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Caros amigos o blog Historiando: debates e ideias visa promover debates em torno de vários domínios de História do mundo em geral e de África e Moçambique em particular. Consta no blog variados documentos históricos como filmes, documentários, extractos de entrevistas e variedades de documentos escritos que permitirá reflectir sobre várias temáticas tendo em conta a temporalidade histórica dos diferentes espaços. O desafio que proponho é despolitizar e descolonizar certas práticas historiográficas de carácter eurocêntrico, moderno e ocidental. Os diferentes conteúdos aqui expostos não constituem dados acabados ou absolutos, eles estão sujeitos a reinterpretação, por isso que os vossos comentários, críticas e sugestões serão considerados com muito carinho. Pode ouvir o blog via ReadSpeaker que consta no início de cada conteúdo postado.

30 outubro 2013

PARA ALGUNS MOÇAMBICANOS INIMIGO DO MEU INIMIGO É MEU AMIGO

Um colega britânico, de nome John Huges, que há décadas tem acompanhado os desenvolvimentos sócio-economicos e militares moçambicanos, escreveu-me um e-mail, no passado dia 28, no qual dizia o seguinte: Coisas estranhas estão acontecendo em Moçambique. Figuras da Igreja defendendo gangs armados! E os Estados Unidos argumentando contra a acção militar (do governo) contra terroristas.
No segundo parágrafo, ele vinca que todos nós somos a favor das negociações, mas é a Renamo que necessita tomar a decisão de abandonar as suas armas.
Ele lamenta a existência de comentadores que agora defendem a tese de que o pomo da discórdia (entre o governo e a Renamo) esteja em torno do dinheiro.
É muito triste. O que se faz com a Lei e Ordem!, Escreve este jornalista britânico cujo pai, Lord Huges, apoiou muito a luta de libertação de Moçambique do colonialismo português no período entre 1962 a 1974, incluindo os 10 anos de luta armada.
Eis a transcrição da frase de Huges na sua versão em inglês: Strange things are happening in Mozambique. 
Church figures defending armed gangs! And the United States arguing against military action against terrorists. We are all in favour of negotiations, but it is Renamo that needs to make the decision to lay down its arms. Commentators are now coming to the view that it is all about money. Very sad. What about law and order!, sic.

A MINHA RESPOSTA A HUGES

Em resposta a este seu e-mail, eu disse-lhe que não era para perceber a posição dos que agora tentam deitar todas as culpas ao Presidente Armando Guebuza, ou ao Exército moçambicano, pela captura do Quartel-General da Renamo em Santujira, na província central de Sofala, a 21 deste mês, que foi uma retaliação aos sucessivos ataques não provocados protagonizados pelos homens da Perdiz desde Abril último.
Nessa minha resposta, vinquei que encarava os que estavam contra a reacção do exército moçambicano como sendo pessoas que talvez não acompanharam os actos da Renamo ao longo deste ano. Disse ainda que poderiam ser pessoas que detestam a Frelimo, seu Governo e mesmo o próprio Guebuza, e que se guiam religiosamente pela tese de que inimigo do meu inimigo é meu amigo.
Para essas pessoas, sendo a Renamo o pior inimigo da Frelimo e do seu Governo, assumem-no como seu amigo, porque está contra um inimigo comum que, para essas mesmas pessoas, é a Frelimo ou Guebuza.
As pessoas que agora estão contra a reacção das tropas moçambicanas sentiam muita satisfação, prazer e esperança de se verem livres da Frelimo, quando a Renamo vinha realizando impunemente ataques sistemáticos e mortíferos contra polícias, militares e civis.
A minha conclusão é partilhada por muitos outros analistas, e fica mais do que provado, quando em nenhum desses ataques da Renamo contra civis, polícias e militares, se ouviu essas pessoas protestarem, como o fazem agora que, finalmente, o Governo decidiu retaliar, tomando de assalto o Quartel-General da Renamo em Santujira, que também era a residência de guerra do seu líder, Afonso Dhlakama.
Ficou mais do que evidente que este assalto entristeceu os que encaravam os ataques da Renamo como uma contribuição para o desmoronamento do Governo de Guebuza e, por consequência, da Frelimo como partido que detém o poder há cerca de 40 anos.
Por incrível pareça, agora até alegam que o assalto e toda a acção defensiva e ofensiva das FADM contra a Renamo, é inconstitucional, como se não fosse dever e obrigação de um governo, defender os cidadãos que o elegeram quando são alvos de ataques de quem quer que seja!

OUTRO BRITÂNICO, UM ACADÉMICO DE RENOME MUNDIAL, CULPA A RENAMO

O jornalista John Huges não é o único que culpa a Renamo. Existem muitos outros analistas não eivados pelo interesse de ver a Frelimo e o seu Governo desmontados do poder, que culpam a Renamo de ter provocado o Executivo até obrigá-lo a reagir, assaltando Santunjira.
O conceituado jornalista e académico britânico, Joseph Hanlon, através de um artigo de leitura obrigatória que escreveu e distribuiu via Internet a 27 de Outubro corrente, intitulado History Matters, (História Conta, tradução em português) deixa claro que foi a Renamo quem desencadeou toda esta situação.
Aqui estão alguns dos extractos desse seu artigo: As recentes escaramuças entre os guerrilheiros da Renamo e militares do governo moçambicano, que tiveram como ponto mais alto o ataque de segunda-feira à sede de Afonso Dhlakama em Santunjira, precisam ser vistas num contexto mais amplo da história pós-guerra.
Depois de provar com factos que o problema da Renamo foi nunca ter conseguido transformar-se em partido político. Hanlon escreve que a Renamo agora volta a revelar-se como uma máquina de guerra sem quartel, tendo os civis como alvos predilectos.
Hanlon vinca que a Frelimo, pelo contrário, foi-se constituindo como um partido eficaz e numa máquina similar aos partidos políticos europeus, e o nível médio de liderança tem grande autonomia para trabalhar dentro das directrizes estabelecidas pela sua liderança.
As duas primeiras eleições parlamentares realizadas no final da década de 1990 são reveladoras. Armando Guebuza como chefe da bancada ligada à Frelimo no parlamento foi capaz de a transformar numa oposição à própria Frelimo em relação ao governo do Presidente Joaquim Chissano. Mas a Renamo nunca foi capaz de utilizar o parlamento como uma plataforma para apresentar-se como uma oposição com ideias alternativas e políticas, explica Hanlon.
Finalmente, diz ele, Dhlakama provou ser um mau negociador, insistindo em fazer exigências máximas, recorrendo a boicotes em vez de adoptar a negociação como sua principal táctica.
Em 2000, ele negou uma oferta para participar na nomeação dos governadores das províncias em que ele e o seu partido haviam ganho nas eleições de 1999, o que o teria dado uma oportunidade de aumentar de forma significativa o seu prestígio político; mas ele rejeitou isso, exigindo mais e mais, e no final, não recebeu nada.
Joseph Hanlon prossegue, abordando a questão das negociações em torno do pacote eleitoral, em que uma vez mais Dhlakama voltou a provar que é um péssimo negociador.
Da mesma forma, na redacção da lei nova eleitoral a liderança da Renamo não aproveitou as oportunidades para fazer alterações à lei eleitoral que teriam sido concebidas pela Renamo, tendo pautado pela tese dos ganhos máximos, como quando exige a chamada paridade na Comissão Nacional de Eleições (CNE), em que a oposição teria 10 dos 14 membros que a constituem, o que obviamente foi recusado pela Frelimo, porque é contra o que está regimentado pelo Parlamento.
Mas, em contrapartida, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), o segundo maior partido da oposição, aceitou ser minoria nessa Comissão.

HANLON DIZ QUE RENAMO RECORRE AS ARMAS PORQUE PERDEU A FORÇA DA RAZÃO

Na sua análise, o conceituado jornalista e académico britânico deixa claro, para ambos pro e contra a Renamo, que Dhlakama e seus acólitos têm consciência de que já perderam parte considerável dos seus apoiantes, razão pela decidiram recorrer novamente a força das armas.
Ele aponta como prova o facto de nas eleições de 1994 e 1999 ter conquistado mais de 2 milhões de votos, mas que em 2004 e principalmente em 2009, o apoio a Dhlakama caiu para 650.000.
De facto, a Renamo teve em 1994, 112 deputados, contra 129 da Frelimo, e nas de 1999, teve 117 contra 133 da Frelimo, mas já nas de 2004, teve apenas 90 deputados, e mesmo assim, teve de coligar-se a mais partidos, e nas de 2009, teve apenas 51 deputados.
Hanlon aponta a retirada de Dhlakama de Maputo para Nampula e, em seguida, para as matas de Santunjira, como tendo acentuado a sua invisibilidade e, consequentemente, o seu esquecimento pelos que ainda o apoiavam.
Dhlakama é um bom estratega militar, e vários dos ataques realizados nos últimos meses (deste ano) foram bem planeados e eficazes. Mas ele é mau na táctica, porque não tem nenhuma visão clara do que ele espera conseguir, e limitou-se a apresentar uma lista de demandas máximas, vinca Hanlon.
Este académico diz que Dhlakama irá perder de novo esta guerra que recomeçou, porque desta vez está numa situação péssima, porque já não conta com a mesma base de apoios que tinha quando moveu a de 16 anos que culminou com o acordo de Roma em 1992. Nessa altura, a Renamo era massivamente apoiado pelo então regime do apartheid da África do Sul, e de forma indirecta, pelo Ocidente que via a Frelimo como um agente e aliado dos então regimes comunistas.

HANLON APONTA O DINHEIRO COMO RAZÃO DA PRESENTE GUERRA DE DHLAKAMA

Hanlon cita o então representante da ONU em Moçambique entre 1993-1994, Aldo Ajello, como tendo reiterado que o que move Dhlakama a fazer exigências descabidas, é que ele quer cada vez mais dinheiro. Diz que Ajello sempre salientou que a Renamo estava mais interessada no dinheiro do que pelo poder político, e que para ganhar a sua adesão à paz e harmonia, foi-lhe oferecido esse dinheiro e grandes casas em Maputo, ao mesmo tempo que era permitia que os seus membros que viviam em hotéis, fizessem gastos à vontade ou na medida dos seus caprichos.
E a actual disputa tem no dinheiro a sua base, remata Hanlon, dizendo que alguns dirigentes da Renamo dizem em surdina que invejam o poder monetário e as grandes casas de alguns dos políticos da Frelimo, revela Hanlon, como que a secundar uma outra revelação de Alex Vines, um outro académico britânico também e de renome, de que mesmo para ir a Roma assinar o acordo de paz foi após ser pago pelo falecido milionário britânico, Tiny Rawlands.
Há também muita gente que defende que mesmo os que não sendo simpatizantes da Renamo, apoiam também este belicismo contra a Frelimo, na sua maioria são também movidos pela percepção de que os frelimistas comem sozinhos, ou seja, são movidos pela inveja que nutrem deles.
Os que defendem esta tese adiantam que tais pessoas deixam cair a sua máscara de inveja, quando usam os termos camaradas e frelimistas em tom pejorativo como se tivessem feito tanto mal ao País, e em contra-partida, revelando muita simpatia pela Renamo que na verdade nunca fez nada de vulto e útil para Moçambique, senão ter sido um instrumento de guerra do apartheid e de Ian Smith.

CRONOGRAMA DOS PRINCIPAIS ACONTECIMENTOS QUE DESENCADEARAM A PRESENTE SITUAÇÃO

1 de Fevereiro de 2013  A Renamo, através do seu delegado político em Manica, Sofrimento Matequenha, reitera que os seus militantes irão boicotar e inviabilizar as eleições municipais e gerais em todo o Pais.

20 de Fevereiro de 2013 - Governo reitera, no término de uma sessão do Conselho de Ministros, que as eleições terão lugar nas datas já anunciadas, apesar do boicote e das repetidas ameaças da Renamo.

13 de Março de 2013  A Chefe da Bancada da Frelimo, Margaret Talapa, reafirma também que as eleições terão lugar nas datas já indicadas, independentemente das ameaças da Renamo.

19 de Março de 2013 
 Outro dirigente da Renamo, desta vez seu delegado em Nacala, e que responde pelo nome de Benjamim Cortes, reitera também que o seu partido boicotará as eleições, bem como não permitirá a sua realização, em entrevista ao jornal electrónico Wamphula Fax, editado na cidade de Nampula.

20 de Março de 2013  A Renamo boicota a Comissão Ad-Hoc que iria seleccionar os membros que iriam constituir a nova Comissão Nacional de Eleições, deixando a Frelimo e o MDM, partido fundado pelo antigo membro da Renamo, Daviz Simango, a deliberar sozinhos.

25 de Março de 2013  A Renamo ordena os seus membros a não se recensearem para as próximas eleições municipais de 20 de Novembro, segundo o jornal 
O País, publicado em Maputo, cita o chefe da mobilização da Perdiz na Beira, Horácio Calavete, vincando estamos a dizer é que não só iremos boicotá-las, como os nossos membros não devem se registar, ao mesmo tempo que faremos tudo para que não tenham lugar sequer.

30 de Março de 2013 - O Secretário-geral da Renamo, Manuel Bissopo, profere um discurso bastante belicoso, através de uma entrevista ao Wamphula Fax, e que depois foi ecoada pelo porta-voz da Renamo, Fernando Mazanga, a agência noticiosa Lusa a 2 de Abril seguinte, com ambos vincando que estavam a afinar a sua maquinaria para acabar com o que descreveram como arrogância do governo. Eles vincaram que a Renamo estava a afinar a sua maquinaria para inviabilizar as eleições.

18 de Abril de 2013  Guebuza repudia ataques da Renamo, mais concretamente ao que foi protagonizado contra o Paiol de Savane, em que foram mortos seis soldados que a guarneciam e apelando a razão da liderança da Renamo.

19 de Junho de 2013  O Brigadeiro da Renamo, Jerónimo Malagueta, proclama em Maputo que as forças armadas da Renamo irão interditar a circulação de viaturas e pessoas no centro de Moçambique.

21 de Junho  A Renamo ataca de facto um camião e um autocarro em Muxúnguè, como prova de que o que Malagueta disse não era para o inglês ouvir.

21 de Junho de 2013  Malagueta é preso e encarcerado na cadeia por incitamento a guerra e ameaça a paz no País.

12 Outubro de 2013 - Renamo ataca um posto de polícia em Samacueza, estação de caminhos-de-ferro, no distrito de Muanza em Sofala, não muito longe de Savane onde a mesma Renamo matou soldados em Junho, ou seja, cinco meses antes do assalto a 21 de Outubro corrente à base em que Dhlakama vivia em Santunjira que agora está sendo apontada como prova do belicismo do Governo de Guebuza.

16 / 19 Outubro de 2013 - Uma unidade de polícias e do exército cerca Santujira e corta o acesso a base em que vivia Dhlakama. Pelo menos três confrontos entre os homens armados da Renamo e do exército e da polícia de choque, causando a morte de pelo menos dois membros da Renamo. Neste mesmo período a Renamo celebra em Santunjira os 34 anos do primeiro comandante da Renamo, André Matsangaissa, morto a 17 de Outubro.

21 Outubro de 2013 - Base de Satunjira foi invadida pelo exército e polícia de choque. Dhlakama, Bissopo e outros fogem. A Renamo diz que Armindo Milaco foi morto durante o assalto.

22 Outubro de 2013 - Renamo retalia e ataca e ocupação a sua antiga base de Maringuè que serviu de como seu Quartel-General entre 1982-92. Há uma fuga em massa dos residentes daquela base.

24 Outubro de 2013 - Dhlakama é reportado em lugar incerto, tendo perdido o controle dos seus ex-guerrilheiros, conforme o seu porta-voz parlamentar, Arnaldo Chalaua, em entrevista ao semanário @Verdade.

26 Outubro de 2013  Novo ataque da Renamo na Estrada Nacional N1, em que causa um morto e 10 feridos.

FACTOS INDICAM QUE RENAMO É O ÚNICO RESPONSÁVEL PELO ESPECTRO DA GUERRA
Como estes dados o mostram, o único causador da tensão política e do espectro da guerra que prevalece em Moçambique, é a Renamo e não Guebuza ou a Frelimo a quem a liderança da Perdiz acusa de estar num casamento diabólico com o MDM.
Negar esta culpa A Renamo, e atribuí-la a Frelimo ou ao Guebuza, é ser mau juiz, e seria o mesmo que dizer que os aliados é que foram responsáveis pela III Guerra Mundial, só porque retaliaram aos ataques não provocados de Hitler.
Os agredidos têm todo o direito a legítima defesa como bem o diz o Presidente Guebuza, mesmo para um cidadão comum sem armas de fogo, muito mais para quem tenha armas como é o caso do exército moçambicano que vinha sendo dizimando há meses, com Dhlaklama vangloriando-se que estavam a matar os periquitos que agora o sacudiram de Santunjira. Já era tempo do exército moçambicano dizer basta, o suficiente é suficiente.
Para os que são contra este contra-ataque das FADMs, eu compreendo a sua mágoa, porque Balzac disse há muito que os interesses se sobrepõem aos sentimentos.
O seu interesse em ver a Frelimo ser destronada do poder os faz com que não sintam a matança dos civis, polícias e soldados pela Renamo, porque sendo esta inimiga de quem é seu inimigo também, acabam encarando a perdiz como sendo seu amigo e mais do que isso, seu aliado estratégico.
É uma aliança que se funda no interesse comum que é derrubar a Frelimo do poder. Tem a sua lógica se bem que peque por recorrer a métodos não só ilícitos como pior que isso, a todas as luzes criminosos.
GM/SG
gustavomavie@gmail.com
AIM – 30.10.2013


Um comentário:

sarika disse...

Historiado: debates and ideasaims to promote debates around various areas of world history in general and Africa and Mozambique in particular. I read this blog interestingly and like it very informative.
thanks for sharing.