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Caros amigos o blog Historiando: debates e ideias visa promover debates em torno de vários domínios de História do mundo em geral e de África e Moçambique em particular. Consta no blog variados documentos históricos como filmes, documentários, extractos de entrevistas e variedades de documentos escritos que permitirá reflectir sobre várias temáticas tendo em conta a temporalidade histórica dos diferentes espaços. O desafio que proponho é despolitizar e descolonizar certas práticas historiográficas de carácter eurocêntrico, moderno e ocidental. Os diferentes conteúdos aqui expostos não constituem dados acabados ou absolutos, eles estão sujeitos a reinterpretação, por isso que os vossos comentários, críticas e sugestões serão considerados com muito carinho. Pode ouvir o blog via ReadSpeaker que consta no início de cada conteúdo postado.

03 dezembro 2012

AS OPERAÇÕES MAIS PERIGOSAS DO AGENTE SECRETO DE SALAZAR


Reportava directamente ao ditador, usava identidades falsas e andava sempre com uma cápsula de cianeto. Liderou missões de alto risco, sequestros e a libertação de portugueses em África e na Índia. Jorge Jardim morreu há 30 anos.
O último aventureiro
Guerreiro, diplomata, político e empresário por vontade própria. Jorge Jardim superou a pequenez do regime do Estado Novo com acções que desafiam a imaginação humana, fazendo a sério o que o James Bond faz nos filmes. Ele foi o 007 de Salazar, retratado por José Freire Antunes ao longo de 605 páginas de Jorge Jardim Agente Secreto,  lançado pela Bertrand, no dia 3 de Abril de 2012.


Pedro Vieira
No dia 13 de Novembro de 1982, Jorge Jardim comemorou os seus 63 anos em casa de uma das filhas. A festa prolongou-se até às 6 da manhã. Poucos dias depois, regressou a Libreville, o Gabão, onde se casara em 1980, com palmira barral, antiga miss Quelimane. Mas, a 1 de Dezembro, teve uma paragem cardíaca, enquanto lia um contrato. Ao contrário do que ele sempre pedira, não foi autopsiado. O médico carlos Graça, mais tarde primeiro-ministro de São Tomé, mas na altura a viver no Gabão, disse a Freire Antunes: “Devíamos ter feito a autópsia”.
O corpo foi enbalsamado e depois transferido para Portugal. Repousa no cemitério de Queluz. Mas a família não esquece que ele gostaria de ser enterrado em Moçambique e ainda não pôs de parte a hipótese de tasladação para o Dondo, perto da beira, a terra, onde em 1952, começou a sua aventura africana.
Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria aos 29 anos, Jardim parecia talhado para uma carreira ascencional nos meios do Salazarismo. Apesar, de no primeiro contacto com Salazar, este o ter exortado a usar chapéu - “Vá, tenha Juízo, compre um chapéu”, contou Baltasar Rebelo de Sousa a Freire Antunes - e do desgaste provocado pelo duelo com o ministro Ulisses Cortez, ele estava bem cotado junto do chefe do Governo e não lhe faltariam oportunidades no quadro do regime. Mas quando abandonou o Governo, em 1952, com quatro filhos e a mulher grávida do quinto, operou um corte radical na sua vida, aceitando um convite do empresário Raul Abecassis para dirigir a fábrica da Lusalite no Dondo, em Moçambique.
Jorge Jardim, que superara uma meningite em miúdo, que abraçou o escutismo, que chorou de raiva quando ficou livre da tropa, que, já membro do Governo, vestia a farda de bombeiro para ir combater incêndios, dificilmente caberia na estreiteza e na burocracia da vida portuguesa de 1950. Os apelos heróicos á defesa do Império vividos nos tempos de estudante de agronomia misturavam-se com as imagens grandiosas de áfrica transmitidas pelo general Baden-Powell, fundador do escutismo. Era hora de decidir.

A vertigem da acção 
As situações provocadas pelos processos de descolonização proporcionariam novos louros a a Jorge Jardim. A guerra civil no Congo Belga (hoje Zaire) afecta duramente a comunidade portuguesa naquele território. Conforme se narra no livro da Bertrand Editora, Jorge Jardim oferece-se como voluntário para participar na ponte aérea Léopoldville (Kinshasa)-Luanda. Acaba a chefiar a operação, a partir da torre de controle do aeroporto de Leopoldville, onde permanece durante três dias e três noites. Regressa a Luanda no último avião. Mas depois voltou várias vezes ao Congo, em viagens clandestinas, para resgatar portugueses e belgas. Escolhia o período crepuscular do amanhecer para aterrar. Na última vez, foi preso por soldados congoleses. Terá sido salvo do pelotão de fuzilamento por ter comovido os seus algozes com a fotografia da numerosa prole.
No início de 1961, estava metido noutra, sempre na base do voluntariado. Por altura do apresamento do Santa Maria, deslocou-se ao Brasil, saltou de cidade para cidade, e conseguiu fazer chegar informações cifradas a Lisboa, através da Companhia Nacional de Sabões, que supostamente tinha um negócio com uma empresa brasileira.
Logo a seguir, vamos encontrar Jorge Jardim, no norte de Angola, na resposta ao ataque da UPA aos fazendeiros portugueses. Mais tarde, participaria em operações militares no território. O mancebo sem físico para militar, vingava-se dessa humilhação e assumia-se como um general de campo.
Aliás, no mesmo ano, escrevia a Adriano Moreira, ministro do Ultramar, nos seguintes termos, citados por Freire Antunes: “Na hora em que vivemos prefiro, ali, cada vez mais acompanhar os militares - que aliás gostam de mim - e aparecer menos com os políticos, mesmo quando amigos pessoais.”
Mas a imaginação e a capacidade “james bondesca” de Jardim ainda não tinham atingido o seu ponto máximo. Faltava a Índia.

 Agente especial na Índia 
No final de 1961, as tropas de Nehru ocupam Goa em dois tempos e fazem prisioneiros os 4 mil militares portugueses da guarnição. Salazar tenta ganhar tempo e dar repercussão ao caso dos prisioneiros, ameaçando com a expulsão de cidadãos indianos residentes em Moçambique. Jorge Jardim concebe, então, um plano para ir à ìndia negociar a libertação dos prisioneiros portugueses, sendo recebido  ao mais alto nível pelo governo do país.
O primeiro passo, segundo a narrativa de Freire Antunes, foi uma espécie de sequestro moral de Kakoobbai, um indiano a viver em Moçambique, possuidor de grande fortuna. Enquanto ele está em Lourenço Marques, rouba-lhe documentos comprometedores, na sua casa na beira, mas consegue que Kakoobba ainda lhe fique agradecido, porque sugere que a PIDE tinha intenção de os confiscar. Por outro lado, Jorge Jardim manda montar guarda à casa onde estão a mulher e a filha do indiano, em Lisboa, dizendo de novo que era a PIDE, e faz-lhe uma proposta “irrecusável”: Kakoobba passa-lhe uma procuração sobre todos os seus bens em Moçambique e, ao mesmo tempo, abre-lhe as portas em Nova Deli. O “negócio” resultou em cheio. Em Fevereiro, Jorge Pereira Jardim partira da Suíça, munido de um passaporte com nome falso e visto da embaixada indiana naquele país, acompanhado de Kakoobbai. À chegada foi logo recebido pelo ministro dos Negócios Estrangeiros V.C. Trivedi. Das conversações resultaram medidas de confiança: a libertação de quatro indianos presos em Lisboa e de três jornalistas portugueses detidos em Goa.
Após várias viagens, a crise dos prisioneiros resolveu-se no início de Maio de 1962 com uma ponte aérea de Mormugão para Portugal. Salazar chegara a pretender que os navios levassem os indianos de Moçambique para a Índia  e trouxessem os portugueses tentando deste modo criar problemas a Nehru.
Nas suas andanças pela Índia, terá chegado a fugir, disfarçado de mulher, para não ser morto. Baltasar Rebelo de Sousa disse a Freire Antunes que Jorge Jardim esteve também na origem das bombas que rebentaram em Goa nessa altura. Houve um atentado falhado contra o governador, por a bomba posta na Câmara Municipal de Vasco da Gama ter explodido antes da hora prevista.
No dia 13 de Maio, quando o general Vassalo e Silva, o governador deposto, deixou o território, Jorge Jardim ainda entregou á enfermeira Ivone Reis, disfarçada de hospedeira francesa, um saco com documentos confidenciais. E não concedeu a vassalo e Silva a honra de ser a última pessoa a abandonar Goa. Ficou mais algum tempo no território.
Jardim trouxe para Lisboa o retrato de Afonso de Albuquerque, retirado do Palácio de Hidalcão. Adriano Moreira tinha-lhe pedido que recuperasse o de D. João de Castro. Perante a decepção do ministro do Umtramar ele voltou a Goa e conseguiu, não se sabe por que artes, trazer o quadro. Costa Gomes disse a Freire Antunes que a devolução dos referidos dois quadros “foi uma das primeiras coisas que Mário Soares fez quando se tornou Presidente da República”.

Um Salazar de preto
Acabada a aventura indiana, Jorge Jardim preparou-se para a inevitabilidade da guerrilha nacionalista chegar a Moçambique. Voltou as suas atenções para a Niassalândia, que mudaria o nome para Malawi, cujo território penetra profundamente no da ex-colónia portuguesa. Conhece, então, Pombeiro de Sousa, um português fixado em Blantyre desde 1946 que, em articulação com Jorge Jardim, irá desempenhar um papel decisivo no condicionamento da política do Malawi por Portugal. Pombeiro de Sousa, mais tarde nomeado cônsul de Portugal na capital daquele país, foi o fornecedor dos móveis da casa de Hastings Banda, médico e dirigente do Malawi Congress Party.
Apesar de alguma duplicidade do dirigente do Malawi, a política de Lisboa foi no sentido de uma aproximação. A oferta para melhorar o fornecimento de combustíveis ao país através da ligação a Nacala, constituiu a oportunidade de um contacto directo de Jorge Jardim com Banda, em meados de 1963.
Um ano mais tarde, em 6 de Julho de 1964, é proclamada a independência com a presença de uma forte delegação portuguesa. Dois meses antes, Banda fora recebido em Nacala e Nampula como se de um chefe de Estado se tratasse.
Ao mesmo tempo, Jorge Jardim e a sua mulher mobilizaram-se para os preparativos da festa da independência, ajudando nomeadamente as mulheres dos dignitários. João Barreto, piloto de Jardim, disse a Freire Antunes: “Levei em várias viagens máquinas de costura, linhas de coser e costureiras da Beira, para as mulheres se vestirem para a festa”.
Mas a ofensiva de Jardim não se limitou à costura. No mesmo ano, Boullosa (SNASP) juntou-se a Banda para formar a Oil Company of Malawi. Do mesmo passo, Jorge Jardim era nomeado cônsul do Malawi na Beira.
Ainda em 1964, Jardim que ganhara um estatuto único junto de Salazar, trouxe o seu amigo, Pombeiro de Sousa a São Bento. Pombeiro de Sousa contou a Freire Antunes esse encontro: “Falou três ou quatro vezes nos pretinhos. Eu disse, a certa altura: ‘O senhor presidente desculpe, mas olhe que há pretinhos com tanta ou mais capacidade de que os brancos’. Ele então disse, zangado:’O senhor não tem um avião para apanhar?’ Praticamente pôs-me fora da sala”. Nesse mesmo encontro Jardim instado por Salazar a explicar como era o Banda, teve uma resposta lapidar: “Tal e qual como V. Exª, mas em preto.”

Um susto para Banda
Em 25 de Setembro de 1964, a Frelimo lança as primeiras acções de guerrilha. Jardim tem o seu dispositivo de informações bem montado e colabora estreitamente com as Forças Armadas e com a PIDE. Mas mantém a habitual ousadia na frente diplomática. Convida para visitar Moçambique dois jornalistas da Pravda que conhecera nas festas de independência do Malawi. Claro que Domogatsky e Kolesnichenko eram oficiais do KGB. Talvez por isso se entenderam tão bem com o agente secreto português, ao longo de uma viagem de cinco mil quilómetros.
Só em 1965, Orlando Cristina, o caçador de elefantes que falava as línguas nativas e casava com as filhas dos régulos, se tornou um colaborador directo de Jorge Jardim. Desertara para a Frelimo, em Dar es Salaam, alegadamente numa missão de recolha de informações, mas no regresso foi preso por desconfiança em relação á autenticidade do seu comportamento. Sai da prisão quase de forma clandestina para ir dirigir o treino dos Young Pioneers. Um dia, na capital do Malawi, Jardim entra no palácio presidencial e chega à presença de Banda, sem ser interceptado por ninguém e pergunta, segundo conta Pezarat Correia, antigo comandante da Polícia da Beira:”’O senhor presidente sente-se seguro?’ Banda disse que sim. ‘Olhe que eu entrei por aqui dentro, ninguém me interceptou, se quisesse matá-lo já o tinha morto.’ Banda ficou impressionado com o golpe de teatro de Jardim e aceitou formar uma guarda pessoal”. Essa tornou-se uma das missões dos Young Pioneers dos opositores do presidente Banda. O próprio Pezarat Correia ia entregar armas ao campo de treino daquela força.

Negociações com a Frelimo
Entretanto, Jardim abre uma nova frente de relações públicas. Promove os concursos de misses, mas depois conta com elas como agentes secretas, como aconteceu com Palmira Barral, a mulher com quem casou em 1980, de pois de enviuvar de Teresa Monteiro de Sousa, mãe dos seus 12 filhos, dois dos quais, o mais velho e o mais novo, já falecidos. Com João Maria Tudela, palmira barral participou na vinda a Lisboa de Oscar Kambona, um opositor de Julius Nyerere. Esta deslocação fazia parte de uma operação mais vasta, destinada a apoiar o derrube do presidente da Tanzânia.
Em 1973, depois de tantos anos a lutar pelo Império ou por Portugal do Minho a Timor, Jorge Jardim descola pela primeira vez da articulação que mantinha em Lisboa. Ele pode perder tudo, menos Moçambique. Segundo Freire Antunes, o seu papel na divulgação do massacre de Wyriamu credita-o como um interlocutor aceitável para Kaunda. Inicia-se, então, um processo de negociações com a Frelimo através do presidente da Zâmbia, tendo como horizonte a independência. Mas Jardim chega tarde ao encontro com a história. No dia 25 de Abril de 1974 está em Lisboa. E, segundo Freire Antunes, quando pretende regressar a Moçambique, Spínola e Costa Gomes impedem a sua partida, receosos da dinâmica provocada pela sua presença. Não mais lá voltaria. Mas morreu na esperança de que esse dia havia de chegar.


O Malawi a seus pés
 Os caminhos de Costa Gomes e de Jorge Jardim que depois do 25 de Abril de 1974 ficariam em campos irredutivelmente opostos, cruzaram-se pela primeira vez em 1965, quando o futuro Presidente da República assumiu em 1965 o cargo de 2º comandante da Região Militar de Moçambique. Apesar de o entendimento não ser completo, nesse período Costa Gomes beneficiou do conhecimento do terreno e do ascendente de Jardim junto do presidente do Malawi, Hastings Kamuzu Banda. “Nunca esqueci os serviços relevantes que o Jardim prestou ao País”, disse Costa Gomes a José Freire Antunes. Banda é um das figuras centrais do capítulo nono de Jorge Jardim, Agente Secreto, intitulado Protectorado do Malawi 1968-1969, do qual publicamos alguns excertos. Com a chancela da Bertrand, o livro foi lançado  dia 3 de Abril no Centro Cultural de Belém, com apresentação de Adriano Moreira.
Os anos de 1968 e 1969 ficaram assinalados por dois acontecimentos decisivos: a subida ao poder de Marcelo Caetano e o assasssínio de Eduardo Mondlane, fundador da Frelimo. Na nova situação, Jorge Jardim continua a jogar fundo a cartada do Malawi.


 “Operação Likoma”
 As águas do lago Niassa - 500 quilómetros de comprimento e 110 quilómetros de largura no seu ponto máximo - foram divididas no século XIX, através do tratado de Portugal com a Inglaterra que se seguiu ao Ultimato de 1890. A Ilha de Likoma, habitada por ajauás-nyanjas, ficou integrada através do tratado na parte do que era a Niassalândia e viria a ser o Malawi. Em 1954, Paulo Cunha, ministro dos Negócios Estrangeiros, negociou com a Niassalândia a repartição da Ilha de Likoma com Moçambique, pela linha média das águas. A pequena ilha - oito quilómetros de comprimento por quatro de largura - pelo censo de 1966 tinha 5 000 habitantes, que viviam sobretudo da pesca. a terra era fraca, nela se produzindo milho e mandioca, “muito raquítico”. os produtos de primeira necessidade idos do Malawi a partir do porto lacustre de N’Kota Kota eram transportados de barco - espécie de “cacilheiros” pequenos - uma vez por mês. a ilha distava cerca de 40 quilómetros de N’Kota Kota e 8 quilómetros de Cobué, uma povoação moçambicana a 30 quilómetros de Matâmgula, capitania do Lago Niassa. Após o início da guerra, em 1964, Likoma tornou-se um destino de refugiados e também de elementos da Frelimo, ocorrendo um acréscimo súbito da população. A Frelimo usava a ilha como posto de vigia das lanchas da marinha portuguesa, o que preocupava tanto Banda como as autoridades de Moçambique. Era preciso agir, mas sem estardalhaço, ficando excluída a hipótese de um desembarque militar. “Muito menos sabendo nós ( o engenherio jorge Jardim e eu [Jorge Calrão]), que havia dois elementos do Peace Corps . Normalmente ligados á CIA - na ilha e que de vez em quando também apareciam, para visitas rotineiras, alguns ingleses ligados aos quadros da polícia do Malawi (esta polícia era enquadrada por ingleses).” O objectivo de J.J. foi “limpar” Likoma de guerrilheiros da Frelimo e para isso obteve luz verde de Banda. Com o seu piloto Calrão planeou então um two-men operation na ilha.
Sabiam, através de voos de reconhecimento, que existia em Likoma uma pista de aterragem, térrea e mal conservada, com cerca de 500 metros, que permitia a aterragem do Cessna 401. Prevendo anomalias na aterragem ou um ataque da Frelimo, levavam na bagageira do avião uma mini-mota eléctrica desmontável. J.J. pensou arrebatar os habitantes com ofertas e Calrão foi a Salisbury comprar 100 quilos de rebuçados, 50 quilos de bombons, pipocas, 20 rádios a pilhas, 200 cpas de pescador, 50 caixas de cerveja, coca-cola em lata, saquetas de arroz, feijão e grão, embalagens de sabão, caixas de primeiros socorros, agulhas, linhas, tesouras e uma enorme quantidade de capulanas, tecidos estampados com motivos de África. a etapa seguinte do Cessna 401 foi Vila Cabral, onde J.J. cumprimentou o governador distrital, coronel Nuno Melo Egídio. Enquanto Calrão adquiria garrafões de vinho normal, J.J. foi pedir ao bispo de Vila Cabral, D. Eurico de Nogueira, garrafas de vinho de missa, especialmente engarrafado por ele para oferecer ao velho padre anglicano M’zeca: “Só na altura soube, que ao dizerem a missa, os anglicanos também usam vinho. Levámos, pois, uma caixa desse vinho especial, ecuménica e gentilmente oferecida pelo bispo. Mais um pormenor que só ao Jorge Jardim lembraria” [Jorge Calrão]. Assim, carregados dirigiram-se para Metângula, onde pernoitaram, e na manhã seguinte aterraram normalmente em Likoma. J.J. pegou na mini-mota, em estilo espectaculoso, e abalou em direcção ao povoado para se encontrar com o padre M’zeca.
Enquanto isto, junto ao avião, e sem mãos a medir, Calrão começou a distribuir os presentes aos àvidos habitantes, sobretudo crianças. Algum tempo depois surgiram o padre M’zeca e J.J. que o convidou a entrar no avião e deu-lhe o vinho especial do bispo de Vila Cabral: “Ficou cheio de alegria e desfazia-se em agradecimentos. Foi-nos contando quais as dificuldades por que passavam os habitantes da ilha, que nós já conhecíamos pelo próprio dr. Banda” [Calrão]. O padre chamou alguns homens para ajudarem a descarregar o avião e a transportar tudo para a Casa central (caso do chefe). Os autóctones perceberam que tudo o que vinha a bordo era para eles e irromperam “em gritos de alegria e vivas”. M’zeca convidou-os depois para uma visita à ilha. Como o sacerdote usasse uns óculos velhos, colados com adesivo, ofereceram-se para o levar à beira, a uma consulta médica. a multidão despediu-se com uma sonora alegria, como se os dois doadores tivessem descido do céu: “E assim, numa acção baratíssima, conquistámos as boas graças da ilha de Likoma, que tantas preocupações vinha dando a tantos portugueses responsáveis e que já propunham até um desembarque de tropas numa acção (como vimos desnecessária) de força” [Calrão]. Foi a estratégia de conquista das bocas e dos corações que J.J. passou a usar, com sucesso na Ilha de Likoma.

Caetano no poder
Manuel Nazaré, um negro nascido em Quelimane, foi médico de análises clínicas de Salazar durante mais de 20 anos. Dedicou-se à sua carreira profissional, sem grandes entregas à política mas ainda assim serviu como deputado á Assembleia Nacional. Diz que Salazar pensou nele, em 1968, para governador de Moçambique e chegaram a falar em privado sobre essa hipótese. Ante a insistência de Salazar, Manuel Nazaré pôs como condição despachar directamente com ele, única maneira de resolver os problemas de Moçambique; o Presidente do Conselho disse que não podia ser, que não se podia passar por cima do ministro do Ultramar, Silva Cunha. manuel Nazaré sugeriu-lhe então J.J., de quem era amigo e que tratava por tu, mas Salazar argumentou:”Sabe, o Jorge Jardim seria um bom nome, simplesmente hoje está metido na indústria, já não tem o beneplácito das populações.” Salazar adiantou então o nome de Baltasar rebelo de Sousa, que tinha sido aluno de Manuel Nazaré na Faculdade de Medicina. davam-se bem. À noite, encontrou-o por acaso na ópera e revelou-lhe que ele ia ser governador de Moçambique: “Ele disse: ‘Você está maluco’ Ficou completamente tonto.” Mas no dia seguinte Salazar chamou Rebelo de Sousa e convidou-o. O velho amigo de J.J. tomou posse como governador em 27 de Julho de 1968. Consumava-se, enfim, o velho projecto de estarem os dois ao mesmo tempo em África.
Augusto dos Santos continuou como comandante-chefe e Costa Gomes como comandante da região Militar, e a articulação deles com o governador foi boa. Formalmente, a posição de J.J. ficou mais forte com Rebelo de Sousa na Ponta Vermelha, mas a amizade entre os dois vinha perturbar, de certo modo, o estilo e a vocação autónomas de J.J. nas suas deambulações. Rebelo de Sousa reagiu em 1976 ao livro de memórias de J.J., esclarecendo que, durante o seu mandato de governador, “nunca Jorge Jardim dispôs de serviços especiais de informação nem de grupos especiais de intervenção nem de facilidades que não fossem as de qualquer cidadão qualificado ou as que resultassem da representação consular do Malawi que detinha”.(...)
Com o afastamento de Salazar em 1968, começava uma nova fase na vida de J.J., o multifacetado gestor de empresas, “correio do Czar”, cônsul do Malawi, agente secreto, e guerrilheiro, frequentador de São bento e da State House, amigos de ricos e padrinho de pobres. Entre 1952 e 1968, sob a protecção de Salazar, adquirira um estatuto especial no Estado Novo e um poder considerável sobra a política, a economia, a sociedade e a estratégia de contra-subversão em Moçambique. Chefiava pelotões de combate no mato com o mesmo ritmo frenético com que conspirava nos salões da diplomacia ou entrava na Ponta Vermelha, movia-se entre as capitais de África e as capitais da Europa com a auréola de um poderoso na sombra e de um manobrador oculto. Tudo isto, mais o que sobre ele se imaginava, tornavam J.J. diz Hall Themido, “um agente do Governo”, de Salazar e de Franco Nogueira, um embaixador sem ser nomeado”. Funcionava como ponte para vários serviços secretos, favoráveis ou hostis a Portugal, da rodesiana CIO ao sul-africano BOSS, da americana CIA ao inglês MI-6 e, sobretudo, o francês Service de Documentation Extérieure et de Contre-Espionage (SDECE). Era um especialista em informação e contra-informação, um manipulador obedecido e o chefe de uma rede autónoma de peões e de apóstolos que o seguiam incondicionalmente, um impulsionador ardiloso. Articulava operações em África com a PIDE mas mantinha zonas de impenetrabilidade em relação á polícia e, por vezes, criava atritos. Álvaro Pereira de Carvalho, director dos serviços de Informações da PIDE, via J.J. como “um especialista ao alto nível no mundo da diplomacia”. Mas desde o verão de 1952, quando abalou para o Dondo, a sua proximidade meio filial a Caetano tinha sido substituída por uma distanciação humana e política e pela inserção num novo círculo de cumplicidade.(...)

Gestão do saco “azul”

Um ritual prático explicado por J.J. a Caetano durante os encontros iniciáticos em que se fixaram as normas funcionais, era o financiamento das operações secretas. Acertou-se um aumento das verbas atribuídas pelo Estado. Em 10 de Fevereiro, J.J. acusava a recepção: “Entretanto já me chegou o anúncio do esforço dos meios financeiros, dentro do plano estabelecido e já lhes fiz dar o seguimento habitual.” As verbas incluíam-se no Orçamento das Forças Militares Extraordinárias do Ultramar (OFMEU), um orçamento especial para as actividades das forças irregulares e das tropas especiais em África. O dinheiro era enviado através do serviço de Administração e Finanças, chefiado por Vicente Varela Soares, e depositado em contas pessoais de J.J., pedia a Caetano uma aceleração: “ Até ao momento ainda não tive notícia do solicitado depósito na minha conta, no Lisboa & Açores, dos meios normalmente atribuídos (1 500) e de acordo com o combinado no nosso último encontro em Lisboa. Muito agradeceria o favor das suas instruções em tal sentido.” Depreende-se que os depósitos não eram automáticos e que, por vezes, dependiam da luz verde de Caetano e dos seus ministros. Costa Gomes diz que J.J. recebia verbas dos ministérios da Defesa Nacional e do Ultramar, e do Governo-Geral de Moçambique: “Jardim tinha um orçamento de Estado para as Forças Armadas. Eram verbas especiais, de que não dava conta a ninguém, e de que não há escrita.” Para a Operação Malawi, com a abreviatura MW, J.J. recebeu entre Outubro de 1966 e Fevereiro de 1974, a quantia de 57 625 000$00, distribuída por verbas anuais que variaram entre 1 000 000$00 (em 1966) e 11 500 000$00 (em 1973). Para a Operação Oscar Kambona, com a abreviatura OK, o Governo atribuiu a J.J., entre 1971 e 1974, a quantia de 42 400 000$00. O total eleva-se a 100 025 000$00. Deve concluir-se que havia consenso no Governo quanto á utilidade das verbas que o Estado canalizava para J.J. e que eram geridas só por ele.

Um dos homens encarregados de encaminhar os dinheiros para J.J. era o tenente-coronel José Florêncio de Almeida, chefe dos serviços administrativos do Ministério da Defesa Nacional. Arnaud Pombeiro (membro dos SEII, na Beira) diz que J.J. guardava os recibos todos, fazia uma contabilidade expedita e apresentava-a em Lisboa: “Quando era despesas maiores , pedia autorização para as fazer. para as mais pequenas, ia ter com o actual coronel Florêncio de Almeida”. Álvaro Récio, já definitivamente conquistado por J.J., foi durante 13 anos um dos seus homens de maior confiança. J.J. fez-lhe teste de eficácia em situações difíceis , teve-o na Beira, ao seu serviço, entre 1961 e 1964 e depois enviou-o para Lourenço Marques, onde chefiava a delegação da Lusalite. Récio foi penetrando no apaixonante e perigoso mundo de J.J., onde se cruzavam o expediente do comércio e as missões escaldantes da política de guerra, e ficou subordinado: “Vivia aterrorizado com o que pudesse acontecer e o jardim tinha-me na mão. Era um homem superior, extraordinariamente vaidoso. Mas para mim a verdade era para se dizer. Ele fazia-me uma pergunta ou punha-me um problema e eu dizia a verdade. a maior parte das vezes o jardim zangava-se comigo, mas zangava-se de forma paternal.” J.J. atribuiu também a Récio a função de guardador e distribuidor de dinheiros: o “saco azul”  passava, em parte pelas suas mãos. A sua primeira experiência foi aterradora. Teve de ir buscar cash ao gabinete do governador, e levou os seus dois irmãos, armados de caçadeiras, trazendo duas malas cheias de dinheiro: “A única preocupação do governador era tirar as tiras que diziam de onde é que vinha o dinheiro: do Banco de Fomento, do BNU, de muitos sítios. Vinha também em notas estrangeiras.” Não havia contas nos bancos para este esforço de guerra das empresas de uma economia estatizada, o dinheiro circulava no género “saco azul, mala preta”, e os gerentes bancários sabiam de onde provinha o dinheiro para J.J., mas não diziam.
Militares como Costa Gomes, Rosa Coutinho e Pezarat Correia falaram muito nos fundos de J.J. oriundos dos cofres do estado, uma matéria delicada, mas ninguém até agora o acusou de ter feito fortuna graças a esses dinheiros públicos ou de ter usado a sua disponibilidade financeira para fins que não fossem os da causa do regime em áfrica. As operações mais sensíveis e mais dispendiosas que J.J. levou a cabo tiveram sempre cobertura de S. Bento ou dos ministérios. Por outro lado, ao nível dos negócios empresariais, J.J. fazia movimentar verbas avultadas: “Claro que fui um homem que ganhou muito dinheiro. Devo dizer que o ganhei sempre em empresas privadas. Nunca á mesa do orçamento.” Entre o temor e o deslumbre da importância de certas acções secretas de J.J., por mais sórdidas que lhe parecessem, Récio aprendia com o mestre as duras manobras da guerra africana: “Devo dizer que paguei durante dois anos a uma amante do Nkrumah que nos dava informações. Era uma mulher da África inglesa, era negra clara. Hospedava-se no Hotel Polana.” Para todos estes pequenos, mas às vezes vitais, circuitos da espionagem era necessário dinheiro, muito dele provinha do Estado e das empresas e uma parte, segundo afirma Récio, era canalizada para conspícuos destinos: “Cheguei a pagar a generais que depois apareceram ligados ao partido Comunista na fase de 1974-75.” J.J. organizou também uma estrutura de informações, chamada na gíria “mini-CIA”, que disseminava a sua actividade por vários países da África Negra. A sede da “mini-CIA” não dava nas vistas, era um pequeno escritório na Beira, em frente aos SEII (Serviços de Informação).

Livro-bomba: Mondlane morto
Sete meses depois da reabertura da frente de Tete, com a ajuda directa de tropas de Kaunda, a dissidência de Lázaro Kavandame, um líder Makonde, continuou a desagregar a Frelimo em clãs de natureza política e tribal. Filipe Magaya, primeiro comandante, foi assassinado. Devido ao facto de ter trazido brancos para as fileiras, Mondlane era criticaado e a influência da sua mulher, Janet Rae não era bem vista. Em Dezembro de 1968, junto a Rovuma, segundo reza a história oficiosa da Frelimo, a guerrilha makonde de Kavandame liquidou Samuel Kankhomba, membro do estado-maior de Machel. A direcção executiva da Frelimo, reunida em 3 de Janeiro de 1969, expulsou Kavandame, sendo a decisão comunicada ao líder makonde numa carta de Mondlane. No início de 1969, como notava Rebelo de Sousa a partir da Ponta vermelha, a guerrilha passava por um refluxo a que não seriam alheias as profundas dissensões internas: “O terrorismo tem estado quieto. Esperemos que por todo o mês de Fevereiro volte a aparecer com alguma intensidade. Como temos falta de tropa, só com material conseguiremos evitar desastres. Mas o material nunca mais chega.” O ambiente dentro da Frelimo ficou de cortar à faca. Foi neste quadro que morreu Mondlane, o pai fundador da organização e se ideólogo cimeiro. Miguel Murupa diz que nunca esquecerá o dia 3 de Fevereiro de 1969. Era então vice-secretário da Frelimo para as relações exteriores e funcionava nos escritórios de Dar-es-Salam, um rés-do-chão espaçoso, num edifício frente á linha de caminho-de-ferro. Aí mantinha a Frelimo a base para questões administrativas e financeiras, sendo que os serviços operacionais se encontravam em Nashingwea, onde estavam o vice-presidente, Uria Simango, e o chefe militar, Machel. Um mês antes, Miguel Murupa tinha acompanhado Mondlane ao Egipto e ao Sudão, onde participaram em conferências. Murupa sentia-se mais próximo de Uria Simango; mas não tem dúvidas em afirmar sa superioridade intelectual de Mondlane e em dizer que, com ele vivo, Moçambique seria hoje um país diferente.
Uma primeira circunstância estranha, a não ser por autoconfiança ou amadorismo, é que o presidente da Frelimo manuseava o correio que lhe era dirigido, incluindo encomendas. Assim fez Mondlane nesse dia. apareceu no escritório, por volta das nove da manhã, reuniu com  alguns dos presentes, e uma hora depois saiu, levando a correspondência como era seu hábito. O líder da Frelimo preferia trabalhar em casa da secretária, Betty King, uma branca americana, num arredor discreto de Dar-es-Salam. Entre o correio empilhado e dirigido a Mondlane contavam-se vários embrulhos com livros. Um deles chamou a atenção de Miguel Murupa porque, sendo uma encomenda de aspecto normal, com uma fita em volta, tinha no exterior a inscrição em inglês “Manual de Filosofia Marxista” (outra versão aponta para um encomenda com selo de Moscovo, contendo uma edição de textos de George Plekhanov). Fosse como fosse, Mondlane agarrou na pilha de correspondência, despediu-se com a sua jovialidade característica, e foi-se embora para não mais voltar.: “Por volta das 11 horas, apareceu o Chissano a chorar. Mondlane morreu ao abrir o livro. A explosão decepou-lhe as mãos e separou-lhe o tronco em duas partes.” Joaquim Chissano, futuro presidente de moçambique, era o responsável pela segurança da Frelimo. A polícia tanzaniana isolou a residência de Betty King e, segundo Murupa, apenas Nyerere e Marcelino dos Santos viram o cadáver de Mondlane no meio dos destroços provocados pelo livro-bomba. Nyerere promoveu um funeral de Estado a Mondlane com honras militares, no cemitério de Kinondini, em Dar-Es-Salam. Uria Simango, o vice-presidente assumiu formalmente o poder até á reunião seguinte do comité central. A morte do pai histórico da Frelimo foi o acontecimento capital da guerra em Moçambique no ano de 1969 e teve profundas consequências para o futuro do território.
Os autores do assassinato permaneceram envoltos em mistério, excepto para quem tem certezas adquiridas. Costa Gomes, um bom conhecedor dos mecanismos da PIDE, que o distinguiu com o seu Crachat d’Ouro, é definitivo: “Quem matou o Mondlane foi a PIDE.” No sentido oposto, aponta Silva Cunha, ministro do Ultramar, a quem interessava mais ter Mondlane á frente da Frelimo, por ser um homem moderado, do que Machel, que era “de um nível cultural mais baixo e mais rancoroso contra nós”. Silva Cunha observa que o mais curioso é que os selos da Rússia, supostamente apostos na encomenda letal, não estavam carimbados. Mas o antigo ministro não se pronuncia sobre quem cometeria o crime. Álvaro Corte-real, presidente da Associação Africana, a quem Mondlane fizera chegar, sem resultado, mensagens de aliciamento, é um outro homem sem dúvidas: “Por amor de Deus, toda a gente sabe que foi uma facção da Frelimo que matou Mondlane.” Outra pessoa muito segura  quanto á origem do crime, segundo J.J., foi Banda. Em 6 de Fevereiro , três dias após a morte de Mondlane, o líder do Malawi previu um endurecimento da Frelimo e atribuiu a morte “às manobras dos agentes da China”. Um antigo operacional da CIO rodesiana, Henrik Ellert, afirma que o goês Casimiro Jordão Monteiro, inspector da PIDE dado como responsável pela morte de Delgado, foi quem armou a cilada. Pombeiro de Sousa tem uma ideia diferente. Pensa que a operação foi demasiado bem montada para ser obra da polícia portuguesa: “A PIDE não fazia nada de jeito.” António Vaz nega o envolvimento da PIDE. porquê matar Mondlane, se ele era, para a política de Portugal, “o líder menos mau?”. Miguel Murupa põe a hipótese de intervenção de potências como uma indetectável capacidade operacional: “Só pode suspeitar-se de serviços secretos altamente sofisticados. Mas a minha pergunta é esta: porque é que Nyerere nunca publicou o relatório sobre o assassinato?” O mistério subsiste, 27 anos depois.
Também J.J. foi visado como co-autor da morte de Mondlane. segundo o Servizio Informazione Difesa (SDI), a espionagem italiana, a operação teria sido preparada por uma rede envolvendo J.J., Simango, Robert Leroy, a Aginter-Presse, organização transeuropeia de direita com sede em Lisboa, na Lapa, e ligações aos ministérios da defesa e dos negócios Estrangeiros. Como espião em Dar-es-Salam teria agido Robert Leroy e por detrás da acção teria estado Casimiro Monteiro. Numa versão que deu da sua condecoração por outros chefes da Frelimo, Simango terá contado que, após a morte de Mondlane, em reuniões em casa de Janet Rae, na Baía das Ostras, Machel, Joaquim Chissano, Marcelino dos Santos, Armando Guebuza, Aurélio Manave e Josina Abiatar Muthemba deliberaram que o vice-presidente e três outros militantes, Silvério Nungu, Maiano Masinye e Samuel Dhlakama, eram responsáveis e deveriam ser eliminados. A hipótese da cumplicidade de Simango é rejeitada por Miguel Murupa. Sendo um padre protestante, muito devoto, Simango não contemplaria o assassinato entre os critérios de acção, apesar das suas divergências com Mondlane. O chefe dos serviços secretos da Tanzânia, geoffrey Sawaya, concluiu que fora usado no livro-bomba material explosivo da casa Pfaff, em Lourenço Marques (Rua Joaquim Lapa, nº 5), e que a PIDE teria sido ajudada dentro da Frelimo por Lázaro Kavandame e Silvério Nungu, secretário administrativo no quartel-general de Dar-es-Salam, que morreu durante uma greve de fome. O chefe da delegação da PIDE na beira, inspector Gomes Lopes, íntimo de J.J., disse a um repórter americano que “ou os russos planearam os assassinatos, ou tratou-se de uma engenhosa armadilha montada pelos chineses”. J.J. negou durante anos a fio a sua ligação á morte de Mondlane. Disse que sentiu a maior pena e que, quando o crime ocorreu, Banda estava até a combinar um encontro entre ele, J.J. e Mondlane, só não tendo feito mais cedo “por duvidar da minha preparação para isso”. A Frelimo nunca levou até ao fim o inquérito á morte do seu pai histórico.(...)

Ordens a Sebastião Mabote
J.J. com a colaboração dos Young Pioneers, interceptou no Malawi correspondência enviada da Tanzânia por Sebastião Mabote, o chefe da secção operacional da Frelimo, para a base de Catur, dentro de Moçambique. A carta continha instruções operacionais, foi expedida da Tanzânia e levantada  no Limbe e, dado o seu interesse. “apressei-me a fornecer a fotocópia á PIDE, na beira”. Continuava a firmar, em abril de 1969, baseado nos seus serviços de vigilância, que a Frelimo não preparava actos armados dentro do Malawi nem tinha no território “qualquer actividade”. Mas em 10 de Maio, Augusto dos santos informou J.J. da existência de actividades da Frelimo na zona do Chala-Catur, com movimentos junto á fronteira e possível refúgio no Malawi. Combinou-se com Banda que as tropas portuguesas poderiam perseguir elementos que se refugiassem no Malawi, “mesmo que para tanto tivessem de penetrar em território daquele país”. J.J. soube que partidários de Henry Chipembere, o rival de Banda, estavam activos na zona de Makangila, onde houve assaltos a povoações, cantinas e viaturas, com armas idênticas ás usadas pela Frelimo. Detectaram-se quatro indivíduos, chefiados por um tal Canadá, mas não foram detidos devido “à protecção que recebem da população da área”. De posse da informação de que o posto português de Namizalo seria atacado, na noite de 14 de Maio, por elementos idos da Zâmbia, alertou Rebelo de Sousa pelo telefone e fez o mesmo a Vasco Futscher Pereira, que passou a informação aos militares da Beira: “O ataque veio a verificar-se na noite de 15 para 16, mas a nossa guarnição estava alertada. Ignoro detalhes.” Estava a fixar-se, segundo J.J., um esquema que visava limitar as consequências das múltiplas informações fantasiosas sobre a actividade subversiva proveniente do Malawi”. Por exemplo, o padre nacionalista Mateus Gwengere não estava no Malawi, segundo J.J., mas na Zâmbia. Os boatos davam como certos a sua presença no Malawi e um seu encontro com Banda. O que este negava.
A assistência da marinha de Portugal à “Marinha” do Malawi para fiscalização do lago Niassa era uma outra faceta da cooperação bilateral e mais uma aplicação dos entusiastas de juventude de J.J. como piloto naval e “marinheiro” da Legião Portuguesa. O tenente Manuel Agrellos, da reserva Navalk, comandava a lancha John Chilembwe, tripulada por Young Pionners treinados em Metangula. Notavam-se apenas deficiências em Nkata-Bay, devido á inexperiência do Malawi em tudo o que fosse actividade náutica, e ao facto os Young Pioneers viverem num “ambiente de rusticidade”. Alguns europeus residentes no Malawi consideravam a lancha uma unidade da Marinha portuguesa sob bandeira do Malawi, mas a actuação de Manuel Agrellos permitiu ultrapassar as dificuldades, e John Chilembwe controlava todas as embarcações do Malawi que se movimentavam no Lago Niassa. Banda pediu a J.J., em 31 de Janeiro de 1969, que os conselheiros portugueses ficassem por mais um ano, até estar seguro da capacidade dos tripulantes do Malawi que eram treinados em Metangula.(...)
O incremento de contactos sociais foi outra preocupação do cônsul do Malawi, que aproveitou o casamento de uma filha sua, na beira, para promover amizades políticas. rebelo de Sousa conheceu então Cecília Kadzamira, primeira dama do Malawi, que dispunha no país, segundo J.J., “de muito considerável influência”. O governador e a mulher convidaram-na a visitar Moçambique e Banda concordou, mas disse que gostaria de receber primeiro a visita no Malawi da esposa de Rebelo de Sousa. Banda queria que a visita coincidisse  com o Kamuzu Day, a festa do seu próprio aniversário natalício, e que J.J. e a sua mulher o acompanhassem. Convidou também o governador de Tete, coronel Cecílio Gonçalves, para a festa da independência do Malawi, em Julho J.J. achava que isso teria interesse dentro da estratégia de estreitamento das relações com o Malawi. Maria das Neves rebelo de Sousa esteve no Malawi entre 12 e 17 de Maio (1969). Banda distingui-a entre os convidados de diversas nacionalidades, e ela estabeleceu, segundo J.J. relações da maior cordialidade com Banda e “de intimidade com Miss Cecília Kadzamira, cuja importância na vida política do Malawi é conhecida”. A presença de um dos filhos de Rebelo de Sousa, pedro Miguel, então com 14 anos, contribuiu para reforçar os laços pessoais, devido até ao desembaraço juvenil e simpatia com que se comportou”. Nas cerimónias do Kamuzu Day esteve uma missão diplomática portuguesa, chefiado por Caldeira Coelho, que tinha ido ao Malawi negociar assuntos na área dos transportes. Outra visitante distinguida por Banda foi a filha do presidente do Quénia, Jomo Kenyata, que era vereadora do município de Nairobi, e que J.J. convidou a visitar Moçambique.
Vasco Futscher Pereira (ministro dos Negócios Estrangeiros em 1982 e 1983, já falecido), embaixador no Malawi, convalescia de um acidente. Mas ofereceu em honra de Maria das Neves Rebelo de Sousa uma recepção concorrida e reveladora que aquele nosso representante diplomático, vai obtendo”. Desenvolvia-se, entretanto, uma outra fonte de entendimento: no início do ano tinham sido presos no Malawi dois membros da Frelimo, Manuel Silika e Aisa Alifa, condenados em tribunal por serem portadores de armas. Estravam a cumprir pena após a qual serial libertados e devolvidos à Tanzânia. J.J. tinha uma alternativa: “Foram-me fornecidos os elementos relativos a estes elementos e sugerido que, caso isso interessasse às nossas autoridades, se poderia promover uma manobra de fuga com vinda para Moçambique. Consultei a PIDE que se mostrou interessada nestes elementos. Nos primeiros dias de Junho vai proceder-se a tal operação.” No ar, na água  no mato, no palácio de Banda, no Dondo, nos casamentos: era o J.J. total e sideral. A articulação com o Malawi passava agora por uma fase dourada. Silva Cunha, lembra que em 1969, quando Banda foi visitar oficialmente os Estados Unidos, pediu a Portugal que montasse junto á fronteira um dispositivo militar para intervir contra eventuais opositores que o quisessem derrubar. O que foi feito. Em ligação a J.J. Augusto dos Santos, ordenou a um coronel em Nampula que pusesse em stand by várias companhias. O Malawi era assim, e por uma panóplia de dependências, uma espécie de protectorado de Portugal.
In: https://sites.google.com/site/pequenashistorietas/personalidades/jorge-jardim

Veja também aqui Download Visao448_jorgejardim



FORMAS LITERÁRIAS ORAIS (AFRICANAS)




"Para Shorter (1974:117, in Altuna, 1985:37-38), "o elenco de formas literárias orais africanas resume-se no seguinte: 
a) fórmulas rituais: orações, invocações, juramentos, bênçãos, maldições, fórmulas mágicas, títulos, divisas;
b) textos didácticos: provérbios, adivinhas, fórmulas didácticas, cantos e poesias para crianças; 
c) histórias etiológicas: explicações populares do porquê das coisas, evolução das coisas até ao estado actual; 
d) contos populares: histórias só para divertir; 
e) mitos: todas as fórmulas literárias que utilizam símbolos. Melhor, são mitos certas histórias transmissoras de tradições arcaicas, de tipo religioso ou cosmológico, relacionadas com Deus ou com a criação; 
f) récitas: heróico-épicas, didácticas, estéticas, pessoais, mitos etiológicos, memórias pessoais, migrações;
g) poesia variadaamor, compaixão, caça, trabalho, prosperidade, oração;
h) poesia oficial: (histórica), privada (religiosa, individual), comemorativa (panegírica); poesia culta, ligada às castas aristocráticas e senhoriais; poesia sagrada, cantada nos ritos religiosos e mágicos, em cerimónias de sociedades secretas, em ritos fúnebres, poesia que interpreta a filosofia e os mistérios da vida e da morte; poesia popular, cantada nos jogos à volta do fogo, transmissora de ensinamentos morais e históricos;
i) narrações históricaslistas de pessoas e lugares, genealogias, histórias universais, locais e familiares, comentários jurídicos, explicativos, esporádicos, ocasionais".  

 "Vansina (1982, vol. I:160) considera as seguintes "formas fundamentais das tradições orais":
1. "poema" ("de forma estabelecida e conteúdo fixo");
2. "fórmula" ("de forma livre e conteúdo fixo");
3. "epopeia" ["de forma estabelecida e conteúdo livre (escolha de palavras)"];
4. "narrativa" ["de forma livre e conteúdo livre (escolha de palavras)"].
Veja-se do mesmo autor (1966 [?]:156) a “Tipologia de las tradiciones orales”, mais completa."

"Honorat Aguessy (1985:44-45) distribui o campo da tradição oral por cinco sectores:
1. tradição oral; 
2. toponímia e antroponímia; 
3. arte e artesanato; 
4. mitos e elementos culturais veiculados pelos relatos e rituais religiosos; 
5. fitoterapia e psicoterapia, e, em sentido restrito, a farmacopeia." 


In: http://alfabetizamos.blogspot.com.br/search/label/Tradi%C3%A7%C3%A3o%20oral

LIVRO - ANGOLA E AS RETÓRICAS COLONIAIS DE ALBERTO OLIVEIRA PINTO*


LIVRO - ANGOLA E AS RETÓRICAS COLONIAIS DE  ALBERTO OLIVEIRA PINTO*


"Angola e as Retóricas Coloniais reúne parte das intervenções - ensaios, comunicações, artigos, conferências - que o autor realizou durante cerca de uma década e que vieram a preparar a sua tese de Doutoramento em história de África, Representações Coloniais de Angola e dos Angolanos e suas Culturas (1924 - 1939), defendida na faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 2010 e publicada pela Fundação Calouste Gulbenkian em 2012.

Embora todos os estudos aqui seleccionados visem teorizar sobre as representações do “Outro” na retórica, preferencialmente literária, legitimadora do facto colonial, nem todos têm por objecto a análise de obras literárias, além de não se restringirem, nem a autores coloniais portugueses, nem ao caso angolano.

Analisam-se inicialmente duas obras de ficção da literatura europeia do século XIX, uma de Júlio Verne, outra de Emílio Salgari, versando sobre Angola, além de duas obras de banda desenhada do século XX,  uma de Hergé, outra de Jacques Martin, tendo esta última como pano de fundo o que poderiam ter sido Angola e Congo na Antiguidade Clássica. Reflecte-se também sobre os motivos pelos quais o poder colonial erigiu em Luanda, no século XIX, as estátuas de Pedro Alexandrino da Cunha e de Salvador  Correia de Sá, além de se proceder a uma abordagem geral sobre a instituição do Concurso de Literatura Colonial da Agência Geral das Colónias em 1926, ou seja, de como emergiu efectivamente a literatura colonial portuguesa. Confrontam-se, por fim, obras de literatura colonial portuguesa com obras literárias angolanas emergentes da oralidade, nomeadamente as obras de Óscar Ribas.

Inserindo-se no campo teórico da história cultural ou dos imaginários – encarando a cultura como um conjunto de significados e símbolos construídos pelos homens para explicar o mundo, que pressupõe sempre um posicionamento inevitavelmente valorativo –, estes ensaios de Alberto Oliveira Pinto propõem ao leitor um questionamento sobre o facto colonial, encarado não apenas da perspectiva da memória e da história, mas também das realidades contemporâneas que se convencionaram designar por “pós-coloniais” ou, mais concretamente, por neo-coloniais."

in: Angola e as Retóricas Coloniais (2012) Ed. Mercado de Letras



(*) Alberto Oliveira Pinto (Bibliografia gentilmente cedida pelo autor)
Alberto [Manuel Duarte de] Oliveira Pinto nasceu em Luanda a 8 de Janeiro de 1962. Licenciou-se em Direito pela Universidade Católica Portuguesa em 1986. É Doutorado e Mestre em História de África pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde colaborou como docente no Departamento de História. Leccionou igualmente noutras universidades portuguesas.

Como ficcionista publicou os seguintes romances: Eu à sombra da figueira da Índia (Porto, Afrontamento, 1990), Concerto na nespereira (Porto, Afrontamento, 1991), O Saco dos Livros (Porto, Afrontamento, 1991), A Família dos Paladinos (Porto, Edinter, 1991, juvenil), A Canção de Rolando (Porto, Edinter, 1991, adaptação), O Senhor de Mompenedo (Porto, Afrontamento, 1992),O Onagro de Sintra (Porto, Afrontamento, 1994), A Sorte e a Desdita de José Policarpo (Lisboa, Bertrand, 1995), As Filhas do Olho de Vidro (Porto, Civilização, 1996, juvenil), Mazanga (Luanda, INAL, 1998; Lisboa, Caminho 1999) e Travessa do Rosário (Luanda, Chá de Caxinde, 2001). Tem colaboração dispersa em revistas e jornais angolanos, portugueses e brasileiros e está representado em várias antologias.

No ensaio é autor dos livros A Oralidade no Romance Histórico Angolano Moderno (Lisboa, Novo Imbondeiro, 2003), Domingos José Franque e a história oral das linhagens de Cabinda (Lisboa, Novo Imbondeiro, 2004), Cabinda e as construções da sua história (1783-1887) (Lisboa, Dinalivro, 2006; Luanda, Chá de Caxinde, 2006) e Representações Literárias Coloniais de Angola, dos Angolanos e suas Culturas (1924-1939) (Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2012),Angola e as Retóricas Coloniais (2012), além de diversos estudos publicados em revistas da especialidade angolanas, portuguesas e brasileiras.

In: http://alfabetizamos.blogspot.com.br/2012/10/angola-e-as-retoricas-coloniais-alberto.html


         

29 novembro 2012

A REVOLUÇÃO SUL-AFRICANA

A REVOLUÇÃO SUL-AFRICANA


 Por Analúcia Danilevicz Pereira

Sinopse
Carregada de mitos, a história da Revolução Sul-Africana, que levou ao poder o Congresso Nacional Africano (CNA) sob a liderança de Nelson Mandela, em 1994, é ainda pouco conhecida. A transição do regime do apartheid para a democracia, por exemplo, não foi pacífica. Além disso, embora tenha melhorado a situação social dos negros, o novo governo não conseguiu eliminar os privilégios da minoria branca. Por fim, uma espécie de reação conservadora tenta, hoje, conferir significado mais positivo ao regime racista e atudo que ele representou, enquanto busca desmoralizar o CNA por sua incapacidade de conquistar mais estabilidade política e combater com efetividade a corrupção, desconsiderando que estas são dificuldades comuns às jovens democracias.
Nesta obra, a autora remonta ao processo de colonização da África do Sul por holandeses, franceses e ingleses no século 17, reconstruindo a partir daí as raízes do regime racista, quedeu origem à revolução enraizada em condições históricas peculiares - a contradição entre classe e raça. Ela também mostra como, nesse cenário, emerge sua liderança máxima, Nelson Mandela, explicitando a trajetória ainda pouco conhecida do político que se tornaria modelo mundial de resistência.
Um dos momentos decisivos para a consolidação do regime foi a vitória britânica nas guerras bôeres, entre o fim do século 19 e o começo do século 20. AGrã-Bretanha anexou os estados independentes que aqueles fazendeiros brancos, de origem holandesa, haviam estabelecido no oeste, já então minerador. Empobrecidos, eles passaram a pregar o nacionalismo africâner - contra os invasores ingleses e os nativos. Lançavam-se assim os fundamentos do racismo, que o sistema de exploração mineral empregado pelos britânicos, contrapondo trabalhadores brancos e negros, ajudou a sedimentar.
O nacionalismo africâner culminaria com as legislações segregacionistas no começo do século 20, ganharia elementos fascistas e resultaria na instituição, em 1948, do regime do apartheid, do qual os países industrializados se tornariam cúmplices. Estava posto naquele momento o ambiente para uma reação mais agressiva por parte dos negros, que na verdade começaram muito cedo a se organizar, embora pacificamente, contra o regime - em 2012 o CNA, o movimento de libertação mais antigo, completou 100 anos.
A luta armada como ação política passou a fazer parte da estratégia dos movimentos de libertação da África do Sul no início dos anos 1960. As negociações entre o CNA e o Partido Nacional só se tornaram possíveis a partir do fim da Guerra Fria, quando ambas as partes se enfraqueceram, já que o governo tinha apoio do bloco ocidental e os revolucionários, da União Soviética.
Atualmente, após quase 20 anos da transição democrática, a sólida estrutura erguida pelo apartheid permanece nas bases sociais e econômicas da África do Sul e continua dificultando o acesso igualitário da maioria da população aos recursos econômicos do país. O grande desafio, diz a autora, é aprimorar a ainda frágil democracia.



Sobre o autor
Analúcia Danilevicz Pereira
Professora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pesquisadora do Centro de Estudos Brasil-África do Sul, da mesma instituição.

28 novembro 2012

A CONSTRUÇÃO DA NAÇÃO MOÇAMBICANA


A CONSTRUÇÃO DA NAÇÃO MOÇAMBICANA


Apontamento de Jorge Heitor

Os nacionalismos de Moçambique, Angola e Guiné-Bissau é o tema de um livro editado este ano na Europa e nos Estados Unidos por Eric Morier-Genoud, que muito tem escrito sobre religião e política na África Austral.
O êxito de organização da Frelimo tem algo a ver com a capacidade dos seus dirigentes para saberem tirar benefícios das alianças globais. Isto escreve Giorgui Derlugian no livro Sure Road? Nationalisms in Angola, Guinea-Bissau and Mozambique, editado recentemente por Eric Morier-Genoud.
A escrita de uma cultura própria, como se verificou no primeiro seminário sobre esse tema organizado pela Frelimo e na antologia Poesia de Combate, pode ser vista como um esforço para se construir uma unidade de tempo e espaço, um povo e uma nação. Esta é a opinião de Maria-Benedita Basto, outro dos investigadores que neste volume se debruçam sobre as origens do Moçambique contemporâneo.
A utopia moçambicana foi a coincidência de um discurso com um lugar, um território e uma realidade, como o eram na década de 1960 as zonas libertadas e a própria luta de libertação, prossegue Maria-Benedita, Professora Adjunta da Escola de Educação Superior de Viana do Castelo, em Portugal.
Uma ideologia de modernidade, que existia na elite dominante de Moçambique, foi essencial para estruturar as relações de poder e para formar o nacionalismo que caracteriza a Frelimo. A opinião é agora de Jason Smith, que estudou Antropologia na London School of Economics e trabalha agora na Universidade de Pretória.
As ligações entre uma espécie muito particular de modernização e o nacionalismo que caracteriza o trajecto político moçambicano são demonstradas por Smith neste livro de 270 páginas incluído nas African Social Studies Series.
O Museu de Chai
Em Moçambique, todas as antigas bases da luta de libertação foram transformadas em monumentos e em 2005 criou-se em Chai um Museu Nacional da Libertação. Quem o recorda é Eric Morier-Genoud, ao reflectir sobre os nacionalismos em três das antigas colóniasa portuguesas na África.
Monumentos mais pequenos a fi guras específi cas foram inaugurados por todo o país, bem como muitos monumentos ao primeiro Presidente da República, Samora Moisés Machel.
Existe hoje em dia um forte interesse nos nacionalismos e nas nações da África onde se fala oficialmente português, tanto na sociedade em geral como no mundo académico, reconhece o editor desta obra, publicada com o apoio da associação de investigadores da revista Lusotopie.
A capa do trabalho é o mural “Terra de Cabral”, do artista Joel Bergner, mural esse existente na Fundação Amílcar Cabral, da Cidade da Praia, em Cabo Verde. E foi o mesmo editado tanto na cidade holandesa de Leiden como na cidade norte-americana de Boston.
Para além dos autores já citados, também nele colaboram David Birmingham, Michel Cahen, Philip J. Havik, Justin Pearce, Didier Péclard, Fernando Tavares Pimenta e Gavin Williams.
CORREIO DA MANHÃ – 27.11.2012

NAKUPULA CLAMA PELA SUA VALORIZAÇÃO


NAKUPULA CLAMA PELA SUA VALORIZAÇÃO

NA região de Nakupula, no distrito de Meconta, em Nampula, encontram-se muitos vestígios simbolizando a resistência secular dos povos macua contra a penetração portuguesa no norte de Moçambique, encabeçada pelo um dos considerados mais intrépidos reis desta tribo, Kupula Muno.

Estes testemunhos da história e cultura do país clamam pela sua valorização para que o local possa ser conservado e preservado, permitindo assim que as gerações vindouras conheçam esta parte do percurso do nosso país.
Muitos residentes da zona são de opinião que o estado de abandono em que actualmente se encontra o local onde decorreu também a conhecida Batalha de Malavini, envolvendo os guerreiros locais e os portugueses, não prestigia nem à população nem às autoridades, principalmente estas, vistas como quem deveria tomar acções no sentido de o local ser conservado e valorizado.
Maria Silvano, uma anciã que fez a sua vida em Nakupula, diz ver com tristeza por exemplo o memorial do rei Kupula Mano a estar no estado em que está, por falta particularmente de valorização. Na sua óptica, aquele local bem conservado e preservado podia trazer consigo valores que contribuiriam para a educação patriótica dos cidadãos.
“É um local de importância histórica ímpar, apesar de se encontrar num estado de abandono, recebe muitas pessoas que querem conhecer os feitos dos reis macuas, neste caso Kupula Muno, durante a resistência contra a penetração portuguesa no norte de Moçambique. Tendo em conta isso, já deveriam ter sido construídas algumas infra-estruturas para acomodar visitantes e mesmo para informar as gerações novas sobre o que ali aconteceu”, comentou a anciã.
Por seu turno, Fernando Arlindo, responsável da associação dos jovens daquela região, destacou que Nakupula é um lugar de interesse histórico, daí haver a necessidade de se preservar, conservar e promover o local no sentido de efectivamente imortalizar aquele património histórico, cultural e didáctico. A associação destaca-se na promoção de algumas actividades relacionadas principalmente com a sensibilização da sociedade sobre a necessidade e importância da valorização da região de Nakupula.
Fernando Arlindo afirmou que a colectividade juvenil de que é dirigente vai continuar a desenvolver acções concretas com vista a dignificar aquele local, sensibilizando as pessoas para a necessidade de valorizarem os feitos do rei Kupula Muno e outros na resistência à colonização portuguesa.
Todavia, e porque tais acções só terão efeitos desejados com o envolvimento das estruturas que tutelam o sector da Educação e Cultural na zona, Arlindo afirmou que vai encetar contactos junto dessas estruturas e espera que elas se mostrem receptivas.
Entretanto, o porta-voz da direcção provincial da Educação e Cultura em Nampula, Fernão Cacecasse, disse sem entrar em pormenores, quando contactado pela nossa Reportagem a propósito do assunto, que tanto em Nakupula como noutros locais que simbolizam a resistência do povo moçambicano ao colonialismo português existentes na província de Nampula, há um trabalho que está a ser feito com vista a valorizar e eternizar a nossa história neles. 

Maputo, Quarta-Feira, 28 de Novembro de 2012:: Notícias



LIGAÇÕES TRANSATLÂNTICAS: MARES, MEMÓRIAS E LUGARES NO TRABALHO DE MÓNICA DE MIRANDA
Se eu estudar, eu procuro apenas aprender o que se relaciona com o conhecimento de mim mesmo
Michel de Montaigne

Durante o período compreendido entre  1605  e 1609 o número de publicações geográficas na Europa cresceu exponencialmente para alcançar a mesma figura que todos os livros publicados desde o começo da impressão em 1550. Este fenômeno esteve diretamente ligado ao enorme impacto que a expansão colonial teve  na mente dos europeus. Os Livros queriam transmitir as viagens de descobrimento, com suas representações de territórios desconhecidos e a  presença mágica de “outras” culturas, tornou-se material de leitura elegida. A civilização que invadiu a América Latina na viragem do século 16 foi impulsionada pelo ritmo da explosão criativa conhecida como a Renascença. A essa luz, a América parecia ser, de acordo com Eduardo Galeano, “mais uma invenção, incorporada ao lado da pólvora, a imprensa, o papel e a bússola, no iminente nascimento da Idade Moderna”.

No contexto da expansão colonial e do nascimento do capitalismo, viajar era um veículo para se conectar interesses econômicos e políticos aos recursos naturais e humanos. Por mais que uma reflexão sobre esses impulsos como expressão da interconexão proposto pela globalização, um número considerável de artistas articulam a experiência  das  viagens, migração e deslocamento como a armadura conceitual do seu trabalho.
Viagens no imaginário de Monica de Miranda torna-se uma metáfora para o que Walter Mignolo chama de “ferida colonial”: como uma maneira de explorar seus múltiplos movimentos e da sua família entre lugares ligados por uma matriz colonial comum, onde ela constrói o seu próprio mapa emocional em uma variedade dos mediums. Pode-se argumentar que os lugares escolhidos para o seu trânsito sugerem uma reflexão sobre a descolonização que nos termos dos zapatistas nos levaria a um mundo que se encaixa em  muitos mundos: uma proposta  pluriversal-  em oposição ao universal - à leitura da realidade.

Seguindo a lógica implícita da política do corpo e em contraste com a geopolítica - que incide sobre a relação entre poder e espaço - o artista localiza o objeto de estudo no indivíduo. Neste território da subjetividade, a casa torna-se uma mudança de paradigma, onde a viagem do pessoal é essencialmente uma tentativa constante de pertencer. Superando as limitações da política de identidade, a produção artística de Mónica de Miranda torna-se um exercício de mapamento da sua própria  geografia emocional.
A Casa como um território delimitado pelo corpo é representado graficamente no trabalho baseado em texto Come Home to the place you have never left, apresentado na Carpe Diem como um prólogo para a épica ‘novela’ da sua viagem que se apresenta em capítulos, no tríptico do vídeo Once upon a time. Como exemplo mais convincente da tentativa de recriar e reinventar a geografia, o tríptico oferece uma rica panóplia de imagens fragmentárias coletadas durante os trânsitos do artista através de três continentes. O vídeo tece uma história complexa em que lugares fictícios e reais cruzam espaços pessoais de memória e desejo de construir uma narrativa que não é linear.
O  recurso ao uso de mapas em corpos era já visivel em trabalhos anteriores da artista, como no caso de Where r u from? (2007), agora nas suas mais recentes produções este processo atinge o seu clímax poético no que não é dito e fica ausente  no processo de misturar lugares com o qual ela tem laços emocionais - Angola, Rio de Janeiro,  Lisboa, Londres e Cabo Verde - como em um jogo de cartas imprevisível.

No seu outro trabalho na exposição, Home sweet sour house, a artista faz uso do desenho para criar uma série de representações de memória de todas as casas que habitou durante a sua vida. A partir dos contornos imprecisos de casas de infância até ao seu domicílio atual, o exercício descritivo é interrompido pela passagem do tempo, enquanto quebrado pelo conflito de exílio, ou migrações e pela a inquietação  da ambigüidade de sentimentos. O resultado é uma linguagem codificada na necessidade de tradução. Mais tarde interpretado por um arquiteto em renderings técnicos, os desenhos a mão tornaram-se placas virgens mostrando layouts sensíveis que, todavia, mantem as características pessoais trazidos de volta a memória: quartos de proporções incertas retem  os nomes das pessoas que ocuparam os diferentes espaços. Home sweet sour house, mais uma vez, é um repositório de memória, um arquivo pessoal feito de caligrafias expressivas que reconstroem o espaço da tradição oral. Oralidade esta , neste caso, ligado com a maternidade. Através de imagens intercaladas de uma mãe e sua filha que apresentam uma conexão tão profunda como o oceano onde o individuo  precisa encontrar o rumo. Evocativo das figuras femininas de sincretismo Yemanjá e Iansã, deusas do panteão Yoruba, mães das águas e úteros de história, o vídeo liricamente descreve a perda e a dor da separação. O conhecimento oral constrói um fio condutor que é passado de geração em geração como numa paisagem de ascendências fragmentadas , onde a continuidade repousa apenas nos vasos sanguíneos.

O segundo capítulo da viagem de Once upon a time é apresentado na Plataforma Revólver na Transboavista, intitulado de An ocean between us, foi possível pela proximidade artistas para o porto fluvial do rio Tejo, em Lisboa. Em Um oceano entre nós, vemos o porto fluvial e um navio de carga estacionária se tornar o palco de trânsitos metafóricas: como uma passagem entre os dois mundos, o forro evoca as viagens que ligavam os continentes através dos mares, garantindo terreno para o encontro de culturas, a expansão do comércio, e também o início da escravidão. Concebido como um conjunto de caixas de luz e projeção de vídeo, um oceano entre nós lida com a ambiguidade espacial com tons melancólicos.

Navios para viagens marítimas, fases em que cordões umbilicais simbólicos unem as partes perdidas: um oceano e um rio, uma mãe e uma filha, um amor perdido, e a promessa de um reencontro são elementos de uma catarse. Os vários capítulos desta exposição itinerante aspiram a apresentar uma arqueologia do eu através de passagens e paisagens. Nele, a viagem torna-se um veículo de conhecimento, onde a representação não pode ser confiável como as representações de lugares residem dentro do reino do inconsciente, e as memórias são as ferramentas para um exercício de cura da ferida colonial - e pessoal.

Londres, setembro 2012

25 novembro 2012

ENTENDA COMO A FAMÍLIA GUEBUZA ENRIQUECE COM A “NEGLIGÊNCIA” NO ESTADO



ENTENDA COMO A FAMÍLIA GUEBUZA ENRIQUECE COM A “NEGLIGÊNCIA” NO ESTADO


Promiscuidade entre governação e negócios (I)
Todo aquele que controla o volume de dinheiro de qualquer país é o senhor absoluto de toda a indústria e comércio, e quando percebemos que a totalidade do sistema é facilmente controlada, de uma forma ou de outra, por um punhado de gente poderosa no topo, não precisaremos que nos expliquem como se originam os períodos de inflação e depressão.” – James Abram Garfield (1831 –1881), 20º Presidente dos EUA, semanas antes de ser assassinado
“Armando Emílio Guebuza tem intenção, sim, não de continuar a dirigir o Estado moçambicano, porque tem um impedimento constitucional, mas ele quer manter-se no xadrez político nacional, que é para continuar, porque há um tipo de negócios que você consegue quando controla o poder” – Adriano Nuvunga, Director do Centro da Integridade Pública (CIP), em entrevista ao Canal de Moçambique no dia 03 de Outubro de 2012
Borges Nhamirre
Quando através de uma das suas Holdings, a “Focus 21 - Gestão e Desenvolvimento Limitada”, nomeadamente, a família Guebuza, a família do actual chefe de Estado moçambicano, criou a “Startimes Media Company Mozambique, Limitada”, em 2010, em parceria com a “SDTV Holdings da China”, era para muitos moçambicanos, mais uma de muitas empresas de que esta família presidencial possui.

In: http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2012/11/entenda-como-a-fam%C3%ADlia-guebuza-enriquece-com-a-neglig%C3%AAncia-no-estado.html

24 novembro 2012

RENAMO ANUNCIA CINCO PONTOS PARA NEGOCIAR COM A FRELIMO



RENAMO ANUNCIA CINCO PONTOS PARA NEGOCIAR COM A FRELIMO

Os pontos que a Renamo pretende negociar são o Acordo Geral de Paz, defesa e segurança, processos eleitorais, questões económicas e despartidarização das instituições do Estado.
A Renamo tem cinco pontos para negociar com o Governo moçambicano liderado pela Frelimo.
Segundo um documento enviado pela Renamo ao Gabinete do primeiro-ministro, Alberto Vaquina, os cinco pontos que a delegação do maior partido da oposição pretende negociar são o Acordo Geral de Paz, assinado há 20 anos em Roma, defesa e segurança, processos eleitorais, questões económicas e despartidarização das instituições do Estado.
O documento foi igualmente enviado a algumas embaixadas ocidentais em Maputo e ao Secretário Executivo da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, SADC, Tomaz Salomão, por sinal economista moçambicano que já foi membro do Governo.
Em relação ao Acordo Geral de Paz, a Renamo está preocupada com aquilo que considera falta de reintegração dos seus antigos guerrilheiros na Polícia.

Segundo o antigo movimento rebelde, o governo alegou falta de condições financeiras para a conclusão do processo de integração que era financiado pela Comunidade Internacional, através das Nações Unidas.
Mas o governo considera que a Renamo não colaborou devidamente, porque queria continuar a usar os seus homens armados para ganhos políticos depois da formação do exército único no âmbito do AGP.
No ponto relativo à defesa e segurança, a Renamo quer discutir com o governo o que considera discriminação dos antigos guerrilheiros integrados nas forças armadas.
Para o partido de Afonso Dhlakama, os processos eleitorais iniciados em 1994 não têm sido livres nem transparentes porque os órgãos eleitorais são dirigidos por membros da Frelimo.
A Renamo considera que a economia do País é dominada por veteranos da Frelimo que partilham a riqueza nacional entre si, excluindo a maioria da população sobretudo os membros da oposição.
Para a Renamo, as instituições do Estado são prolongamentos das células da Frelimo que sempre agiram a favor do partido no poder.
Estas são preocupações que segundo o documento, levaram Dhlakama a voltar as matas de Gorongosa, província de Sofala, centro do País.
VOA – 23.11.2012
In: http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2012/11/renamo-anuncia-cinco-pontos-para-negociar-com-a-frelimo.html#more

22 novembro 2012

S IS FOR SAMORA, DE SARAH LEFANU


S IS FOR SAMORA, DE SARAH LEFANU


A premiada escritora Sarah LeFanu escreveu uma nova e significante biografia de um dos maiores heróis da libertação da Africa com o tiítulo de  « S é para Samora Machel. » A autora descreveu o seu livro como uma « Biografia lexicográfica de Samora Machel e do sonho moçambicano ». A  biografia toma em conta o discurso de igualdade, liberdade e o camaradismo que animou a luta de libertação da Africa austral nos anos 1960 e 1970 no contexto  do decurso da Guerra Fria.
Em 1974, Samora Machel dirigiu a Frelimo, a Frente da Libertação de Moçambique, à vitoria sobre o governo colonial português.  No ano seguinte, ele tornou-se o primeiro presidente de Moçambique e 11 anos  mais tarde morreu num acidente misterioso de avião que muita gente suspeita de ter sido engendrado pelo governo do aparthheid da Africa do Sul.
Analisando os discursos, documentos, as memórias daqueles que conheceram Machel e   evidências  anedotais, a biografia  apresenta as várias facetas do homem que Nelson Mandela descreveu como “um verdadeiro revolucionário africano. »
Machel  foi treinado como enfermeiro, mas ele não podia aturar a opressão colonial e acabou por se transformar no mestre estratega militar.
Filho dum machambeiro com profundos conhecimentos diplomaticos para balançar a relaçao com a China e a União soviética – enquanto atraindo dirigentes ocidentais tais como Margaret Thatcher – Machel era um homem do povo que ao mesmo tempo se encontrava completamente isolado.  Embora um proponente dedicado à paz, ele só enfrentava a guerra.
«Fazendo uso do jornalismo, diários e pesquisa académica, LeFanu consegue apresentar vários aspectos de grande profundeza do Machel que ainda não eram conhecidos  até à data. A autora apresenta uma profunda imagem pessoal e politica de Machel que o transforma no líder  famoso que era, »  escreve Patrick Chabal, Professor da História Africana de King’s College em Londres  no Reino Unido.
Susan Williams, pesquisadora senior no Instituto de Estudos da Commonwealth, diz na introdução ao livro: « Um livro brilhante que faz uma fresca contribuiçao para o nosso  entendimento do Moçambique postcolonial e dos seus vizinhos  na Africa austral. »
Sarah LeFanu é a autora da aclamada biogafia “Rose Macaulay” e do premiado livro “In the Chinks of the World Machine: Feminism and Science Fiction.” Ela diza que Samora Machel foi uma pessoa que deixou uma herança fascinante, adiantando  que ele era “necessariamente” um homem que  falhou e também herói ao mesmo tempo.
LeFanu nota que quando Machel assinou o pacto de não-agressão, o Acordo de Nkomati, com a Africa do Sul em 1984, ele tinha sem duvida sido enganado por Pretória para cometer um dos seus  piores erros na vida do seu país. Não obstante, Machel era ao mesmo tempo um homem de dignidade e  de humor,  que dirigiu  uma pequena naçao – quase na bancarota – a uma posição respeitável de  influência na sua região e no Terceiro Mundo.  E ele mantinha  elementos rivais no seu partido durante tempos de adversidade e guiou o seu governo ao longo dum percurso pragmático.
Veja 
http://www.angusrobertson.com.au/book/s-is-for-samora-a-lexical-biography-of-samora-machel-and-the-mozambican-dream/31059960/
In: http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2012/11/s-is-for-samora-de-sarah-lefanu2.html#more