TERRITORIALIZAÇÃO DE MOÇAMBIQUE COLONIAL: “AVANT TOUT” UMA LUTA PELA TRANSPOSIÇÃO DE CONTRARIEDADES ENDOGENÉTICAS PRESENTES NO SISTEMA PORTUGUÊS EM MONTAGEM
MARTINHO PEDRO
Departamento de Antropologia e Sociologia, Faculdade de
Ciências Sociais, Universidade Pedagógica, Maputo,
Moçambique
marpmatos@gmail.com
Resumo
Os primeiros momentos da sistematização de possessões ultramarinas parece
terem se constituído, para Portugal, uma empresa fácil, se aferirmos o processo
a partir da relativa audácia demonstrada, fundamentalmente nos primeiros cem anos
da sua epopeia expansionista. Esta ideia é corroborada pela imposição,
juntamente com a sua jumelle ibérica,
de uma comunicabilidade com zonas bem distanciadas da península, da aplicação
da teoria do mare clausum, bem como, da
posse jurídica da metade oriental do Planeta Terra, por Portugal, marcando, em
termos geopolíticos, o início de uma abordagem global da teoria do poder.
Entretanto, tal realidade desvaneceu-se desde cedo, pela integração de novas potências
no cenário expansionista, acompanhada pela reclamação da liberdade de navegação
nos mares/oceanos (mare liberum).
Base de disputas abertas, o encontro entre as potências ibéricas e as
novas, no cenário colonial, obrigou a definição de espaços concretos,
transformando, consequentemente, a posse de territórios num dos projectos mais
titânicos para Portugal. A necessidade de defesa dos seus territórios da África
Oriental dos holandeses, suíços e mais tarde dos ingleses e alemães
constituem-se exemplos concretos. Daí advém a explicação da sistematização dos
territórios e formação das colónias definitivas em função da correlação de
poderes eurocêntricos que actuaram nas distintas zonas geográficas do
continente africano, agregada ao confronto, nos espaços coloniais em
construção, entre cada um dos diferentes poderes hegemónicos e os diferentes
poderes representativos das estruturas sociais locais. Ademais, os estudos até
aqui desenvolvidos têm apontado que a natureza do avanço dos poderes em
incrustação no terreno foi proporcional ao vigor humano, diplomático, material,
financeiro, estratégico de cada uma das potências, incluindo Portugal.
Entretanto, na análise dos fundamentos definidores da incrustação do poder
eurocêntrico em Moçambique, o caso português parece orientar-nos para uma nova directriz,
situada longe da disputa territorial entre as potências, por um lado, ou da
luta entre aquelas e as estruturas africanas pré-existentes, por outro lado. De
facto, para o congresso procuraremos discutir a ideia segundo a qual a
definição do espaço colonial português em Moçambique, isto é, a territorialização
definitiva, não foi retardada por esses dois opositores tradicionais: os grupos
sociais endógenos cuja frontalidade vinha da necessidade destes de manterem a
sua reprodução existencial, e os concorrentes europeus que procuravam
estabelecer possessões coloniais no período e nos mesmos espaços cobiçados por
Portugal. Para nós, o processo da definição do espaço colonial português em
Moçambique resultou de contrariedades endogenéticas de carácter intersubjectivo,
que demarcaram territórios, fronteiras, colonialismos paralelos e concorrentes
no interior do espaço concorrido pelo capital internacional, que, em última
instância, dificultaram a circunscrição de um espaço colonial definitivo em
Moçambique, pelo menos até aos anos 40 do século XX.
Palavras-chave: Portugal, colonização, territorialidade, Moçambique colonial.
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