10 fevereiro 2014

STUART HALL MORRE AOS 82 ANOS


Sociólogo foi um dos principais teóricos do multiculturalismo
Causa da morte ainda não foi divulgada

 

RIO - Um dos principais teóricos do multiculturalismo, o sociólogo Stuart Hall morreu nesta segunda-feira, aos 82 anos. Nascido na Jamaica em 1932 e radicado na Inglaterra desde os anos 1950, ele foi um dos pioneiros do campo de pesquisas que ficou conhecido como "estudos culturais". A causa da morte não foi divulgada.
Hall tinha na própria biografia um exemplo eloquente de suas teses. Nascido em 1932 em Kingston, capital da Jamaica, em uma família negra de classe média, ele se mudou para a Inglaterra nos anos 1950 para escapar das tensões raciais e do peso do colonialismo britânico em seu país natal. Mas nunca se sentiu totalmente em casa na terra que adoptou: “Não sou inglês e nunca serei. Vivi uma vida de deslocamento parcial”, disse em entrevista recente ao jornal “The Guardian”. Foi desse ponto de vista “deslocado” que Hall influenciou decisivamente os debates sobre identidade, raça, gênero e cultura ao longo de mais de cinco décadas.
Hall desembarcou na Inglaterra em 1951, com uma bolsa de estudos para a Universidade de Oxford. A sensação de deslocamento no novo ambiente fez com que o recém-chegado mergulhasse nas comunidades de migrantes que cresciam no pós-guerra e nos debates sobre o futuro da esquerda. Colaborou com as primeiras edições da revista “Universities and Left Review”, que em 1960 se fundiu com outro veículo para formar a “New Left Review”. Hall foi editor e um dos fundadores da publicação, voz influente nos principais debates políticos da segunda metade do século XX.
Em 1964, Hall foi o primeiro pesquisador convidado para o recém-criado Centro para Estudos Culturais Contemporâneos da Universidade de Birmingham, na Inglaterra. Em 1972, ele se tornaria director do departamento. Lá, ajudou a moldar um campo de pesquisas emergente, que procurava construir uma abordagem interdisciplinar da cultura mesclando áreas como sociologia, antropologia, filosofia, crítica literária, linguística e teoria política. Para Hall, a cultura, mais do que um conjunto de referências estéticas ou históricas de determinado grupo humano, era “ponto crítico de acção e intervenção social, no qual relações de poder são estabelecidas e potencialmente desestabilizadas”.
Com esse olhar, Hall analisou em seus ensaios temas variados como cultura popular, mídia, marxismo e a situação de comunidades de imigrantes em sociedades pós-coloniais. Foi um analista agudo dos efeitos do colonialismo no mundo contemporâneo e um intérprete sempre atento às representações estereotipadas de culturas ditas “periféricas” em tempos de globalização.
Em seis décadas de carreira, Hall publicou sobretudo ensaios em revistas académicas e veículos de imprensa. Dava mais importância ao trabalho colectivo, editando publicações com expoentes dos estudos culturais. Essa concepção colaborativa do conhecimento se reflectiu em sua decisão de, a partir de 1979, dar aulas na Open University, dedicada ao ensino e à pesquisa à distância. Foi professor lá até 1997, quando se aposentou.
Apesar da aposentadoria, continuou suas actividades públicas na Inglaterra e no exterior, onde seu trabalho tinha repercussão crescente. Esteve no Brasil em 2000 para uma série de conferências e teve traduzida a colectânea de ensaios “Da diáspora — Identidades e mediações culturais” (Editora UFMG, organização de Liv Sovik) e o livro “A identidade cultural na pós-modernidade” (DP&A Editora).
Continuou também a ser uma voz activa na política britânica. Em 2011, o primeiro-ministro do Reino Unido David Cameron afirmou em um discurso em Munique, na Alemanha, que “o multiculturalismo do Estado” falhou e que a Inglaterra precisava fortalecer sua identidade nacional para combater ameaças externas. Em entrevista ao jornal “The Guardian” meses mais tarde, Hall se mostrou reticente quanto aos rumos do país. “Politicamente, estou mais pessimista do que nos últimos 30 anos”, ele disse, acusando a esquerda de “falta de ideias”.

Tema de documentário
Nos últimos meses, Hall estava retirado da vida pública devido a problemas de saúde, principalmente em consequência de uma insuficiência renal. Mas seu pensamento se manteve influente, como demostrou o documentário britânico “The Stuart Hall project”, exibido no Festival do Rio no ano passado. Dirigido por John Akomfrah, o filme mistura memórias de Hall com depoimentos de intelectuais que destacam a relevância de sua obra. A certa altura, Hall faz um resumo irónico de seu interesse de toda a vida em questões de identidade e imigração: “Hoje em dia, quando pergunto a uma pessoa de onde ela vem, espero ouvir uma longa história”. Veja o documentário abaixo:



In: http://oglobo.globo.com/cultura/stuart-hall-morre-aos-82-anos-11560954

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