31 julho 2012

ATRIBUIÇÃO DOS APARTAMENTOS DA VILA OLÍMPICA AOS ANTIGOS COMBATENTES: ACTO DA CONFIRMAÇÃO DE NEPOTISMO, CORRUPÇÃO, ABUSOS DO PODER E ARROGÂNCIA POLÍTICA


ATRIBUIÇÃO DOS APARTAMENTOS DA VILA OLÍMPICA AOS ANTIGOS COMBATENTES: ACTO DA CONFIRMAÇÃO DE NEPOTISMO, CORRUPÇÃO, ABUSOS DO PODER E ARROGÂNCIA POLÍTICA


Por Jorge Fernando Jairoce

Realmente a notícia veiculada pelo semanário Canal de Moçambique na edição passada (nr.158, de 25 de Julho de 2012), dando conta de que figuras da elite política e económica moçambicana, entre ministros e ex-ministros, governadores e ex-governadores, PCAs de empresas públicas ou participadas pelo Estado e deputados ocuparam parte dos apartamentos da Vila Olímpica do Zimpeto, na cidade de Maputo, a coberto de título de antigos combatentes, indignou muitos cidadãos com mente sã. Só não ficariam indignados os indivíduos  com demência confirmada pelos psiquiatras.

É caso para dizer que esta elite política e económica necessita urgentemente de exorcismo político com vista a expurgar todos os espíritos maus e demais demónios que os acompanham. Analisando a nossa história económica desde o período pós independência observa-se que esta elite política gananciosa passou por um longo  retiro e jejum económico que não os permitia ter acesso aos bens públicos de forma fraudulenta no período de economia centralizada dirigido por Samora Machel. Aliás, é preciso recordar que as circunstâncias da morte de Samora ainda não foram devidamente esclarecidas aventando-se a hipótese de conspiração interna até porque os demónios de aburguesamento tomaram conta desta elite política logo após a sua morte aproveitando-se de instrumentos políticos e económicos aprovados pela Assembleia Popular de Moçambique-refiro-me aos Programas de Reabilitação Económica (PRE) e de Reabilitação Económica e Social (PRES). Estes dois programas no contexto da conjuntura política e económica vigente contribuiram para a emergência duma certa elite política e económica que sob a capa da liberalização do mercado tomaram conta das principais empresas estatais e demais bens  patrimoniais estatais para a satisfação do seu ego individual e transformando-se em verdadeiros delapidadores dos recursos da Pátria e da coisa pública. Para piorar o Governo ainda atribuiu fundos do tesouro público que muitos deles nunca e jamais poderão reembolsar. É caso para dizer que o País virou a capoeira onde pode-se buscar os ovos para qualquer festa ocasional. Lembro-me com mágoa e nostalgia que muitos moçambicanos  foram  executados,  presos e desterrados nos campos de concentração- que na altura eram denominados centros de reeducação (fenómeno que a historiografia moçambicana deverá ainda clarificar) acusados de candonga. Hoje os mesmos que desumanizaram estes cidadãos viraram os verdadeiros candongueiros do Pátria amada e gloriosa. Para elucidar o meu argumento é só observar os nomes dos donos das várias empresas que exploram os recursos naturais, alguns serviços públicos, as infra-estruturas públicas, etc.  Realmente falta-lhes alguma vergonha. Hoje a mesma elite política reclama por ter uma juventude que faz crítica a ausência de políticas públicas consistentes nas áreas sociais como no acesso ao emprego, transportes, educação e saúde de qualidade. O que  poderia se  esperar dessa juventude que não tem como buscar nenhuma referência ético-moral dessa elite política? O fenómeno do apossamento dos recursos e bens públicos também esta  presente nas políticas de redução da pobreza urbana e rural. Quem realmente têm acesso aos vulgo sete milhões de meticais? É o cidadão que vive abaixo da linha da pobreza ou seja com 1,25 dólares por dia? A resposta para questão é clara. Os vulgo sete milhões  são atribuídos aos cidadãos que vivem acima da linha da pobreza – refiro - me aos funcionários públicos, alguns agricultores, comerciantes e indivíduos com cartão do Partido Frelimo. Estes fundos estão  a servir para revitalizar as células partidárias adormecidas. É um fundo de exclusão e não inclusão. Esta é a razão pela qual os cidadãos não devolvem o dinheiro emprestado e nenhuma justiça é feita. Uma verdadeira candonguização dos recursos públicos. Existem trabalhos de licenciatura, dissertações de mestrado de alguns estudantes que confirmam esta vergonhosa situação  de drenagem de dinheiro público para satisfação do ego político. Os trabalhos a que me refiro chegaram a conclusão de que critérios de atribuição destes fundos deixam a desejar porque para além de não serem inclusivos, não respeitam as liberdades de escolha dos indivíduos quanto as reais necessidades da comunidade local e como tal não estão a contribuir para a redução da pobreza absoluta. E depois ficamos espantados quando nos relatórios de desenvolvimento humano publicados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) aparecemos no grupo de países com baixo índice de desenvolvimento (é só observar o Índice de Desenvolvimento Humano de 2010). Estamos cansados de ouvir falar do crescimento económico sem referência ao desenvolvimento social, sabido que a renda (como valor monetário) resultante desse crescimento apesar de  ser contabilizado no nosso Produto Interno Bruto não entra para os cofres do Estado porque são drenados para o estrangeiro pelas multinacionais e o pouco que entra é mal distribuído através de políticas exclusivas e irracionais. Aliás, este é um fenómeno que se repete ano após ano minando os esforços de desenvolvimento humano. Um dos grandes desafios do Ministério das Finanças é identificar os acumuladores da renda e desequilibradores da economia em Moçambique e obrigá-los a pagarem os impostos  na medida certa visto que muitos deles não pagam. Por fim gostaria de desafiar esta elite política e económica a virem ao público desmentirem o que eu disse e justificarem honestamente os mecanismos usados na  acumulação da renda de que dispõe. Por uma questão de sensatez seria bom que devolvessem os apartamentos em sua posse ao Fundo de Fomento e Habitação para merecerem o devido destino - aos grupos de renda baixa e média. Talvez esta seria uma possibilidade de se retratarem diante desse Povo atento e em estado latente (não se esqueçam das famosas manifestações populares que eclodiram na cidade de Maputo). Certamente que não farão porque estão possuídos de vários demónios  e não conseguem livrar-se dos mesmos. É caso para dizer que é urgente o exorcismo político da elite política e económica de Moçambique.

30 julho 2012

PARTIDO FRELIMO TEM PESO A MAIS NA SOCIEDADE


PARTIDO FRELIMO TEM PESO A MAIS NA SOCIEDADE



– diz historiador Suíço, Professor Dr. Eric Morier-Genoud, que lançou semana finda livro sobre nacionalismo em Moçambique, Angola e Guiné-Bissau.

“Toda a gente sabe que o partido no poder tem um papel muito preponderante e com peso na sociedade, talvez, maior do que devia ser. Quem não dá apoio (ao partido) e quem não concorda ou discorda abertamente pode ter dificuldades. Há também uma distribuição bastante ilegal das riquezas. Portanto, penso que há mais que a gente possa fazer.” – Professor Dr. Eric Morier-Genoud



Maputo (Canalmoz/Canal de Moçambique) – O Professor Eric Morier-Genoud, estudioso suíço lançou há dias um livro em Maputo, intitulado “Sure Road? Nationalisms in Angola, Guine Bisau & Mozambique”. Concedeu uma entrevista ao Canal de Moçambique para falar da obra que ele editou. Na entrevista, o Professor Dr. Eric Morier-Genoud desmonta algumas teorias históricas oficiais do Estado moçambicano. Por exemplo, quando fala sobre a guerra dos 16 anos, nega que esta tenha sido toda ela de desestabilização, como o Governo da Frelimo oficialmente considera. Eric entende que o que iniciou como guerra de desestabilização, encontrou terreno fértil internamente para virar guerra civil. Diz também que deve se estudar mais figuras consideradas “reaccionárias” pelo regime, como Padre Gwengere, Uria Simango. Analisando a situação actual do País, considera que o partido Frelimo tem peso a mais na sociedade e que quem não apoia o partido no poder pode ter dificuldades para progredir em Moçambique. Eis a entrevista na íntegra que voltamos a reproduzi aqui no Canalmoz:



Canal de Moçambique (Canal) – Dr. Morier-Genoud veio a Moçambique para proceder ao lançamento do livro, «Sure Road? Nationalisms in Angola, Guine Bisau & Mozambique». Trata-se de uma obra que inclui trabalhos de vários académicos como o Dr. Michel Chahen, Georgi Derlugian, Fernando Tavares Pimenta, para apenas citar alguns. O senhor como editor desta obra, pode dar-nos uma indicação sobre as linhas mestras que orientaram a publicação do livro?

Professor Eric Morier-Genoud (Dr. Morier-Genoud): O livro é o fruto de uma conferência que organizei em Oxford em 2008 com o Professor Gavin Williams, da Universidade de Oxford também. Achámos que era boa altura para fazer um livro sobre o tema porque a maior parte dos livros sobre o nacionalismo continua a ser aquelas obras dos anos 60 e 70 sobretudo. Mais, nos últimos 10 a 20 anos abriram muitos novos arquivos. Os arquivos da PIDE, muito interessantes, os arquivos da FRELIMO, do MPLA, do Departamento do Estado dos Estados Unidos da América, de Igrejas que tiveram ligações com nacionalistas, etc. Portanto há muito material novo que pode trazer uma nova luz sobre a questão do nacionalismo.

Em termos teóricos, a maneira como a gente aborda o assunto do nacionalismo mudou também muito. Há 20 anos a perspectiva dominante era de que o nacionalismo tinha a ver com coisas muito concretas, uma perspectiva que a gente chama de “primordialismo”: a nação definir-se-ia pela língua, pela genealogia, e pelo território. Na década de 80 houve um grande debate e avançou-se com a ideia de que a nação é uma coisa muito mais complicada, uma coisa imaginária, talvez até inventada. Na década de 90, a maioria dos académicos acabou por concordar que a nação é uma coisa da imaginação das pessoas. Por exemplo, você que é moçambicano e vive aqui em Maputo, não conhece todos os senhores que estão na mata de Cabo Delgado, mas você, como ele, se for da mesma nação, sentem que tem algo em comum, e que pertencem por isso à mesma nação. Portanto a nação não é uma coisa concreta, física, mas uma identidade que é imaginada.

Os académicos também mudaram o foco da análise, deixando de trabalhar unicamente sobre as elites – como é que as elites se tornaram nacionalistas e mobilizaram o povo para libertar o país. Hoje em dia estamos mais interessados em ver como o povo virou nacionalista e talvez até levou as elites para o nacionalismo. Também estamos mais interessados noutros grupos como as mulheres ou a juventude que tiveram um papel preponderante no nacionalismo, uma coisa que é ainda pouco tratada na literatura sobre o nacionalismo nos países lusófonos. Em suma, teoricamente é a maneira de tratar o nacionalismo que mudou, e temos hoje muito novo material, dois elementos que achamos criavam uma necessidade de rever o tema do nacionalismo em Angola, Guiné-Bissau e Moçambique.



Canal: Então, resumidamente o que podemos encontrar de novo neste livro?

Dr. Morier-Genoud: O livro não é uma história de nacionalismo nos países lusófonos. A ideia é mais dar novas pistas sobre como a gente pode abordar de maneira nova o tema do nacionalismo. Não é uma nova história da FRELIMO, da luta de libertação, não é uma nova história de Angola, etc. O que há na obra são novas maneiras de encarar o assunto. Há um artigo, por exemplo, que trata de como a Frelimo entendia a moçambicanidade, como a Frelimo inventou uma cultura moçambicana, durante a luta de libertação. Há outro artigo que trata do nacionalismo entre os brancos em Angola. Muitas pessoas pensam talvez que todos os brancos eram colonos, mas havia brancos no sul da Angola (neste caso), que pensavam como angolanos antes da independência. Até criaram um partido nacionalista angolano para libertar a nação angolana! Esta é uma faceta pouco conhecida do nacionalismo em Angola, e o estudo desta faceta muda a maneira como a gente vê o assunto do nacionalismo em Angola.

Portanto, o livro abre novas pistas e mostra como é que analistas e gente interessadas podem entender o nacionalismo duma maneira mais complexa, subtil, e penso interessante.



Canal: Fala-nos sobre si, o que lhe liga a Moçambique e o que despertou em si o interesse de estudar a história de Moçambique?

Dr. Morier-Genoud: É uma questão complicada. Não tenho uma resposta muito precisa. Mas, digamos que em 1989 viajei pela África Austral e passei por Moçambique nessa altura. Achei um país fascinante, com a guerra, com o V Congresso da Frelimo, etc. Isso despertou em mim a curiosidade, e levou-me a querer estudar sobre Moçambique. Depois quem estuda descobre novas perguntas que levam a mais estudos, e assim por diante. Fiz pesquisa em arquivos missionários na Europa, fiz investigação no terreno em Moçambique, e também vivi e trabalhei cá na década de 90.



Canal: Numa primeira fase da história da independência de Moçambique, a religião revelou ser uma questão controversa. Acha que a política do governo da Frelimo foi contra os interesses das igrejas no seu todo, ou apenas um ajuste de contas com a Igreja Católica?

Dr. Morier-Genoud: No meu entender, quando chega a independência, a Frelimo era sobretudo secular. Quis separar o Estado das instituições religiosas, acabar com o sistema que reinante durante o colonialismo em que a Igreja Católica teve um papel predominante. A Igreja Católica (e de forma muito menor algumas igrejas protestantes) cuidava de toda a educação e toda a saúde dos africanos. Portanto, com a independência a Frelimo abriu uma nova fase, em que separou a Igreja do Estado e nacionalizou aqueles serviços sociais que estavam nas mãos das igrejas. Isto abrangeu todos: a Missão Suíça, a Igreja Adventista, todos foram abrangidos, mas a Igreja Católica foi mais atingida, uma vez que tinha aquela posição dominante no período anterior. Não penso que isto foi um ajuste de contas. Houve alguma hostilidade, sim, mas foi antes de tudo uma mudança de regime, da qual quem sofreu mais (mas não unicamente) foi a Igreja Católica.



Canal: Mas a hostilidade foi mais visível contra a Igreja Católica. Aí a pergunta se tratava de algum ajuste de contas por esta ter sido rotulada como a Igreja do Colono…

Dr. Morier-Genoud: Numa primeira fase, da qual eu estava a falar, houve a nacionalização de todos os empreendimentos das igrejas e alguma hostilidade contra todas as igrejas. Mas não havia ajuste de conta. Agora a partir de 1978, quando a Frelimo já era partido-Estado, houve aí, sim, uma luta que tem a ver sobretudo com a Igreja Católica. Isso esteve relacionado com duas dinâmicas: primeiro, o III Congresso da Frelimo que trouxe a oficialização do socialismo na Frelimo e, segundo, no mesmo ano, a Assembleia Pastoral nacional da Igreja Católica que decidiu adoptar o modelo de uma igreja das comunidades. Os bispos que eram progressistas queriam ter uma igreja do povo, uma igreja progressista, mas alguns bispos conservadores queriam aproveitar esta estrutura para resistir ao “assalto” do comunismo. Ora, quaisquer que tivessem sido as nuances na igreja, a Frelimo entendeu que com esta Assembleia Pastoral a igreja estava a entrar em modo de resistência, se não de oposição. E por isso começou a atacar a religião, sobretudo a católica, em 1978. Houve aí uma luta forte entre a Igreja e o Estado. A luta tinha a ver com a igreja católica antes de tudo, mas abrangeu todas as religiões. Muitas igrejas e mesquitas foram fechadas e a Frelimo começou a ensinar o ateísmo, não só na rádio, mas também no campo, para os camponeses. No entanto, isso não durou muito tempo por que havia a guerra da Rodésia, a situação económica era complicada, muitos países vizinhos e europeus queixaram-se deste ataque à religião, e uns religiosos e crentes começaram a entrar em resistência aberta. A partir de 1980, Samora Machel e o regime começaram a deixar de hostilizar as religiões e começaram a trabalhar para restabelecer relações razoáveis com as instituições religiosas.



Canal: Depois desta fase difícil, a Igreja Católica teve um papel preponderante no estabelecimento da paz no país. O seu papel missionário continua na promoção da educação em zonas remotas de Moçambique, acha que foi uma decisão acertada o Estado ter tentado hostilizar a igreja?

Dr. Morier-Genoud: Acho eu que o ataque que houve à religião por parte da Frelimo foi desnecessário e custou muito – o que a Frelimo rapidamente viu sozinha. Isto é uma coisa. Agora outra coisa é a separação entre o Estado e a Igreja. Antes da independência, o Estado colonial só queria a igreja católica e ele hostilizava as outras religiões. A Frelimo pôs fim a esta situação em 1975, e isso penso que toda a gente concorda que foi um desenvolvimento positivo. O modelo que temos hoje (de pluralidade religiosa) é porque houve esta ruptura com o modelo duma a Igreja Católica quase oficial. Penso que esta ruptura foi necessária para termos o modelo de hoje. Agora, se podia ter chegado ao mesmo ponto de uma forma mais suave, mais diplomática, isso não sei. Mas penso que a ruptura era inevitável e necessária.



Canal: Dr. Morier-Genoud, figuras de destaque da religião moçambicana pagaram com a vida por defender o seu sacerdócio, as suas ideias de justiça, de direitos humanos, do respeito pela harmonia social e convivência familiar. Recordamos o Padre Estêvão Mirasse, que desapareceu num campo de reeducação no Niassa. Recordamos uma figura da nossa história, como o Padre Mateus Gwengere. Que contributo poderão dar os intelectuais ligados a Moçambique, como o Dr. Morier-Genoud, para a reabilitação da imagem dessas figuras?

Dr. Morier-Genoud: Aqui há duas coisas. Há, do lado político, a questão de saber se é necessário reabilitar o Padre Gwengere e o Estêvão Mirasse. Isso penso que os moçambicanos devem decidir por si próprios. Eu sou estrangeiro e portanto não a pessoa própria para dizer o que vocês devem pensar e fazer. Por outro lado, como historiador, acho que temos, sim, que estudar estas figuras que foram chamadas de “reaccionários”, entre outras coisas. Estudar o pensamento deles – que não foi só sobre justiça social e harmonia... – e restabelecer a diversidade de pensamentos que existiam no nacionalismo, e fora dele, durante e depois da independência. Estudar para melhor compreender e para mostrar as diversas linhas de pensamento que existiam na época – os diversos marxismos, o pan-africanismo, o liberalismo, a social-democracia, os conformistas, etc. Também as diferentes maneiras de imaginar a nação moçambicana – com quais valores internos, com quais relações de género, de gerações, de “raça”, com quais alianças internacionais, e com que herança portuguesa (se alguma).



Canal: O Professor acha que é cedo demais para falar destas figuras?

Dr. Morier-Genoud: Não sei. Honestamente ainda não sei muito bem. Estêvão Mirasse conheço pouco. O padre Gwengere conheço relativamente bem. Sei que há moçambicanos que estão a trabalhar numa biografia dele e penso que é uma boa coisa se for feita a sério. Para mim, Gwengere é um caso muito interessante para entender a história recente de Moçambique. É uma pessoa que pensava de maneira diferente e ele desencadeou, e talvez ainda desencadeia, paixões muito fortes (pró e contra). Ele cristalizou vários problemas dentro e fora da Frelimo, em relação ao assunto da religião, da “raça”, da nação, da estratégia militar, problemas que ele pensava de maneira diferente de certos líderes da Frelimo. Ele nunca trabalhou para a PIDE, mas veio a ser acusado disto e veio a ser apresentado depois da independência como um dos principais traidores da nação. Porquê? Como? Estudar Gwengere pode ser uma maneira interessante de estudar a diversidade de pensamento dentro do nacionalismo, assim como a dinâmica das ideias dentro de Frelimo, e dentro doutros grupos de nacionalistas. Mesmo os erros do Gwengere, durante a transição de 1974-75, são interessantes para o historiador. Porque voltou à Beira? Porque não tentou restabelecer pontes com a Frelimo? Porque não desistiu da política e ficou padre de vez? Como a Frelimo conseguiu marginalizá-lo na própria Beira?



Canal: Mas o Professor pensa que seria interessante estudar este outro lado da história dessas pessoas que pensavam diferente, e que saíram perdedoras?

Dr. Morier-Genoud: É de facto interessante. Olha que tivemos o caso da reabilitação, entre aspas, que o Barnabé Nkomo fez do Uria Simango. E que teve muita aceitação e trouxe um debate muito interessante sobre o nacionalismo. E penso que foi uma obra que quebrou de maneira importante o monolitismo da história de Moçambique. Foi um debate muito interessante. Mas não é meu papel fazer isso.



Canal: Porquê não escreve sobre essas figuras?

Dr. Morier-Genoud: A questão para mim não é tentar reabilitar essas figuras, ou não, e fazer uma história que chamaria de contrária. Isto é, contrária no sentido de que quando antes dizia-se que Simango era traidor, agora é grande nacionalista, quando antes dizia-se que a Frelimo era boa, agora vamos dizer que a Frelimo era má (ou menos boa). Barnabé Nkomo foi acusado por alguns académicos de fazer uma tal história contrária. Como eu disse, o livro trouxe um debate muito interessante, mas como historiador tem problemas e eu tento fazer outra coisa.

O meu livro e a minha tentativa como historiador é de incentivar outros historiadores, não estou a dizer políticos, mas historiadores a adoptar outra perspectiva. Estudar como é que o povo aderiu ao nacionalismo, como é que as mulheres ajudaram e moldaram o nacionalismo, como é que uma cultura nacional emergiu e foi forjada por actores em Moçambique, quais foram as correntes dos nacionalismos (nacionalismos com ʺsʺ) em Moçambique e outros países. Isto é, nem uma história contrária, nem uma história do nacionalismo feita só através da história dos líderes.



Canal: Voltemos ao livro que o Dr. lançou. Num dos capítulos de autoria de Georgi Derlugian, é feita uma reinterpretação das divisões ocorridas no seio da Frelimo em 1968. Notamos que Derlugian faz uma reinterpretação que vai muito ao encontro da posição defendida pelos que saíram vitoriosos no contexto das lutas internas na Frelimo. Será correcto concluir que não houve uma preocupação do editor da obra em apresentar os pontos de vistas, as teses, da outra parte?

Dr. Morier-Genoud: Como eu disse, não estou interessado em fazer uma história de um lado ou doutro lado. Estou a tentar fazer um outro tipo de história. Falei dos brancos em Angola, mas deixe-me dar um outro exemplo que pode interessar. Há um partido que a gente não fala na história do nacionalismo em Moçambique e cuja consideração pode levar a encarar o nacionalismo duma outra forma. Por exemplo, o Mozambique African National Congress (MANC) foi criado no início de 1963 na Rodésia. A UDENAMO já havia saído da Rodésia para a Tanzânia e o núcleo de Moçambicanos que havia ficado no país criou este novo partido com base em imigrantes do centro do país (sobretudo senas, chuabos, e achikundas), com Peter Balamanja como presidente. O Partido teve muita aceitação e teve bons contactos internacionais, sobretudo na Zâmbia e no Malawi. Até que o Blamanja foi convidado para em 1963 ir a Londres. Aí a PIDE ficou assustadíssima e fez tudo para que os líderes fossem presos e o partido banido na Rodésia, o que conseguiram. O partido ficou abalado, mas continuou na Zâmbia. O partido nunca teve a oportunidade de entrar na Frelimo por que foi criado depois das negociações em Dar-es-Salam. O partido, portanto ficou confinada na Zâmbia e em 1965 coligou-se com os outros movimentos moçambicanos para criar o COREMO (ao qual a Frelimo recuso aderir). O que significa? Que houve partidos nacionalistas moçambicanos que não se uniram à Frelimo e que não foram dissidentes da Frelimo. Portanto, o COREMO também não foi só um partido dos dissidentes da Frelimo. Mais, nota que o MANC desenvolvia outro tipo de ideologia comparado à Frelimo e outros partidos dissidentes, sendo abertamente pan-africanista. Aí está, portanto, uma parte da história que tem a ver com o País mas que as pessoas pouco conhecem ou não consideram. Para mim, é interessante e importante tentar estudar todas as correntes do nacionalismo, e estudar as correntes que a gente esqueceu, e que muitas vezes fracassaram. Mostra que a dinâmica do nacionalismo era muito mais larga do que os “bons” e os “maus” dentro da FRELIMO, os dissidentes e não dissidentes. Há partidos que foram criados mas que nunca foram dissidentes. Em suma, da mesma maneira que a história dos brancos nacionalistas na Angola abre novas perspectivas, a história do MANC mostra a multiplicidade do pensamentos nacionalistas, os diferentes caminhos que existiram na história do nacionalismo moçambicano, caminhos alguns que tiveram sucesso, outro que fracassaram, mas que fazem todos parte da história, uma história mais complicada, complexa e menos linear.



Canal: O livro faz também referência à guerra civil no nosso país. Para além de Georgi Derlugian, também há o contributo de Michel Cahen. Nota-se no livro editado por si que continua a haver uma certa preocupação por parte dos intelectuais do Ocidente em rotular o movimento Renamo de acordo com os que a apoiavam, e não segundo os ideais que defendia e pelos quais lutava, que era o estabelecimento de uma ordem democrática no nosso país. Não havia condições internas para a luta da Renamo, esta surgiu devido à agitação externa, somente?

Dr. Morier-Genoud: É um assunto de debate muito grande. E há muita discordância. No início da década de 90 houve muitas revistas e livros publicados aqui e lá fora que contribuíram para esse debate. Como resultado, houve uma mudança de como a gente encara a história da Renamo. O pensamento dominante hoje já não é de dizer que a Renamo é só uma criação da Rodésia. O que a maioria dos académicos concorda agora é dizer que foi criada pela Rodésia, que a África do Sul levou a Renamo para a África do Sul com a Rádio África Livre após 1980, mas que depois dos (acordos de) Inkomati a Renamo começou a levar uma dinâmica mais própria e a guerra desenvolveu uma dinâmica mais interna. Acho que a maioria das pessoas concorda hoje em dia que foi uma guerra de desestabilização no início, mas que virou guerra civil a partir de uma certa data, data que a gente ainda vai debater, mas eu diria que foi por altura do Acordo de Inkomati (1984). Este é o pensamento dominante entre os historiadores.

Agora os ideais da Renamo? Bem, vale a pena sublinhar aqui que fazer a história da Renamo é complicado, porque não há arquivos da Renamo conhecidos ou, se existem, não estão abertos. A Renamo também não tem história própria, oficial ou não. O que dificulta o trabalho sobre a história da Renamo, e a história das ideias ou da propaganda deste movimento. Os historiadores têm que trabalhar nos arquivos do Estado sul-africano ou nos arquivos do Estado moçambicano, e estes arquivos têm documentação que tem uma perspectiva muita colorida. A única forma, portanto, de fazer uma história com “documentos” da Renamo é fazer muitas entrevistas, o que leva tempo. Era bom que a Renamo abrisse os arquivos dela se existirem e que ajudasse mais os historiadores a fazer a história dela e portanto a história recente do país.



Canal: Porque é que não há, por parte de certos intelectuais do Ocidente, a mesma tendência de se rotular uma Frelimo segundo os apoiantes que teve desde a sua fundação, e que são muitos e variados: americanos, chineses, soviéticos, cubanos... etc.? A Frelimo também não foi criada em Moçambique…

Dr. Morier-Genoud: Em parte tem razão. A Frelimo talvez não tivesse conseguido ganhar a luta de libertação se não fosse a Tanzânia. Houve a Zâmbia, mas estava muito apertada para não dar apoio. Portanto, não há dúvida que se não fosse a Tanzânia a Frelimo não teria conseguido. Mas aí o assunto é mais complicado, quando estamos a falar da criação. A FRELIMO não foi criada pela Tanzânia. Havia movimentos nacionalistas que foram para a Tanzânia, a UDENAMO, MANU, UNAMI e estes juntaram-se, sob orientação da Tanzânia. Já não se pode dizer a mesma coisa em relação a Renamo. Não havia lá partidos ou movimentos preexistentes. Havia no melhor um punhado de indivíduos que estava a querer montar um movimento de oposição ou de guerrilha. Portanto, a Renamo foi mesmo criada pela Rodésia. E aí é onde acho que há uma diferença qualitativa. Sei que há gente que vai discordar comigo, mas penso que é uma diferença qualitativa. Agora, há o facto, e há a interpretação do facto. Isso é: eu não sei se o facto de a Renamo ter sido criada pelos rodesianos lhe tira toda e qualquer legitimidade para sempre. Há quem acha que sim, outros que acham que não. Este julgamento já e muito político. Portanto, há o facto, e há a interpretação do facto.



Canal: Para quando uma perspectiva mais abrangente da parte de quem estuda e escreve sobre Moçambique? Dr. Morier-Genoud pensa em escrever uma história mais inclusiva que fale de todos?

Dr. Morier-Genoud: A história é sempre escrita e reescrita. Não há ponto de chegada. Porque os historiadores mudam, as teorias mudam, a forma como vemos o passado muda, e as fontes mudam. A gente revê a história constantemente. Até a história da Frelimo não é a mesma que a gente e a própria Frelimo escrevia há 20 anos atrás. Agora escrever uma história mais abrangente: penso que várias boas histórias de Moçambique já foram feitas O que eu estou a tentar fazer com este livro que editei é sair dessa dinâmica binar e linear sobre o nacionalismo, de dizer que este tinha razão, aquele não tinha razão, este era legítimo, este não, este foi bom, e este foi mau, tudo julgado à luz do momento do discurso, lendo o passado à luz de hoje. Eu quis promover outro tipo de história, que não esteja tão preocupada com a política no sentido restrito do termo, e que estudasse o processo histórico da formação da nação, a emergência duma cultura nacional, que restabelece o pluralismo dos pensamentos, que situa a luta da Frelimo e dos outros nacionalistas no contexto global da época, nos debates de ideias de então, etc.

Penso que da mesma maneira temos que começar a fazer a história da última guerra, e da Renamo, de maneira menos apaixonada, nós como historiadores. Fazer uma história militar e política certa, mas também uma história da ecologia, do campesinato, das mulheres, das ideias, das crenças tradicionais, uma história local, talvez até biográfica, que enriquece o nosso entendimento.



Canal: Mais algum dado para acrescentar?

Dr. Morier-Genoud: Espontaneamente aqui não pensei em nada particular. (pausa). Talvez a ideia de que o nacionalismo é uma coisa muito viva em Moçambique, hoje. Não só em Moçambique mas em Angola, e na África Austral em geral. Este livro intervém neste contexto e uma das ideias nossas foi de tentar abrir um pouco o debate, para mostrar a diversidade, as múltiplas possibilidades, que existiram no passado e que existem hoje para o futuro, para incluir as mulheres no debate, o papel das mulher no nacionalismo, na nação, assim como o papel da juventude, etc. Para não só celebrar a luta de libertação de maneira teleológica ou como sendo unicamente lugar de origens do presente, mas como lugar complexo e múltiplo, na base de um olhar para frente, base de uma reflexão sobre o futuro. Sobretudo que temos o petróleo que está a chegar, o gás, as minas, temos um futuro que é promissor, mas que vai trazer muitos desafios. E a questão é: qual é a nação que a gente quer para este futuro, com quais valores, com que tipo de relações entre regiões ou entre gerações? Com que modelo de distribuição das riquezas? Uma nação inclusiva, unida, multicultural, pluricultural, outra?



Canal: Acha que estamos a construir uma nação inclusiva em Moçambique do ponto de vista político, económico e regional se olhar para o rumo que o país está a levar…?

Dr. Morier-Genoud: Penso que em relação a uns anos atrás, a situação é melhor. Pelo que eu vejo, a situação é mais inclusiva. Vejo que muitos moçambicanos na diáspora voltaram, os moçambicanos da Renamo voltaram. Estamos numa situação muito melhor do que há 25 anos atrás. Ao mesmo tempo toda a gente sabe que o partido no poder tem um papel muito preponderante e com peso na sociedade, talvez, maior do que devia ser. Quem não dá apoio (ao partido) e quem não concorda ou discorda abertamente pode ter dificuldades. Há também uma distribuição bastante ilegal das riquezas. Portanto, penso que há mais que a gente possa fazer.



Canal: O que é preciso fazer para inverter esta situação que acabou de descrever?

Dr. Morier-Genoud: Isso é uma coisa que os moçambicanos devem decidir e resolver. Eu sou convidado no debate, tenho que respeitar as regras da hospitalidade…



Canal: Mas a sua opinião como académico. O que aconselha os moçambicanos a fazer?

Dr. Morier-Genoud: (Risos…) nada, não vou entrar nesse debate. Mas talvez uma outra coisa que queria dizer, que muito me interessa e que acho interessante em Moçambique em relação à luta anticolonial, mas raramente em relação ao período anterior. Ora, para mim era interessante reflectir nisso. O período pré-colonial. Estive na Nigéria e lá há um orgulho da história pré-colonial, que aqui não se vê tanto. Até há museus sobre o período pré-colonial!







Canal: O que iríamos encontrar nesse período de interessante?

Dr. Morier-Genoud: Penso que é um período muito complicado. Há coisas positivas, mas também muitas divisões e conflitos. Portanto íamos encontrar de tudo e não está claro o que íamos ganhar e perder no processo. Depende da análise e dos debates que se seguiriam. Hoje em dia há celebrações do Makombe e do Gwaza Muthini, entre outros. Mas há muito mais do que estes “heróis” encarados unicamente como proto-nacionalistas. Há períodos anteriores, e há outras figuras para considerar e debater. Portanto há riqueza a esse nível.



Canal: Quais as hipóteses que, como estudioso, o Professor levanta para justificar este esquecimento do período pré-colonial?

Dr. Morier-Genoud: É um período de muitos conflitos com o Mfecane, o Ngungunhane, e muitas outras guerras no sul, no centro e no norte do país. Portanto, neste período não vamos encontrar uma unidade já feita e desejada. Penso que é uma das principais razões pela qual a gente não vai a este período de “divisionismo”. Mas ao mesmo tempo eu vejo o assunto de maneira diferente, talvez com razão, talvez não. A minha impressão é que ao debater este passado pré-colonial, os moçambicanos iam poder imaginar uma nação diferente, mais profunda, mais larga, e talvez mais dinâmica. (Borges Nhamirre / Canalmoz / Canal de Moçambique- 30/07/2012)

29 julho 2012

MEIN KAMPF FILM - MINHA LUTA - UMA VISÃO DA ERA DO CAOS


MEIN KAMPF FILM - MINHA LUTA - UMA VISÃO DA ERA DO CAOS

Um documentário brilhante e imperdível. Cada segundo deste documentário é  uma autêntica filmagem alemã descoberta dos arquivos secretos da guarda de elite nazista e escondida pelo próprio Goebbels por serem muito fortes. "Minha Luta" criou impacto internacional e foi aclamado como um dos mais incríveis documentos históricos.


20 julho 2012

ARGÉLIA: DA INDEPENDÊNCIA AOS NOVOS DESAFIOS ECONÓMICOS, CULTURAIS E POLÍTICOS

ARGÉLIA: DA INDEPENDÊNCIA  AOS NOVOS DESAFIOS ECONÓMICOS, CULTURAIS E POLÍTICOS
 Os conflitos na Argélia: a guerra de independência e os choques internos entre facções com diferentes políticas, religiões e ideologias é o assunto apresentado neste filme documentário.

18 julho 2012

MOZAMBIQUE AND THE DEATH OF MACHEL

MOZAMBIQUE AND THE DEATH OF MACHEL
By Barry Munslow
Death of a president President Samora Machel  had been attending a summit meeting in northern Zambia with the heads of state of Angola, Zaire and Zambia itself. The summit was occurring amidst growing tension within southern Africa, and South Africa's war of destabilisation against Mozambique was seriously escalating. President Machel wanted to return to Maputo immediately after the summit on Sunday, 19 October 1986, because he had an important meeting on the following day. This meeting was to bring together all the senior officers in the armed forces and top party officials to discuss the much needed reorganisation of the country's military apparatus. This was deemed to be essential in order to combat the South African- backed  forces of RENAMO (the Mozambique National Resistance Movement) which were wreaking such havoc within Mozambique. What Machel had in mind for that meeting will never be known, as the Tupolev 134-A jet in which he was flying crashed at Mbuzini, in a remote corner of South Africa near the Mozambique and Swaziland border, killing the president. Immediately, controversy surrounded the circumstances of the crash. The official communique  released  by the Mozambican government declared that the plane had 'crashed, under circumstances not yet clarified'.' The South African Government meanwhile immediately blamed the Soviet crew for pilot error. Soon, as details of the crash began to leak out, there were strong suspicions that the presidential plane was lured off course by a decoy beacon, deliberately set up to divert the plane from landing at Maputo airport. A South African board of inquiry was set up to investigate the crash against the wishes and without the cooperation of the Mozambican Government. It released its final report on 9 July 1987, blaming the dead Soviet crew for pilot error and negligence. The international commission of inquiry, composed of representatives from South Africa, Mozambique and the Soviet Union, had presented a factual report on the crash earlier in January 1987, indicating that the plane had made a Right turn off its established route because of a radio signal received from a navigational beam. Mozambique's own national commission of inquiry rejected the South African Government's finding sand indicated that it would like the tripartite commission to investigate the mysterious radio beacon in further detail. In a radio broadcast made on 16 June 1987, Machel's successor, Joaquim Chissano, described his death as 'murder' for the first time and there were strong implications that the South African Government was involved. Once again the issue of succession to the leadership of FRELIMO (the Front for the Liberation of Mozambique) was to occur in a context of tragedy and possible assassination. On 3 February 1969, FRELIMO'S first president, Eduardo Chivambo Mondlane, was killed when he opened a parcel bomb in his Dar Es Salaam home. The deed was the work of the Portuguese secret service PIDE (International Police for the Defence of the State) in collaboration with people inside the movement. The assassination occurred at a most difficult time in FRELIMO's history. The movement formed in 1962 had taken up arms against Portuguese colonial rule in September 1964. The early years were marked by rivalries and defections within the movement's Central Committee but Mondlane was able to steer the movement to growing success. By 1968, when FRELIMO held its second congress, liberated areas existed in two of the country's nine provinces and the guerrilla struggle was opening in a third province. But ideological conflicts were coming to the fore as the issue of the nature of post-independence Mozambican society began to be raised in microcosm in debates concerning the organisation of the liberated areas and of the movement itself. Following the death of Mondlane, the Vice-President, Uria T. Simango, who represented the right wing within the movement, was keen to assume the mantle of the presidency. He quickly arranged a meeting of the executive committee and was able to harness sufficient support to be declared interim president. But there was major opposition to this move, led by the radicals, principally within the army. At the time of the assassination Machel and other leading radicals were inside the liberated areas and hence unable to deal directly with Simango's  manoeuvres. At a meeting of the Central Committee held in April 1969 Simango was prevented from replacing Mondlane, and instead a presidential council was formed, representing a triumviratele a dership of Simango, Machel (head of the army) and Marcelino dos Santos (the leading revolutionary intellectual within the movement). The radicals argued the case that succession was not automatic and this finally won 24 the day. Simango, who was opposed to the increasing radicalisation of the movement, was isolated and the left effectively took power.  In May 1970 at the following meeting of the Central Committee, Machel was declared President and Simango was expelled from the movement. The top leadership of the party from that time onwards has continued in power, showing remarkable stability and cohesion. An orderly succession The historical precedent did not appear to bode well for an orderly presidential succession, yet such it was to be. There were a number of possible candidates whose names were mentioned in the international press. Marcelino dos Santos was the vice-president of the party until the post was abolished at the third congress of FRELIMO held in 1977, but he did not harbour leadership ambitions. As a mix to (a person of mixed race) with a white wife there would be obvious political sensitivities of race to consider if such an issue arose, not with standing FRELIMO'S overt policy of anti-racism. (The Political Bureau has people of all the races represented in Mozambique.) While he remained listed second to Machel in the hierarchy of the Political Bureau the consensus of opinion was that he would not be the successor. The thinking behind the abolition of the vice-presidency was deliberately to prevent a clear hierarchy of succession being presented to the outside world. It was obvious to the astute observer of the FRELIMO leadership that Joaquim Chissano, listed third in the hierarchy, was the natural choice. His pedigree made him well suited to the task. As a youth he had been an active member of the student movement NESAM (Nucleus of Mozambican Secondary Students). He went on to study in Europe but soon joined the nationalist movement where he became the secretary to President Mondlane. Chissano also worked alongside Machel in FRELIMO's training camp at Kongwa in Tanzania and built up a close relationship with him there. He took charge of security and was later made chief representative in Tanzania. Following the signing of the Lusaka Accords between Portugal and Mozambique in September 1974, a transitional government was formed comprising six FRELIMO ministers and three appointed by the Portuguese, with Joaquim Chissano as Prime Minister. He was very popular in this role during the nine months of the transitional government and his appointment as successor to Machel was widely welcomed. Two other names mentioned as possible successors were Mario Machungo, the newly appointed Prime Minister in the post created following a major reorganisation of the structure of government earlier in the year, and Armando Guebuza, who has held a number of important positions in a rather varied career. Machungo, however, did not have the kudos of being involved directly in the armed liberation struggle. He was a highly qualified economist who before independence had worked in a bank in the capital city, being a clandestine member of FRELIMO. He only joined the political leadership at independence. He has held a series of senior economic positions in government including Minister of Industry (1975-78), Minister of Agriculture (1978-81) and Minister of Planning (from 1980). While Machungo has his base mainly within the state bureaucracy, Guebuza has tended to work within the party and security apparatuses. More recently, following the death, also in the plane crash, of the Transport Minister, Luis Alcantara Santos, Armando Guebuza has taken on that portfolio. While these names were being bandied about in outside circles, in reality there was no major struggle for power inside the Political Bureau. The overriding sentiment was one of shock and grief at the loss of Samora Machel and an urgent sense of the critical situation caused by the war within the country and increased regional tensions. Following the President's death, Joaquim Chissano called a meeting of the diplomatic corps accredited in Maputo to announce that the Political Bureau, in the name of the Central Committee, was directing all aspects of the nation's life. When the Political Bureau first met, however, they discussed only the arrangements for the funeral. It was not until after the funeral that there was a meeting to discuss the succession. In that meeting one of the members of the Political Bureau nominated Chissano, the case was made for him and all who were present assented. No other candidate was proposed. According to Article 57 of the post-independence Constitution, in the event of the death of the president, his functions are immediately assumed collectively by the Central Committee. As this is now a large body of people spread over the entire country with poor avenues of communication, this is impractical on a day-to-day basis and power is effectively in the hands of the Political Bureau. When the Central Committee meeting was finally convened, the recommendation of the Political Bureau was presented and in a matter of fifteen minutes it was accepted without dissent. This does not imply that the Central Committee is merely a rubber-stamping body. It has a number of very forthright members. At the fourth congress although forty-five of the fifty-four members of the old central committee were re-elected, a further eighty three new members were added, 'largely from rural areas and including many critics, who will totally outweigh the old guard'. On 3 November following this decision by the Central Committee, the forty seven-year-old Chissano became President of FRELIMO and, under the terms of Article 53 of the Constitution, also President of the People's Republic of Mozambique and Chief of the Armed Forces. In a formal sense there was no prior established line of succession. This precedent was established during the leadership crisis of 1969 and the point was underlined when the vice-presidency was abolished. In theory the new President did not even have to be a member of the Political Bureau, but such an occurrence would in practice be unlikely. That the succession was peaceful and orderly and did not provoke a major power struggle with recriminations and expulsions does not mean that the death of President Machel did not come as a severe blow to the party, the government and the population at large. Samora Machel was such a powerful personality and forceful figurehead that he was literally seen as being FRELIMO-its core and personification. Given the gap that his death left, the leadership was left considering how he could be replaced. It was clearly impossible to replace him with someone possessing a similar style: Samora's style was unique. As a style of leadership it was very direct but also informal, and contrasts markedly with that of his successor. First as the FRELIMO representative in Tanzania during the liberation struggle and later as Foreign Minister, Chissano's training as a diplomat has encouraged a more formal and less direct and personally expansive style. He plays his cards close to his chest and appears keen to encourage a devolution of power and responsibility. As a member of FRELIMO from its foundation in 1962 and of the Central Committee since 1963, he has digested the shared experiences and lessons learnt by the party, appearing committed to the method of collective leadership operating in the Political Bureau. While the style of leadership has undoubtedly changed with the succession the policy course had not shifted dramatically. During his maiden presidential speech, Chissano stressed the continuity of domestic policies and of a foreign policy based on the principles of African unity, non-alignment and socialism. That such a continuity has occurred and that the succession was accomplished so smoothly under tragic and menacing circumstances reflects the unity that exists at the top. This in its turn is a function of the nature of the collective leadership that has developed within FRELIMO. Hanlon suggests that this unity derives from three factors: a strong commitment to consensus; a tendency to institutionalise conflicts and keep them within the party and ministries; and, finally, the careful use of cadres and a commitment to give them another chance should they fail in one particular position. This does not mean that there is never conflict, only that it is contained. In an important new study of Mozambique, Bertil Egero identifies two major lines of divergence in the thinking that has shaped post-independence development. On the one hand, there is the modernisation ideology promoting heavy industry, central planning and state farms, reinforced by trends of thought stemming from both the socialist bloc and the state functionaries who had witnessed the rapid urban growth of the late colonial period. On the other hand, there is the ideology of the liberation war, of mass participation and decentralisation. As Egero observes, 'The blending of the modernisation imperative with the persistent line of mass participation lends a never resolved ambiguity to the overall development strategy'. This is reflected in the various twists and turns of policy over the years. But, whatever the outcome of the debates over strategy, one thing remains perfectly clear-without an end to the war very little development of any kind can take place. War and succession The worsening war situation in 1986 provided a difficult backdrop to the change of leadership in Mozambique. A counter-offensive by RENAMO in the early months of the year had brought considerable success. Initially the major thrust of the offensive was in Maputo province in the south with railways, roads and power lines subjected to crippling attacks. In February, RENAMO recaptured its main base at Gorongosa in the centre of the country. This had been taken the previous year in a combined  assault by Zimbabwean and Mozambican troops. As an act of solidarity amongst the Front line States both Zimbabwe and Tanzania had sent troops to Mozambique to aid the fight against the rebels. Mozambican troops left to guard the captured base were easily overrun. Morale was low and supplies inadequate, and this reflected more generally the state of the Mozambican army which was poorly trained and organised, with chaotic logistics. Press speculation at the time that peace talks with RENAMO were the only alternative'1 were quickly rejected by Mozambique. However, it is apparent that the Zimbabwean army was critical of its Mozambican counterparts. Some reports indicated that 5,000 of the 12,000 Zimbabwean troops defending the Beira corridor, which carries Zimbabwe's imports and exports to the sea, had been withdrawn following the loss of the base. However, given the natural turnover of troops and the changing circumstances of the war, fluctuations in the number of troops stationed at any one time in the country are inevitable. But a further grievance amongst some of the Zimbabwean commanders was that certain senior Mozambican army personnel were not extending their fullest cooperation to the Zimbabwean forces. It was plain to see, therefore, that the FRELIMO leadership had to institute a major reorganisation of  its war effort. Inside the country complaints about the army were made public at the Second Conference of Mozambican Youth held in March. Zacarias Kupela, the movement's secretary, spoke of corruption in the army with officers siphoning off supplies to sell on the black market. The reorganisation of the army was a major challenge confronting Machel but it was left to his successor to complete this task. However, important initiatives were taken. Special commando units were being trained for the first time and a special training programme for Mozambican soldiers was set up in Zimbabwe with the collaboration of the British Army. Since the signing of the Nkomati Accord non-aggression pact between Mozambique and South Africa in March 1984, South Africa has consistently violated the terms of the agreement. This was dramatically revealed when the diaries of the RENAMO leader were captured following the taking of his headquarters in Gorongosa. The diaries showed continuing South African support. Even Chester Crocker, the US Assistant Secretary of State for African Affairs, stated publicly that RENAMO still existed. Support continued to flow to RENAMO, but Malawi now became the most important conduit. Little effective pressure had been applied on the Malawian government by the Frontline States and RENAMO appeared to operate across Malawi's borders with impunity. This was in spite of the fact that on his first official visit to Malawi in October 1984 President Machel had signed a non-aggression and cooperation pact. The central provinces of Mozambique - Zambezia and Tete in particular - were the worst affected by RENAMO activity. Mozambique's Natural Disasters Office warned in April 1986 that more than a million people faced starvation in Zambezia as a result of the war: 'Though rains have been plentiful, people are always moving from one place to another to seek relative stability. Therefore they have not been able to plant crops. In August 1986 the first signs appeared that tougher action was to be taken against the Malawian government. Mozambican troops crossed into Malawi in pursuit of rebels and fought a battle with Malawian troops near the town of Chikwana. In September Machel, Kaunda and Mugabe flew to Blantyre in a concerted effort to obtain cooperation in the war against the rebels. On Machel's return from the meeting he declared 'The Malawian police, the Malawian armed forces and Malawian security are all totally under South Africa's command."He threatened to close the border with Malawi and site missiles along the border if Malawian support to RENAMO did not cease. The Frontline States of Mozambique, Zambia, Zimbabwe and Tanzania threatened to close their borders, which to land-locked Malawi could have disastrous consequences for the economy. With insufficient rain and the intensification of the war, by September 1986 the population of the three provinces bordering  Malawi  were in a perilous state. The Mozambican Government called for international assistance to avert a famine threatening to affect almost four million people.The pressure on Malawi began to have some effect and at the end of September it was agreed to create a high-level joint security commission between the two countries, a proposal first suggested by Machel a year and a half earlier. Malawi expelled a large number of RENAMO troops who had flooded across the border causing a major escalation of the fighting. One estimate suggested that 10,000 RENAMO personnel were involved. Their strategy was to try to cut the country in two by occupying the Zambezi valley, and a number of important towns were taken. Meanwhile, relations between South Africa and Mozambique deteriorated still further. Following a land-mine blast near the Mozambique border which injured six South African soldiers, Pretoria ordered an end to the recruitment of migrant labour from Mozambique. General M A Malan, the South African Defence Minister, warned that 'the Nkomati Agreement and land-mines cannot exist side by side'. As tensions mounted, Mozambique announced that it expected an invasion aimed at overthrowing the government. Less than seventy-two hours before the fateful plane crash, Carlos Cardoso, the director of the Mozambican information agency commented prophetically, 'Observers in Maputo believe that the assassination of the Mozambican leader appears to be in the minds of the South African generals, and there are already certain public indications of this. The thinking amongst the Political Bureau of FRELIMO is that the assassination of Machel might have been envisaged by the South African government in order to impede new developments taking place in three key areas. First, Samora Machel had played a very forceful role within SADCC and in the Frontline States. He had exerted a powerful influence for regional coordination to lessen links of dependency on South Africa. The death of Machel was one way of reducing Mozambique's influence within the region as it would take a new leader a while to acquire the same stature. Secondly, there were new developments taking place on the military front which Machel's death would almost certainly impede. There were two aspects to these developments. The first was the policy of increasing regional self-reliance militarily, notably cooperation with Zimbabwe, Tanzania and most recently Malawi. Military cooperation with the ruling ZANU-PF in Zimbabwe stretched back to the days of the liberation struggles, with guerrillas from the two parties fighting side by side as early as 1970 and FRELIMO's expanding area of activities permitting access to the north-east of Zimbabwe for ZANU forces. FRELIMO'S support for the Zimbabwean nationalist struggle massively increased following Mozambican independence, but the cost this entailed was enormous. In 1976, Ken Flower of the intelligence arm of the white settler government in Rhodesia set up the RENAMO force to try to undermine the Mozambican rear base of the Zimbabwean nationalists. He bred a monster that would later bring the Mozambican economy to its knees and destroy the social and material fabric of life for the overwhelmingly rural peasant population. Following Zimbabwe's independence and nearing the end of his life, Ken Flower was to destroy the claim made by some US Republican Senators and right-wing voices in Europe that RENAMO was a legitimate political force which deserved backing, when he commented, 'It is not a bona fide guerrilla movement because they have not got a clear political objective. I'll take it further than that, they probably couldn't have continued to exist without our [Rhodesian] assistance, they probably couldn't continue now without somebody else's assistance. We helped, we trained-inside Rhodesia-and those inside Mozambique provided the recruits. Their motivation was money. The debt that the newly independent government of Zimbabwe owed to Mozambique coupled with the importance of the Mozambican port and transport links to the sea for the Zimbabwean economy, laid a firm foundation for Zimbabwe's support for the FRELIMO government in its war against the rebels, whose paymaster at Zimbabwe's independence had been transferred to South Africa. From October 1982 Zimbabwean troops were brought into Mozambique to guard the Beira corridor, which provided a rail, road and oil-pipeline link between Zimbabwe and the port of Beira. From initially assuming a defensive role, the Zimbabwean Army was soon to adopt a more offensive strategy in collaboration with the Mozambican FPLM (Popular Forces for the Liberation of Mozambique). Tanzanian troops were also brought in as part of the policy of regional military self-reliance. An interesting new development in 1987 is the bringing in of Malawian troops to help guard the northern Nacala railway line, a result of the pressure applied to the Malawian government by the Frontline states. A second aspect of the military arena that the killing of Samora Machel may have been aimed at impeding was the internal reorganisation of the Mozambican armed forces. Attempts to restructure and rectify problems in the armed forces were not a new phenomenon. Abuses of the population by the security forces had been a central target of the general offensive launched by FRELIMO in 1980 order to transform the state apparatus. As RENAMO infiltration and terrorism increased, the insufficiencies of the army to meet the challenge that they faced became more apparent. In August 1986, the Defence Minister, Alberto Chipande, presented a report on the armed forces to the National Assembly. In it he acknowledged the serious bottlenecks and problems of management and control that existed: 'We are aware of problems in supplying the troops, and in our recruitment and mobilisation. The problems in the army began at the top in terms of the chain of command and the division of labour. The processo for reorganizing the military was certainly slowed down by the death of Machel. President Chissano had not been in close contact with military affairs for a long time and he needed time to acquaint himself in detail with the situation. On 20 June 1987, however, in less than a year of Chissano assuming the presidency, a major reorganisation of the senior military staff was carried out. A new chief of general staff was appointed, as were new commanders for the three wings of the armed forces, and a reshuffle of the general directors in the Ministry of Defence and extensive changes in the military command in nine out of the country's ten provinces were effected. The changes were intended not only to improve the efficiency and effectiveness of the army but also to smooth out any difficulties in the close relationship with the Zimbabwean forces noted earlier. The training  programmes and the use of elite commando forces were also having a positive effect on an improved war effort. A third possible aim of a South African strategy to eliminate Machel, according to the FRELIMO leadership, was to disrupt the newly reorganized governmental structure inside Mozambique. In March 1986 efforts were made to reassert party control over the state, with three Political Bureau members each being given a group of ministries to oversee. Then in July 1986 Mozambique's first Prime Minister was appointed and for the first time there began to be regular cabinet meetings, whereas previously much had been done on a bilateral basis between the President and each Minister. A communique at the time stressed that the number of tasks assumed by the President had to be reduced: 'The development of our political, military, economic and social situation is no longer compatible [with the concentration of responsibilities at the top] if we want to ensure efficiency in government'.The Prime Minister would now assume the role of heading the Council of Ministers and dealing with provincial governors. The communique went on to stress that the President would then be free to concentrate his efforts on the conduct of the war. The process of lightening the load on the President's shoulders and devolving responsibilities was carried further by Chissano, who also shed the task of running the National Assembly, a responsibility which took a considerable amount of Machel's time. The main strategic aim of the South African Government is to continue the war to such an extent that FRELIMO obliged to accept a coalition with RENAMO. They realise that at this period in Mozambique's history it would not be possible to do away with FRELIMO entirely, although some may think they can. On the other hand, they know they cannot achieve their aims with a FRELIMO government, hence the idea of a coalition. The situation in Mozambique by 1987 was drastic in the extreme, with one in three of the population facing starvation, half a million refugees displaced in neigh bouring states and 10 per cent of the population homeless. Half the schools in the country and a quarter of the health posts and health centres have been either closed or destroyed. Food aid needs for 1987-88 run to 650,000 tons of cereals. It is hard to see how a country as poor as Mozambique can continue to carry the cost of living on the front line with apartheid, but the government and people continue to shoulder the burden. A massive and continuing effort of international aid will be required, but also an increase in the pressure on South Africa through the use of sanctions. The key to peace within Mozambique and more generally within the region lies in change within South Africa. There are some bright spots on the horizon, however. Mozambique has been very successful in renegotiating its international debts, which had grown alarmingly with the country's economic decline. By the end of 1986 the outstanding disbursed foreign debt was US$3,400,000,000 and the debt service burden had risen to 275 per cent of its exports of goods and services. In June 1987 it won aid pledges of US$400 million from the Paris Club and the following month US$700 million at a meeting with donor nations at the World Bank; these were to cover its external financing needs. Debts to the socialist countries, estimated at US$478 million, were also to be renegotiated.A comp rehensive economic recovery programme was launched at the beginning of 1987 involving currency devaluation, higher producer prices, a new wages policy to improve productivity, changes in taxation policy and a drive to achieve greater efficiency and economy. The major development effort in the country centres on the Beira corridor. The port of Beira is being extensively modernised, with four berths being rebuilt and a number of other improvements which should be completed by the end of 1990. Upon the success of this project much depends, for many of the SADCC countries are alarmingly dependent upon South Africa for the transit of their goods. Conclusion If the FRELIMO leadership is correct in its assessment that the death of Machel may have been carried out with the connivance of the South African Government as part of a plan to force a coalition with RENAMO or, in the minds of some within the all-powerful State Security Council which effectively rules South Africa, to overthrow FRELIMO completely, then how successful have they been? Let us begin by examining the degree of success in the three instrumental goals of weakening Mozambique's influence within the region, causing a setback to new military developments both regionally and internally and disrupting the newly reorganised governmental structure. The response to the death of  Machel by other countries within the region was to rally around with support to Mozambique. Regional policies within SADCC have already been agreed, with a strong input from Mozambique, which has the all-important transport portfolio. The new Transport Minister, who also bears responsibility for SADCC work, is now a Political Bureau member, Armando Guebuza. FRELIMO'S impact on SADCC is likely to remain considerable, therefore, and will remain strongly anti-apartheid. President Chissano, as former Foreign Minister  has excellent regional and international contacts and has already made his mark as President. On the military front, regional collaboration is increasing and improving, and the internal reorganization of the army has been carried out, although somewhat belatedly. The changes in the government structure, with a move away from over- centralization of power in the person of the President, will suit the style and political inclinations of the new President. Hence, the death of Machel has not brought South Africa the hoped-for result. As to a possible coalition with RENAMO, President Chissano has repeatedly rejected any negotiations with the rebel group, which is, in any case, now split into numerous factions. Indeed, the determination to prosecute the war has only been reinforced by such acts as the massacre at Homoine on 18 July 1987, when 388 people were left either dead or wounded following a RENAMO attack. The prospects for the country remain bleak in the short run, as it is only with the end of white rule in South Africa that the real conditions for peace can be created and Mozambique's development path properly resumed. Meanwhile, FRELIMO has proved its strength and stability by so far passing successfully through the ordeal of presidential succession and thus thwarting South African goals.
Veja o vídeo:
http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2012/08/gra%C3%A7a-machel-sobre-amorte-de-samora-machelvideo2.html

http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2012/07/gra%C3%A7a-machel-sobre-amorte-de-samora-machelvideo.html










17 julho 2012

A QUARTA GUERRA MUNDIAL

 A QUARTA GUERRA MUNDIAL

Este filme documentário faz um inventário das milhares de pessoas e movimentos sociais que se manifestam em toda parte do planeta, mostrando uma nova página da história composta pelos atos da resistência ao neoliberalismo. Das linhas de frente nos conflitos sociais no México, Argentina, África do Sul, Palestina e Coréia; "no norte" de Seattle a Gênova; na "guerra ao Terror" em Nova Iorque, no Afeganistão e no Iraque, o filme traz as imagens e as vozes de uma guerra não noticiada: a resistência radical ao capitalismo global, com cenas de manifestações populares inéditas na grande mídia. 

16 julho 2012

A MODERNIDADE, A QUESTÃO RACIAL E A SUBALTERNIDADE


A MODERNIDADE, A QUESTÃO RACIAL  E A  SUBALTERNIDADE
Por Jorge Fernando Jairoce

Introdução
Neste artigo pretendo trazer uma reflexão sobre a modernidade e os seus efeitos na História da humanidade, relacionando particularmente com a questão da desvalorização da raça negra,  sua subalternidade  e a imposição da violência epistêmica sobre outros povos  e culturas pelo Ocidente.

1.1.Significado da  modernidade na História
A partir do século XVII, os filósofos modernos como René Descartes, Emanuel Kant e Francis Bacon atribuem a razão (os racionalistas) ou os sentidos (os empiristas) como via privilegiada do conhecimento  (dimensão filosófica da modernidade). A modernidade visto nesta perspectiva  expressa  a ideia de que a ciência em geral e não apenas as ciências sociais assentava nas seguintes ideias fundamentais: distinção entre sujeito e objecto e entre natureza e sociedade ou cultura; redução da complexidade do mundo a leis simples susceptíveis de formulação matemática; uma concepção da realidade dominada pelo mecanicismo determinista e da verdade como representação transparente da realidade; uma separação absoluta entre conhecimento científico – considerado o único válido e rigoroso – e outras formas de conhecimentos como o senso comum ou estudos humanísticos; privilegiamento da causalidade funcional, hostil à investigação das “causas últimas”, consideradas metafísicas, e centrada na manipulação e transformação da realidade estudada pela ciência[1].
A questão do conhecimento se impôs no cenário moderno a partir das incertezas presentes no século XVI em consequência do declínio do modo de vida feudal. Para isso contribuíram fatores como a retomada da vida urbana, o incremento do comércio como forma de produção de riqueza, a constituição dos Estados Modernos, as Grandes Navegações e a descoberta de novos povos, a invenção da imprensa, a Reforma (e a contra-reforma) religiosa e, por fim, o surgimento da física matemática.
Costuma-se situar o início da modernidade com o pensamento de Descartes, o fundador do funcionalismo moderno. Ele propôs estabelecer as condições de possibilidade para a obtenção de um conhecimento seguro da verdade. Descartes é tomado como inaugurador da Modernidade no sentido de que ele marca o fim de todo um conjunto de crenças que fundamentavam o conhecimento. O homem moderno não buscava a verdade em um além, em algo transcendente.
O filósofo Francis Bacon, contemporâneo de Descartes, pode ser apresentado como o fundador do moderno empirismo. Para Bacon a razão deixada em total liberdade pode se tornar tão especulativa e delirante que nada do que produza seja digno de crédito. É necessário dar à razão uma base nas experiências dos sentidos e na percepção; desde que essa percepção tenha sido purificada, liberada de erros e enganos a que está submetida no cotidiano.
A sociedade que se formou na Europa durante a Idade Moderna para além de constituir um modelo complexo e especifico de organização social, econômica e política e ela vai criar bases para edificação de uma sociedade baseada na geopolítica do conhecimento que subalterniza saberes, povos e culturas, memórias, línguas e histórias locais. Portanto as histórias locais serão silenciadas e suprimidas pela colonialidade do poder no imaginário moderno/colonial (Mignolo. 2003). A edificação deste modelo de sociedade foi possível através de elaborações científicas baseadas na racionalidade científica europeia que era considerada a mais credível e verdadeira como veremos a seguir.

1.2. Modernidade, filósofos iluministas e o preconceito racial
A ideia de que o mundo explica-se com base na racionalidade científica é atinente a Europa e como tal somente ela tem a capacidade de criar a cultura e a civilização. É recorrente, nos compêndios que apresentam a ideia de uma história da civilização ocidental, o equívoco  no tratamento do referencial que diz respeito ao continente africano e às suas gentes (Hernandez, 2008, p.17). Estas considerações foram feitas no cerne do Iluminismo como foi evidenciado por filósofos e cientistas desta época, David Hume e Immanuel Kant, Montesquieu e mais tarde Hegel,  por exemplo, afirmaram a inferioridade congênita do Negro.
Na leitura do livro Tratado sobre os caracteres nacionais”  Hume diz que a raça negra é inferior a raça branca. Segundo Hume, não existe nenhuma nação desta raça que seja civilizada e nenhum indivíduo ilustre por suas ações ou suas capacidades intelectuais ou morais. Para ele os negros ignoram tudo o que tem a ver com inteligência: a manufatura, a arte, a ciência. O autor vai mais longe: não existe nenhuma comparação entre a barbárie do negro mais evoluído e a barbárie do branco mais vulgar. É que o branco revela um potencial do progresso indefinido enquanto o negro se caracteriza pela estagnação. Isso significa que ao longo do tempo e do espaço, a diferença entre essas raças é permanente e invariável. Hume continua dizendo que é a própria natureza que explica tais diferenças. É que o objetivo da natureza era diferenciar as raças humanas e estabelecer uma hierarquia rigorosa entre elas. Preventivamente, Hume recusa o argumento histórico-social que tenta explicar a imbecilidade do negro pela servidão. Ele fornece um exemplo: os negros livres não mostram nenhum indício de inteligência superior em comparação ao indício dos negros escravizados. Sobre um negro da Jamaica que teria talento, Hume afirma a mediocridade das obras daquela pessoa, semelhante a um papagaio que apenas balbucia algumas palavras aprendidas (Hume, 1999, p. 207, nota 12).
Sobre essas questões, Kant concorda com Hume e parece severo. Kant diz que “Os negros da África não possuem, por natureza, nenhum sentimento que se eleve acima do ridículo”(Kant, 1993, p. 75). Chamando a autoridade de Hume, ele afirma que
Dentre os milhões de pretos que foram deportados de seus países, não obstante muitos deles terem sido postos em liberdade, não se encontrou um único sequer que apresentasse algo grandioso na arte ou na ciência, ou em qualquer outra aptidão; já entre os brancos, constantemente arrojam-se aqueles que, saídos da plebe mais baixa, adquirem no mundo certo prestígio, por força de dons excelentes. Tão essencial é a diferença entre essas duas raças humanas, que parece ser tão grande em relação às capacidades mentais quanto à diferença de cores. A religião do fetiche, tão difundida entre eles, talvez seja uma espécie de idolatria, que se aprofunda tanto no ridículo quanto parece possível à natureza humana. A pluma de um pássaro, o chifre de uma vaca, uma concha, ou qualquer outra coisa ordinária, tão logo seja consagrada por algumas palavras, tornam-se objeto de adoração e invocação nos esconjuros.” (Kant, 1993, p. 76).
A filosofia de Kant era cheia de preconceitos. E nas relações com os negros ele recomenda o uso do chicote: “Os negros são muito vaidosos, mas à sua própria maneira, e tão matraqueadores, que se deve dispersá-los a pauladas.”(Kant, 1993, p. 75-76). Este posicionamento pode ter influenciado para violência física impostas aos negros escravos nas plantações das Américas e mesmo no contexto da exploração nas colónias (Gilroy, 2007).
Reconhecidamente, a imagem reservada à África designava um espaço assoberbado pela opressão dos elementos naturais, assolado pela indigência cultural e pela inferioridade diante da civilização européia. Nesse recorte, existiam apenas populações destinadas a serem sujeitadas, jamais compreendidas. O pensamento referente à incapacidade do africano de produzir conhecimento racional ou civilização – conceito bastante utilizado pelos pensadores deste século – foi subjacente a diversas manifestações intelectuais do mundo ocidental e foi compartilhada, por exemplo, por diversos autores modernos iluministas dentre os quais o francês como Voltaire, o escocês Hume e Kant , mesmo enfatizando a universalidade da razão, negaram aos africanos e a sua descendência a posse de capacidade literária e civilizacional como bem dizia Kant: “ O Negro permaneceu trancado do lado de fora do círculo das relações intersubjectivas.” (Gilroy, 2007, p.84).
O filósofo alemão, Emmanuel Kant, importante teórico da “ética” como conceito prático da reflexão sobre a “moral” e defensor da racionalidade como ferramenta essencial à produção do conhecimento, em um livro publicado em 1802, se referia aos africanos ao sul do Saara como “homens que cheiram mal” e têm a pele negra por “maldição divina. Kant rejeitava desta forma a humanidade dos indivíduos africanos visto que para ele somente  o europeu, se supunha ser a essência da humanidade e da civilização. Entendia que os negros eram mais um elemento da natureza africana, semelhante aos bichos e rios. (Foé, 2011).
Sobre esta questão, devemos notar a especificidade do caso de Voltaire na medida em que seu ponto de vista parece contraditório. Inicialmente, Voltaire aceita a fraternidade e a igualdade entre as raças negra e branca, quando ele afirma a identidade de todas as raças do mundo. Em nome deste princípio fundamental, Voltaire condena veementemente a escravidão e a opressão que sofrem os negros. Mas de maneira surpreendente o mesmo. Voltaire tenta justificar a escravidão do negro quando ele diz que a Europa compra os escravos domésticos nos países dos negros porque este povo trafica seus próprios filhos. Voltaire não compreende a razão porque a Europa é censurada quando ela pratica este negócio. Porque, segundo Voltaire, um povo que trafica seus filhos é mais condenável que o comprador. De qualquer maneira, este negócio demonstra a superioridade absoluta da Europa. E Voltaire conclui que aquele que se entrega a um mestre nasceu para ter um. (Voltaire, 1963, p. 807). Esta conclusão merece uma observação. Tentar convencer o povo vencido da África que ele é responsável pela sua própria servidão parece um fenômeno único na história.
Voltaire tenta explicar a inferioridade dos negros. Primeiro, ele enfatiza a inferioridade física  descrevendo-o com um nariz chato, os olhos redondos, os lábios sempre espessos, os cabelos em forma de lã e depois enfatiza ainda  a inferioridade intelectual afirmando que a medida da inteligência mostra enormes diferenças entre o povo branco e o povo negro. Assim, como exemplos, diz que os africanos não são capazes de concentrar a atenção; eles são incapazes de calcular. Enfim, esta raça não parece criada para suportar nem os benefícios nem os abusos da filosofia da Europa. O retrato do negro feito aqui mostra uma ligação forte entre as características físicas e as qualidades morais e intelectuais. O preconceito comum era que a beleza física condiciona a boa qualidade da mente, como o explica o livro  Do Espírito das Leis do Montesquieu . Nele relata os preconceitos da época dele  e escreve que é tão natural considerar que é a cor que constitui a essência da humanidade, que os povos da Ásia, que fazem eunucos, privam sempre os negros da relação que eles têm conosco de uma maneira mais acentuada. Pode-se julgar da cor da pele pela dos cabelos, que, entre os Egípcios, os melhores filósofos do mundo, eram de tão grande importância, que mandavam matar todos os homens ruivos que lhes caíam nas mãos. De um ponto de vista moral, os homens da época de Montesquieu estavam convencidos que Deus, que é um ser muito sábio, não podia introduzir uma alma boa num corpo completamente negro. De um ponto de vista intelectual, Montesquieu aponta a estupidez dos negros que, segundo ele, não são capazes de tirar proveito dos metais preciosos dos seus países. Uma prova de que os negros não têm senso comum é que dão mais importância a um colar de vidro do que ao ouro, fato que, entre as nações policiadas, é de tão grande conseqüência. Durante a época de Montesquieu, a cor preta justificava plenamente a escravidão dos povos da África. Então, porque lamentar estes seres que, além de ser preto, têm um nariz achatado. A verdade é que nesta época não se teve certeza da humanidade dos negros. Mas é interessante ver como o capitalismo recusa a humanidade a um grupo humano ou a uma raça para justificar a escravidão. É que a economia da Europa precisava de novos animais de carga para substituir os Índios da América exterminados. (Foé, 2011).
 É porque Montesquieu diz que: “Se eu tivesse que defender o direito que tivemos de escravizar os negros, eis o que diria: Tendo os povos da Europa exterminados os da América, tiveram que escravizar os da África, a fim de utilizá-los no desbravamento de tantas terras. O açúcar seria muito caro se não se cultivasse a planta que o produz por intermédio de escravos”. (Montesquieu, 1979, livro XV, cap. 1).
O Iluminismo decretou a inferioridade dos negros para legitimar a servidão. As diferenças dos caracteres com os brancos são permanentes e imutáveis porque os negros são condenados a se tornarem escravos dos Europeus.
Como já citado, os europeus haviam iniciado a conquista do continente africano e o domínio de suas populações. Como este domínio carecia destas justificativas morais, além da concepção de que a África não é uma parte histórica do mundo. Os filósofos modernos e iluministas conceberem estas justificativas morais e os seus ideiais influenciaram vários cientistas sociais. A ideia de que a África não tem movimentos, progressos a mostrar, movimentos históricos próprios esta e outras considerações hegelianas foram reforçadas pela aplicação dos princípios de Darwin. (Foe, 2011). Ainda que a influência de Hegel na elaboração da história africana tenha sido fraca, a opinião que ele representava foi aceita pela ortodoxia histórica de seu século. Na concepção do século XIX, a África não tinha e nem poderia ter história. Essa opinião anacrônica e destituída de fundamento ainda hoje não deixa de ter adeptos.
O professor A. P. Newton – grande defensor da atividade histórica como uma análise científica e rigorosa de fontes originais e escritas, em 1923, numa conferência diante da Royal African Society de Londres, sobre “A África e a pesquisa histórica” expôs que este continente não possuía nenhuma história antes da chegada dos europeus. A história começa quando o homem se põe a escrever. Assim, segundo o mesmo, o passado da África antes do inicio do imperialismo europeu só podia ser reconstituído a partir de testemunhos dos restos materiais, da linguagem e dos costumes primitivos, coisas que não diziam respeito aos historiadores, e sim aos arqueólogos, aos lingüistas e aos antropólogos. Fica clara, assim, a concepção muito presente tanto no século XIX quanto no XX, de que a história da África só poderia ter inicio, com a chegada do europeu “civilizado” e da escrita como fonte histórica. Negando, desta forma, as diversas outras possibilidades de fontes históricas e a própria existência de escritas autóctones africanas, além dos hieróglifos egípcios, uma das primeiras escritas criadas pela humanidade. Diversos outros sistemas gráficos ricos em informações histórica tal qual o meroídico, o núbio antigo, o copta, o tifinagh – milenar sistema de escrita milenarutilizado pelos tuaregues, aparentemente derivado do alfabeto púnico de Cartago –, o ge’ez – sistema de escrita etíope com símbolos gráfico utilizados nas líguas ahmárico e o tygrinia – e o bamun também denominado Aka Uku, criado no século XIX pelos administradores do Reino do Bamum na atual República do Camarões. Além de ideogramas estilizados nsidibi, inventados pelos ejagham da Nigéria e do Camarões  (Hernandez, 2008).
A construção historiográfica do continente africano estava barrada pelo preconceito e pelo etnocentrismo. Os europeus acreditavam que sua pretensa superioridade sobre os negros africanos estava confirmada por sua conquista colonial. Em consequência disso, em muitas partes da África, especialmente no cinturão sudanês e na região dos Grandes Lagos, eles estavam convictos de que sua presença no continente tinha como finalidade legar as populações africanas os conhecimentos e a civilização européias (Idem).
No decorrer das primeiras décadas do século XX, mais explicitamente pós década de 1920, um movimento de renovação quanto aos paradigmas, métodos e temáticas históricos Escrevia George Friedrich Hegel (1770-1831), importante filósofo alemão do século XIX, em sua obra “Filosofia da História Universal”, que a a-istoricidade da África, decorre, em particular, de duas razões independentes: “A primeira, pelo fato de a história ser própria de um Velho Mundo que excluía a África subsaariana e a segunda por conceber o africano como sem autonomia para construir a sua própria história” (Hernandez, 2008, p.19). Portanto para o Hegel na África subsaariana “...não há conhecimento real; existem crenças, opiniões, magia, idolatria, entendimentos intuitivos ou subjectivos, que na melhor das hipóteses, podem-se tornar-se objectos ou matéria-prima para inquirição científica.”(Santos, 2009, p. 25).  Contudo, esta África genérica e a-histórica, é divida por Hegel, em sua referida obra, em partes distintas: a setentrional, banhada pelo mar mediterrâneo a qual “pode dizer-ser que esta parte não pertence propriamente à África, senão à Espanha com a qual forma uma concha” e a “África propriamente dita”, que fica ao sul do Saara (Hernandez, 2008, p.19). Sobre esta última região, diz o filósofo:

A África propriamente dita é a parte característica deste continente. Começamos pela consideração deste continente, porque em seguida podemos deixa-lo de lado, por assim dizer.
Não tem interesse histórico próprio, senão o de que os homens vivem ali na barbárie e na selvageria, sem fornecer nenhum elemento à civilização. Por mais que retrocedamos na história,acharemos que a África está sempre fechada no contanto com o resto do mundo, é um Eldorado recolhido em si mesmo, é o país criança, envolvido na escuridão da noite, aquém da luz da história consciente. [...] Nesta parte principal da África, não pode haver história” (Ibid., p. 20).

A partir da leitura deste trecho específico podem se perceber alguns pontos instintos da visão historiografia hegeliana. Primeiro, percebe o continente num perpétuo eterno estado selvagem, “no qual predomina a natureza”, negando a existência de cultura ou de história possível aos povos africanos. Segundo, percebe a África como um bloco fechado em si mesmo – “acharemos que a África está sempre fechada no contato com o resto do mundo, é um Eldorado recolhido em si mesmo” – negando, desta forma, a extensa realização de comércio extra-continentais com a China, Índia ou Península Arábica na África oriental ou a grande quantidade de caravanas  responsáveis por abastecer o centro africano ou mesmo boa parte dos mercados auríferos europeus (Idem).
Contudo o contexto no qual estas idéias foram criadas – o século XIX – os mundos asiáticos e africanos encontravam-se sob o domínio colonial da Europa e outros países Imperialistas. Tais idéias foram criadas como justificativa, para a subordinação e submissão destes povos então considerados inferiores, selvagens ou desprovidos de cultura nas mãos das potências européias. Este pensamento etnocêntrico enraizado no inconsciente dos pensadores e filósofos do norte do globo contribui como justificativa moral e até religiosa, para as ações realizadas por estas nações ditas “civilizadas” no restante do mundo. Como fica claro no trecho citado do mesmo livro de Friedrich Hegel:

Encontramos, [...], aqui o homem em seu estado bruto. Tal é o homem na África. Porquanto ohomem aparece como homem, põe-se em oposição à natureza; assim é como se faz homem.
Mas, porquanto se limita a diferenciar-se da natureza, encontra-se no primeiro estágio, dominado pela paixão, pelo orgulho e a pobreza; é um homem estúpido. No estado de selvageria achamos o africano, enquanto podemos observá-lo e assim tem permanecido. O negro representa o homem natural em toda a sua barbárie e violência; para compreendê-lo devemos esquecer todas as representações européias. Devemos esquecer Deus e a lei moral. Para compreendê-lo exatamente, devemos abstrair de todo respeito e moralidade, de todo o sentimento. Tudo isso está no homem em seu estado bruto, em cujo caráter nada se encontra que pareça humano” (Hernandez, 2008, p.21).

Assim, desde o Iluminismo até a época de Hegel e de Gobineau e com exagero até os dias de hoje pela corrente eurocêntrica o ser negro foi excluído do gênero humano comum e mesmo da História. O ser negro foi submetido para além da violência física (pela prática do trabalho braçal) uma violência epistêmica, cuja tática de neutralização do Outro, seja ele subalterno ou colonizado consiste em inviabilizá-lo, expropriando-o de qualquer possibilidade de representação, silenciando-o fazendo analogia a violência epistêmica sofrido pelo sujeito subalterno (Spivak, 2010).
As ideias  apresentadas pelos filósofos iluministas e outros  contribuiram para criação de formas de representação do homem negro e da história e cultura de África acabando por ser um factor catalisador do capitalismo imobilizando a história dos povos vencidos ou a maneira como este regime obriga as nações exploradas a executar as tarefas repetitivas. A exploração dos vencidos não é possível sem a imobilização da cultura indígena e sem a saída do vencido de sua historia anterior. É o sentido que o negro é desvalorizado como sujeito histórico e perda a iniciativa histórica (Gilroy, 2007). Em jeito de conclusão, Gilroy (2007, p.82) afirma que estas ideias raciológicas misturam o físico e o metafísco num poderoso e elaborado argumento cosmopolitista para justificar a matriz colonial do poder que vai-se desenhando e que implicava também a colonialidade do saber.

1.3. Modernidade, colonialidade do poder e saber e a questão da raça
Walter Mignolo refere que não dá para pensar a modernidade sem pensar na matriz da colonialidade do poder que assenta-se no controle da economia, da autoridade, da natureza e seus recursos naturais, do género e sexualidade e da subjectividade e conhecimento (Mignolo, 2010, p.12). Isto para dizer que, não bastava a colonização do poder como tal, era necessário também uma colonização do saber (Mignolo, 2003) sobretudo para as raças não europeias. Para reforçar este argumento Quijano acrescenta referindo-se ao termo colonialidade do poder para designar a classificação social da população mundial de acordo com a ideia de raça. Trata-se de uma "construção mental que expressa a experiência básica da dominação colonial e que desde então permeia as dimensões mais importantes do poder mundial, incluindo sua racionalidade específica, o eurocentrismo." (Ibid., p.13). A ideia de raça foi assumida pelos conquistadores como o principal elemento constitutivo das relações de dominação que a conquista exigia. Assim, foi classificada a população da América, da África e  posteriormente, do mundo, a partir desse novo padrão de poder, ou seja, embora o pensamento da raça tenha existido em periodos anteriores, a modernidade transformou o modo como a raça era compreendida e praticada (Gilroy, 2007, p.80) para responder obviamente aos interesses da matriz colonial do poder. Não foi por acaso que os índios numa  primeira e depois os negros foram desumanizados e reduzidos a máquinas de trabalho escravo. A questão racial foi bem aproveitada para este propósito e como refere Gilroy (2007, p.81) certas raças foram historica e socialmente inventadas pela modernidade catalisando o regime distinto de verdade. Em outras palavras, as ciências humanas modernas  particularmente a antropologia, geografia e filosofia emprenderam um elaborado trabalho de modo  a tornar a ideia da raça epistemológicamente correta (Idem). Sobre este aspecto ficou bem patente no subtítulo anterior quando os filósofos iluministas e outros cientistas sociais apresentaram vários argumentos para justificar a ideia da superioridade/inferioridade racial.
A perspectiva de superioridade/inferioridade além de estar na base do conceito de superioridade étnica, também implica a superioridade epistêmica. O conhecimento produzido pelo homem branco é geralmente qualificado como científico, objetivo e racional, enquanto que aquele produzido por homens de cor (ou mulheres) é mágico, subjetivo, irracional e subalterno (Spivak, 2010). Esta dimensão, da colonialidade epistêmica ou do saber, não apenas estabelece o eurocentrismo como perspectiva única de conhecimento, mas também descarta as outras produções intelectuais. Para Mignolo (2003) a diferença colonial epistêmica parte de uma pressuposição situada sobre um julgamento antecipado de que os legados de línguas e pensamentos não europeus são de algum modo deficientes. A hipótese é que as pessoas que falam e são educadas nessas línguas são de alguma maneira epistemicamente inferiores.
A superioridade atribuída ao conhecimento europeu em muitas áreas da vida foi um aspecto importante da colonialidade do saber. Os conhecimentos subalternos foram excluídos, omitidos, silenciados e ignorados (Spivak, 2010). Desde a Ilustração, no século XVIII, esse silenciamento foi legitimado pela ideia de que tais conhecimentos representavam uma etapa mítica, inferior, pré-moderna e pré-científica do conhecimento humano. Somente o conhecimento gerado pela elite científica e filosófica da Europa era considerado como conhecimento verdadeiro, já que era capaz de fazer abstração de seus condicionamentos espaço-temporais para se localizar em uma plataforma neutra de observação. (Mignolo, 2003).
Mas a modernidade possui outras características, que também são derivadas das relações de produção capitalistas. A dominação e exploração da classe trabalhadora provocam a resistência desta e a luta de classes. A classe capitalista busca manter sua dominação através da repressão, da ideologia, do imaginário, da criação de instituições que buscam integrar o proletariado na sociedade burguesa enfim marginalizando e subalternizando este grupo sem voz como diria Spivak.

Conclusão
Depois de vários argumentos apresentados pelos filósofos iluministas observa-se que eles foram importantes para o avanço do pensamento racional moderno europeu que criou padrões da racionalidade para o  mundo, abrindo espaço para desvalorização (violência epistêmica) de outras formas de conhecimento que não respondesse a esse padrão. Consequentemente essa racionalidade contribui para edificação de preconceitos raciais sobretudo para a raça negra, o que propiciou condições para sua dominação cultural e económica daí que, não dá para pensar a modernidade sem a colonialidade do poder e saber. E como alternativa para esta modernidade Mignolo fala de pensamento liminar “gnose liminar” que aponta uma razão pós-ocidental e uma reflexão crítica sobre a produção do conhecimento pautada na colonização epistêmica e na subalternização de todas as formas de saberes que não estivessem pautadas nos cânones da ciência eurocêntrica- projecto que vai se chamar de estudos pós-coloniais que representa um grande desafio para o sul global.

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[1] Boaventura Sousa Santos na Conferência de Abertura do VIII Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, realizado em Coimbra, de 16 a 18 de Setembro de 2004.