12 agosto 2012

Autor tanzaniano analisa papel desempenhado pelo regime de Nyerere


Autor tanzaniano analisa papel desempenhado pelo regime de Nyerere

Processo de Nachingwea organizado pela Frelimo

O Reverendo Uria Simango, uma das proeminentes figuras políticas presentes nos famigerados julgamentos de Nachingwea, foi raptado no Malawi por agentes da Frelimo que “trabalhavam em estreita colaboração com a polícia política tanzaniana, Usalama wa Taifa (UwT)”

Os julgamentos de Nachingwea surgiram na esteira de três outros, organizados pelo regime de Nyerere. O julgamento em massa de Nachingwea foi o maior de todos e que à semelhança dos anteriores teve como principal objectivo “humilhar publicamente os prisioneiros antes da sua execução; talvez como aviso dirigido aos que se opunham à política da Frelimo”, refere ainda Ludovick S. Mwijage, autor do livro “Julius K Nyerere – Servant of God or Untarnished Tyrant”.

O papel desempenhado pelo regime de Julius Nyerere naquilo que já é conhecido em instâncias de Direito internacional como o “Processo de Nachingwea” é um dos temas tratados num livro acabado de publicar com o título, “Julius K Nyerere – Servant of God or Untarnished Tyrant”. O autor, Ludovick S. Mwijage, faz um historial dos chamados julgamentos de Nachingwea, organizados pela Frelimo em estreita colaboração com as autoridades tanzanianas no antigo centro de preparação político-militar da Frente de Libertação de Moçambique, situado em território tanzaniano.

Antigo prisioneiro político, que chegou a estar detido no campo de detenção de Oyster Bay, em Dar-es-Salam, Mwijage refere que os julgamentos de Nachingwea surgiram na esteira de três outros, organizados pelo regime de Nyerere. O julgamento em massa de Nachingwea, segundo narra o autor, foi o maior de todos e que à semelhança dos anteriores teve como principal objectivo “humilhar publicamente os prisioneiros antes da sua execução; talvez como aviso dirigido aos que se opunham à política da Frelimo”.

Ludovick S. Mwijage afirma que o Reverendo Uria Simango, uma das proeminentes figuras políticas presentes nos famigerados julgamentos de Nachingwea, foi raptado no Malawi por agentes da Frelimo que “trabalhavam em estreita colaboração com a polícia política tanzaniana, Usalama wa Taifa (UwT)”. Acrescenta o autor: “Tal como nos julgamentos em massa que precederam o de Nachingwea, o Reverendo Simango foi forçado a ler em público uma confissão redigida, na qual ele implica a sua pessoa e as de outros no assassinato do Dr. Mondlane.”

O autor salienta ser “difícil discernir como é que uma tal ‘confissão’ poderia ter sido extraída de Simango (ou dos demais prisioneiros) sem recurso à coação, especialmente ao se examinar as circunstâncias envolvendo o seu afastamento da Frelimo e, o que é crucial, a forma como foi raptado do exílio”. E autor frisa que a tortura, como forma de se extraírem confissões, era uma prática rotineira na Tanzânia , país em que o Reverendo Simango foi interrogado antes de ter comparecido nos julgamentos em massa de Nachingwa.

O Inferno na Terra

O destino dado às vítimas do Processo de Nachingwea, que para além de Uria Simango incluíam pessoas como Joana Simeão, Paulo Gumane, Eugénio Zitha, Arcanjo Faustino Kambeu e Gwengere, foi outro dos temas abordados pelo autor do livro a que temos vindo a fazer referência. “Os campos de reeducação para onde as vítimas de Nachingwea foram enviadas, eram uma reminiscência dos Gulags de Joseph Stalin. Milhares de pessoas foram desterradas para esses campos e muitos deles não saíram de lá com vida durante o regime tirânico de Machel”, escreve o autor. Debruçando-se sobre as condições prevalecentes nesses redutos, o autor cita o Coronel Mbuta das Forças Populares de Defesa da Tanzânia (TPDF) que em 1978 visitou alguns dos campos de reeducação instituídos pelo regime da Frelimo em Moçambique. Em conversa amena durante uma recepção no Hotel Turismo (actualmente Hotel IBIS) em Maputo, o Coronel Mbuta frisou que esses redutos “não deviam ser confundidos com campos de férias. Eles são como o inferno na terra”.

O autor de “Julius K Nyerere – Servant of God or Untarnished Tyrant” tentou obter depoimentos de entidades oficiais moçambicanas directamente ligadas ao Processo de Nachingwea a fim de esclarecer as circunstâncias da prisão e posterior execução de pessoas como Celina Simango e Lúcia Casal Ribeiro. Entre as entidades abordadas por Ludovick S. Mwijage conta-se o coronel na reserva, Sérgio Vieira. Numa carta enviada a Sérgio Vieira por correio electrónico, com a data de 17 de Julho de 2010, o autor recordou que “o destino das vítimas havia sido selado na Tanzânia”; que “não teriam sido mortas se o regime de Nyerere não as tivesse entregue à direcção da Frelimo”; e que esse mesmo regime “não havia recusado dar permissão para que os julgamentos em massa decorressem em território tanzaniano”; para além de ter “concedido apoio logístico para transportar os prisioneiros para a sua iminente morte”.

Em resposta à missiva do autor de “Julius K Nyerere – Servant of God or Untarnished Tyrant”, Sérgio Vieira, criando um precedente em Direito, afirmou em tom lacónico: “Como pessoa privada que deixou de fazer parte do governo em 1987, não estou em posição de responder. Queira fazer o favor de contactar o governo.”

13/12/2010- CanalMoz

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