OS
DONOS DO PODER EM MOÇAMBIQUE: A FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA DA ELITE POLÍTICA E
ECONÓMICA
Por
Jorge Fernando Jairoce
Porto Alegre/Brasil- A elite do poder é simplesmente o grupo que tem o máximo que se pode ter, inclusive, de modo geral, dinheiro, poder e prestígio- bem como todos os modos de vida a que estes levam. Mais a elite não é simplesmente constituída dos que tem o máximo, pois não o poderiam ter se não fosse pela sua posição nas grandes instituições, que são as bases necessárias do poder e riqueza e do prestígio e ao mesmo tempo constituem os meios princípais do exercício do poder, de adquirir e conservar a riqueza, e de desfrutar as principais vantagens de prestígio.
Ninguem será portanto, realmente poderoso a menos que
tenha acesso ao comando das princípais instituições, pois é sobre estes meios
de poder instituicional que os realmente poderosos são, em primeiro lugar
poderosos. A elite política controla esse poder instituicional através de
nomeação de dirigentes membros do partido FRELIMO (ministros, reitores,
directores, procuradores, juízes, directores de orgãos de comunicação,
comandantes militares e policiais, PCAs, etc) com argumento de que são de
confiança política. Outro mecanismo de controle consiste na implantação de células partidárias nas
instituições do Estado (partidarização do aparelho estatal) que aliás, foi
reconhecido pelo Secretário Geral do Partido FRELIMO, Filipe Chimoio Paúnde, como algo absolutamente normal da organização partidária e monitoria
das actividades governamentais (pausa para reflexão....mais pausa para
reflexão... seguido de mais pausa). No entanto somente o Partido FRELIMO é que
pode possuir células nas instituições num país onde a Constituição da República
defende o multipartidarimo. A existência
destas células cria um ambiente psicológico de coação no sentido de que todos
os funcionários devem fazer parte dela sob o risco de suspeita de não estarem a
cumprir as metas governamentais mesmo tratando-se de tecnocratas de reconhecido
mérito profissional.
Mas nem todo o poder é exercido por meio destas
instituições, mas somente dentro delas e através delas o poder será mais ou menos
contínuo e importante. A riqueza é adquirida
e conservada através das instituições. Portanto a política funciona como
um corredor para a fortuna. O volume e a fonte da renda depende da sua posição
dentro do Partido e da economia política. Como a riqueza e o poder, o prestígio
é cumulativo: quanto mais temos, mais poderosos conseguimos ser, traduzido para
as palavras mais simples: o rico verifica ser-lhe mais fácil conseguir o poder
do que o pobre; os que têm o status comprovam ser mais fácil controlar as
oportunidades de adquirir as fortunas do que os que não tem. Para elucidar esta
ideia é só verificarmos os moçambicanos que possuem licenças de minas de carvão, de ouro, as empresas que vencem maior parte dos concursos
públicos em Moçambique e os beneficiários
dos fundos de tesouro público e dos empréstimos do ex-BPD e ex-BCM (remeto a
análise de padrões de acumulação em Moçambique nos artigos publicados no Jornal
Metical por Joseph Hanlon- As galinhas
dos ovos de ouro e os trabalhos efectuados por Instituto de Estudos
Económicos e Sociais).
A elite (pessoas que dela fazem parte) podem ser
consideradas membros de um estado social elevado como um conjunto de grupos
cujo membros se conhecem, se vêem socialmente e se associam para negócios e por
isso ao tomarem decisões, levam-se mutuamente em consideração A elite nesta perspectiva é considerada como
um círculo íntimo de classes sociais
superiores e poderosas. Por isso que normalmente ouve-se dizer que o
ministro X foi padrinho da filha ou do filho do PCA Y. O ex-ministro têm uma
sociedade empresarial com o dirigente Y. O filho do dirigente Y casou-se com a
filha do ex-ministro X, etc. São exemplos de algumas relações de circuito
íntimo. Parece existir uma certa consciência de si mesmo como uma classe social
e se comportam uns para com os outros, de modo diverso daquele que adoptam para
com os membros de outras classes. Acertam-se, compreendem-se, os filhos
casam-se entre eles; procuram trabalhar e pensar, se não juntos, pelo menos de
forma semelhante.
Em Moçambique é mais fácil observar a elite política e
económica em termos de sociologia de
posição instituicional e da estrutura social a que essas instituições formam
(por exemplo as posições ocupadas em termos de cargos governamentais, empresas
pertencentes aos dirigentes ou ex-dirigentes governamentais, os círculos de
interesse e até o nível de influência no Partido). Avaliar a elite em termos de
estatística de valores monetários ou da riqueza que eles possuem como foi a anunciado há quatro anos atrás (os
dez mais ricos de Moçambique) acarreta uma investigação aprimorada, se bem que
o número de empresas e interesses económicos permitam especular a grandeza
financeira dos mesmos, mas dificilmente pode-se contabilizar a fortuna de cada
um, porque não é possível ter acesso as contas bancárias dos mesmos até porque
na sua maior parte está depositada no
estrangeiro (bancos sul-africanos e suiços preferencialmente).
Esta elite do poder muitas vezes ela é que toma
importantes decisões para o País, acabando-se por se considerar fazedores da
história do País, criando seus heróis e vilões com a intenção de perpetuar a cultura e ideologia de respeito, admiração,
dominação e controle dos recursos públicos e naturais do País. Assim, vai-se
criando grupos de dominantes no País. Sobre o papel destes grupos dominantes na
história do País carece de uma discussão
mais cuidada na teoria da história, não cabendo a sua análise nessa reflexão. Esta elite às vezes esquece
que a história se faz à revelia dos homens, ou seja, a história é uma
correnteza sem domínio, que dentro dela há acção, mas não há feitos; que a
história é apenas acontecimentos e factos que ninguém pretendeu.
Não há dúvida que as decisões tomadas por esta elite do
poder podem mudar o curso dos grandes acontecimentos, mas também as
decisões podem ser afectadas pela
correnteza e não se atingir os resultados esperados por ela, porque na tomada
de decisões maior é a possibilidade de serem cegados pelos seus
próprios erros. É assim que funciona o
motor da história. Muitos membros do
Partido FRELIMO (que não fazem parte da elite do poder) fazem eco as decisões tomadas pelas elites do
poder sem perceber que estão contribuindo para manutenção da dominação da mesma. Embora
estejamos todos dentro da história, nem todos temos o poder de fazê-las. Nem todos temos os meios
técnicos e instituicionais do poder que existem, nem influência igual
sobre a sua aplicação. Os meios do poder
aqui referido devem ser entendidos como as instituições de apoio ao poder da
elite tais como os meios de comunicação social, as instituições jurídicas e de
segurança. Através deste meios de poder pode-se
manipular a sociedade - a opinião pública, defender os interesses privados
e usar a violência quando é necessário manter a legitimidade do poder. Aliás, o
recurso a violência tem muito a ver com a nossa história de libertação visto
que maior parte dessa elite política veio da Luta Armada de Libertação Nacional
ou seja da linha militar e como tal a violência foi sempre uma prática
recorrente desde os julgamentos de Nachingwea até as manifestações populares de
2010. Esta elite julga-se proprietária dos destinos do País, para isso basta
recordar as palavras do Alberto Chipande: temos
o direito de ser ricos porque libertamos o país (pausa para reflexão...mais
pausa para reflexão...mais pausa). Assim, os meios do poder tendem a se tornar
fino para a elite que os comanda. Não há nada na história do país que nos leve a crer que é impossível a
uma elite de poder fazê-la. Como dizia o saudoso Carlos Cardoso: em
Moçambique só falta chover de baixo. Na verdade, a vontade desses homens é
sempre limitada, mas jamais os limites foram tão amplos, pois jamais os meios do
poder foram tão grandes. Daí que termino dizendo que a elite política e
económica de Moçambique são os donos do poder. Perante os factos ora
apresentados surge uma questão a reflectir será esta uma elite responsável ou
não para o desenvolvimento do país?
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