EM BUSCA DA NOSSA IDENTIDADE! AFINAL QUEM SOMOS NÓS?
A
NECESSIDADE DE RESGATAR OS NOSSOS VALORES ÉTNICO-CULTURAIS PERDIDOS A MERCÊ DO
COLONIALISMO, E HOJE, DA MODERNIDADE E DA GLOBALIZAÇÃO
Ivan Mausse[1]
Moçambique é um país “politicamente” independente
(ex-colónia portuguesa) desde o ano de 1975. Antes de sua independência todos os
conteúdos no que concerne ao tipo ou modelo de educação eram absolutamente a
moda portuguesa, o incrível de tudo é que mesmo encontrando-se em solos
africanos, e neste caso concreto, em solos moçambicanos, a Geografia que se estudava
não era moçambicana (não era de Moçambique), isto é, moçambicanos e filhos de
colonialistas portugueses, todos eles eram obrigados a estudar a geografia
portuguesa, enquanto isso a moçambicana constituía uma excepção naquilo que
constituía o programa curricular colonial português.
Além disso, o povo moçambicano oprimido pelo regime
colonial português era obrigado a “civilizar-se”, isto é, tinha que deixar de
ser um homem “selvagem” e passar a comportar-se como um bom português. Para tal
efeito, o moçambicano tinha que se tornar homem em primeira instância, e o meio
para que este conseguisse se tornar homem passava necessariamente em ser
submetido a escravatura, ao trabalho forçado, a humilhação, e não só. Assim, o
moçambicano era obrigatoriamente envergado de cultura, valores, língua e das
conquistas feitas pela “heroicidade”
portuguesa.
Sendo Moçambique uma colónia cuja era directamente
administrada pela sua metrópole, todos os seus filhos-habitantes eram ensinados
a se envergonharem da sua cultura, das suas origem (etnias), da sua identidade,
do seu passado (da sua história), da sua cor, da sua diversidade linguística,
dos seus usos e costumes, da sua tradição, em geral de serem aquilo que eram,
de serem africanos e moçambicanos, de serem filhos de antepassados que cujos na
óptica do colonizador eram selvagens. Portanto ao moçambicano era ensinado a
deixar de considerar como válidos todos os seus valores étnico-culturais
passando assim a considerar como válidos os valores, princípios e regras de
convivência autenticamente portuguesas: é daqui onde surgem os “[2]pele
negra, máscara branca” os assimilados e, os não-assimilados. Os
não-assimilados eram também chamados indígenas. Portanto, no tempo colonial,
havia uma espécie de dois tipos de moçambicanos, por um lado havia os
assimilados cujos comportavam-se como portugueses, a esses era atribuído o
direito de poder circular na cidade, de frequentar jardins, teatros, hospitais,
escolas, praças e outros serviços públicos que o homem branco também
frequentava.
Por outro, existiam os não-assimilados ou simplesmente
indígenas que praticamente constituíam o inverso dos assimilados, isto é, esta
classe de moçambicanos não tinha àqueles direitos que os assimilados e
colonialistas dispunham, ou seja, aos indígenas era reservado nada, ou por
outras palavras, não lhes era reservado algum direito humano senão a vida isolada e sofrida.
No sistema de ensino colonial português introduziu-se o
ensino rudimentar que tinha como objectivo principal tirar “o moçambicano de uma vida de selvajaria para
uma vida civilizada” isso passava primeiro em despersonalizar o moçambicano, desligando-o do seu
país e da sua origem, levando-o assim a negar, desprezar, a envergonhar-se do
seu povo e da sua classe, a perder a iniciativa criadora (não mobilizar
resistência contra a exploração colonial) e reconhecer como válidos os valores
do colonizador (cf. Cossa & Mataruca sa:152).
O colonialismo pretendia com isso separar alguns
africanos dos seus povos e incutir os valores e mentalidade ocidentais através
da política dos assimilados. Isso fez com que a partir de 1930, o governo
colonial português procedesse à modificação
do sistema educacional, assim passou a controlar directamente o ensino
destinado à população negra, com o objectivo de habilitar o indígena para
trabalhar na economia colonial.
Severino Ngoenha e José Castiano em sua obra “A Longa Marcha duma «Educação para Todos» em
Moçambique” apontam que os africanos eram formados naquelas profissões que
seriam úteis aos brancos e missionários no cultivo de terras e nas obras de
construção. Pois, uma vez nas escolas, estas pessoas podiam se revoltar contra
o sistema. A educação podia aumentar as expectativas de promoção social dos
negros, que podiam resultar em atitudes críticas contra as próprias
instituições coloniais. Assim,
“A escola devia, noutras palavras, ser uma instância de
administração e política colonial. (…) As crianças e as elites escolarizadas
eram endoutrinadas no sentido de reconhecerem a superioridade do branco, de, ao
mesmo tempo, implicitamente, desprezarem a sua cultura, ou no mínimo, de
reduzirem as suas culturas locais de origem a uma esfera privada, fora da vida
pública” (NGOENHA & CASTIANO, 2013:210).
Tal como sublinhei no primeiro parágrafo deste artigo, em
1975 Moçambique alcança a sua vitoriosa independência, fruto de um combate que
durou cerca de 6 (seis) séculos ou então cerca de 500 anos de colonização.
Durante esses cerca de seis séculos ou 500 anos houve uma co-existência da colonização
e resistência contra a mesma, ou seja, desde sempre os moçambicanos resistiram
a opressão colonial.
Mas o porquê do colonialismo? Da escravatura e exploração
humanas? Será uma punição pelo facto de ser negro? (preto tal como era chamado
o negro pelo colonialismo português), de pertencer a um continente descoberto
por eles enquanto faziam as suas navegações marítimas? (época dos
descobrimentos). Porém, quanto à mim, não se trata necessariamente de uma
descoberta, pois nenhum africano se encontrava coberto ou tampado por alguma
coisa. Portanto, o melhor termo não é dizer o povo ocidental descobriu o continente africano e nem os
africanos, mas sim «encobriu-os», ou
seja, não se trata de uma descoberta, mas de um encobrimento: encobriram a
escravatura, a exploração, a humilhação e privação dos direitos humanos dos
africanos. De lembrar que a aquando da sua chegada a África, os europeus diziam
que encontravam-se em solos extra-europeus: eles ainda consideravam que,
enquanto na Europa há leis, em África há caos; enquanto a sociedade europeia
tem história, a africana é a-histórica (pré-histórica); enquanto na Europa há
Estado, em África existem chefaturas; enquanto na Europa há religião, em África
há práticas mágico-religiosas; enquanto na Europa há médico, em África há
curandeiro; enquanto na Europa a sociedade é civilizada, em África estamos
perante uma sociedade selvagem e primitiva – assim considerava ocidente.
O povo moçambicano de antes da independência, ou
simplesmente, o povo moçambicano colonizado tinha de se identificar e se
inspirar nos ideais portugueses. Em certos estabelecimentos ou instituições
tais como hospitais, mercados municipais, restaurantes e entre outros, era
interdita a circulação de moçambicanos que na altura eram chamados por pretos tal como dizia Francisco Langa o mais conhecido por
Chico-Nhoca, personagem real da obra literária do ilustre escritor moçambicano
Albino Magaia intitulada “Yô Mabalane”
de 1983. Como se o preto da pele fosse a essência e ao mesmo tempo nome de cada
homem moçambicano.
As palavras, branco, asiático, goês - caneco,
paquistanês, indiano - monhé, mestiço – mulato e indígena são termos que não
exprimiam unicamente o grupo racial a que pertenciam, mas também o seu lugar na
escala colonial social portuguesa.
A condição para frequentar as praças e serviços públicos,
tal como disse, passava em ter um registo português ou então tornar-se num
“pele negra, máscara branca”, num assimilado: homem de raça branca, mas num
mero faz de contas pois apesar de ter registo português e fazer de contas que
era um homem branco e por isso compartilhava quase que os mesmos direitos com o
colonizador, no fundo continuava negro, africano e moçambicano, quer dizer,
continuava 100% moçambicano como eu.
Conquistada a independência nacional e total a 25 de
Junho de 1975, segundo alguns documentos oficiais, graças a homens tais como
Samora Machel, Eduardo Mondlane, Felipe Samuel Magaia, nasceu a esperança de um
futuro promissor principalmente à juventude daquela época. Todo moçambicano
estava engajado de uma liberdade de sonhar, de sorrir e de poder portar-se de
acordo com os valores da nossa moçambicanidade que já estavam enraizados nas
veias do próprio passado moçambicano. Assim, cabia aos moçambicanos resgatar
tais valores em prol da reconstrução da moçambicanidade que esteve em
detrimento e submissa durante o período do regime colonial português.
É de recordar que, o homem negro moçambicano tinha que,
sobretudo, respeitar o homem branco. Era também obrigado a se sentir
racionalmente inferior ao branco, isto para dizer que o homem negro se sentia e/ou
era um instrumento nas mãos dos homens brancos. Portanto, já deu para notar que
o povo moçambicano não só é heróico pelo facto de ter conquistado a sua
liberdade e independência, mas também pelo facto de ter resistido desde o
início da escravatura e por ser dono de uma rica e emocionante história, quer
de resistência, como de libertação, desde os impérios até a formação de
movimentos independencialistas.
Hoje em dia ainda, assistimos cenas idênticas, ou melhor,
semelhantes àquelas que outrora sucederam. Há casos de moçambicanos que até
hoje e, mesmo depois dos seus antepassados terem morrido com o fim último de
garantir uma vida melhorada às gerações que os procederia, neste caso concreto
nós. Nos dias actuais, há pessoas que se envergonham de ter os pais que têm, de
falar a língua que os pertencem, de vestir aquilo que lhes é digno, de comer
aquilo comem (gastronomia), de seguirem as suas tradições, de viverem onde
vivem, de assumir a sua identidade, de frequentar a religião que frequentam, de
possuir a cor que possuem, de pertencer a etnia que pertencem, em geral de
serem o que são.
Tais pessoas além de negar a sua identidade, ainda nutrem
os ideais do colonizador, dizendo: o homem negro não vale nada, como se o homem
branco valesse mais em relação ao primeiro, pois, ultimamente os homens de cor
negra têm-se estigmatizado entre si mesmos, dizendo-se que ambos não prestam,
isto é, que o homem negro não presta. Mas daí emerge uma pergunta muito interessante,
quem colonizou, oprimiu e pôs a sofrer o outro? Será justo o próprio negro
dizer ao outro igual a si que não presta? E ao dizer que o outro não presta não
estaria a valorar o colonialismo? Não estaria a desvalorizar os nomes e a honra
daqueles que tanto lutaram para libertar esta pátria que, por sua vez, eram
igualmente negros? Portanto todos àqueles que incansavelmente lutam em dizer
que o homem negro não presta ou então não vale nada, não estarão infectados
pela doença da colonização mental Salazariana?
Em certos restaurantes em que está lá a trabalhar um
grupo de serventes negros, quando chega um cliente que por sinal é negro, é mal
atendido, mas quando lá chega o branco é atendido com simpatia e hospitalidade. E, há vezes em que quando
chega o negro em primeiro e o branco em segundo, o último é o primeiro a ser
atendido, funciona assim o provérbio “os últimos serão os primeiros”. Assim, um
servente negro é hospitaleiro em relação ao branco e tolerante em relação ao
negro.
Na nossa sociedade quem não sabe falar a língua de
Camões, isto é, a língua portuguesa, é colocado à parte, ou seja, quem não tem
noções da língua portuguesa é tratado de forma discriminatória, porque no lugar
deste falar português, fala changana,
chope, macua, ndau, sena etc., como se estas línguas não fossem
válidas, e válida apenas a língua portuguesa, que por sinal herdámos do
colonizador, Portugal.
Tal aconteceu uma vez quando estava no interior duma das
bibliotecas existentes na capital Moçambicana (Maputo), na companhia de um
colega, quando resolvemos em nos comunicar em nossa língua materna, mas foi-nos
proibido de continuar a usá-la, isto é, foi-nos pedido, ou melhor foi-nos
obrigado a ter que nos comunicar em português pelos funcionários daquela
estância bibliotecária. E assim o cumprimos. Mas, pouco tempo depois,
resolvemos em nos comunicar em inglês, e para a nossa surpresa, não disseram-nos
nada. E daquele modo descobrimos que naquele lugar e noutras instituições do
país é proibido usarmos as nossas línguas locais, mas as internacionais não.
Tal acontecia ou talvez ainda acontece nas escolas, lembro-me que, quando
estava no ensino primário nos anos 1999-2005 sempre que o professor nos ouvisse
a falar a minha língua materna, o changana,
submetia-nos a um castigo.
Actualmente, nas escolas moçambicanas estuda-se mais a
história dos povos ocidentais do que a história dos povos africanos, razão pela
qual muitos jovens desconhecem o passado histórico de África, e particularmente
de Moçambique. Não sabem dizer com precisão quem era Eduardo Mondlane, Samora
Machel, Felipe Samuel Magaia, qual a data: do início da luta de libertação
nacional; da proclamação da independência nacional; da assinatura do acordo
geral de paz, datas que deviam ser conhecidas por todos moçambicanos pertencentes
à esta pátria amada. Assim, no lugar dos jovens estudarem conteúdos nacionais,
estudam conteúdos ultra-nacionais.
Todos os dias canta-se o desejo de construir a identidade
e orgulho moçambicanos: a moçambicanidade.
Mas, como será possível construir a tão desejada moçambicanidade, se as
gerações presentes desconhecem da heroicidade deste povo? Como poderão estes
ter orgulho de serem moçambicanos, de serem filhos de antepassados
moçambicanos, se nem sequer conhecem a história do seu povo, da sua tribo ou
então da sua etnia? Portanto, quanto à mim, os jovens só terão orgulho de serem
cem por cento moçambicanos quando envergados da heróica história do passado
moçambicano e das resistências levadas a cabo pelas suas tribos no passado
longínquo, médio e recente.
Qual é o jovem que não pode gostar de saber que há muito
tempo, um jovem moçambicano de nome Eduardo Chivambo Mondlane, nascido na
aldeia de Nwadjahane, distrito de Manjacaze, província de Gaza, por sinal numa
zona totalmente rural, pastor de gado como qualquer outra criança daquela
época, numa altura em que era difícil uma criança africana frequentar e
concluir o ensino rudimentar. Apesar da constante perseguição da PIDE, este
jovem fez de tudo e conseguiu estudar mesmo sendo órfão de pai e mãe, o pai e a
mãe morreram quando este tinha dois e treze anos respectivamente. Das várias
bolsas de estudo que este jovem conseguiu ganhar, destaca-se aquela que o
possibilitou de ir aos Estados Unidos, onde, de 1951 a 1956, frequentou o
Oberlin College e a Northwestern University, nessas escolas superiores obteve
sucessivamente os graus de Bacharel, Licenciado e Doutor em Sociologia e
Antropologia. Este jovem foi convidado para trabalhar na secretaria das Nações
Unidas. Diga-se de passagem que, Eduardo Mondlane já tinha a sua vida feita,
mas sentiu a necessidade de compartilhar aquele ambiente de paz e liberdade aos
seus irmãos-compatriotas que estavam em Moçambique, que por sinal, viviam
abalados pelo regime colonial português. Este jovem chamado Eduardo Mondlane,
preferiu deixar os Estados Unidos, a secretaria das Nações Unidas, em fim, a
vida boa que ele tinha, e, voltou a África, voltou a Moçambique para pegar em
armas e lutar para que os seus irmãos pudessem um dia sentir o cheiro e o
conforto de viver em paz, em liberdade, em independência. Um jovem que sabia do
perigo que corria quando saiu dos EUA, ou seja, Mondlane sabia que podia
morrer, pois onde há conflito ou guerra infere-se danos humanos, infere-se a
morte. Portanto, digam-me vocês, qual é o jovem que não sentiria orgulho de
fazer parte de uma pátria de um homem como este, de um homem como Eduardo
Chivambo Mondlane?
Para podermos construir a tão desejada moçambicanidade,
passa necessariamente em conhecermos o nosso próprio passado histórico, não essencialmente
em conhecer o passado histórico alheio: àquele que não nos pertence; assim o
passado histórico alheio tem de ser usado não como objecto de estudo do povo
moçambicano, mas sim como objecto de referência na compreensão da nossa
história, da nossa história entanto que povo moçambicano, entanto que entidades
pertencentes a esta nossa gloriosa pátria amada, Moçambique.
Passados tantos anos de independência e “liberdade”, ou melhor, passados tantos anos de independência
político-administrativa (o que também nem chega a ser), pois, quanto à mim, a
independência que conquistámos em 1975 trata-se de uma independência política e
administrativa que possibilita os moçambicanos a governarem o seu próprio país
criando leis que facultem a paz, a liberdade, a solidariedade, ordem e
segurança num Estado de direito que somos. Assim, trata-se de uma independência
político-administrativa porque até nos dias actuais, vivemos economicamente dependentes
do ocidente, vivemos pedindo “esmola” a Europa. Portanto, vivemos dando sentido
e vida àquela expressão medieval segundo a qual: “o ser humano é independente se for dependente”.
Bem, talvez seja o preço que o ocidente deva pagar por
tantos anos de exploração dos recursos africanos e do próprio Homem africano
que outrora foi usado como um instrumento para a obtenção de capitais. Esse
mesmo Homem africano teve de participar duma guerra que não lhe dizia respeito
(II Guerra Mundial) só, e, exclusivamente, para defender os interesses do
opressor. Além disso, grande parte da grandeza da Europa e da América derivam
da exploração da raça negra. Portanto, o financiamento europeu para os povos ou
países africanos de hoje, trata-se na minha opinião de uma restituição do que é
devido, logo é algo justo, pois para Polemarco discípulo de Sócrates “...a justiça consiste em restituir a cada
um o que lhe convém...” (cf. A República - no livro I nas páginas 10 e 11).
Todavia, o que dizer da forte influência que os líderes
africanos recebem do ocidente? Parece que os líderes africanos não são cem por
cento autónomos nas suas decisões. Se nos consideramos livres e independentes,
então porquê até hoje somos coagidos por forças externas nas nossas decisões
internas, como país, como nação, como povo e como continente?
Passados tantos anos de independência, tal como já referenciei,
muitos africanos ainda se sentem inferiores em relação ao povo ocidental em
quase tudo. Vivem ainda oprimidos. Quando se fala de desenvolvimento, refere-se
aquilo que acontece no mundo ocidental, e, nós africanos temos que imitar
aquele referido desenvolvimento, temos que «nos modernizar». E modernizar-se
refere-se construir edifícios como aqueles que se constroem no ocidente,
vestir-nos como vestem no ocidente, mobilar as nossas casas a moda estrangeira
e com objectos luxuosos. Já agora, somos obrigados a ter que ratificar do novo
acordo ortográfico para a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Será que até quando teremos de viver colonizados, escravizados e globalizados
não de maneira directa ou notória, mas de forma indirecta, ou se
quisermos ainda, de forma moderna? Seremos nós “os condenados da terra”?
Não obstante, devido a esta intermitente tendência de
plagiarmos de tudo e um pouco que vem do ocidente, como por exemplo os modelos
de administração, de governação e de desenvolvimento ocidentais, maior parte
dos nossos planos de desenvolvimento tem resultado em fracassos e insucessos.
Neste sentido, enquanto os nossos governantes africanos não enveredarem segundo
as realidades dos seus povos, é verdade que os fracassos jamais cessarão. Além
do mais, é de competência que os governos africanos através dos seus tutelares
da pasta da cultura (Ministério da Cultura) motivem a auto-estima dos seus
povos e a sua auto-afirmação como negros e como pessoas.
É necessário que cada moçambicano, cada negro e cada
africano tenha orgulho daquilo que é, tal como sustenta o filósofo Edward
Blyden citado por Severino Ngoenha[3]
na sua “Das Independências às Liberdades” [4]
(1993). Para Blyden,
«A nossa personalidade e a nossa raça pressupõem a
existência de uma responsabilidade. O dever de cada um, e de cada raça é lutar
pela própria individualidade, para mantê-la e desenvolvê-la. Portanto orai e
amai a vossa raça. Se não fordes vós mesmos, se abdicares da vossa
personalidade, não havereis deixado nada ao mundo. Não tereis satisfação,
utilidade, nada que fascine os homens, porque com a supresão da vossa
individualidade havereis perdido o vosso carácter distintivo. Vereis, então que
ter abdicado da vossa personalidade, significará ter abdicado da missão e da
glória particular a qual sois chamados. Seria de facto renunciar à nossa divina
individualidade, o que seria o pior dos suicídios» (Blyden apud Ngoenha, 1993:68).
Na verdade, não era àquele primeiro o meu propósito
principal neste presente artigo, isto é, o meu objectivo não era contar-vos da
história da colonização em Moçambique. Mas, resolvi descrevê-la de forma
sucinta, uma vez que, o assunto que queria aqui abordar conjectura-se com a
colonização sofrida pelos moçambicanos, ou seja, o actual quotidiano dos
moçambicanos possui sintomas da colonização mental “Salazariana”. Portanto, trata-se fundamentalmente não de uma
discrição da história da colonização em Moçambique, mas dos efeitos que a
colonização mental trouxe e traz até agora às actuais gerações moçambicanas,
que por sua vez, cria barreiras na construção da moçambicanidade e/ou seja, da
identidade moçambicana que tanto a almejamos.
Nota do autor:
O que fiz no presente artigo não se trata de uma narração
da história de Moçambique. Apenas usei da história do nosso passado como
referência para melhor fazer compreender aos ilustres leitores o pulsar do meu cogitar.
O que fiz devia-se fazer, outrossim, com a história ocidental para os
moçambicanos, quer dizer, temos que usar da história ocidental como uma citação
ou referência quando estivermos a estudar ou abordar a história de Moçambique.
Portanto, se quisermos que as gerações vindouras possam ter orgulho deste belo
Moçambique, o nosso objecto de estudo tem de ser em primeira instância, a
heroicidade do povo moçambicano. Um outro aspecto não menos importante, seria
incutir a história de Moçambique em todos sistemas de ensino nacional, ou seja,
proponho que se institua o ensino de história de Moçambique nos ensinos
primário, secundário e não só, mas também no ensino superior e
independentemente do curso ou da faculdade que esteja-se a fazer, quero com
isso dizer, tínhamos que ter no nosso currículo nacional de ensino uma
disciplina que se ocupasse só e exclusivamente da história de Moçambique vigente
em todas as classes, mesmo para àqueles estudantes que estejam a fazer a secção
de ciências do ensino secundário médio (11ª e 12ª classes), bem como aos
estudantes das faculdades de ciências naturais e matemática, pois, é fundamental
que todos nós conheçamos o nosso passado histórico independentemente da classe
ou da especificidade que estejamos a cursar no ensino superior. O melhor homem
é aquele que conhece o seu passado, portanto, a sua história. É urgente dar a
conhecer aos jovens a história do povo unido do Rovuma ao Maputo, do Zumbo ao
Índico cujo colhia e colhe os frutos do combate pela paz, diante do qual,
cresce o sonho ondulando na bandeira, que vai lavrando na certeza do amanhã,
tal como se diz na terceira estrofe do nosso hino nacional, «Pátria amada».
Bibliografia
CARRILHO, Maria, MONDLANE, Samuel. Português- 8ª Classe. 2ª edição. Maputo:
Diname, 1990
NGOENHA, Severino. Das
Independências às Liberdades. Maputo: Edições Paulistas – África, 1993.
HOFISSO,
Narciso, Sitói, Lucas. A história da minha pátria, 5ª Classe
(antigo currículo). Maputo: Diname, 1986
Cossa, Hortência Mataruca, Simião.
Moçambique e sua história- 12ª
Classe. Maputo: Diname
Ivan Dário Maússe
Estudante de
Filosofia
E-mail:
ivanmausse@gmail.com
facebook:
ivan.mausse@1facebook.com
[1] Estudante de Filosofia na Universidade
Pedagógica
[2] Título do livro de Frantz
Fanon publicado em 1952. Este livro foi escrito para mostrar a interpretação
psicanálitica do problema do negro (ontologia da raça). O ser do negro era
avaliado em meras questões da cor da pele, assim quanto mais clara fosse a cor
da pele signficava que o conteúdo desse mesmo homem era bom, todavia se a cor
da pele fosse escura era sinal de que o conteúdo de tal homem é sujo. Neste
sentido, o negro teve de negar da sua cultura e cor para adoptar a cultura e a
cor do branco através da política de assimilados. Assim, o negro tornava-se num
pele negra e máscara branca porque praticava o imitismo civil, preocupava-se em
se comportar como um branco e como um burguês, renegando-se a si mesmo.
[3] Bacharel em
teologia e Doutor em Filosofia pelas Universidades Urbaniana e Gregoriana de
Roma respectivamente, nasceu em Maputo no ano de 1962, é autor de várias obras
tais como: Pensamento engajado, Por uma dimensão Moçambicana da consciência
Histórica, Duas interpretações
Filosóficas da História do Século XVII. É docente na Universidade
Pedagógica lugar onde lecciona as disciplinas tais Filosofia Africana,
Filosofia pós-modernidade. É também docente em outras Universidades nacionais e
internacionais lugares onde lecciona diferentes disciplinas.
[4] Nesta obra, Severino Ngoenha discute muito a questão
da liberdade e auto-determinação dos povos africanos. Depois de conquistadas as
independências dos países africanos a partir da década sessenta, prevalece o
problema de falta de auto-determinação, ou seja, os líderes africanos não
chegam a ser livres nas suas decisões internas tal como deviam. Até hoje ainda
recebem influência da Europa e do Ocidente quando desenham suas políticas. Isso
reflecte-se nos modelos de governação, razão pela qual há insucessos e
fracassos. Ele próprio diz: “deve-se conceber um modelo de desenvolvimento
endógeno; isto é, deve haver uma interiorização de modelos técnicos pelas
massas e a tomada de iniciativa no âmbito de grupos comunitários como os
distritos” (cf. 171).
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