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Caros amigos o blog Historiando: debates e ideias visa promover debates em torno de vários domínios de História do mundo em geral e de África e Moçambique em particular. Consta no blog variados documentos históricos como filmes, documentários, extractos de entrevistas e variedades de documentos escritos que permitirá reflectir sobre várias temáticas tendo em conta a temporalidade histórica dos diferentes espaços. O desafio que proponho é despolitizar e descolonizar certas práticas historiográficas de carácter eurocêntrico, moderno e ocidental. Os diferentes conteúdos aqui expostos não constituem dados acabados ou absolutos, eles estão sujeitos a reinterpretação, por isso que os vossos comentários, críticas e sugestões serão considerados com muito carinho. Pode ouvir o blog via ReadSpeaker que consta no início de cada conteúdo postado.

14 junho 2012

MUSEUS E O PATRIMÓNIO HISTÓRICO CULTURAL MOÇAMBICANO


MUSEUS E O PATRIMÓNIO HISTÓRICO CULTURAL MOÇAMBICANO





Jorge Fernando Jairoce





Neste artigo pretendo fazer uma  reflexão em relação a situação dos museus e o património histórico cultural no nosso país. O brasileiro Mário Chagas (2007), considera o museu “como um espaço de trocas, de relação e de preservação de documentos, que só possuem sentido se para eles houver um uso social”(p.4).

A partir desta definição, podemos dizer que o museu não é um espaço acabado, restrito a quatro paredes para existir, ou seja, o local onde se depositam coisas velhas, gabinete de curiosidades, tal como demonstram os museus moçambicanos. Os museus em Moçambique ainda são vistos na perspectiva tradicional, ou seja, estáticos e  fechados (restritos ao seu plano conceptual e não prático). Os museus em Moçambique carecem de programas educativos e sociais específicos. No estudo por mim efectuado em 2004,  para avaliar a utilizaçao dos museus da Cidade de Maputo pelos professores e alunos no ensino de História trouxeram dados supreendentes. As escolas da Cidade de Maputo que estão próximos do museus passam anos e anos sem visitá -los, o que vale referir que os professores mesmo com os museus próximos  da escola (Museu da Revolução próximo da Escola Secundária Francisco Manyanga; o Museu de História Natural e de Geologia próximo da Escola Comercial de Maputo e Escola Secundária Josina Machel) não utilizam  como recurso educativo, o que contribui para o seu desconhecimento por parte dos alunos.

Outra razão que contribui para o desconhecimento dos museus tem a ver com a sua fraca divulgação e publicitação, uma vez que não promovem o contacto com as escolas divulgando a sua realidade aos alunos  e pior ainda não possuem serviços educativos organizados. Os nossos museus carecem de profissionais formados que possam acompanhar didácticamente os visitantes.

A preservação de alguns museus e os acervos deixam a desejar, tal é como é o caso do Museu da Revolução em Maputo e o Museu Nacional de Etnologia em Nampula só para citar alguns exemplos. Estes museus carecem de uma restauração urgente. De uma forma geral, os museus do país precisam de acompanhar a dinâmica do mundo culturalmente mais diverso, senão os mass media cada vez mais criativos e abrangentes acabarão substituindo o seu papel na divulgação do património histórico cultural nacional. Os museus nacionais  devem investigar cada vez mais, renovar os seus acervos, promover círculos de interesse educativos e tornarem –se mais interventivos com vista a  preservação do património histórico cultural indispensáveis para promoção do espírito patriótico e de cidadania moçambicana. Considerando este último os museus deviam ser geridos por instituições académicas  e de pesquisa e não por partidos políticos como se pretende com o Museu da Revolução.

Quando referimos o património histórico cultural estamos  a incluir os seus elementos constituintes que são os bens culturais materiais (florestas sagradas, objectos arqueológicos, monumentos, livros, instrumentos musicais, etc) e imateriais  (tradições orais- contos, danças, canções, provérbios, mitos, línguas, etc) indispensáveis para a promoção da identidade cultural e preservação da memória colectiva.

Estes bens culturais constituem importantes  documentos históricos que merecem a sua valorização e preservação para a construção da nossa história que ainda constitue uma floresta virgem a ser desbravada. As nossas cidades capitais, ilhas, algumas vilas, montanhas, edifícios antigos, etc, devem ser preservados, restaurados e utilizados com  vista ao desenvolvimento do País, sobretudo através de promoção de actividades turísticas, educativas e sociais.

Com vista a valorização  e preservação do património histórico cultural do país alguns passos foram dados com realização em Julho de 1978, da 1ª Reunião Nacional dos Museus na Ilha de Moçambique, onde foram discutidas questões relacionadas a organização e  funcionamento dos museus bem como a necessidade da recolha e estudo do património histórico cultural do país. Este encontro conduziu à realização de campanhas de preservação e valorização cultural do património cultural em todo país. Estas campanhas duraram cerca de 4 anos, ou seja, até 1982 quando foi criado o então Serviço Nacional de Museus e Antiguidades que recolheu informações e testemunhos sobre a História, manifestações artísticas, múmias e danças, cerimónias e rituais, utensílios e instrumentos de produção,  que deveriam ser legalmente protegidos pelo Estado.

Foi então que, em 1988, como forma de regulamentar a protecção do património cultural, o Conselho de Ministros aprovou a lei 10/88 de 22 de Dezembro de 1988, relativa a protecção do patrimóno cultural moçambicano. Esta lei, no seu capítulo III, artigo 4, atribui ao estado a responsabilidade de incentivar a criação das instituições científicas e técnicas como museus, bibliotecas, arquivos, laboratórios e oficinas de conservação e restauro, necessárias à protecção e valorização do património cultural. A lei estimula a  utilização dos meios do Sistema Nacional de Educação e orgãos de comunicação sociais para educar os cidadãos sobre a importância do património cultural e a necessidade da sua protecção.

Passados vinte anos após a aprovação desta lei, os meios do Sistema Nacional da Educação continuam ineficientes na sua acção educativa com a vista a valorização e protecção do património cultural moçambicano. Aliás, este constitui um dos principais desafios enfrentados pelo país no relacionamento prático da educação com a realidade sócio cultural  da comunidade, o que seria extremamente importante do ponto de vista afectivo e didáctico tendo em conta que a educação afigura-se como o mecanismo mais adequado para a valorização e preservação do nosso património histórico cultural, tal como foi reconhecido no I Conselho Coordenador da Cultura realizada em 2000.

É interessante registar, entretanto, que os conteúdos,  transmitidos pelas nossas escolas ao longo dos anos, têm privilegiado padrões de cultura importados, aplicados sem a devida redução social, em conteúdos impostos de cima para baixo, dissociados da realidade dos alunos, em escolas burocratizadas e distantes das comunidades na qual estão inseridas. Então, é altura de valorizarmos estudos da nossa realidade  cultural e da nossa memória histórica.

Perante esta situação urge reflectirmos sobre a função educacional dos nossos museus (educação patrimonial), da nossa política nacional da cultura e dos museus e o lugar do património histórico cultural como elemento de desenvolvimento e da promoção da cidadania moçambicana. Valorizando o património cultural nacional  estaremos a valorizar a nossa história e consequemente a promover a cidadania moçambicana.

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