Por Marcelino Síthole
Quem são os heróis?
É
uma pergunta, que vem ao espírito de quem acaba de ler o relatório de Fanuel
Guidion MAHLUZA, que o «Canal de Moçambique» publicou há dias.
Mahluza apressou-se a escrever (em inglês) e enviar para «Amnesty
International» (Amnistia Internacional) este relatório, pouco depois de chegar
a Nairobi, em proveniência do campo de "reeducação" de «Ruarua»,
planalto de Mueda de onde se tinha evadido, a 27 de Agosto de 1977, com Artur
Janeiro da Fonseca, Atanásio Filipe Muhate e Lumbela.
Cansado pela viagem e traumatizado pelas privações e a perda de dois dos
companheiros de evasão, a principal preocupação de Mahluza era a sorte dos
numerosos combatentes da liberdade, estudantes e intelectuais, que a FRELIMO
tinha internado nos seus campos de concentração, oficialmente designados por
campos de "reeducação". Como se sabe, também o governo de Hitler, na
Alemanha, tinha designado os seus campos de concentração e exterminação por campos
de "trabalho": Die Arbeií machlfrei! (O trabalho liberta!), era a
divisa destes campos.
Entre os presos políticos e de consciência dos campos de "reeducação"
encontravam-se milhares de Testemunhas de Jeová, por adorarem Deus e cumprirem
os seus mandamentos, quase todos os dirigentes do COREMO e de outros partidos
nacionalistas moçambicanos não financiados pelo neocolonialismo soviético, por
acreditarem no pluralismo, tolerância e valores morais tradicionais do povo
moçambicano, Joana Simeão admirada e recordada até hoje, por força da sua
coragem de mulher africana, assim como dezenas de estudantes regressados de
vários países da Europa, da América e de África, por terem aprendido a pensar
com as suas próprias cabeças. Entre estes estudantes havia Samuel Mapilele,
brilhante intelectual, militante da UGEAN, diplomado em economia pela
Universidade de Belgrado, Sebastião Mucavaca, regente agrícola formado na
Tunísia, que tinha alcançado com Bartolomeu Mbalica, depois de atravessarem a
África do Oceano Índico ao Mediterrâneo pêlos seus próprios meios e tantos
outros, que lá perderam a vida e de cujos talentos e conhecimentos Moçambique
nunca viria a beneficiar. Saídos com vida destes campos de
"reeducação", só tenho notícia de F. G. Mahluza e Artur Janeiro da Fonseca,
que um dia nos contará, como conseguiram atravessar o Rovuma, escalar o
Kilimanjaro e chegar a Nairobi a pé, pelo mato, entre as feras.
Dos que lá desapareceram, Mahluza cita muitos nomes. Será uma metade, um
terço,...? O número de nacionalistas, estudantes e intelectuais moçambicanos
desaparecidos, logo após a independência, parece atingir proporções de
genocídio, sobretudo para a nossa jovem nação desprovida de recursos humanos
qualificados. Os Nazis, que dirigiam os campos de "trabalho" da Alemanha,
mantiveram registos, que permitiram apurar os números do genocídio de milhões
de alemães. No Camboja, ainda se podem contar as caveiras. Haverá jornalistas e
historiadores moçambicanos interessados em esclarecer o que se passou, no nosso
país? Se a publicação deste relatório contribuísse de alguma maneira para
suscitar o interesse dos profissionais competentes e isentos, que já cá temos,
sobre este aspecto da nossa história recente, F. G. Mahuza, apesar de não ter
podido evitar o pior, quando redigiu o seu relatório, não o teria feito em vão.
Mahluza, que nos deixou o ano passado e está sepultado na sua terra de
Moçambique, foi um combatente da liberdade corajoso e um patriota e
nacionalista exemplar.
Foi fundador e dirigente da UDENAMO, antes de Marcelino dos Santos ter aderido
a essa organização. Foi fundador e eleito para o Comité Central da FRELIMO.
Quando, depois do Congresso Constitutivo, o Presidente Professor Eduardo
Mondhlane se ausentou temporariamente para a sua Universidade de Syracuse, a direcção
da FRELIMO em Dar Es Salaam entrou em crise, registando-se expulsões e
demissões. A UDENAMO foi reconstituída e abriu escritório no Cairo, com Paulo
Gumane e F. G. Mahluza, para, mais tarde, se integrar no COREMO, em Lusaka.
Foi Mahluza, quem abriu a frente de luta armada em Tete: atacou o posto
administrativo e içou a bandeira do COREMO em Fingoè. Antes de atacar, mandara
avisar o chefe do posto, que tinha andado com ele na Escola Técnica de Lourenço
Marques, permitindo-lhe fugir com a família. Os guerrilheiros do COREMO da
província de Tete dirigidos por Mazunzu Bobo foram, mais tarde, convidados pela
FRELIMO a discutir sobre a "unidade de acção contra o colonialismo" e
trucidados, numa cilada. Depois da independência e da evasão de Ruarua, Mahluza
tornou-se dirigente da RENAMO e trabalhou, em Pretória, com o Secretário-Geral
Orlando Cristina, que ele, como muitos outros, considerava um Homem. A RENAMO,
todos sabem, trouxe, mal ou bem, a democracia para Moçambique.
Nas suas conversas Mahluza, referia-se às vezes ao seu primo, rindo-se com
tristeza daquele ilustre e consagrado herói, que, por ambição, más influências,
insensatez e complexos pessoais, tinha feito cair Moçambique dentro dum poço
muito fundo cheio de águas turvas.
Mahluza foi um nacionalista moçambicano da primeira hora e de todos os momentos
guiado por princípios nobres, pêlos ideais da fraternidade, justiça, liberdade
e democracia, que sempre se manteve alheio a interesses mesquinhos e ao racismo
e tribalismo e que sempre se levantou contra as injustiças.
In: CANAL DE MOÇAMBIQUE – 16.03.2006
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Por Fanuel Guidione Malhuza
Ao Sr. Malcolm Smart
Amnistia Internacional
Soutthampton Street, 19
Nairob, Quénia – 3 de Abril de
1978
Caro Sr. Smart
Obrigado pela sua carta datada de 22 de Março de 1978. Também lhe endereço os meus
sinceros agradecimentos pelo seu interesse pelo estado dos meus colegas que
continuam presos em Moçambique.
Além do documento que preparei para um jornalista a quem pedi que o publicasse,
envio-lhe dados sobre a situação nas cadeias e “campos de concentração” que
vivi durante a minha detenção em Moçambique.
Em Junho de 1974, as autoridades zambianas sob pressão da Frelimo e do governo
da Tanzania invadiram as instalações dos escritórios do «Coremo» e prenderam
todos os seus líderes e membros proeminentes. Mais tarde foram todos entregues
à Frelimo que deveria formar o governo de transição em Moçambique como medida
para destruir qualquer tipo de oposição dentro do país. Poucos dias depois da
nossa detenção, graças a Deus, fui agraciado por uma pequena sorte. Com sucesso
consegui escapar do campo onde estávamos detidos na Zâmbia e passei a viver
escondido em Lusaka sob protecção do embaixador zairense na Tanzania.
Como ele não me pudesse garantir uma prolongada protecção juntamente com a
minha família, passados poucos dias mais tarde após ter enviado minha família
para Moçambique fui de novo detido quando me preparava para abandonar a Zâmbia.
Fiquei preso numa cadeia de máxima segurança até 03 de Outubro de 1975, dia em
que as autoridades zambianas, via aérea, me embarcaram de regresso a
Moçambique. Chegado ao Aeroporto de Maputo estava o Comandante Provincial da
Polícia, Sr. Manuel Verniz que me conduziu para o Comando Geral da Polícia onde
fui objecto de prolongados interrogatórios durante 08 meses. Aqui encontro o
Dr. António Chade, secretário administrativo do «Coremo» o qual, passados
alguns dias, foi enviado para província de Cabo-Delgado. Após isso fui
conduzido à Cadeia Civil de Maputo onde permaneci outros 10 meses. Aqui
encontrei vários ex-estudantes moçambicanos os quais, após o seu regresso do
estrangeiro, foram levados presos directamente do aeroporto para a cadeia.
Entre vários ainda conservo alguns nomes que consegui fixar de memória:
- Prof. Manuel S. Prova, vindo da Serra Leoa.
- Prof. José Brito Simango vindo dos Estados Unidos da América.
- Domingos Aníbal, vindo do Quénia.
- Teodoro Mpunga, vindo do Quénia.
- Feliciano Dimbejo, vindo do Quénia.
- Artur J. da Fonseca vindo da RDA (República Democrática da Alemanha), e mais
Atanásio Muhate e Raimundo Lumbela que desertaram da Frelimo durante a luta
armada. Daqui, fui transferido para Cadeia da Machava, ainda em Maputo. Machava
era a antiga cadeia da PIDE (Polícia Internacional de Defesa do Estado) agora
usada pela Frelimo para encarcerar presos políticos e os chamados sabotadores
económicos. Aqui fui mantido durante um mês. Aqui encontrei outros
prisioneiros:
- Absalom Bahule, secretário geral do «Coremo».
- Kampira Momboya, influente membro do «Coremo».
- Matias Mbowa, ex-comissário político da Frelimo.
- Dr. António ex-estudante da Frelimo.
- Irene Buque, antiga esposa de Machel.
- Dr. Mapilale, ex-estudante da Frelimo que foi mandado estudar para o exterior
pela própria Frelimo, e todos aqueles que participaram no motim de 17 de
Dezembro de 1975.
Da Machava com outros 23 presos fomos mandados de avião para Pemba, (ex.Porto
Amélia), capital da província de Cabo-Delgado. Aqui fomos mantidos em celas
subterrâneas durante 70 dias. Finalmente fomos enviados para o «campo de
concentração de RUARUA». Oficialmente estes campos são chamados de «Campos de
Re-Educação». Aqui fiquei até 27 de Agosto de 1977, dia em que consegui escapar
com mais três companheiros, Dr. Artur J. da Fonseca, Atanásio Muhate e Raimundo
Lumbela. Muhate e Lumbela foram descobertos pelas autoridades tanzanianas como
fugitivos e foram detidos e recambiados para Moçambique.
Enquanto estive no campo de concentração de RUARUA encontrei vários outros
presos membros de outras organizações políticas que também haviam sido
transferidos de outras cadeias e «campos de concentração»:
- Matsinhe, membro do «Gumo» (Grupos
Unidos de Moçambique).
- Dr. Waya, ex-estudantes nos Estados
Unidos da América.
- José Vilankulos, vindo do Quénia.
Existem ao todo 14 campos de concentração em Moçambique. Três na província do
Niassa; 03 em Cabo-Delgado: «RUARUA», «Bilibiza» e «Chaimite». Três na
província da Zambézia. Dois em Sofala: «Gorongosa» e «Inyangawi» (Inhangau).
Dois em Inhambane (Inyambane): «Inhassune» (Inyassune) e «Inhassoro» (Inyassoro).
Um (1) em Maputo, na ilha de Xefina.
Todos os 11 mil testemunhas de jeová
estão detidos na província da Zambézia.
Minha experiência nas prisões
e campos de concentração
No «Comando da Polícia» as celas estavam superlotadas. Uma cela com capacidade
para 70 detidos, continha cerca de 280 presos. Uma refeição por dia. Durante as
investigações os oficiais usam violência brutal. Eles colocam uma colher entre
os dedos e pressionam-na, enroscado-a entre os dedos até partir os dedos.
Também amarravam e penduravam o preso ao tecto pelos pés com a cabeça virada
para baixo por um longo período. Alguns presos que não aguentavam esta tortura
eram desamarrados inconscientes.
Na «Cadeia Civil» para além dos dois métodos que mencionei, eles queimavam o
corpo do preso durante várias horas desde os membros inferiores até ao pescoço.
Também podiam obrigar o preso a ficar ajoelhado durante várias horas. Aqui
éramos cerca de 2 mil presos. As celas estavam abarrotadas que os oficiais
tinham que recorrer à capela existente para enclausurar os presos a mais. Na
«Cadeia da Machava» eles usavam todos os métodos sofisticados de tortura.
Machava é a sede da cadeia do «Snasp» (Serviço Nacional de Segurança Popular).
Eram também usados choques eléctricos, na tortura.
Em Pemba, na cadeia subterrânea as condições são humilhantes, degradantes e
quebram física e moralmente os presos. Éramos mantidos em celas subterrâneas
completamente nus, no chão, sem luz dia e noite e fisicamente violentados
diariamente. Podiam bater-nos as chambocadas até ficarmos inconscientes. Aqui
encontrámos 10 rodesianos, nove homens e uma mulher que eram opositores de
Mugabe e da «Frente Patriótica» apoiada pelo governo de Samora Machel. Era-nos
dado a cada um meia refeição por dia.
Em RUARUA havia 900 presos. A vida é dura e penosa.
Éramos obrigados a cultivar durante a noite, carregar comida para o
abastecimento dos campos em distância de 60 Km com uma carga de uns 30 Kg. Não
se importavam como o preso podia estar fraco ou doente. Não havia assistência
médica.
Há uma cela subterrânea alcunhada de «Universidade de Lekeni». Era destinada
aos presos suspeitos de tentativas de fuga ou quando quebravam as normas da
reclusão. Uma vez o preso levado para lá as chances de voltar vivo eram
escassas. Este é um método usado para amedrontar outros presos e evitar
tentativas de fugas. Uma refeição pobre é servida uma vez por dia, após longas
horas, longas horas de sede e de duro trabalho.
Ainda há muitos prisioneiros, que tal como eu, eles têm tentado escapar. Aquele
que for apanhado após escapar pelas autoridades ou populações que vivem à
volta, são devolvidos e sumariamente executados. Durante as fugas, alguns são
devorados por animais selvagens, outros morrem de fome nos respectivos
esconderijos. No campo não há nenhuma assistência médica. Presos doentes acabam
por morrer sem nenhum socorro. Em toda minha experiência não vi ninguém ser
julgado ou acusado num julgamento conforme mandam as regras.
Em Moçambique não existe sistema judicial. Todos os presos são sumariamente
detidos e mantidos indefinidamente por longo tempo. Alguns foram detidos no
longínquo ano de 1972 durante a luta armada e ainda não foram acusados nem
julgados. Muitos nem sabem sequer porquê estão presos:
Chaimite
Líderes e membros do «Coremo»
- Paulo José Gumane, presidente.
- Arcanjo Kambeu, secretário para
Informação.
- Uria Simango, secretário para Relações Exteriores.
- Joaquim Nawawa, secretário para Segurança.
- Valentino Sithole, secretário para as Finanças.
- Sebastião Sigauke, secretário para Organização.
- José Maria, secretário para Assuntos Sociais.
Membros do «Gumo»
- Dra. Joana Simeão.
- Dr. Unyayi
- Dr. Razão
Outros
- Pedro Mapangelane
- Lázaro Kavandame
- Adelino Gwambe
- Basílio Banda
- Narciso Mbule.
Todos estão detidos no «Campo de Chaimite» a mais de 100 Km de Pemba e situa-se
entre Pemba e Macomia. A informação referente a «Chaimite» me foi facultada no
«Campo de RUARUA» por outros presos vindos transferidos de lá. Todos estavam ou
ainda estão vivos. O Dr. Absalão Bahule, secretário geral do «Coremo», está
preso na Cadeia da Machava. O Dr. António Chade, secretário para Administração
do «Coremo» está no campo de RUARUA.
Meus planos futuros
Sobre o meu futuro, desejo, somente, apanhar um local onde possa viver sem
temer pela minha vida. Também espero uma eventual reunificação com a minha
família de 5 elementos que os deixei à sua sorte em Moçambique. Gostaria de ter
uma formação que me permitisse garantir uma vida decente à minha família. Em
relação ao país, estou pronto para seguir para qualquer lugar onde a minha
segurança e da minha família estejam garantidas.
Atenciosamente,
Fanuel Guidione Malhuza
Veja e ouça aqui a voz de Uria
Simango desvrevendo, em Nashingueia, como Eduardo Mondlane foi assassinado.
Recordo que Uria Simango já se encontrava na altura prisioneiro.
(Aguarde um pouco para abrir)
Excerto retirado do CD-ROM
comemorativo dos 25 anos de Independência
25 de Junho -Moçambique
Vitória de um povo
Narrador - Leite de Vasconcelos
Edição Creatix-Promédia
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DEMOS(Maputo)
19 de Maio de 2004
Para as gerações mais jovens, educadas num ambiente em
que com devoção se
cantava: "Simango,reaccionário..." a obra de Barnabé Lucas Ncomo é
verdadeiramente o resgate de uma figura histórica deste país. Com efeito,
"Uria Simango: Um homem, uma causa" é, uma obra: que estava a faltar
ao imaginário político moçambicano. Aliás, quando colocado face desta imagem
tão sinuosa quanto emblemática, uma das questões que se erguem é de saber se
estamos perante um herói ou perante um mercenário.
Relegado para a condição de reaccionário, Simango, hoje resgatado por Barnabé
Lucas Ncomo, começou a despertar interesse enquanto tal através de um
questionamento suscitado pela interrupção do som de
uma emissão televisiva alusiva aos vinte anos da morte de Eduardo Mondlane. Ia
Janeth Mondlane a dizer que, antes da sua morte, todo o povo moçambicano
saberia quem matou Mondlane descartando a teoria
que liga o pastor Simango ao assassinato do primeiro presidente da Frelimo,
quando houve corte do som por um período suficientemente longo e não seguido de
alguma explicação como sempre acontecia.
Muito mais recentemente Mahluza, o homem que se
apresentou como quem sugeriu o nome FRELIMO para o movimento de libertação,
afirmaria de boca cheia uma espécie de heroísmo para a mesma figura.
A obra de Ncomo apresenta-se como algo de particularmente
impressionante na medida em que em quase quinhentas páginas, o autor nos conduz
no meio de um ambiente obscuro e proibido à busca do um
Simango reinterpretado e, através de um percurso histórico resgata a figura
histórica.
Sem se preocupar pelo rigor científico, vai a busca da
verdade e não teme deixar questões em aberto, como foi o caso da data e
circunstâncias da sua morte.
Por outro lado, mesmo sem sucumbir ante a dificuldade de
discernir um pensamento simanguiano vai mostrar o caminho tortuoso e difícil da
formação e desenvolvimento da Frente. Mais do falar em consensos,
ele mete em evidência as várias tendências que era necessário fazer convergir.
Nas linhas que se seguem Demos transcreve alguns excertos
da obra.
MORTO EM DATA E LOCAL INCERTO
Difícil estabelecer com exactidão as datas. O certo é que
em dia impreciso do período que vai de Maio de 1977 a Junho de 1980, durante o
mandato do então governador da província do Niassa, Aurélio Benete Manave,
M'telela acolhe no seu solo o que resta de um homem que muito fez para a
libertação de Moçambique. O Rev. Uria Timóteo Simango era barbaramente
assassinado na companhia de outros
moçambicanos tidos como reaccionários pelo regime totalitário da Frelimo.
O acto, executado dentro do secretismo que caracterizava
as hostes do poder político em Moçambique, só viria a tornar-se público cinco
anos mais tarde com a fuga para a Africa do Sul de um destacado
membro do SNASP (Serviço Nacional de Segurança Popular) e pela voz da
Resistência Nacional Moçambique.
DISCIPLINA
PARTIDÁRIA
A primeira tentativa de se conciliar ideias a volta do
assunto nas hostes do. poder a politico em Maputo ocorre em1980 quando o Comité
Politico Permanente da Frelimo ensaia a intenção de informar o país
e o mundo sobre o destino de Simango. De certa forma ao que tudo indica, essa
tentativa criou algumas desinteligências no seio do próprio partido no poder,
pois um considerável número de membros da
cúpula daquele partido não terá aceite pactuar com a farsa de que se pretendia
forjar.
Desde então, a Frelimo tem-se esforçado por apresentar o
caso como encerrado, visto que o plano denominado Código Namuli, conforme mais
adiante se verá, não seria levado avante.
O que se sabe sobre a morte de Uria Simango e seus
companheiros gira em torna informações colhidas junto de pessoas que de
M'telela escaparam com vida mantendo-se o silêncio dos mandantes e dos
executores directos do acto. Tudo leva a crer que houve um pacto entre a classe
dirigente, consubstanciado a disciplina partidária.
Segundo assevera o então governador Manave:
"Uma das características da Frelimo é a disciplina e
o sigilo partidários. Ninguém está autorizado a tocar na questão Simango senão
os que têm autoridade. Eu, como indivíduo singular, não tenho essa autoridade.
Houve um juramento de sigilo à volta da questão e apenas a quebra oficial desse
juramento poderá libertar os pactuantes para falarem do assunto. Duvido que
algum dia isso aconteça. A maioria dos pactuantes está viva e acho que mesmo
com a garantia de se manter seus nomes no anonimato, dificilmente podem
dizer algo sobre a figura de Uria Simango.
Conheci Simango e com ele convivi durante muitos anos. O que posso dizer e
apenas que aquando da captura dos reaccionários em 1974 eu era o Comandante do
Campo de preparação político-militar de
Nachingweia, para onde foram conduzidos esses reaccionários. Todos eram humanamente
tratados e nunca torturámos alguém. Fui igualmente o governador de Niassa até
1983, altura em que de lá saí para
cumprir outras tarefas que me confiaram. Nada mais posso acrescentar, senão
isso. (Aurélio Benete Manave).
NÃO HÁ RAZÃO PARA TAL
Sintomático do receio e terror psicológico que a questão
provoca nos então detentores do poder político em Moçambique, passados que são
décadas do silêncio absoluto, e a indisponibilidade mostrada por alguns em
abordar com profundidade a "questão Simango". Tal é o caso de Óscar
Monteiro, um nome sonante da vida nacional moçambicana após independência.
Monteiro afirma que apesar de ter conhecido Simango, conviveu pouco tempo com
ele, pois cedo passou a representante da Frelimo em Argélia, o que, de certo modo,
o impediu de o conhecer com profundidade. Pouco adiantou sobre o homem. Contudo
reconhece
ter tido alguns contactos com o Reverendo no contexto da luta armada de
libertação nacional. Nada mais acrescentou, porque "ando muito ocupado e
não sei quando é que terei disponibilidade para falarmos
disso." (Óscar Monteiro) Apesar da insistência do autor, visando marcar
uma entrevista para outra ocasião, Monteiro pouco interesse mostrou em abordar
o assunto. Todavia, Monteiro aparecera mais tarde
a lamentar-se do fim que tiveram Os presos de M'telela dizendo que não se devia
ter feito uma tal coisa, pois "não havia razão para isso" (Óscar
Monteiro)
O EMBARAÇO DE CHISSANO
Joaquim Chissano, que subira ao trono depois da: morte de
Samora Machel em Outubro de 1986, num comício em Maputo a 9 de Janeiro de 1990,
igualmente denotando perturbação, em resposta a uma questão sobre os presos
políticos levantada na ocasião por um cidadão Zebedias Jaime Machava, viria
sub-repticiamente a confundir a questão que lhe era colocada. Estava-se no auge
da paz, e uma amnistia em favor dos chamados "bandidos armados", e os
considerados "traidores da Pátria", havia sido decretada.
Corajosamente, e em resposta ao apelo formulado por Chissano para que as
pessoas naquele comício apresentassem livremente as suas preocupações,
implicitamente, Machava levantou a questão de Simango
e outros presos de consciência, tendo-se estabelecido então com o presidente um
estranho diálogo nos seguintes termos:
(Machava) Chamo-me Zebedias Jaime Machava. Eu vim aqui
para poder apresentar algumas questões que sinto. Eu tenho acompanhado passo a
passo a evolução política do nosso país, do nosso partido, e tenho
também acompanhado as iniciativas do nosso governo no sentido de estabelecer a
paz neste país. E também queria aproveitar esta oportunidade para poder
exprimir o meu sentimento perante os membros
do governo, os membros do Bureau Político e membros do partido para poder fazer
chegar essa preocupação que eu tenho.
O governo da República Popular de Moçambique procedeu a
uma amnistia aos bandidos armados. Essa amnistia abrange todos aqueles que
estão a matar. Os que foram os primeiros que ainda permaneciam no
banditismo armado beneficiam dessa lei quando vieram se entregar
voluntariamente, e quando abandonaram a via violenta. Estão beneficiados por
essa lei.
Então, eu queria pedir a todos os membros que estão aqui para podermos também
rectificar, ver também aqueles que praticaram crimes durante a luta de
libertação nacional, os desertores, aqueles que desertam ou que .. .aqueles que
nós consideramos como dissidentes, aqueles que não quiseram corresponder com a
linha da Frelimo. Estes até este momento estão numa situação de privação, não
é? Estão privados não ouvimos falar deles, não se ouve quase nada, não é? não
se ouve. Não sei se existem ou já morreram eu não sei. Portanto, eu queria que
o povo moçambicano, dentro do sentimento que nós temos de amnistiar aqueles que
fizeram ma1, ou que fazem mal, então.
(Chissano) - Sim podemos responder a sua preocupação,já compreendemos.
(Machava) -Sim
(Chissano) - A amnistia era para todos, incluindo esses aí.
(Machava) - Sim
(Chissano) - Não estão incluídos. Estão amnistiados.
(Machava) - Estão amnistiados?
(Chissano) - Uns estão em Portugal, estão na América. Não são muitos. Podem vir
a qualquer altura aqui e esses aí para eles a amnistia não acaba. Podem
(Machava) - E também...
(Chissano) - Obrigado
(Machava) - Desculpe Sua Excelência.
(Chissano) - E por causa dos outros. Temos que limitar o tempo.
(Machava)_ Há aqueles que estão nas nossas mãos. Aqueles...
(Voz de mulher) A luta continua! (Rádio Moçambique)
EXECUTADO À REVELIA
Entre as escassas informações (a maioria das quais
desencontradas) existem também acusações e ilibações caricatas que ilustram o
peso de consciência que reina nos que detinham o poder nas mãos. Fernando
Ganhão, outra figura de destaque nas hostes do regime, afirma que tomou
conhecimento da liquidação física de Simango posteriormente ao acontecido.
Segundo ele, "aquilo foi decidido lá no norte sem o conhecimento de
ninguém cá em Maputo.
Foi "AM" quem fez aquilo. Mandou para lá um
indivíduo que andava com a filha dele. Parece que mandou liquidar esse
indivíduo e, por extensão, todos os presos políticos que estavam a guarda dele
no Niassa. Todos foram mortos. Samora chateou-se muito com isso. Ninguém sabia
de nada cá. Mesmo Marcelino dos Santos não sabia de nada. Foi uma decisão
unilateral de alguém consultar o próprio Chefe do Estado e a direcção máxima do
partido. (Fernando Ganhão)
EXEMPLO DE JUSTIÇA
POPULAR
Marcelino dos Santos altura segunda pessoa importante na
hierarquia partidária foi categórico ao afirmar que a decisão de executar
sumariamente Simango e outros presos políticos fora um exemplo de "justiça
altamente popular", tendo frisado:
"Mas que se diga bem claramente que nós não estamos arrependidos da acção
realizada porque agimos utilizando violência revolucionária contra traidores e
contra traidores do povo moçambicano. (Marcelino
dos Santos)
As informações existentes - fruto de mais de 15 anos de
cuidadosa investigação - indicam os anos entre 1977 como o período mais
provável em que o Rev. Uria Timóteo Simango terá sido morto cruelmente. A sua
esposa, professora Celina Simango, viria a ser executada, segundo uma das fontes,
em Julho de 1982 na companhia de duas outras senhoras dentre as quais Lúcia
Tangane, esposa de um destacado prisioneiro de M'telela -(Raul Casal Ribeiro),
ex-comissário politico da Frelimo e secretário-adjunto do Departamento
de Defesa após a morte de Filipe Samuel Magaia.
SAMORA NÃO QUERIA AQUELE HOMEM MORTO
Por sua vez, Mariano de Araújo Matsinhe, outro
proeminente membro da hierarquia da Frelimo, afirma que "a confissão
Política não foi informada sobre a liquidação física dos presos. Samora não
queria
aqueles homens mortos. Queria mantê-los vivos para depois mostrar-lhes o
Moçambique independente que ele sonhava.
Ele foi pressionado para fazer aquilo. Nem eu, nem o presidente Chissano
sabíamos da morte de Simango e de outros. Alguns passaram a saber que os presos
foram liquidados através de uma informação que o
presidente Chispando acabou dando em resposta a perguntas feitas por alguns
moçambicanos exilados nos Estados Unidos foi numa reunião com moçambicanos em
Nova Iorque. (Mariano Matsinhe)
Mas Matsinhe não ousa divulgar quem terá pressionado Samora Machel a fazer a
que ele chama "aquilo", remetendo para a inconcebível ideia de uma
Frelimo com separação de poderes, onde par um lado estava
Machel dirigindo uma Comissão Política (Bureau Político) imaculada nos actos e,
por outro, o mesmo Machel, na companhia alguns veteranos da luta ar como
Salésio Nalyambipano, Lagos Lidimo, Abel
Asikala e alguns mais, agindo independentemente. Uma espécie de anarquia que
não bate certo com a realidade, mas, em todo o caso hipótese que não se pode
descurar se se tiver em conta que o Serviço
Nacional de Segurança Social (SNASP), então instituído em Outubro de 1975,
conferia ao Chefe do Estado plenos poderes de agir (em alguns momentos) num
círculo restrito com os oficiais daqueles serviços,
sem prévia consulta aos diversos órgãos do partido no poder.
A IMPRENSA ESTRANGEIRA
No início do último trimestre de 1976, um grupo de
jornalistas nacionais e o cineasta mauritano Abid Med Honda, contra todas as
previsões, visitaram M'telela no âmbito de uma digressão que faziam pelo norte
do País. Com a excepção de Muradali Mamadhusen, então Director Nacional de
Informação no Ministério da Informação, os restantes componentes do grupo não
sabiam em que local de Niassa se encontravam. De Lichinga, foram todos
introduzidos em viaturas tendo seguido para um destino incerto. Chegados a
-M'telela, reconheceram de imediato Uria Simango e Joana Simeão.
"Na altura" - segundo relataria um dos jornalistas "a nossa
preocupação imediata foi ver o estado de espírito em que se encontravam esses
homens e se estavam sendo bem tratados, embora o comandante do campo - um tipo
alto e forte, todo ele simpático para connosco - nos tivesse garantido que os
presos estavam sendo bem tratados, custou-nos a acreditar pelo semblante que
ostentavam aqueles detidos. Ao responderem as nossas perguntas, os presos
transmitiam no seu olhar uma mensagem de tristeza e profunda angústia. Víamos
medo nas suas respostas porque estavam a volta guardas a controlar todos os
movimentos. Para despistar aqueles guardas, e pôr os presos à-vontade. alguns
de nós tiveram que mentir
dizendo que eram jornalistas estrangeiros. Fomos fazendo perguntas em inglês e
francês ao que Simango e Joana iam respondendo sem problemas porque os guardas
não entendiam essas línguas. De regresso a Lichinga ficou combinado que nenhum
jornalista deveria fazer uso do material recolhido. E como o seguro morreu de
velho. Muradali recolheu tudo, desde apontamentos, filmes, gravações, etc. Esse
material está algures aí em Maputo, certamente com os detentores do poder. Os
presos estavam sendo maltratados. Julgo que previam um fim fatal.
(Eliodoro Baptista)
UMA DATA PROVÁVEL
Mas a data de 25 de Junho de 1977, segundo aniversário da
Independência nacional, tida como o dia da saída dos presos do Centro de acordo
com Maria Flora Ribeiro - e data prováveis da execução dos mesmos, entra em
colisão com uma das principais testemunhas de M'telele - Manuel Pereira - como
mais adiante se verá, Contudo, é curioso notar que aquela data poderá, de
facto, ter sido a data da execução de diversas sentenças decretadas nos
corredores do poder em Maputo. Com efeito, a 25 de Junho de 1977, no
outro extremo de Moçambique, na zona de Nambude em Cabo Delgado, o então
director local da Contra Inteligência Militar, António Miguel, é referido como
tendo presidido à execução pública de dois antigos
combatentes, nomeadamente do comandante Joaquim Mandeio Muthamangue,
cognominado Francisco Ndeio e do seu adjunto Pedro Canisio.
No decurso da tarefa que the fora incumbida, Pereira
constatou que Uria Simango e outros políticos detidos no Centro de M'telela,
haviam sido executados em Outubro de 1978. O ano de 1978 como altura
provável da execução dos prisioneiros políticos voltaria a ser ventilado pelo
próprio Sérgio Vieira no decurso de um debate televisivo em 2001. Ao se abordar
o sistema de reeducação no Moçambique pós-Independência, Vieira admitiu terem
havido falhas durante a vigência do monopartidarismo em Moçambique. Sem
precisar datas, afirmou que no período entre 1978 e 1979 se haviam cometido
excessos, tendo os mesmos culminado com a execução sumária de presos políticos.
Em particular, Vieira afirmou ter assinado e ordenado diversas execuções
extrajudiciais. Todavia, em jeito de conclusão,
afirmou que não se sentia arrependido.
E SIMANGO NÃO PEDIU PERDÃO
Para RR, os presos políticos foram executados em Junho de
1980 pouco depois da passagem de Samora Machel por Niassa a caminho de
Madagáscar. RR que estava ligado as Forcas de Defesa e Segurança na
cidade de Lichinga, diz que lembra-se muito bem do mês porque Samora fez uma
escala rápida em Lichinga e no dia seguinte estava de volta a Maputo para
anunciar a nova moeda, a metical.
CF por sua vez, citando afirma que a sua fonte informou
que o Rev. Simango foi severamente maltratado durante a sua audição. Permaneceu
de pé quase seis horas consecutivas perante as pardas figuras que o exigiam que
pedisse perdão. Alguns dos presos aflitos, acabaram acedendo ao pedido na
esperança de verem as suas penas comutadas.
Contudo, a despeito do cansaço físico que denotava e a constante zombaria à sua
volta, Simango negou continuamente pedir perdão. "Não vejo razão nenhuma
que me leve a ter que pedir perdão. Não fiz mal
nenhum. A quem devo pedir perdão, aos senhores?" - insurgia-se
constantemente Simango, de acordo com a mesma fonte.
NACIONALIDADE E RELIGIÃO
Em 1957 foi-lhe concedida uma bolsa de estudos por uma
instituição religiosa nos Estados Unidos da América. Todavia, as autoridades
coloniais impediram-no de se ausentar de Moçambique para prosseguir
os estudos. Segundo pessoas da época, a recusa fundava-se no facto de, até
então, estarem frescos na memória das autoridades portuguesas os transtornos
causados por Kamba Simango aquando do seu
regresso dos Estados Unidos à cidade da Beira. Certamente, as autoridades
consideravam ser perigoso se Uria trilhasse os mesmos caminhos que kamba. Para
além do mais, vivia-se nessa altura outra turbulência causada por um outro
Simango-Sixpence - promotor do Núcleo Negrófilo de Manica e Sofala. A coberto
do Núcleo, Sixpence Simango e seus correligionários, os Negrófilos, como
habitualmente se identificavam os membros do Núcleo, transformaram-se em ouvido
e fiéis mensageiros das populações negras perante as autoridades.
Contra as sevícias infringidas pelas autoridades coloniais contra a população
negra, o Núcleo Negrófilo de Manica e Sofala destacava-se nos pronunciamentos
em nome dos oprimidos.
O destino havia apanhado o jovem pastor Uria Simango nesse ambiente de
discriminação racial e de perseguições.
A semente do nacionalismo havia sido plantada anos antes pelo Rev. Kamba.
Todavia, o conceito de nação em Manica e Sofala, e em particular entre as
populações da etnia shona, agudizar-se-ia com o deflagrar do motim da Machanga.
O motim seria urna das principais fontes de inspiração para uma luta aberta
contra a presença colonial portuguesa em Moçambique. Vários jovens abandonaram
nessa época a colónia indo refugiar-se na então Rodésia do Sul. Do Búzi, onde
trabalhava numa empresa açucareira, saiu o principal percursor da Udenamo,
Lhomulo Chitofo Cwambe, mais conhecido por Adelino Gwambe.
Muitos
outros abandonariam Mocambique exilando-se nos países vizinhos.
Mas da leitura de um estudo recente sobre e motim de Machanga,
depreende-se que o levantamento não tinha um cunho político, pois foi motivado
pelo comportamento irresponsável de alguns funcionários administrativos
corruptos que haviam desviado donativos de
emergência para as vitimas dum ciclone que havia assolado a zona.
Simango havia tomado conhecimento da Constituição na
África do Sul, por um grupo de moçambicanos oriundos maioritariamente de
Mambone e Machanga de uma associação denominada Associação Fúnebre de
Moçambique (AFM). Ferraz de Freitas queria saber de Urias Simango e Ngwenha
qual o papel que a Igreja Protestante havia tido nos levantamentos de Machanga
e Mambone.
Para além de mais, sendo Resende um agente do Vaticano,
não poderia na altura fazer mais ondas do que então fazia. Pelo que Simango
nunca se expunha muito perante o bispo no respeitante à independência das
colónias portuguesas. Contudo, de Resende e Bertulli, soube Simango extrair
grandes ensinamentos. Tanto um como outro nutriam denodada admiração pelo jovem
pastor negro que, contrariamente à maioria naquela época, falava bem o
português e o inglês, e tinha ideais claros sobre a salvação humanidade.
--------------------------------------------------------------------------------MOÇAMBIQUE: OS FANTASMAS DE
NACHINGWEA
Centenas de pessoas foram julgadas no campo de Nachingwea
nos meses que antecederam a independência de Moçambique. O que lhes aconteceu? Um investigador
responde.
Estávamos em 1975 a pouco meses da
independência de Moçambique. O fervor revolucionário de mudança sentia-se em
todo o país. A Frente de Libertação de Moçambique, Frelimo preparava-se para
assumir o poder na certeza absoluta das suas convicções e linha política. Não
havia lugar para dissidência ou pontos de vista diferentes.
Nesses meses que antecedem a
independência na Tanzânia centenas de pessoas são julgadas pela Frelimo
acusadas de vários crimes contra a luta de libertação e contra a revolução.
Agora familiares desses acusados
querem saber o que aconteceu aos réus do julgamento de Nachingwa. Vão
formar uma associação. Nachingwea é conhecida pelos moçambicanos como uma das
principais bases da Frelimo na Tanzânia. Mas não só. Neste regresso ao passado
falamos com o investigador João Cabrita que nos disse que cerca de 300 pessoas
foram, julgadas em Nachingwea. Foram acusados de traição ou deserção. Algumas
delas são figuras conhecidas como Urias Simango e Joana Simião que seriam
fuzilados anos mais tarde num campo de reeducação. Mas Cabrita disse nos que
ninguém sabe o que aconteceu á esmagadora maioria daqueles que foram julgados.
“Só as autoridades moçambicanas podem revelar isso,” disse o investigador.
Escute a entrevista de João Cabrita.
Nota do blog: Entre a Memórias Silenciadas, título do novo livro do escritor
moçambicano Ungulani Baka Khosa lançado no dia 1 de Agosto de 2013 em
Maputo desvenda o ambiente que se viveu no período em que as pessoas foram
concentradas nos centros de reeducação que João Cabrita prefere chamar de campos de concentração Vale apenas ler.