recentemente um acordo entre o Governo e
  os doadores para se manter da auditoria em segredo ?por haver pessoas
  implicadas?. 
   
  Uma fonte próxima da PGR disse -nos há dias que estavam a ser seguidas pistas
  concretas, sobretudo com a ajuda da auditoria forense. Procuramos falar com o
  PGR, Joaquim Madeira. Ele estava de férias. Mas fontes próximas referem que a
  auditoria forense veio dar um maior fôlego a ?investigação? 
   
  e que dentro de algum tempo haverá material mais consistente para fornecer a
  família e ao público.  
  
3 - Porquê uma auditoria forense? 
  
 
  Uma das questões que ainda pode não estar muito bem clara na opinião públia é
  o significado de uma auditoria forense. O cidadão comum tem ouvido falar
  inúmeras vezes sobre auditoria; mas de auditorias normais, externas ou
  internas, que são uma espécie de julgamento das contas de uma determinada
  instituição, o qual visa saber, por exemplo, se o fundos foram devidamente
  geridos ou se foram aplicados no que estava destinado. 
   
  Uma auditoria forense é uma auditoria especial. Como o Banco Austral viveu
  não apenas uma fase de gestão danosa, seguida de um homicídio, as perguntas
  que se devem fazer, sobretudo por causa do homicídio, são: ?Quem??;
  ?Porquê??. Por outras palavras, qual foi o móbil do crime? Na investigação
  policial, e sabemo-lo dos livros, os criminalistas fazem esta pergunta
  desdobrando-a na seguinte: quem ganhava com a morte da vítima? Neste caso,
  quem ganhava com a morte de Siba Siba? 
   
  Podemos considerar que todos os devedores do Banco Austral ganhavam com o
  assassinato de Siba Siba, mas olhar as coisas somente através deste ângulo
  parece uma abordagem demasiado simplista. Aliás, ela só teria sentido se o
  quadro do BAU fosse apenas um quadro de crédito mal parado sem esta
  componente trágica da gestão danosa. Na verdade, com Siba Siba morto ou não,
  todos os devedores acabariam por, a bem ou a mal, pagar as dívidas ? se os
  créditos tivessem sido correctamente concedidos. Por isso, não se pode dizer
  que a morte de Siba Siba interessasse a todos os devedores; ela não levaria
  ao cancelamento das dívidas ? se os créditos tivessem sido correctamente
  concedidos. 
   
  Mas, como dissemos, o quadro do BAU é um quadro de gestão danosa, com um pano
  de fundo de créditos concedidos sem garantias e nem contrato. Daí que se
  podem levantar algumas hipóteses sobre as razões do assassinato. 
   
  A primeira hipótese é que Siba Siba estava a descobrir e a revelar quem eram
  as pessoas que tinham recebido dinheiro do Banco Austral sem que o processo
  tivesse sido claro e transparente, nomeadamente sem garantias e sem contrato.
  A segunda hipótese é que ele estava a descobrir quem tinha sido o responsável
  pela concessão desses empréstimos. A terceira hipótese, é que Siba Siba
  estava a descobrir o que é que se tinha, de facto, passado no Banco Austral
  desde a altura da sua privatização em 1997 até 2001, tendo também em conta
  que a actividade de um banco não se resume a emprestar dinheiro. 
   
  Por tudo isto é que a realização da auditoria forense era de extrema
  importância, sobretudo porque ela pode fornecer pistas mais sólidas visando a
  descoberta dos autores morais do crime. 
   
  Agora que o processo está na PGR, só resta à opinião pública perguntar-se
  qual será o destino da auditoria forense, sabendo que todos sabemos que uma
  auditoria forense visa apurar responsabilidades criminais sobre uma gestão
  danosa, neste caso sobre uma gestão danosa que culminou com um assassinato. 
  
4 - Nem todos os devedores foram
  denunciados no jornal 
  
 
  O assassinato de Siba Siba seguiu-se à publicação de uma lista de devedores
  na Imprensa, num comunicando onde os visados era convocados para reembolsarem
  os valores em dívida. Isso aconteceu a 19 de Junho de 2001. A maioria dos
  indivíduos e companhias tinha empréstimos vencidos no banco. 
   
  No entanto, a lista publicada não apresentava a relação completa das dívidas
  e seus titulares, dentre os quais se destacavam figuras sonantes da classe
  política e empresarial. Por que é que não foram publicados todos os nomes e
  todas as dívidas? O que é que isto significava?  
   
  Apurámos que Siba Siba, quando começou a investigar as contas do BAU, decidiu
  que, para que o nome de um devedor não viesse publicado no jornal, este tinha
  de fazer um certo pagamento até Junho de 2001. Curiosamente, nem todos os
  devedores apareceram no jornal, mas também nem todos fizeram pagamentos em
  Junho...e viu-se mais tarde que a dívida (o conhecimento sobre a dívida) de
  alguns desses devedores foi subindo exponencialmente entre Abril e Agosto de
  2001. 
   
  Segundo fontes credíveis, subsequente à publicação da lista de 19 de Junho,
  Siba Siba tinha intenções de publicar uma segunda lista, contendo os nomes
  dessas individualidades. Isso não aconteceu por causa de pressões que
  alegadamente recebeu. Mas quem foram esses devedores sonantes que tiveram o
  privilégio de não ver os seus nomes ou parte das suas dívidas publicadas na
  imprensa? 
   
  Eis uma lista dalguns devedores cujas dívidas não foram publicadas na famosa
  lista do jornal Notícias.(Os valores são referentes a Abril de 2001). 
  
Tabela 1: Lista dalguns devedores
  cujas dívidas não foram publicadas 
  
 
  NOME Valor (em mdc) 
   
  STEIA 2000 SARL (Octávio Muthemba) 27.81.1942 
  IMOBILIÁRIA IMPERIAL 7.021.896 
  GEOMOC (Grupo STEIA) 
  IMOBILIÁRIA ALIANÇA 
  SORGAZA (Cadmiel Muthemba) 5.295.727 
  TRANSPAN (Levi Muthemba) 
  CONTRAPLACADO I MADEIRA (Nuno Palmeira) 32.272.911 
  KET TRADING 
  MARGOT INTELEC, LDA 
  CHAZEIRAS DE MOÇAMBIQUE 12.340.000 
  GULAMO COMERCIAL 11.587.369 
  ARMAZÉNS AL-OWAIS 8.557.467 
  AÇUCAREIRA DE XINAVANE 11.968.008 
  SOGA (João Américo Mpfumo) 13.992.246 
  MARIA DO CÉU BRITO 10.397.851 
  NUSA HOLDINGS 
  GOLDENS SANDS 10.262.441 
  AFZAL TRADING 9.900.044 
  MARAGRA COMERCIAL 7.878.075 
  SOTUX 8.876.378 
  CBM, LDS (grupo SOTUX) 
  PAN AFRIQUE INV MNAGN 5.822.324 
  NYMPINE CHISSANO 7.457.869 
  SOCLIMA 5.609.557 
  PASTELARIA PRIMAVERA 4.464.623 
  FUNDO DE FOMENTO AGRÁRIO 4.368.312 
  MÉDICOS ASSOCIADOS 5.524.034 
  SOPRIM, LDA (Josephine Pereira+Paulo Muxanga) 3.818.085 
  PARMOL, LDA (Castigo Langa) 2.990.722 
  SETEC AUTO, LDA 2.861.184 
  SALOME MOIANE 2.989.747 
  TRIUNFO GUEST HOUSE 2.191.304 
  TONY FERREIRA 1.035.193 
  ELECTRO 2000 2.296.705 
  ABDUL ANGIGE GULAMUSSENE 2.134.196 
  NAM I, SARL 1.231.870 
  MOBILIAS MAKDA FOAM 1.292.073 
  AHAMAD MAMAD HANIF 1.230.450 
  INDÚSTRIAS OMOLI 1.211.125 
  ARISTA PREST SERVIÇO 1.219.541 
  PLASMEX 1.144.462 
  ANTÓNIO HAMA THAI 1.338.120 
  TAÍBO AHMAD ISSIMAEL 1.050.296 
  SOMMERCHIELD ESTATES, LDA 11.700.000 
  FRANCISCO CARAVELA 12.961.068 
  ELECTRO FERRAGEIRA 13.056.875 
  TROMAR 9.912.781 
  CASA SALVADOR 4.005.730 
  CROCODILOS DO UMBELUZI 2.507.862 
  HIDRAÚLICA DO CHOKWÉ 2.946.832 
  SPANOS GRÁFICA 668.294 
  EMPACOL 1.000.000 
   
  FONTE: Centro de Integridade Pública, com base em informações de várias
  fontes reputadas. 
   
  Outra informação interessante hoje é se saber quais destes devedores faziam
  parte dos maiores devedores do BAU em Agosto de 2001. Eis o que apuramos, por
  ordem decrescente de dívida (optamos por mencionar apenas algumas das
  dívidas). 
  
Tabela 2: Lista de Maiores Devedores
  Não Anunciados 
  
 
  NOME Valor (em mdc) 
   
  STEIA 2000 SARL (Octávio Muthemba) 28.976.336 
  IMOBILIÁRIA IMPERIAL 8.636.699 
  CONTRAPLACADO I. MADEIRA (Nuno Palmeira) 
  CHAZEIRAS DE MOÇAMBIQUE 18.510.026 
  GULAMO COMERCIAL 11.587.369 
  AÇUCAREIRA DE XINAVANE 
  SOGA LDA (João Américo Mpfumo) 13.992.246 
  MARIA DO CEU BRITO 
  NUSA HOLDINGS 10.359.493 
  GOLDEN SANDS 
  AFZAL TRADING 9.900.043 
  MEDICOS ASSOCIADOS 
  SOMMERCHIELD ESTATES LDA 
  FRANCISCO CARAVELA 
  ELECTRO FERRAGENS LDA 
  TROMAR 
   
  FONTE: Centro de Integridade Pública, com base em informação de fontes
  reputadas. 
   
  É relevante referir que a lista acima é composta pelos maiores devedores do
  Banco Austral em Agosto de 2001 cujos nomes não vieram publicados na lista
  que Siba Siba mandou ao Notícias. Ou seja, não são todos os maiores devedores
  da altura; são alguns. Entre os 50 maiores devedores da altura existem muito
  mais nomes de empresas e individualidades. 
  
5 - Gestão danosa: crédito sem
  contratos nem garantias 
  
 
  O Banco Austral era gerido politicamente. Havia crédito mal parado, letras de
  crédito sem cobertura, transferências de dinheiro para Ministros e muitos
  favores pessoais. As decisões eram tomadas pelos funcionários fora do seu
  mandato, violando regras, procedimentos e a Lei. Em 2000, na sequência de
  relatos na imprensa, o Banco de Moçambique restringiu novos empréstimos e
  obrigou a realização de uma auditoria, confiada à KPMG e submetida a 15 de
  Janeiro de 2001. 
   
  Num artigo no Savana de 6 de Abril de 2001, uma fonte anónima do Banco
  Austral disse que os empréstimos eram dados a pessoas sem garantias, por
  vezes a troco de comissões de 10%. O MediaFax de 18 de Abril de 2001 alegava
  que o pessoal malaio também concedeu empréstimos sem garantias e falava da
  "generosidade" de K. Muganthan, o Director Executivo malaio, facto
  que se veio a confirmar mais tarde. 
   
  O relatório da auditoria da KPGM mostrou que as provisões para o crédito mal
  parado e outros problemas tinham sido subestimadas em 50 milhões de dólares.
  O relatório constatou que 31% dos empréstimos deviam ser considerados dívidas
  não pagas, ao contrário dos apenas 11% assumidos pela administração do banco.
  Entre outras constatações interessantes, o relatório da KPMG sugeria que, do
  crédito mal parado, resultante da má contabilidade, do roubo e da fraude, 15
  milhões de USD vinham de antes da privatização e 30 milhões de USD
  correspondiam a apenas 3 anos de gestão privada. Quais eram as práticas
  ilegais e quem foram alguns dos beneficiários dos créditos ilegais? 
   
  A nossa investigação apurou o seguinte: os gestores do Banco Austral davam
  dinheiro por emprestado ou sem contrato ou sem a exigência de garantias. Isso
  aconteceu várias vezes. Eis alguns desses casos: 
  
Tabela 3: Lista dalguns Devedores Sem
  Contratos nem Garantias 
  
 
  Nome Sem contrato (S/C) Sem garantia (S/G) 
   
  ABDUL ANGIGE GULAMUSSENE S/G 
  AÇUCAREIRA DE XINAVANE S/G 
  ALVARO JULIÃO MASSINGA S/G 
  F BRONZE S/C S/G 
  FARIDA ABDUL SATAR S/G 
  FINAL (Fernando Sumbana) S/G 
  GIVA REMTULA S/G 
  GOLDEN SANDS S/G 
  ISSUFO NURMAMAD S/G 
  MAKDA S/G 
  MITHOMBO S/G 
  MOPAC (Jamu Hassan) S/G 
  PETER INDÚSTRIA S/G 
  SOMOL S/G 
  SOTUX S/G 
  SPAR S/G 
  USSENE CASSIMO S/G 
   
  Fonte: Centro de Integridade Pública, baseando-se em informações credíveis 
  
6 - Da gestão danosa ao silêncio do
  Ministério Público 
  
 
  Há dois aspectos que podem ser considerados separados mas também interligados
  neste caso. 
   
  Para efeitos de procedimentos judicias pode-se considerar o caso do crime
  distinto do caso da gestão danosa. Mas para efeitos da compreensão do crime e
  do apuramento do seu móbil, a gestão danosa é importante. Consultando alguns
  juristas e olhando para a legislação vigente, chega-se à conclusão de há
  espaço para uma responsabilização criminal neste caso. 
   
  Fizemos uma incursão na Lei e descobrimos que ela prevê a gestão danosa como
  crime. A legislação relativa à actividade bancária prevê os crimes de
  violação das normas de gestão critériosa e de violação das normas de conduta.
  A Lei 15/99 de 1 de Novembro (que Regula o Estabelecimento e o Exercício de
  Actividade das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras) prevê
  factos ilícitos cometidos no âmbito da actividade bancária. Prevê, por
  exemplo, o crime de gestão danosa ou ruinosa.  
   
  Esse crime é punido pelo artigo 104 dessa Lei. 
   
  Tal como esta Lei estabelece, o crime de gestão ruinosa visa tutelar bens
  jurídicos patrimoniais, nomeadamente o património dos depositantes,
  investidores e credores. Isto quer dizer que, para se considerar um caso como
  sendo de gestão ruinosa, é preciso que o património referido tenha sido
  prejudicado. Uma gestão ruinosa é aquela que abre flancos para pertubar o
  equilíbrio financeiro que as normas de gestão aconselham. 
   
  Já o artigo 482º do Código Penal prevê a gestão negligente ou culposa. Este
  artigo podia ter sido usado pelo Ministério Público (MP) para accionar
  mecanismos de responsabilização criminal neste caso do Banco Austral. Mas o
  MP não fez. Qualquer cidadão que investigar atentamente vai verificar que no
  caso do Banco Austral houve uma gestão infiel às normas técnicas, às práticas
  e condutas préestabelecidas pela Lei e regulamentos da actividade bancária. 
  
Mas quem pode ser incriminado por
  gestão danosa? 
  
 
  A Lei é clara quanto a isso, referindo que os agentes deste crime são os
  titulares dos órgãos sociais, incluindo outros órgãos não obrigatórios
  criados por uma instituição de crédito (no caso o Banco Austral) à luz do seu
  pacto social, bem como titulares de cargos relevantes de gestão nos termos
  definidos pelo Banco de Moçambique. 
  
Como é que a Lei pune a gestão danosa
  ou ruinosa? 
  
 
  A Lei pune sob a forma de dolo e não por negligência ou mera culpa. Ou seja,
  é necessário que, para além do não cumprimento das normas de prudência na
  gestão e nas regras de conduta, se exija uma intenção concreta. Os juristas
  moçambicanos sabem que o dolo é admissível em qualquer das suas formas: dolo
  directo e necessário e dolo eventual. 
   
  Os juristas e os procuradores moçambicanos também sabem que para a
  verificação do dolo ou da intenção criminosa é necessário haver por parte do
  agente a prática voluntária dos factos e o conhecimento do carácter ilícito
  ou reprovável da sua conduta. Outra revelação que se pode fazer é que, para
  efeito de medida de pena, o crime de gestão ruinosa é equiparado ao crime de
  falência fraudulenta, que está previsto no Código Penal (artigos 447º e 448º)
  e no artigo 1277º do Código de Processo Civil, para o qual o artigo 1278º do
  Código de Processo Civil prevê uma aplicável de 2 a 8 anos de prisão maior.
  Realce-se que o procedimento criminal para este tipo de crime prescreve
  somente passados 15 anos, de acordo com o artigo 125, parágrafo 3,º do Código
  Penal. No caso presente, já passam 5 anos desde que se deu a intervenção do
  banco central no BAU. Mais dez anos e as coisas morrem de velhas. 
   
  O prazo de prescrição do procedimento criminal inicia-se, no caso concreto do
  crime de gestão ruinosa, com o último facto praticado, já que este tipo de
  infracção é um crime permanente. Se o nosso Ministério Público quisesse, se
  houvesse transparência e Justiça em Moçambique, a Lei já teria sido aplicada
  neste caso. Aliás, ao contrário de outros crimes contra o património, o crime
  em causa é de natureza pública, o que significa que o início do procedimento
  criminal não depende da queixa do ofendido. 
   
  Há muitos outros argumentos legais que poderiam ser accionados para que a
  gestão danosa do Banco Austral fosse responsabilizada. Mas cinco anos depois
  do colapso do BAU e do assassinato brutal de Siba Siba, a justiça moçambicana
  continua por dar os passos concretos neste sentido. 
  
7 - Do mutismo confrangedor do Banco
  de Moçambique 
  
 
  Há cerca de duas semanas, o antigo Governador do Banco de Mocambique, Adriano
  Maleiane, deixou as funções depois de 15 anos a frente da instituição. Foram
  15 anos de avanços e recuos no sistema financeiro. Se Maleiane pode ser hoje
  elogiado por uma gestão que evitou o colapso total do sistema, não se pode
  esquecer que, durante os anos do seu consulado, a banca privatizada passou
  por momentos de crise profunda, de quase ruina, o que só realçou a
  fragilidade e a fraqueza da supervisão bancária sob sua tutela. 
   
  A história da crise da banca nos últimos anos está por demais documentada
  (ver Hanlon, 2001). 
   
  Também o economista Roberto Tibana, um dos mais desinteressados campaingners
  pro-justiça no caso Siba Siba, mostrou, em vários artigos, o despesismo
  exacerbado do banco central e a sua pouca viabilidade económica em parte
  devido às mordomias chorudas que atribui aos seus administradores e
  funcionários, num país extremamente pobre como o nosso. 
   
  Há semanas, quando Maleiane deixou o cargo, alguns comentadores elogiaram o
  homem, esquecendo se que ele esteve à frente do banco central nos períodos
  mais negros da sua história recente. Ninguém perguntou porque é que os
  dirigentes do banco central nunca exigiram procedimentos criminais contra os antigos
  gestores do BAU. 
   
  Os factos e a Lei mostram que o banco central poderia ter agido em prol da
  Justiça, se quisesse. 
   
  Seria até uma forma de honrar o seu quadro assassinado, um quadro que foi
  parar no BAU por indicação de Maleiane. Recordemos um bocado os factos, para
  avivar a memória. 
   
  A 3 de Abril de 2001, quando o Banco de Moçambique decide intervir no BAU ?
  numa altura em que nalguns corredores o cheiro da quase falência do banco ja
  era intenso ? a instituição fez publicar um comunicado para explicar as
  razões da intervenção. Entre outras coisas, o comunicado dizia o seguinte: 
   
  ?Apesar das várias advertências feitas por parte do Banco de Moçambique, a
  realização do capital pelo accionista privado foi sendo sucessivamente
  adiada. Além disso, não se verificou qualquer melhoria dos processos de
  gestão, continuando a instituição a incorrer em riscos incompatíveis com a
  sua capacidade, o que levou o Banco de Moçambique a impor um conjunto de
  medidas restritivas,principalmente no domínio da expansão do crédito e da
  participação no mercado interbancário, entre outras? (Comunicado do Banco de
  Moçambique, de 3 de Abril de 2001, publicado no jornal Notícias e no site do
  BM). 
   
  Ao referir-se ao facto de o BAU continuar ?a incorrer em riscos incompatíveis
  com a sua capacidade?, o banco central estava também a reconhecer que se
  tratava de gestão danosa. Ou seja, o Banco de Moçambique apresentava ao
  público indícios de ter havido danos no património do BAU, causados por uma
  gestão ruinosa. Mas, pelo que se sabe na opinião pública moçambicana, não
  houve qualquer denúncia ao Ministério Público por parte do Banco de
  Moçambique para que fosse intentada uma acção criminal. E esse era um
  imperativo legal do banco central, como atesta o artigo 7º do Decreto Lei n.º
  35. 007, de 13 de Outubro de 1945. 
   
  No ordenamento jurídico moçambicano, a acção penal compete ao Ministério
  Público, mas isso não significa que essa acção não possa ser exercida, em
  determinadas circunstâncias, por outros organismos. Aliás, de acordo com o
  n.º 1 do artigo 110º da Lei 15/99, de 1 de Novembro, o processo de
  contravenções é da competência do Banco de Moçambique. Por outro lado, e de
  acordo com o n.º 2 do artigo 55º da mesma Lei, ? no exercício das suas
  funções de supervisão, os funcionários do Banco de Moçambique são equiparados
  aos funcionários públicos, gozando dos poderes e atributos dos agentes de
  autoridade, sendo-lhes também aplicável o respectivo regime penal?. 
   
  Podemos também fazer referência ao artigo 38º da Lei n.º 1/92 de 3 de
  Janeiro, que diz o seguinte: ?os trabalhadores do banco central encarregues
  de acções de inspecção deverão apresentar-se devidamente credenciados e gozam
  de atributos e poderes dos agentes de autoridade do Estado quando no
  exercício das suas funções?. Isto significa que, dado que os trabalhadores do
  Banco de Moçambique são equiparados a funcionários do Estado no exercício das
  funções de supervisão, eles estão legalmente obrigados a denunciar os
  ilícitos criminais de que tenham conhecimento no exercício da função de supervisão. 
   
  Como o Banco de Moçambique fazia, e faz, a supervisão do sector bancário e
  dadas as regras de sigilo bancário que regulam o sector, os crimes ocorridos
  neste sector só podiam ter sido investigados se o banco central o desejasse.
  Sabe-se por Lei que também é dever dos funcionários do Banco de Moçambique
  comunicar o Ministério Público quando tomam conhecimento de um acto ilícito.
  Tratase até de um dever legal cuja omissão é punida como infracção aos seus
  deveres funcionais. Cinco anos depois do assassinato de Siba Siba, o Banco
  Central continua sem mexer uma palha no sentido de se fazer Justiça. 
  
8 - O Acordo com o ABSA nunca foi
  transparente 
  
 
  Quando o ABSA tomou conta do Banco Austral, a opinião pública esperava que o
  Governo pudesse finalmente tornar transparente o negócio de um bem público.
  Esperava-se que os pagadores de impostos deste país fossem informados sobre
  os contornos do negócio e sobre o que é que ele implicava para as finanças
  públicas. Mas isso nunca aconteceu. E entretanto, o Estado procedeu a um
  processo de recapitalização do BAU que teve implicações negativas sobre a
  dívida pública. Em todo o caso, e de acordo com as nossas fontes, o acordo
  entre o ABSA e o Governo teve os seguintes contornos: 
   
  ? O BAU continuaria a gerir todos os créditos mal parados. O que quer dizer
  que, na prática, era como se as pessoas continuassem a dever ao BAU e o BAU
  fosse o dono desses créditos;  
   
  ? Por cada crédito que o BAU conseguisse recuperar, entregava o valor ao
  Estado (através duma operação de amortização de Obrigações do Tesouro que o
  Estado tinha entregue para recapitalizar o Banco); e o Estado pagava, por
  esse valor 1 MT mais uma comissão pelo trabalho feito pelo BAU para recuperar
  esse crédito, uma comissão de 30%, 25%, 20% (respectivamente no primeiro,
  segundo ano e subsequentes) sobre o valor recuperado. 
   
  ? O Estado tinha o direito de, a qualquer momento, comprar do BAU qualquer
  crédito mal parado que estivesse 100% aprovisionado, pelo valor de 1 MT. 
   
  ? O Estado podia, a qualquer momento, pedir ao BAU a gestão do crédito
  mal-parado. 
   
  ? Aparentemente, em Maio de 2002, o Estado e o BAU chegaram a um acordo
  através do qual o Estado adquiriu ao BAU os famosos 70 créditos mal parados. 
   
  Mas a transição desse grande crédito para o Estado não significou que a sua
  cobrança ocorresse com maior rapidez. De acordo com o Tribunal
  Administrativo, no período entre Janeiro e Dezembro de 2004 foram recuperados
  somente 19 milhões de contos dos 346 milhões de contos de créditos mal
  parados do Banco Austral, ou seja, apenas 5.5% do total das dívidas. Qualquer
  que tivesse sido o acordo com o ABSA, o certo é que o Estado embarcou numa
  operação de recapitalização do BAU que consumiu altas verbas do Estado e dos
  doadores. 
  
9 - Dos Créditos Devolvidos ao Estado 
  
 
  Um dos aspectos mais rocambolescos desta operação foi o facto de o Estado ter
  assumido, em 2002, parte do crédito mal parado. Ao fazê-lo, o Estado imputou
  à totalidade dos contribuintes o ónus de suportarem a dívida de um grupo
  restrito de pessoas, os quais aplicaram os fundos, em muitos dos casos, no
  pagamento bens de luxo e supérfluos. O Relatório e Parecer do Tribunal
  Administrativo sobre a Conta Geral do Estado de 2003, recorda que, no âmbito
  do processo de reprivatização do Banco Austral, foram transferidos para o
  Estado, a 8 de Agosto de 2002, 70 processos de crédito mal parado,
  aprovisionados em 100%, no valor total de 346 milhões de contos. 
   
  E, citando o Relatório Trimestral de Execução do OGE de 2003 ? período de
  Janeiro a Dezembro ? o TA descreve a evolução da cobrança desses créditos mal
  parados nos seguintes termos: ?3 processos foram submetidos ao Juízo das
  Execuções Fiscais, 41 à execução judicial comum e os restantes 26 processos
  estão sendo objecto de análise ? (T.A. 2005). 
   
  Era interessante saber-se hoje qual é o ponto da situação da cobranças dessas
  dívidas por parte do Estado. Mas o acesso a essa informação é complicado.
  Temos de esperar pelo próximo relatório e parecer do TA à CGE. 
   
  Em contrapartida, o Banco Austral já fez saber que conseguiu recuperar parte
  considerável do crédito mal parado. Em Julho do ano passado, Werner Pauw,
  Gestor do BAU para a area Internacional e de Tesouro, disse que a fraude e os
  créditos mal parados deixaram de constituir problema para o banco. 
   
  Numa entrevista à Agência de Informação de Moçambique (AIM) Pauw recordou que
  quando o ABSA tomou conta do BAU, 75% do portfolio de crédito consistia em
  empréstimos que não estavam a ser pagos pelos deveores. Em 2005, acrescentou
  ele, a cifra baixou para apenas 2%. 
   
  Pauw também contou que quando o ABSA tomou conta do BAU, os sul africanos
  encontraram um banco totalmente ?desorganizado. Era quase um desastre.
  Tivemos um trabalho muito duro, que culminou com a recuperação de mais de 90%
  do crédito mal parado?. 
   
  Mas Pauw não disse que a recuperação do crédito não se deveu apenas ao
  trabalho do ABSA, mas ao tipo de negócio, nunca revelado claramente, que o
  Governo fez com o ABSA, no âmbito do qual o Estado assumiu parte considerável
  do crédito, sobretudo aquele crédito relacionado com figuras de elite. É hoje
  interessante ver quem foram os devedores que tiveram esse privilêgio de ver
  as suas dívidas devolvidas ao Estado: 
  
Tabela: Lista dalguns Devedores Cuja
  Dívida Foi Devolvida ao Estado 
  
 
  Nome Valor (mdc) 
   
  STEIA 2000 SARL (Octávio Muthemba) 28.976.336 
  STEIA E AGRICOLA 
  STEIA SARL 
  IMOBILIÁRIA IMPERIAL 8.636.699 
  GEOMOC (Grupo Steia) 
  IMOBILIÁRIA ALIANÇA 
  SAVIAR GOPAL (Grupo Steia) 
  DISTRIBUIDOR DO SUL 
  KET TRADING 32.786.531 
  TINA ANGELICA TSOU 
  SCANMO de MOÇAMBIQUE 16.816.839 
  MARGOT INTELEC, LDA 
  OSMAN YACUB 30.503.219 
  CHAZEIRAS DE MOÇAMBIQUE 18.510.026 
  GULAMO COMERCIAL 11.587.369 
  ARMAZENS AL-OWAIS 16.667.264 
  NUSA HOLDINGS 10.359.493 
  AFZAL TRADING 9.900.043 
  MARAGRA COMERCIAL 
  CBM LDA (Grupo SOTUX) 
  ARMAZENS KAS 7.113.055 
  MOZAUTO 
  NORTE DEVELOPERS (Omaia Salimo) 
  PAN AGFRIQUE INV MNAGN 
  PASTELARIA PRIMAVERA 
  ECMEP 
  ETRAP 
  PARMOL 
  MARHABA COMERCIO INTERNACIONAL 
  HUMBERTO MONTEIRO 
  SALOMÉ MOIANE 
  PAULO AUADE 
  AGOSTINHO ZACARIAS 
  MOBIKE 
  TRIUNFO GUEST HOUSE 
  ESTAÇÃO DE SERVIÇO LUSAKA 
  AHAMAD HANIF 
  INDUSTRIAS OMOLI 
  ARISTA PREST SERVIÇO 
  ANTONIO HAMA THAI 
  TAÍBO AMADE ISMAEL 
  ABDUL VARINDE 
  IMAVE 
  NATAVARLAL HARILAL 
  INVAPE 
  LINGISSAI PEDRO 
  ASCALI BASIR 
  FONTE: Centro de Integridade Pública, com base em informações de fontes
  reputadas 
  
10 - Devedores com Dívidas Saneadas 
  
 
  É hoje também possível verificar que alguns dos devedores do Banco Austral
  viram as suas dívidas saneadas naquele banco. Estes, hoje, já não são
  devedores. Como é que os créditos foram pagos, é difícil apurar. O certo é
  que, perante o Banco Austral, estão limpos. 
  
Lista de Devedores Com Dívidas
  Saneadas 
  
 
  BELA VISTA CASAS 
  CASA SALVADOR 
  CLASSE E COMFORTE LDA 
  MACMEBRA 
  MAHOMED IQUBAL 
  MANUEL GONÇALVES 
  MATOLA HEIGHTS 
  NYIMPINE CHISSANO 
  PALMEIRA AÇUCAR 
  QUITÉRIA BUQUE 
  SOC M NU LDA 
  SOCLIMA 
  SOMMERCHIELD STATES 
  SORGAZA 
  SOTRABEL 
  TRANSMAP 
  TRANSPORTES INTERPROVINCIAIS 
  TURMAR 
  FONTE: Centro de Integridade Pública, com base em fontes credíveis 
  
11 - Devedores na Justiça 
  
 
  Alguns devedores foram há muito tempo alvo de acções judicias por parte do
  BAU. Os casos estão envoltos em várias situações: ou aguardam assinatura do
  Ministério Público ou os devedores foram citados para responder às acções ou
  os devedores foram citados e responderam às acções ou já se deu o depacho
  inicial do Juíz, mas não se sabe exactamente o que isto significa, ou foi
  ordenada a penhora dos bens, etc. O facto de estes casos estarem na Justiça,
  não quer dizer que os mesmos estejam a andar. Eis algumas destas situações: 
  
Devedores com casos na Justiça 
  
  
  
  
   
    | 
     
STEIA 2000 SARL (Octávio Muthemba) 
     | 
    
     
Aguarda Assinatura do MP 
     | 
    
   
    | 
     
IMOBILIÁRIA IMPERIAL 
     | 
    
     
Foi citada 
     | 
    
   
    | 
     
GEOMOC (STEIA) 
     | 
    
     
Fez oposição 
     | 
    
   
    | 
     
MARGOT 
     | 
    
     
Aguarda Assinatura 
     | 
    
   
    | 
     
SOGA 
     | 
    
     
Despacho Inicial do Juíz 
     | 
    
   
    | 
     
NORTE DEVELOPERS (Omaia Salimo) 
     | 
    
     
Aguarda Assinatura 
     | 
    
   
    | 
     
CREL  
     | 
    
     
Foi Citada 
     | 
    
   
    | 
     
SALOME MOIANE 
     | 
    
     
Foi Citada 
     | 
    
   
   
  
 
  FONTE: Centro de Integridade Pública, com base em fontes reputadas 
  
12 - Comentário final 
  
 
  Este é um caso ainda não concluído. Logo, o artigo também não tem conclusão. 
   
  Na opinião do Centro de Integridade Pública existe, em suma, matéria jurídica
  para o Estado avançar com procedimentos legais. Não é preciso muito esforço
  para descobrir o que diz a Lei e aplicá-la. Siba Siba Macuacua deixou mulher
  e filhos menores...e o tempo passa. Com a passagem do tempo, existe o risco
  natural de a investigação se tornar mais complicada. É preciso que a Justiça
  seja mais célere.  
   
  Este é daqueles casos cruciais para a credibilidade da Justiça em Moçambique.
  Se Siba Siba foi assassinado em trabalho, num trabalho para o qual foi
  empurrado, é justo hoje exigir que o Estado se responsabilize civilmente pelo
  crime. Porque o Estado, sabendo dos riscos que o trabalho implicava, não
  criou as condições necessárias para evitar o seu assassinato...porque o
  Estado, depois do crime, não criou nem cria as condições para que se
  investigue e para que se responsabilize os culpados do descalabro do Banco
  Austral. 
   
  (Centro
  de Integridade Pública) 
  
Canal de
  Moçambique, 14 Agosto 2006  
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