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28 março 2013

BRICS EM ÁFRICA: NEOCOLONIZAÇÃO OU COOPERAÇÃO?

BRICS EM ÁFRICA: NEOCOLONIZAÇÃO OU COOPERAÇÃO?


Uns dizem que é uma nova linha de colonização, outros preferem chamar de cooperação.
Teorias à parte, África é o único lugar onde há matéria-prima para a indústria dos BRICS e, ao mesmo tempo, só eles têm força para investir no continente. O caminho está aberto, mas o destino depende das escolhas políticas.
O grupo dos países emergentes denominado BRICS, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, terminou, esta quarta-feira (27 de Março de 2013), a sua reunião em Durban, na África de Sul, com a decisão de criar um banco de desenvolvimento para apoiar infra-estruturas (portos, rodovias, aeroportos) e desenvolvimento sustentável (energia, irrigação, agricultura) nas suas potências e nos países em desenvolvimento.
Uma outra decisão tomada na V Cimeira dos BRICS foi a criação de um fundo de reservas, de 100 biliões de dólares, que deverá ser usado em caso de crise financeira internacional. O fundo anti-crise é denominado Arranjo de Contingente de Reservas.
A China vai entrar com 41 biliões de dólares, Brasil, Rússia e Índia com 18 biliões cada e a África do Sul, menor economia do grupo, vai ingressar com 5 biliões de dólares.
Estas decisões surgem numa altura em que se verifica uma corrida em massa destes países para África, onde disputam os recursos naturais e mercados para venda dos seus produtos.
Alguns analistas internacionais não acreditam que este apoio dos BRICS a infra-estruturas dos países em desenvolvimento traga algum benefício às comunidades, isto porque até mesmo os chineses, que são os maiores investidores do grupo em África, têm importado matéria-prima e até trabalhadores da China, para levantar infra-estruturas, deixando de criar emprego no continente.
Não será esta entrada dos países emergentes em África uma forma de fortificar a sua presença no continente, no sentido de aproveitarem as grandes jazidas de minérios, petróleo e outros recursos naturais valiosos existentes em abundância?


Analistas consideram que a ideia dos BRICS, de apoiar os projectos de construção de infra-estruturas nos países em desenvolvimento, pode ter surgido também para melhorar as condições de manuseamento e logística dos recursos explorados pelas empresas que fazem parte do seu bloco.
A África do Sul tinha esperança de sediar a nova entidade bancária, para acelerar o ciclo de desenvolvimento criado nos últimos anos pelos investimentos chineses e brasileiros e irradiar optimismo a todo o continente. Mas as negociações emperaram com a resistência da Rússia. Moscovo não vê utilidade no banco de fomento dos BRICS.
A Rússia tem menos necessidades em infra-estruturas e, além disso, os emergentes já têm bancos de desenvolvimento nacionais consolidados, que podem tocar os projectos intra-Brics.
Foram convidados a participar no encontro os presidentes em exercício das oito comunidades económicas regionais africanas, nomeadamente da SADC, da Comunidade da África Oriental, da Comunidade Económica dos Estados da África Central, da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento, do Mercado Comum da África Oriental e Austral (COMESA), da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) e da União Árabe do Magrebe (UAM), e ainda o Presidente da União Africana.

BRICS COMPETEM PARA GANHAR TERRENO NA ÁFRICA
Para os habitantes da cidade de Durban (local da reunião dos Brics) consideram que quando se pensa  na reunião de cúpula entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, os Brics – um empreendimento vem à mente quando o assunto é o aumento da presença dos países emergentes na África do Sul: o "Shopping Center China".
Com 40 mil metros quadrados e mais de 400 lojas, esse megacentro comercial inaugurado há sete anos (e expandido três vezes) fica aberto sete dias por semana para vender os mais variados tipos de produtos com apenas dois aspectos em comum - preços acessíveis e a etiqueta que informa: "Made in China".
O Shopping Center China – com filial em Johanesburgo – é a face mais visível do fenômeno que ganha força e tornou-se um dos principais temas da cúpula dos Brics: a corrida da China e dos outros países do clube de emergentes para "fincar o pé" na África, ocupando espaços que tradicionalmente pertenciam a potências coloniais europeias.
Se no passado os europeus brigavam pelo direito de explorar terras e jazidas minerais do continente, agora, cada vez mais, são os Brics que disputam os recursos naturais e os mercados africanos.
"É natural haver um acirramento na disputa por alguns filões de negócios entre os países emergentes, conforme os investimentos na África cresçam", disse à BBC Brasil Wayne Morris, diretor da consultoria africana GSEC e membro do conselho da Brand South Africa, entidade que cuida da imagem e promoção de negócios da Africa do Sul.
"Os indianos e os chineses são os que têm presença mais forte na África do Sul, por exemplo – e entre eles já há disputa. O Brasil e a Rússia também estão ampliando sua presença em outros lugares. Mas a competição entre esses países têm tudo para ser saudável – para eles e, principalmente, para a África que terá mais opções de investimentos", acredita.
Harry Shmelzer, presidente da WEG - empresa brasileira líder do mercado de motores elétricos que há três anos tem uma fábrica com 600 funcionários na África do Sul (embora faça negócios com o país há mais de três décadas)- , disse à BBC Brasil que a concorrência com os chineses em sua área já é acirrada.
"Os chineses oferecem uma concorrência agressiva aqui e em outros lugares – mas já sabemos que precisamos estar preparados para isso", diz ele.

Presença dos Brics
Segundo um estudo do sul-africano Standard Bank (banco no qual hoje os chineses têm uma participação de 20%), na última década o volume de trocas comerciais dos Brics com a África aumentou dez vezes, chegando a US$ 340 bilhões – mais que o comércio entre os demais países do grupo (de US$ 310 bilhões)
A China é sem dúvida o país dos Brics cujos negócios mais avançaram no continente africano nos últimos anos, principalmente em função do interesse chinês por recursos naturais. Só o comércio com a África aumentou 20 vezes de 2002 a 2012, passando dos US$ 200 bilhões – o que em parte explica o sucesso do Shopping Center China e outros empreendimentos similares. Segundo estimativas do governo chinês, o país teria um estoque de investimento na África de US$ 20 a US$ 40 bilhões.
A Índia também teve um aumento substancial dos investimentos na região nos últimos anos, apostando em áreas como agricultura, telecomunicações e o setor automobilístico, principalmente no sul e no sudeste sul-africanos. A Rússia tem investimentos na Tunísia, Nigéria, Uganda e África do Sul. Já o Brasil, tem uma presença cada vez mais forte na África lusófona – Moçambique e Angola – embora empresas como a Marcopolo, a Weg e a Camargo Correa também estejam presentes na África do Sul.
Moçambique abriga empreendimentos da Vale e da Odebrecht, uma das maiores empregadoras locais, e Angola é o maior receptor dos investimentos brasileiros no continente (seriam R$ 7 bilhões, segundo estimativas de 2011 da Associação de Empresários e Executivos Brasileiros em Angola). Empresas como Petrobras e as construtoras Odebrecht e Andrade Gutierrez têm operações sólidas no país há muitos anos.
Além disso, Angola é também a principal receptora de investimentos da China na África – então já é natural que brasileiros e chineses tenham de competir para ganhar a licitação de projetos de infra-estrutura e exploração de recursos naturais.
"Nossos investimentos ainda estão muitos concentrados nesses dois países. Comparando com os indianos e chineses, acho que os brasileiros estão perdendo oportunidades no continente africano em função de um certo receio dos empresários em explorar o continente", acredita Roberto Paranhos do Riobranco, presidente da Câmara de Comércio Brasil-Índia que está na África do Sul para participar do encontro de empresários que acompanha a cúpula dos Brics.


'Representação'
Não foi à toa que os investimentos dos Brics na África se tornaram um dos principais temas do encontro do clube dos emergentes em Durban, como explicou à BBC Brasil Oliver Stuenkel, professor da Fundação Getúlio Vargas que está na África do Sul participando de uma série de debates acadêmicos paralelos ao encontro.
A África do Sul foi incluída nos Brics em 2010 - antes disso o grupo era chamado de Bric. Stuenkel diz que o país obteve sucesso em sua candidatura ao clube dos emergentes, apesar do tamanho de sua economia ser equivalente a de uma Província chinesa, ao se apresentar como um "representante" ou um "interlocutor" para a África frente aos outros quatro países.
"A verdade é que se a África (continente) fosse um país, certamente seria um Brics. O tamanho de sua classe média é comparável a indiana e está se expandindo. Além disso, muitas partes do continente têm crescido em um ritmo acelerado", diz Stuenkel. "Mas é difícil pensar que a África do Sul possa falar por todos os países da região."
Três fatores tornam a África atrativa para investimentos dos Brics. Primeiro, a presença de grandes jazidas de minérios, petróleo e outros recursos naturais valiosos no continente. Segundo, o grande crescimento da classe média africana – e aumento do consumo provocado por tal enriquecimento. Por fim, a previsão de gastos bilionários no setor de infraestrutura em países que recém adquiriram estabilidade política e econômica, mas nos quais faltam estradas, portos, aeroportos, etc.
Segundo o FMI, sete dos dez países que mais crescem no mundo estão na África. E ainda que isso ocorra porque tais países partem de uma base muito baixa de desenvolvimento econômico, para muitos empresários dos Brics tal crescimento significa bons negócios e margens de lucro satisfatórias para compensar os riscos africanos.

Novo colonialismo?
Durante a cúpula em Durban, o presidente sul-africano Jacob Zuma irá mediar uma série de encontros entre países do Brics e outros líderes africanos. Nas preparações para o encontro, porém, o que chamou mais a atenção em seu discurso sobre os investimentos do Brics foi uma aparente expectativa de que eles sejam "cooperativos", diferente dos investimentos europeus – que segundo o líder sul-africano seriam "colonialistas".
Uma semana antes do encontro, durante uma conferência sobre temas educacionais, Zuma prometeu: "Os Brics vão contribuir imensamente para satisfazer as necessidades dos jovens da África do Sul de encontrarem trabalho."
A promessa foi feita dias depois de o presidente sul-africano ter dado uma entrevista ao jornal britânico Financial Times na qual exortou as empresas europeias a mudarem seu "velho estilo colonialista na África", lembrando que agora o continente tem a "alternativa" dos Brics.
"Os Brics pretendem apoiar os esforços da África para acelerar a diversificação e modernização de suas economias através do desenvolvimento de infraestrutura, troca de conhecimento, acesso a tecnologias, construção de novas capacidades e investimento em capital humano", diz um documento oficial do encontro, divulgado pelo governo sul-africano.
Para alguns analistas, porém, as expectativas de Zuma podem não ser atendidas. Marcos Troyjo, do laboratório sobre Brics da Universidade de Colúmbia, nos Estados Unidos, por exemplo, lembra que os chineses são conhecidos por um estilo "agressivo" de fazer investimentos – importando matéria prima e até trabalhadores da China para levantar obras de infraestrutura em países africanos.
Além disso, seu interesse maior seria a extração de recursos naturais da África e a venda de produtos chineses para o continente, atividades que não são conhecidas por sua ampla geração de empregos qualificados (apesar de o Shopping Center China dizer que emprega um total de 1.600 pessoas).

'Moderar otimismo'
Jim O’Neill, economista conhecido por criar o termo Bric em 2001, concorda que é preciso moderar o otimismo com os investimentos dos Brics: "Não há como garantir que multinacionais desse ou daquele país vão se comportar de forma diferente. Empresas globais enfrentam os mesmos desafios para se adaptar às regras locais e ao final têm o mesmo objetivo, que é conseguir retorno para seus investimentos", diz.
No caso dos investimentos brasileiros, analistas e empresários costumam enfatizar as diferenças de "estilo" em relação aos chineses. As empresas do país seriam mais flexíveis e mais dispostas a se adaptar à cultura e realidade local, contratando trabalhadores africanos, por exemplo. Mas em Durban alguns empresários e executivos brasileiros que não quiseram se identificar também expuseram para a BBC Brasil o receio de que o governo sul-africano esteja esperando demais das empresas.
"Não dá para querer que as companhias estrangeiras façam todo o trabalho para desenvolver a África", disse um deles. "Os africanos também precisam fazer suas obrigações e investir mais na formação de trabalhadores e racionalização da burocracia de seus países para compensar os riscos e contratempos de se investir no continente – que ainda existem e são muitos."
Para explica o consultor Wayne Morris, da Brand South Africa, "não há como negar que existe um debate sobre os 'elementos colonialistas' dos investimentos dos Brics, e em especial dos chineses."
"A África do Sul e os outros países do continente estão plenamente cientes desses riscos", diz. Ele lembra, porém, que por muito tempo países africanos atraíram o interesse apenas de países desenvolvidos e que a aprovação de empréstimos para projetos de infraestrutura por entidades como FMI e Banco Mundial era condicionada à adoção de reformas neoliberais.
"A grande novidade é que agora temos mais opções e ao menos podemos discutir as condições dos investimentos e empréstimos com empresas e países de ‘igual para igual’ – o que nos dá uma margem de manobra que não tínhamos no passado para evitar esses riscos", opina.
Ruth Costas (Enviada especial da BBC Brasil a Durban (África do Sul- Atualizado em  26 de março, 2013 - 07:18 (Brasília) 10:18 GMT)

BRICS REJEITAM ACUSAÇÕES DE SEREM NOVOS IMPERIALISTAS
Brics rejeitam acusações de serem "novos imperialistas" na África. "Brics, não dividam a África" diz um cartaz no salão de uma igreja no centro de Durban, onde ativistas da sociedade civil juntaram-se para lançar um olhar crítico sobre a cúpula dos cinco poderes globais emergentes. Ativistas anti-pobreza afirmam que as grandes empresas dos Brics que atuam na África buscam o lucro, assim como as empresas do mundo rico. Os chineses e outros líderes dos Brics rejeitam indignados às críticas de que o grupo representa um tipo de "sub-imperialismo". A gigante brasileira da mineração Vale, nomeada em 2012 pelo grupo suíço sem fins lucrativos Public Eye como a empresa com o maior "desprezo para o meio ambiente e os direitos humanos" no mundo. O presidente da Associação Mato-Grossence dos Produtores de Algodão (Ampa) afirmou que “Moçambique é um Mato Grosso no meio da África, com terra de graça, sem tanto impedimento ambiental e frete mais barato para a China”. O ProSavana, projecto para a produção de soja e outros alimentos para a exportação pelas empresas brasileiras abrangerá uma área estimada em 14,5 milhões de hectares nas províncias de Nampula, Niassa e Zambézia, onde cerca de 5 milhões de camponeses vivem e produzem alimentos para o abastecimento local e regional.

Jornais: A Verdade e CanalMoz – 27/03/2013 e 25/03/2013.

Numa altura que se critica a relação Norte Global com o Sul Global como sendo de dominação ou de hegemonia da primeira sobre a segunda, hoje constata-se que mesmo nas relações entre os países do Sul Global começam a aparecer novos grupos dominantes e hegemónicos- como é o caso da BRICS. É uma situação a ser refletida. Afinal o que pretendem os BRICS em África?

Compilação de Jorge Fernando Jairoce



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