28 fevereiro 2013

GUNGUNHANA "ERA FILHO DO REI DE PORTUGAL!"


GUNGUNHANA "ERA FILHO DO REI DE PORTUGAL!"


Assim foi apresentado o dono do vasto império vátua - que no século  XIX englobava grande parte do território de Moçambique - na cerimónia que assinalou os 110 anos da batalha de Chaimite, decorrida no passado dia 28 de Dezembro, no Museu Militar, em  Lisboa.
O que aconteceu então para que este "filho do rei de Portugal", admirado e respeitado tanto pelas tribos nativas como pelas potências estrangeiras da altura, tenha sido capturado e enviado para Lisboa
onde foi humilhado e vergonhosamente exposto à população após a sua chegada?

Texto de Sílvia Fernandes

Fotos de Gil Garcia e Arquivo Pessoal
A resposta surgiria no decorrer da própria cerimónia no Museu Militar, através do orador, coronel  Américo José Henriques. Entre a assistência, sentados lado a lado, os descendentes de Gungunhana e de Mouzinho de Albuquerque, o imperador africano detido e o oficial português  que o deteve. Um cenário que muitos defendem ser possível apenas entre os portugueses, cujos laços amigáveis criados com os povos em tempos colonizados prescindem de teorias, estudos e discursos políticos, podendo ser facilmente testemunhados em momentos como este.
Maria Júlia e Maria Manuela são filhas de Eugenia, neta de Gungunhana e de uma das mulheres que com ele terão desembarcado em Lisboa em Março de 1896. Do lado de Mouzinho de  Albuquerque, está Miguel Sanches de Baêna, descendente indirecto, uma vez que o oficial português não chegou a ter filhos. A cerimónia prossegue. "Gungunhana era como um filho do rei de Portugal, assim como já haviam sido o seu avô, Manukuse e o seu pai, Muzila", continua Américo Henriques.
Manukuse, membro de um dos ramos da tribo zulu, foi o fundador do Império dos vátuas, povo  altivo, guerreiro. Através de massacres das tribos rivais, ou de alianças estratégicas, entre as quais com o rei de Portugal, Manukuse consegue estender o seu império desde o Zambeze até à região de Lourenço Marques (actual Maputo), abrangendo parte do território de Moçambique, África do Sul e Rodésia (actual Zimbabué). Quando morre, em 1858, o seu filho Muzila envolve-se numa guerra sangrenta com o irmão pelo poder e é graças ao apoio dos portugueses, nomeadamente ao arsenal oferecido, que consegue subir ao trono. Após a sua morte, é a vez de o filho, Gungunhana, disputar o trono com os irmãos, tornando-se imperador depois de mandar assassinar Mafe-mane, herdeiro legítimo. Dono de um vasto império, Gungunhana desperta o interesse dos ingleses e dos colonos sul--africanos, particularmente de Cecil Rhodes e da South African Company, que vêem nos portos moçambicanos de Lourenço Marques e Beira dois pontos estratégicos para o escoamento das matérias-primas do Transval. E Gungunhana estava a meio caminho, podendo ser um aliado poderoso para se chegar ao litoral moçambicano, então sob administração portuguesa.
"É a intriga internacional que faz com que Gungunhana atraiçoe os acordos que mantinha com a  coroa portuguesa". Através de constantes "embaixadas", nomeadamente inglesas e alemãs,  enviadas para junto do imperador africano, a relação com os portugueses é "envenenada". "Foram  os interesses internacionais que viraram os africanos contra os portugueses", afirma Américo Henriques, acrescentando de seguida que infelizmente, a história repetiu-se" décadas mais tarde. E como diz um velho ditado africano numa cheia de duplicidade, conforme escreveu Georges  Liengme, missionário que conviveu de perto durante três anos com o imperador vátua.
A gota de água em relação à coroa portuguesa acontece em finais de 1894, quando, mais uma vez  instigados por forças estrangeiras, os guerreiros vátuas atacam a linha dos caminhos-de-ferro às  portas de Lourenço Marques. A notícia surge na imprensa europeia da época com grande impacto, tentando mostrar Portugal como uma potência fragilizada, incapaz de garantir, não só a segurança  das populações não negras da região, como também incapaz de garantir a segurança do transporte  de mercadorias, sector vital para a presença europeia em África. O rei decide contra-atacar e envia António Enes como comissário régio para tentar resolver a situação no local. "António Enes não  era um militar, mas era um profundo conhecedor da realidade africana, com uma grande visão  estratégica, que soube escolher uma elite militar para o acompanhar na sua missão", explica  Américo Henriques. António Enes tinha duas hipóteses: ou ia directamente a Manjacaze, "capital" do império vátua - opção arriscada dado o elevado número de régulos tribais aliados ao imperador  que iria encontrar pelo caminho - ou criava uma série de pontos fortificados, apertando aos poucos  o cerco a Gungunhana, levando-o assim a uma submissão pacífica. Optando por esta segunda solução, as forças portuguesas dividiram-se em três colunas que avançariam para o interior do continente ao longo das margens de três rios, criando uma cintura a Manjacaze: a sul, o Incomati;  no centro, o Limpopo; e um pouco mais a norte, o Inharrime. Mouzinho de Albuquerque integrava  esta última força, que partiu de Inhambane.


EXPEDIÇÃO PUNITIVA
Dia 2 de Fevereiro 1895. A algumas dezenas de quilómetros de Lourenço Marques, a coluna que  subia pelo Incomati trava a batalha de Marracuene. "Neste combate batemo-nos em quadrado e  suportámos um assalto violentíssimo - numa proporção de 30 para um - chefiado por dois dos  régulos mais importantes da região: Mazulo e Matibejana", conta Américo Henriques. Apesar da  vitória das forças portuguesas chefiadas por Caldas Xavier, cujo impacto se fez sentir na imprensa  europeia, os dois régulos conseguem fugir. No entanto, perante as potências estrangeiras, a imagem de Portugal sai reforçada e a campanha prossegue. A Gungunhana é dada a oportunidade de entregar os dois régulos, que, entretanto, se refugiam em Manjacaze. Seria como uma prova de  boa vontade do imperador africano para com a coroa portuguesa. Até porque os dois homens haviam também estado envolvidos no ataque ocorrido em 1894 contra à linha-férrea.
"No entanto, ele recusou entregá-los. Se o fizesse perdia a confiança dos outros régulos seus  subordinados. E assim ficou em posição frontal connosco", explica Américo Henriques, acrescentando que "foi então que nós decidimos preparar uma expedição punitiva a Manjacaze para o Outono de 95, para capturá-lo." Esta expedição, que deveria seguir pelo rio Inharrime, foi atrasada por diversas vezes por dificuldades logísticas. Entretanto, a coluna que subia pelo  Incomati chega a Magul, onde trava nova batalha. Mais uma vez, as forças portuguesas, agora comandadas por Aires de Orneias, saem vitoriosas e a notícia volta a espalhar-se. Encorajada com este resultado, a coluna de Inharrime decide avançar no terreno, apesar do fraco apoio logístico.
Ao seu encontro, Gungunhana, envia um grupo de guerreiros chefiados pelo seu filho Godide, e as duas forças acabam por se confrontar em Coolela, tendo os portugueses alcançado nova vitória.
Gungunhana, ao tomar conhecimento do resultado da batalha, decide fugir e quando o coronel Rodrigues Galhardo, que chefiava a coluna de Inharrime, entra com as suas tropas em Manjacaze,  este está deserto.
Por esta altura, António Enes regressa a Portugal para apresentar o seu relatório ao rei. Mas antes  cria um novo distrito, o de Gaza (até então só existiam o de Lourenço Marques e Inhambane),  nomeando como governador Mouzinho de Albuquerque, a quem deixou ordens expressas para capturar Gungunhana. Também data desta altura a transferência da sede do Governo de Moçambique, da ilha para Lourenço Marques. "O governador, antes da chegada do comissário régio, era o coronel Fernando de Magalhães, que, tal como os seus antecessores, vivia na ilha de  Moçambique. Aí é que era a sede do governo de Moçambique. O António Enes tirou o Governo  da ilha e levou-o para Lourenço Marques, para o sul, para o campo da batalha", explica Américo Henriques.

CAPTURA EM CHAIMITE
Entretanto, vendo o avançar das tropas portuguesas, o imperador vátua manda entregar um dos  régulos, Matibejana, oferece marfim e outro tipo de riquezas e até envia o seu filho Godide como  sinal de boa vontade, mas já de nada lhe vão servir estas atitudes. "O objectivo agora era, única e  exclusivamente, a sua captura", afirma Américo Henriques. Só que Gungunhana estava desaparecido desde a batalha de Magul, enquanto que, do lado português, a campanha para tentar apanhar o "Leão de Gaza" continuava. Até que um dia, num dos pontos fortificados ao longo da linha do Limpopo , surge um indígena de nome Hassane, com uma informação valiosa: Gungunhana está  escondido em Chaimite, panteão vátua, onde se encontram enterrados o seu avô, Manukuse e o seu pai, Muzila. Mouzinho de Albuquerque toma conhecimento da notícia, sabe que tem de agir rapi-damente, mas não tem tropas suficientes para empreender um ataque massivo ao último reduto vátua. Mesmo assim, decide pegar em 46 homens e avançar, entrando em Chaimite no dia 28 de Dezembro de 1895. Ninguém sabe muito bem por que é que os cerca de 300 guerreiros vátuas não  dispararam sobre os homens de Mouzinho de Albuquerque. "Terá sido do factor surpresa ou tão  pura e simplesmente da ousadia do oficial branco?" A verdade é que, "muito superiores em  número, poderia ter sido um verdadeiro banho de sangue, mas em Chaimite apenas morreram dois  homens, conselheiros de Gungunhana, fuzilados pelas tropas portuguesas", explica Américo  Henriques. Quando Gungunhana sai da sua palhota, Mouzinho ordena que lhe amarrem as mãos.
Depois exige que Gungunhana se sente no chão, algo impensável para um imperador. Perante a  recusa deste, afirmando que o chão estava sujo, Mouzinho obriga--o a sentar-se à força como sinal de submissão. Assim foi capturado o temido «Leão de Gaza».
"A captura de Gungunhana foi trágica, mas teve de ser. Sobretudo porque a situação do ponto de vista internacional era tão precária para Portugal que nós tínhamos que mostrar aos estrangeiros,  com determinação e até com uma certa crueldade, a nossa posição ou eles não nos aceitavam",  sublinha Américo Henriques, acrescentando que "a nossa filosofia de colonização foi sempre  branda e a ideia deles era violenta. E nós tivemos também que ser violentos para eles nos  respeitarem. Os estrangeiros, não os nativos, que esses sempre nos conheceram da mesma maneira.
Esta é a verdade de 1895", conclui. Terminada a apresentação, ao sabor de um Porto, Maria Júlia e  Maria Manuela, bisnetas de Gungunhana, Miguel Sanches Baêna, descendente de Mouzinho de  Albuquerque, e ainda os descendentes do régulo Matibejana, vindos propositadamente dos Açores para esta   cerimónia, brindam aos seus antepassados e trocam, entre sorrisos e abraços, as suas próprias  versões dos acontecimentos. Passaram-se 110 anos. Estamos no Museu Militar, em Lisboa.

REVELAÇÕES
Maria Manuela e Maria Júlia nasceram e cresceram em Portugal. Sempre souberam  da sua ascendência através das histórias que a mãe, Eugenia, lhes contava na infância, histórias essas marcadas pela imposição do silêncio. "Não deveríamos falar do assunto", conta Maria Júlia. Porquê? "Talvez por vergonha, não sabemos muito bem, a verdade é que desde pequenas a nossa mãe dizia que não devíamos falar do assunto." Talvez por isso, também, só muito recentemente tenha surgido algum  interesse pela figura do bisavô. Aconteceu por uma ironia do destino, no Verão de 2005. O filho de Maria Manuela estudava na base do Alfeite e o seu superior era o comandante Luís Sanches de Baêna. "Por um acaso, descobriram que estavam frente a frente como descendentes de dois grandes rivais: Gungunhana e Mouzinho de Albuquerque. "Depois disso surgiu o convite para participarmos nas comemorações dos 110 anos da batalha de Chaimite, no Museu Militar", explica Maria Júlia. E a pergunta impõe-se: Qual a sensação ao sentar ao lado do descendente do homem que capturou o vosso bisavô? Depois de alguns segundos,  a resposta surge acompanhada de uma lágrima. "Uma grande emoção. Ficámos sentadas à frente, no lugar dos generais, e não estávamos a contar com aquela honra. Foi uma mistura muito grande de sensações. Não há revolta, não há  ressentimentos, o que existe é uma grande curiosidade para nos conhecermos  melhor."

UMA IMPERATRIZ PARA MOÇAMBIQUE?
Maria Manuela e Maria Júlia terão sangue régio a correr-lhe nas veias. Maria  Manuela ainda conheceu a terra do seu bisavô, quando, entre 1972 e 1976, acompanhou o marido destacado em serviço para Moçambique. Os seus dois filhos nasceram em Nampula e "o amor por aquela terra era tão grande que se não fosse a independência teria ficado por lá", conforme nos confessa. Maria Júlia, pelo  contrário não conhece Moçambique. Mas recorda-se bem da cerimónia solene da trasladação dos restos mortais do seu bisavô, dos Açores para Maputo, em 1985.
"Nessa altura, ainda se pensou falar com as autoridades moçambicanas, para nos darmos a conhecer, mas acabámos por não fazer nada", conta. O silêncio  manteve-se. Algum tempo mais tarde, uma equipa de cientistas açorianos revelava que as ossadas enviadas para Moçambique não pertenciam a Gungunhana.
Mesmo assim, Maria Júlia não esquece a forma como o Governo moçambicano, após a independência, enalteceu a figura do bisavô, como símbolo da luta anti colonialista. Então e por que não solicitar o reconhecimento como uma das herdeiras do império vátua? "Não pensei nisso, mas de qualquer maneira gostava muito de poder ir até lá e conhecer aquela terra", desabafa Maria Júlia. Aqui fica o recado.
Entretanto, se as ossadas que foram trasladadas para Moçambique eram falsas... podemos concluir que os restos mortais do último grande imperador vátua  continuam a descansar nos Açores, em solo português!...

TROFÉU DE GUERRA
Apesar de apelar ao silêncio, Eugenia, neta de Gungunhana e  mãe de Maria Manuela e Maria Júlia deixou algumas histórias do  seu régio antepassado. "O que nos foi contado foi que de facto ele  foi maltratado à sua chegada a Portugal. Terá sido exposto numa  carruagem transformada em jaula, que percorreu algumas ruas da  Baixa de Lisboa, onde foi vaiado e humilhado", diz Maria Manuela.
Os relatos da época também confirmam esta versão. O vapor  "África", depois duma viagem de dois meses desde Lourenço  Marques, entra no Tejo em Março de 1896. A população lisboeta  enche as ruas para ver o "trofeu de guerra", a "fera cruel", como é chamado por alguns jornais da época. Com ele terão  desembarcado outros prisioneiros, entre os quais o filho Godide, o régulo Matibejana e sete mulheres que a imprensa descreve com "ar altivo, feições  finas e bonitas".
Depois do cortejo, seguem para o forte de Monsanto, onde ficam detidos durante três meses antes de serem desterrados para a ilha Terceira, nos Açores. As mulheres terão permanecido em Monsanto, depois enviadas para S. Tomé e Angola. Nos  Açores, Gungunhana viverá ainda dez anos, onde aprende a ler e a escrever, e é  baptizado com o nome de Reynaldo Frederico. Nos seus últimos anos de vida, tornase numa atracção turística, gozando duma liberdade limitada. O objectivo terá sido mostrar à Europa que o grande "Leão de Gaza" tinha sido dominado, estava circunscrito, sem ser maltratado. "Nos Açores, não há registo de que tenha sido maltratado", conta Maria Júlia. "Sabe-se que se passeava pela ilha Terceira. As potências estrangeiras não podiam dizer que estava a ser maltratado, mas ao mesmo tempo não podiam contar mais com este aliado para as suas campanhas em África", concluem as bisnetas do grande "Leão de Gaza". No dia 23 de Dezembro de 1906, Gungunhana, ou Reynaldo Frederico, falece no hospital militar de Angra do Heroísmo, vítima duma hemorragia cerebral.

O COLONIALISMO NUNCA EXISTIU! – ENTREVISTA COM O AUTOR


O COLONIALISMO NUNCA EXISTIU! – ENTREVISTA COM O AUTOR


No seu novo livro, O Colonialismo Nunca Existiu! Colonização, Racismo e Violência: Manual de Interpretação (Gradiva, 2013), Gabriel Mithá Ribeiro questiona interpretações que desde há muito tínhamos por adquiridas, na Academia e fora dela.
O livro é indissociável da trajectória biográfica de Gabriel Mithá Ribeiro e do trabalho de campo que realizou [vem realizando] em Moçambique, desde 1997. Polémico, controverso, talvez até provocatório.
O seu livro tem um título bombástico, «O Colonialismo Nunca Existiu!», que parafraseia, acrescentando-lhe um ponto de exclamação, o título do célebre ensaio de Eduardo Lourenço, O Fascismo Nunca Existiu. Até que ponto ou em que medida podemos afirmar que o colonialismo nunca existiu? É que até na nossa Constituição, no seu artigo 7º, fala em «colonialismo»!
Podemos afirmar que o «colonialismo» nunca existiu até ao ponto em que sejamos capazes de separar, por um lado, o discurso voltado para a instrumentalização do saber com propósitos de intervenção política na realidade imediata de, por outro lado, o discurso ou o pensamento que procure racionalizar os fenómenos sociais e históricos de forma descomprometida e orientado pelo sentido de neutralidade axiológica, como teorizou Max Weber. A palavra «colonialismo» tem inevitavelmente associada a ideia de se segmentar as sociedades, os seus fenómenos e as suas histórias, em inocentes e vítimas. Descontando casos radicais como a inquisição, o nazismo ou o estalinismo, o conhecimento, para ser conhecimento, tem de se libertar do tribunal da história, do tribunal da sociologia, do tribunal da antropologia e assim por diante. Na utilização do termo «colonialismo» mesmo que exista uma parte de razão de ser porque, sem dúvida, qualquer colonização envolve dimensões de violência sobre os colonizados, a ideia de «colonialismo» esgota a complexidade desse tipo de processos históricos na dimensão negativa. Mas em geral, e muito em particular no caso europeu, a colonização ou as colonizações sempre foram muito mais do que isso. Por outro lado, tem de se considerar que o fenómeno da colonização é tão antigo quanto a própria história e foi dos que mais contribuiu para a transformação dos povos. Os critérios e demais instrumentos de análise não podem ser selectivos, isto é, diferentes consoante os ocidentais sejam colonizados ou quando passam ao papel de colonizadores. A história também existe para interpretar fenómenos deste tipo na longa duração. Essa é, aliás, a sua especialidade. O que se verifica é que quando ocorreu a inversão histórica dos europeus passarem de colonizados a colonizadores, e aqui gostaria de destacar o caso dos portugueses, e quanto mais nos aproximamos do século XX, mais se substitui o termo «colonização» pelo correspondente valorativo e depreciativo «colonialismo». E mesmo que se se quisesse ser valorativo, a história e a civilização europeias são de tal modo complexas, tendo oscilado quase sempre entre o bem e o mal (às vezes absolutos), que truncar aprioristicamente uma dessas dimensões na análise de fenómenos complexos de longa duração no tempo induz a deturpação da percepção das realidades enquanto totalidades. Portanto, a ideia de «colonialismo» limita o olhar apenas ao que é negativo e daí que seja, de alguma forma, um conceito adjectivado, isto é, inútil. A colonização europeia em África ou nas Américas, como a colonização romana ou a árabe na Europa e ao longo do Mediterrâneo, não merecem tamanha selectividade ou parcialidade.
O livro agrega três textos, cada qual com uma estrutura própria e a defesa de uma ideia. Quer-nos descrever um pouco melhor o seu conteúdo?
O livro é constituído por três ensaios que se explicam uns aos outros e que correspondem, mais ou menos, a escrever sobre o essencial sobre a colonização, o essencial sobre o racismo e o essencial sobre a violência. Para ser mais preciso, o conteúdo do livro tem a ver com o modo como as universidades, na área das ciências sociais e humanidades, têm elaborado conhecimentos em torno desses temas, conhecimentos que, depois, modelam o pensamento de senso comum e, por essa via, condicionam a vida social. Claro que sobre cada um dos assuntos em causa é possível escrever uns quantos volumes. Mas o que me interessava era focar a atenção, minha e dos leitores, apenas no essencial. Trata-se, em qualquer dos casos, de fenómenos sociais pesados, problemáticos, complexos e, muitas vezes, tratados com excessos de jargão académico. Pretendi fazer uma abordagem que fosse densa de ideias e de rigor terminológico, mas ao mesmo tempo de leitura apelativa para académicos e sobretudo para a opinião pública em geral. Daí a opção por três textos breves sobre três grandes temas. E fi-lo também porque uma das razões que fragiliza a qualidade do saber sobre as sociedades é a opinião pública comum, muitas vezes, não manifestar interesse ou olhar com alguma desconfiança para o trabalho produzido nas universidades. Em sociedades cada vez mais escolarizadas e qualificadas, tentar reforçar o elo com a opinião pública é fundamental na área das ciências sociais e humanidades. A qualidade e o valor do saber sobre as sociedades e sobre a condição humana depende da amplitude da circulação de ideias envolvendo as pessoas comuns. Claro que vários académicos têm mantido essa preocupação, mas só uma parte é inovadora. O meu livro não é mais do que um contributo nesse sentido. Acrescento que o preço da internacionalização do saber académico está a levar a que se use e abuse das publicações em inglês, mesmo quando estão em causa estudos sobre sociedades que têm outras línguas maternas. Significa excluir as pessoas comuns do acesso a um saber que lhes diz directamente respeito, que tem a ver com as suas vidas e sociedades. Se o conhecimento escrito estiver bem elaborado, será tanto útil para leigos, quanto para doutos, mesmo que seja exigente. Essa é uma marca das sociedades escolarizadas a que o trabalho universitário deve dar mais atenção. É uma forma nobre de respeitar as sociedades. Isto não é uma crítica à internacionalização do saber. Mas importa que sejamos ponderados, verificando até que ponto o padrão dos idiomas internacionais é útil, até porque o português é um deles.
No final, termina com uma condenação da violência, seja ela qual for, dizendo, na última frase «não existe violência boa e violência má». Considera que a violência é sempre ilegítima? Mas, assim sendo, como deveremos enquadrar a violência dos movimentos anticoloniais?
Não pretendo ser moralista na matéria até porque a ideia de estado enquanto instituição reguladora da vida das sociedades implica inevitavelmente a existência de uma violência legítima. O que está em causa nessa frase é a violência enquanto instrumento de transformação social. É para mim um dado adquirido que a violência, a esse nível revolucionário, é em absoluto condenável. Todavia, trata-se de uma conquista da história que se aplica ao presente e não é indiferente ao factor tempo quando a projectamos no passado. Num contexto em que o padrão eram as ditaduras, a dominação colonial, o apartheid ou a guerra fria, admito que a luta pela justiça social em determinados contextos pudesse legitimar a violência enquanto prática que visava alvos específicos e para atingir propósitos bem determinados de maior dignificação de pessoas e sociedades. Com isso pretendo distinguir, por um lado, a violência que tenha um fundo de legitimidade de, por outro, a violência indiscriminada que sustenta o terrorismo. O último é sempre ilegítimo. Mesmo no contexto a que me reporto e que marcou a época contemporânea até à última década do século XX, Gandhi, Martin Luther King ou Nelson Mandela foram capazes de enveredar por métodos não violentos e, por isso mesmo, bem mais legítimos, bem mais humanos, bem mais sustentáveis no tempo, bem mais construtivos. A questão é que no século XXI, o século pós-colonial, pós guerra fria e pós apartheid, o século em que a democracia se tornou um modelo hegemónico não violento de gestão das relações de poder dentro e entre as sociedades, voltar a convocar a violência como forma de legitimação do que quer que seja parece-me aberrante. Essa frase «não existe violência boa e violência má», tal como surge no livro, tem também a ver com o problema da falta de autonomia em algumas áreas das ciências sociais e humanidades entre o campo político ou do activismo cívico e o campo do saber académico propriamente dito. Uma parte do trabalho académico não só não se liberta dessa associação, como tende a reforçá-la. Isso pode ser útil para o debate e para a acção política, mas é extremamente prejudicial para a qualidade do conhecimento e para a credibilidade do trabalho universitário.
Trata-se de um livro controverso. Que reacção espera vir a ter e que críticas antecipa?
É muito difícil fazer previsões sobre o modo como as pessoas vão reagir ou sobre o impacto que o livro possa ter. De qualquer modo, no meu ponto de vista a obra não é controversa, antes inovadora na perspectiva em que aborda os temas, uma vez as reflexões são sustentadas num trabalho académico que se estende por mais de uma década. E não se pode confundir o título da obra com o conteúdo. O título é apenas um sinal de chamada à leitura e à reflexão. Quem abordar o conteúdo com intenção de captar o que está para lá do rótulo, perceberá que este é um livro que tenta ser sobretudo racional, equilibrado, pensado, cuidado, respeitador de diferentes sensibilidades. Claro que ser o autor a dizer isto pode não ser muito credível, posto que ninguém é bom juiz em causa própria. Mas é o que penso. Até porque o livro visa exactamente separar o pensamento livre e crítico do pensamento emotivo, valorativo ou activista. Quando estão em causa questões sociais sensíveis como a colonização europeia, o racismo ou a violência, as sociedades, e estranhamente as universidades, habituaram-se a viver de tal maneira dominadas pela dimensão emotiva ou afectiva que as leva a que não consigam pensar certo tipo de assuntos com distanciamento crítico. Conseguir isso seria fazer avançar efectivamente o pensamento para o século XXI. Como na alegoria da caverna, quem vive por hábito num certo ambiente pode não se aperceber da sua natureza. E esse ambiente emotivo, afectivo ou valorativo que nos dominada quando estão em causa certos temas relevantes para a vida social é precisamente o maior obstáculo à renovação do saber e, por essa via, um forte obstáculo à reinvenção do social que aponte para o reforço da maturidade na relação entre povos e no interior das próprias sociedades. Isso não se consegue sem a renovação do saber. Não temos de renegar o conhecimento que está para trás. Apenas renovar a abordagem crítica a partir do presente para o passado. Num outro plano, suponho que a melhor resposta às interpelações suscitadas por este livro não é responder de imediato e com paixão. Isso significará que não conseguimos sair do mesmo. A forma mais séria de resposta ao livro da minha parte e de quem o criticar é reforçar e renovar a investigação académica nas áreas abordadas no livro para ver até que ponto as ideias que ele defende serão fiáveis. Tal não se resolve com meros «acho que» ou «não concordo» que muitos prontamente disparam antes de ler, antes de pensar, antes de estudar empiricamente os assuntos. Se cheguei a este ponto foi porque tive essa preocupação durante muito tempo. Pessoalmente, sinto que este não é um livro do fulgor da juventude intelectual, antes da tranquilidade de alguém que, dentro das suas muitas limitações, sabe que atingiu uma certa dose de maturidade para pensar e escrever com convicção sem atentar contra a dignidade dos outros, seja dos antigos povos colonizados (essa é a minha origem), seja das minorias raciais (em qualquer parte do mundo onde viva eu e pessoas como eu jamais deixaremos de pertencer a uma minoria).

António Araújo – nasceu em Lisboa, em 1966. Jurista e historiador, autor de vários livros e artigos sobre Direito Constitucional, Ciência Política e História Contemporânea. Edita actualmente o blogue Malomil.

26 fevereiro 2013

NOVO ROMANCE DE MIA COUTO PROCURA DESVENDAR A FIGURA DE NGUNGUNHANA


NOVO ROMANCE DE MIA COUTO PROCURA DESVENDAR A FIGURA DE NGUNGUNHANA 


O escritor moçambicano Mia Couto está escrever um romance que abordará "as construções mitológicas sobre o império de Gaza", que se localizou no sul de Moçambique, em que pretende questionar o personagem de Ngungunhana.

"Há pinturas que são feitas (à volta da figura do imperador Ngungunhana) e a pergunta é essa: quem era esse verdadeiro personagem do Ngungunhana?", diz Mia Couto, em entrevista exclusiva à Lusa, sobre a nova produção literária.
O escritor mais traduzido de Moçambique está, desde o ano passado, a escrever o livro, que, garante, "muito certamente não será acabado este ano", pelo que pretende trabalhar o romance ainda sem título mais um ano.
"A grande preocupação que eu tenho é mostrar que essa História, a grande História com H maiúsculo, a história oficial de um país é sempre construída - não só no nosso caso, em todos os casos do mundo - a partir de pequenas mentiras, pequenas ilusões. A necessidade de fabricarmos grandes heróis, personagens que estão acima de um humano tem que ser de alguma maneira desconstruída", diz.
Contudo, assinala Mia Couto, a ideia não é atacar os mitos, porque, diz, entende "que um país precisa de heróis, mitos fundadores, mas, por outro lado, é preciso que a gente saiba que eles são fabricações".
As proezas de Ngungunhana já tinham sido narradas em livro, em 1987, pelo escritor moçambicano Ungulani Ba Ka Khosa num romance intitulado Ualalapi, que, em seis episódios, narra os excessos daquele chefe após assumir o trono do império de Gaza, substituindo o seu irmão.
"O Ualalapi foi um grande livro inspirador para este mesmo livro. Esta desconstrução da imagem que foi construída ideologicamente do Ngungunhana, quer dizer, é muito curioso, porque a personagem Ngungunhana é reconstruída do ponto da elaboração mítica, tanto pelos portugueses, como por nós, moçambicanos", afirma Mia Couto.
O romance de Ungulani Ba Ka Khosa integra a lista dos 100 maiores romances do século passado. 
  • Lusa




PRISÃO DE GUNGUNHANA FOI UM “GOLPE DE SORTE”, AFIRMA HISTORIADOR



Mouzinho de Albuquerque "seria hoje condenado por crimes contra a humanidade", afirmou o historiador Paulo Jorge Fernandes, autor de uma nova biografia do militar que prendeu Gungunhana e garantiu o domínio português sobre Gaza (Moçambique).
Intitulado "Mouzinho de Albuquerque - Um soldado ao serviço do Império", o livro procura "contextualizar Mouzinho na mentalidade da época em que viveu".
"Mouzinho de Albuquerque hoje seria condenado por crimes contra a humanidade, falando de uma forma ligeira, mas na sua época os seus actos não foram interpretados de tal forma, pois o contexto mental e social era diferente", declarou.
A operação militar em Chaimite foi o culminar de um conjunto de vitórias militares ao longo de 1895, depois de sucessivas derrotas das tropas portuguesas, no contexto do Ultimato e da Conferência de Berlim. 
O investigador sublinhou que a detenção de Gungunhana, conhecido como “o Leão de Gaza”, em 1895, "foi um golpe de sorte e não passou de uma bravata militar em que não participaram mais de meia centena de homens e não houve qualquer chacina dos dois lados", declarou.

Após a sua captura, Gungunhana foi despojado dos seus haveres, afastado das suas tradições, transportado para Portugal, onde sofreu humilhações públicas. Com este feito, Portugal garantiu o domínio sobre Moçambique.
Fundado por um ramo zulu fugido à guerra que alastrava a Sul, o reino de Gaza sobreviveu à cobiça europeia durante mais de sete décadas.
Quando Gungunhana foi preso por Mouzinho de Albuquerque em Chaimite, em 1895, parte do seu exército ainda conquistava terreno aos tsongas, aos chopes, aos vandaus e aos bitongas, empurrados sucessivamente para Norte.
No seu esplendor, o império de Gaza espraiava-se do rio Incomáti à margem esquerda do Zambeze, do oceano Índico ao curso superior do rio Save. Era o segundo maior reino africano do século XIX, um território que, no mapa actual, ocuparia mais de metade de Moçambique e um bom pedaço do Zimbabué, entrando ainda pela África do Sul. Há cem anos, tinha uma população entre os 500 mil e os dois milhões de habitantes.
Rádio de Moçambique – 28.05.2010

"EU QUERO OS MEUS HERÓIS"


GENES MACUA  de: Sebastião Cardoso
Eu quero os meus heróis. Gungunhana, era neto de Soshangane, um general zulu que se revoltou contra o Imperador Tchaka.
Derrotado por este, em 1819, foge com o seu exército para Moçambique, subjugando, submetendo e absorvendo numerosos povos especialmente na área costeira desde o Limpopo ate ao Save, fundando, assim, o Império de Gaza. Humilhou, varias vezes, os portugueses, conquistando Lourenço Marques e Inhambane. A questão aqui é: Soshangane pode ser considerado uma figura da nossa Historia com que papel? Invasor zulu ou fundador machangane? Morre em 1858, sucedendo-lhe Muzila.
Vou saltar Muzila e escrever um pouco sobre o neto, Gungunhana, cuja fama ultrapassou fronteiras.

Após a morte de seu pai, em 1884, não sendo ele o legitimo herdeiro, assassina o seu irmão e obriga os outros dois a fugirem para o exílio.
Um fratricida no poder...arrepiante mas, nenhuma novidade na História do mundo.
Iniciam-se, 10 anos de terror, especialmente entre as populações.  Até hoje, estranhamente, até os maronga e matswa partilham ressentimentos e, dificilmente, se identificam com os machanganes. Porque com as duas potencias estrangeiras interessadas na região, Gungu ia fazendo acordos, que nunca cumpria. Os portugueses davam-lhe aguardente e os ingleses libras de ouro.
Existem registos de algumas batalhas contra os portugueses, sempre com o heróico povo maronga na linha da frente, mas o balanço é francamente negativo, contrariamente ao seu avô. Chegou a ser nomeado Coronel do exercito português, recebeu a farda e uma bandeira!!! Pouco tempo depois, queimou estes dois símbolos de submissão, invocando que passavam doenças venéreas as suas mulheres.
Hilariante.
Jogando com um pau de dois bicos, ora juntava-se aos portugueses, ora juntava-se aos ingleses e manteve-se no poder até 1895.
E' abandonado pelos ingleses, cansados das suas qualidades camaleonicas e as atitudes de alcoólatra teem como consequência um exército completamente fragmentado, esfomeado e desmotivado.
Chegando esta oportunidade, os portugueses, comandados por Mouzinho de
Albuquerque ( o que levou tareia em Nampula) marcham em sua perseguição e
capturam-no à mão, em Chaimite, local sagrado onde seu avô estava sepultado.
É exibido em Lourenço Marques como troféu às populações, num acto politico de
vitoria.
Dão-lhe o estatuto de prisioneiro politico, enviam-no para Lisboa com as suas 7 mulheres e um cozinheiro. Ali, é, novamente exibido em público com a mesma finalidade política. O Leão de Gaza, está horrorizado. Chora, manda-se para o chão, promete o que já não tem: ouro, marfim, escravos, mulheres e terra em troca da sua liberdade. Nesta altura, encontrava-se debilitado e foi tratado num hospital de Belém com regalias de oficial.
Não sabia que o seu futuro, até nem seria muito mau.
É enviado, em Junho de 1896, para as paradisíacas ilhas dos Açores, sem as 7
mulheres, devido a intolerância pela poligamia, mas com o seu cozinheiro e dois companheiros que sempre se portaram com dignidade. Com ordens bastante terminantes de ser absolutamente respeitado, vive com uma reforma de oficial, em crescente liberdade, alimenta-se a base de carnes e embriaga-se regularmente com vinhos do Porto e da Madeira, visita semanalmente o bordel da cidade, caca coelhos no monte Brasil e como hobby faz cestos de palha que vende a população local. Passados 10 anos, em 1906, morre alcoolizado, alfabetizado e baptizado com o nome de Roberto Frederico Gungunhana.
Se fosse possível, hoje, teria a curiosidade de lhe perguntar:
- Beto, o que gostaste mais? Os 10 anos de Leão de Gaza ou os 10 anos nos Açores?
A saga de Gungunhana ainda envolve um último acto. Num acordo entre Machel e
Ramalho Eanes, uma urna contendo areia do local onde foi sepultado, com o peso de 225 kgs é trasladada para Maputo.
Em Junho de 1985, 79 anos após a sua morte, o Leão de Gaza ou Roberto Frederico Gungunhana, não sei, é recebido em Maputo com honrosas cerimonias de herói nacional e consegue, finalmente, a proeza de entrar na Fortaleza da ex. Lourenço Marques, tendo como companhia a estátua do homem que o apanhou à mão, Mouzinho Albuquerque!!!
Eu quero os meus heróis.
Há sete instituições de ensino superior em Nampula!!! Não há nenhum departamento que pesquise e investigue História?!
Por favor, dêem-me os meus heróis.
WAMPHULA FAX – 25.08.2010
NOTA:
Porque considerar Gungunhana herói moçambicano? Não há uma só palavra dele que ilustre, defina ou defenda o conceito de Moçambique (país ou nação). Estrangeiro, descendente de 2ª geração de conquistadores (como os portugueses), mas, de longe, com muitos mais massacres de populações locais que os imputados aos portugueses. Aliás, se Gungunhana vitorioso, aí acabava o Moçambique que hoje existe e conhecemos.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE

TRIBUTO - ODE AO MESTRE ALEXANDRE LANGA


TRIBUTO - ODE AO MESTRE ALEXANDRE LANGA


“Hoyo-hoyo Masseve/ Hoyo-hoyo masseve, hoyo-hoyo masseve/ Ashi rwalo shawu canhi shi cala ngopfu masseve/ Hinga tsama hi lani nitaku rungulissa
Nitaku rungulissa/ Nitaku rungulissa/ A xi nhimu xa wena xa navelissa masseve hinga tsama hi lani niatku rungulissa/ Ni ta rungulissa/ Ni tarunguilissa/Hoyo-hoyo masseve, hoyo.hoyo masseve”. Alexandre Langa


Hoyo-hoyo masseve; Uma nota de boas vindas que insinua o intimismo. É assim que hoje recordamos Alexandre Langa. 
Alexandre Langa nasceu no Chibuto, província de Gaza, no dia 26 de Fevereiro de 1943. Se fosse vivo, completaria agora os seus 70 anos de idade.
A sua paixão pela música expõe-se aos quinze anos, quando na companhia da sua viola, feita de lata de azeite de oliveira, inicia uma brilhante carreira que viria a ser interrompida com a sua morte, em Dezembro de 2003.
Ele ajudou no ganho da consciência nacionalista. Fez canções de luta contra alguns males da sociedade, tais como a prostituição, a candonga, o banditismo, o alcoolismo, a ociosidade e a corrupção.
Muitos consideram-no como um dos maiores guitarristas moçambicanos e um dos melhores compositores da música moçambicana. Em palco, Alexandre Langa, era elegante, grave, fechado, praticamente imóvel, mas muito competente.
Foi parceiro e líder da banda do velho Fany Mpfumo, o Rei da Marrabenta, e é o mais influente dos guitarristas moçambicanos, tendo o seu estilo moldado a música ligeira moçambicana do período pós-independência.
Uma das suas maiores produções discográficas foi o álbum, “Magasso ya Mpfundla”, considerado pela crítica “de uma obra-prima absoluta”. Uma mistura de Marrabenta e Magika e ritmos sul-africanos – onde Alexandre Langa viveu e tocou – impressionante, um álbum perfeito. Com oito grandes músicas. De “Xiguevenga” a “Mpfula”, é um desfile sucessivamente impressionante de músicas brilhantes, com referências à queda do Império de Gaza (“Ngungunhana”), odes à independência do Zimbabwe (“Tinena”), lamentos de misérias sociais (“Madlaya Nhoka”), comentários sobre a guerra civil moçambicana (“Magasso ya Mpfundla”), relatos de violência em ambientes de bebedeira (“Va Bandzanile”), ironias contra a má escolha de parceiros amorosos (“Xiguevenga”), descrições do ambiente e comportamento rural de sua zona de origem, em comparação ao ambiente urbano, quanto às práticas alimentares (“Mpflula”) para além da condenação da incompreensão e descriminação de que eram vítimas os músicos na sociedade moçambicana (“Mugunda”).




Maputo, Quarta-Feira, 27 de Fevereiro de 2013:: Notícias

PÔSTERES DE MOÇAMBIQUE: HISTÓRIA


PÔSTERES DE MOÇAMBIQUE: HISTÓRIA

Em 25 de Junho de 1962, em Dar es Salaam, na Tanzânia, vários indígenas  que faziam parte dos movimentos de libertação de Moçambique uniram-se no único movimento- a  Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique). Depois de uma longa luta Moçambique conquistaram a independência de Portugal em 1975. Sob a liderança da Frelimo marxista-leninista, Moçambique foi posteriormente transformado em uma república de  operários e camponeses.
O Internacional Institute of Social History (IISH)  detém uma bela colecção de cartazes moçambicanos de arquivos do Nederlands Instituut voor Zuidelijk Afrika (Dutch Institute of Southern Africa, NIZA). A propaganda era uma arma importante na luta pela independência, para ganhar apoio dentro e fora de Moçambique. Do final dos anos 1960 em diante, o sector de propaganda da Frelimo (Departamento de Propaganda e Informaςão - DIP) utilizou cartazes políticos como um meio de propaganda. Nos primeiros anos os cartazes às vezes eram um pouco estranho (n º 1), mas graças a artistas talentosos como José Freire, João Craveirinha e Milhafre Agostinho, ao longo dos anos tornaram-se mais sofisticados. Após a independência cartazes políticos permaneceram como importante meio de propaganda e passaram ser produzidos sob a supervisão da Direcςão Nacional de Propaganda e Publicidade (DNPP), mas com os mesmos artistas que produziram os  cartazes anteriores.
Os cartazes pré-1975 enfatizavam a crueldade dos governantes coloniais, os objectivos da luta e a coragem e auto-sacrifício dos combatentes da libertação. Depois da independência, a ênfase deslocou-se para a necessidade de reconstruir e desenvolver o país, sob a orientação da Frelimo e do socialismo. Assuntos frequentes foram a comemoração do Dia da Independência (25 de Junho), visitas de chefes de estado, a homenagem a morte do primeiro presidente da Frelimo Eduardo Mondlane e outros "heróis da luta de libertação", anúncios de congressos da Frelimo, bem como campanhas contra a violência doméstica, doenças venéreas e do analfabetismo, e as campanhas de vacinação e do primeiro censo nacional.
A linguagem visual dos cartazes foi parcialmente derivado da arte de propaganda socialista da União Soviética, Cuba, China e Coréia do Norte, incluindo o uso de símbolos como bandeiras vermelhas, o martelo e enxada (uma variação do martelo e foice), estrelas vermelhas e os punhos cerrados, e do uso de estereótipos socialistas, como os trabalhadores resistentes, soldados, enfermeiros, estudantes e camponeses que marchavam em diante, unidos para um futuro feliz. Mas também a influência da arte do cartaz político ocidental e comercial pode ser detectado no uso de fotomontagem, as modernas técnicas de deslocamento, e o idioma design moderno dos anos sessenta e setenta (n º 8). Os cartazes foram principalmente concebidos por artistas moçambicanos, mas às vezes os estrangeiros também (artistas norte-coreanos, por exemplo): os resultados são imediatamente reconhecíveis por sua composição rígida e estereotipada em branco (n º 10).

Outras leituras:
·         Sahlström Berit . Cartazes políticos na Etiópia e Moçambique. Imagens visuais em um contexto revolucionário. Uppsala 1990 (IISH nr de chamadas.1993/352 fol)

·         Sahlström Berit, António Sopa - Catálogo dos Cartazes de Moςambique, Catálogo de Pôsteres moçambicanos . República Popular de Moςambique, 1988 (IISH nr de chamadas.  2011/3893)

Pôsteres de Moçambique:

Foto 10: Defender a pátria / Combater o  subdesenvolvimento / Construir o socialismo / IV Congresso do Partido Frelimo
(Moçambique, 1983) chamada IISH nr: BG E24/140 


Foto 1:  Na zona ocupada: opressão, na zona liberada: a liberdade (Tanzânia, Maputo, Moçambique, ca 1972) IISH chamada nr: BG D41/590



25 de Abril,1974 Projeto Ricardo Rangel (foto) e José Freire, o Grupo dos Democratas de Moçambique (Moçambique, 1974) chamada IISH nr: BG E9/723




 Dia da Independência de Moçambique, 25 de junho de 1975  Desenho José Freire, DNPP (Moçambique, 1975) chamada IISH nr: BG E9/737




Fundação comemoração do SNASP, 11 de outubro de 1981  Serviço Nacional de Segunça Popular (Moçambique, 1981) chamada IISH nr: BG E35/311






 Primeiro Censo Nacional  Ministério da Informação, Moçambique, DNPP (Moçambique, 1980) chamada IISH nr: BG E9/733




Dia da luta contra a SIDA 



 Dia de comemoração da morte de Eduardo Mondlane (Tanzânia, a Frelimo, 1973) chamada IISH nr: BG D17/472




Visita amigável por Fidel Castro (Moçambique, DNPP, 1977) IISH nr chamada: BG D41/577




 Primeiro Congresso Nacional de Agricultura (Moçambique, 1975) IISH nr chamada: BG D17/480





Temos que planejar a produção para melhorar nossas vidas no caminho para o socialismo! (Moçambique, 1978) chamada IISH nr: BG E35/301





7. III Congresso da Frelimo design José Freire (Moçambique, 1977) IISH chamada nr: BG H2/868





Rovuma - Maputo, 03 de fevereiro de 1975 Desenho José Freire (Moçambique, 1975) chamada IISH nr: BG D17/482




Foto 8: Comemoração da Revolução de Moçambique, 1973  design Agostinho Milhafre (Tanzânia, a Frelimo, 1973) chamada IISH nr: BG D17/463


Comemoração de cinco anos da independência Projeto João Craveirinha (Moçambique, 1980) chamada IISH nr: BG E35/308