Bem vindos,

Caros amigos o blog Historiando: debates e ideias visa promover debates em torno de vários domínios de História do mundo em geral e de África e Moçambique em particular. Consta no blog variados documentos históricos como filmes, documentários, extractos de entrevistas e variedades de documentos escritos que permitirá reflectir sobre várias temáticas tendo em conta a temporalidade histórica dos diferentes espaços. O desafio que proponho é despolitizar e descolonizar certas práticas historiográficas de carácter eurocêntrico, moderno e ocidental. Os diferentes conteúdos aqui expostos não constituem dados acabados ou absolutos, eles estão sujeitos a reinterpretação, por isso que os vossos comentários, críticas e sugestões serão considerados com muito carinho. Pode ouvir o blog via ReadSpeaker que consta no início de cada conteúdo postado.

14 julho 2012

HISTÓRIA DA PALESTINA

HISTÓRIA DA PALESTINA
O vídeo documenta a história da criação do Estado de Israel e a luta pela criação de um Estado palestino, desde o fim do domínio do Império Otomano até as negociações mais recentes entre árabes e israelenses. A região era chamada de Palastu pelos assírios.

11 julho 2012

A EXPERIÊNCIA DOS AFRICANOS E SEUS DESCENDENTES NO BRASIL

A EXPERIÊNCIA DOS AFRICANOS E SEUS DESCENDENTES NO BRASIL
O grupo de pesquisa do CNPq foi formado em 2002. Tem como objetivo investigar a experiência dos africanos e seus descendentes no Brasil de uma forma abrangente e comparativa. Tendo esta problemática como foco e pretendendo estabelecer um maior diálogo entre as experiências no sul com as demais regiões do Brasil surgiu a iniciativa de organizarmos os Encontros de Escravidão e Liberdade no Brasil Meridional que, após ter se realizado em Castro no Paraná, em 2003, passou a ser bi-anual e rotativo, realizando-se em Porto Alegre, Florianópolis e Curitiba. A formação do grupo desde então mudou um pouco. José Augusto Leandro, Eduardo Spiller Pena e Sandra Molina atuaram de forma entusiasta em Castro e colaboraram para o desenvolvimento do Grupo. Após a experiência do I Encontro, outros colegas foram se unindo a nós constituindo a nossa atual formação. Além destes Encontros, buscamos integrar investigações sobre o tema, intensificando trocas de pesquisa, intercâmbios entre os discentes envolvidos, promovendo colaborações entre nossas universidades. Colaboramos, ainda, na formação de um campo de estudos sólido desenvolvendo projetos de extensão universitária, nos aproximando de bibliotecas, museus e arquivos. Buscamos, por fim, responder à demanda social inscrita na lei 10.639 de janeiro de 2003 sobre o ensino de História da África e de Cultura Afro-Brasileira. Para o aprofundamento consulte o site: HTTP://www.escravidaoeliberdade.com.br. Assista o o filme AMISTAD que retrata o revolta  dos escravos no navio negreiro AMISTAD na Costa de Cuba em 1839.

09 julho 2012

HISTÓRIA DO SÉCULO XX

 HISTÓRIA DO SÉCULO XX
O vídeo apresenta um resumo didático sobre  história do século XX (com ênfase no período entre as duas grandes guerras mundiais).

08 julho 2012

BREVE HISTÓRIA DE ANGOLA


O vídeo apresenta a história de Angola do período pré-colonial até aos dias de hoje. E para os interessados em estudar aspectos da História de Angola no século XIX podem consultar o site diamang digital (www.diamangdigital.net.) que é um projeto de digitalização e disponibilização em linha de materiais documentais, fotográficos e fonográficos da ex-Diamang - Companhia de Diamantes de Angola, em arquivo na Universidade de Coimbra.



07 julho 2012

O QUE ACONTECEU COM O SONHO DA LIBERDADE NO MUNDO?

 O QUE ACONTECEU COM O SONHO DA LIBERDADE NO MUNDO?
Desde as revoluções burguesas na Europa até hoje, discute-se bastante a ideia liberdade. Basta recordar os filósofos iluministas do século XVIII, como Montesquieu, Rousseau, Voltaire e outros que elaboraram várias teorias em torno da liberdade do Homem no mundo moderno. É verdade que estes ideais também foram debatidos pelos filófosos gregos na antiguidade clássica. Mas o ideal da democracia liberal afigura-se como algo moderno inspirado pelos iluministas. Mas será que passados quatro séculos o homem conseguiu alcançar esta  liberdade de que tanto se fala ou viramos prisioneiros da economia de mercado que comanda as vontades humanas e torna-nos máquinas do tempo? Como  conciliar a democracia política com a democracia de mercado no século XXI? O documentário abaixo ajuda-nos a reflectir sobre estas questões.


06 julho 2012

COMO OS EUA FORAM DERROTADOS NA INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA


COMO OS EUA FORAM DERROTADOS NA INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA


O historiador português Tiago Moreira de Sá teve acesso aos arquivos diplomáticos e dos serviços secretos de Washington relativos aos anos 1974 e 1975. O livro “Os Estados Unidos e a Descolonização de Angola” mostra que Kissinger acordou tarde demais.
A “falta de uma estratégia norte-americana para Angola” é claramente evidenciada no recente livro do historiador português Tiago Moreira de Sá. Com o título “Os Estados Unidos e a Descolonização de Angola”, baseia-se em grande parte nos arquivos norte-americanos que já se encontram desclassificados e disponíveis e que revelam a extensão do atraso, dos erros e da derrota sofrida por Washington na mais importante das colónias portuguesas.
O livro começa com o relato de um almoço, a 19 de Abril de 1975, na Casa Branca, entre o Presidente Gerald Ford, o secretário de Estado Henry Kissinger e o Presidente da Zâmbia Kenneth Kaunda. Foi “o momento de viragem na política dos EUA para Angola e mesmo para o continente africano.”
Kaunda, que falava em nome dos presidentes vizinhos (mencionou Nyerere da Tanzânia, Mobutu do Zaire e Samora Machel de Moçambique), “convenceu Ford de que a URSS estava a intervir em Angola com conselheiros militares e armamento, o que podia ajudar o MPLA a tomar o poder”.
O MPLA, acentuou Kaunda, “não era apenas um grupo marxista como a Frelimo em Moçambique”, mas sim “um instrumento de Moscovo.” O Presidente da Zâmbia propôs que os EUA apostassem em Savimbi como “o líder de compromisso” e assegurou que também o ministro dos Negócios Estrangeiros, Melo Antunes, “estava disposto a passar a apoiar” o líder da UNITA.
O encontro com Kaunda obrigou Washington a abrir os olhos e a passar à ofensiva. Moreira de Sá explica que “os EUA tinham de demonstrar a Moscovo, mas também a Londres, a Bona, a Paris e a Pequim, que a derrota na Indochina não reduzira a capacidade e a vontade de resistir à expansão soviética.”
MPLA o menos tribal
De Luanda, desde 1974 que Washington recebeu relatos diários do seu cônsul Everett Briggs, que assegurava que o MPLA tinha várias ligações com o industrial português Manuel Vinhas, enquanto António Champalimaud seria “o principal apoiante” de um “futuro exército angolano de oficiais brancos”, constituído à base de mercenários. Quanto a Rosa Coutinho, “é definitivamente amigo dos Estados Unidos (…) Ele não nos parece ser um esquerdista.”
Para Robert Hulslander, responsável da CIA em Angola, Holden Roberto, o dirigente supremo do FNLA, era “um homem corrupto e sem princípios” que representava “o pior do racismo radical africano.” Já o MPLA era “o menos tribal dos três movimentos” e o “melhor para governar Angola”. Na altura (1974), estaria mais próximo “do socialismo radical europeu do que do marxismo-leninismo soviético.”
Sabe-se como desde cedo a União Soviética apostou numa “política de fortalecimento do MPLA, sob a liderança de Agostinho Neto”. Mas, na fase inicial, a política de Moscovo foi “dominada pelo seu conflito com Pequim e não com Washington.” A China apostava na FNLA, tendo feito chegar, logo em Maio de 1974, o primeiro contingente de 112 conselheiros militares.
Porém, “a internacionalização da descolonização de Angola não começou por acção de Moscovo, ou de Pequim, ou de Washington, mas sim dos países africanos vizinhos”, como o Zaire (ao lado da FNLA), o Congo Brazzaville (do MPLA) e a África do Sul (da UNITA).
Alvor foi sempre letra morta
Nem os EUA nem a URSS acreditavam no Acordo de Alvor, de Janeiro de 1975, e ambos apostaram em liquidá-lo à nascença. Ainda em Janeiro, o departamento de Estado fazia uma antevisão de possíveis eleições em Angola. A UNITA “provavelmente ganharia por causa do seu apoio forte” entre os ovimbundos; a FNLA, sólida entre os bakongos, “terminaria em segundo”; o MPLA poderia ficar “num distante terceiro lugar”. Mas o principal problema residia “nas ambições pessoais dos três líderes (…), querendo todos ser presidentes”.
A guerra em Luanda iniciou-se a 21 de Março; apesar disso, o cônsul dos EUA sustentava que “não havia o risco iminente de uma guerra civil”. Depois do golpe de 11 de Março em Portugal, Neto enviou a Lisboa Iko Carreira, o seu comandante militar, em busca de “formas concretas de auxílio”, tendo sido acordado o envio a Angola de “civis ligados aos radicais do Movimento das Forças Armadas para falarem com a liderança do MPLA”. A 30 de Abril foram presos no aeroporto de Luanda nove pessoas com passaportes portugueses novos: “dois russos, dois jugoslavos, dois búlgaros, um brasileiro e outros dois de nacionalidade não identificada”.
Segundo o consulado dos EUA, teriam sido “enviados pelo PCP para ajudar o MPLA”. Este foi o primeiro grupo de estrangeiros identificados. Seguiram-se mais dois, um dos quais formado por “portugueses, brancos, membros do PCP, enviados ao grupo de Neto”.
A partir de Lisboa, Melo Antunes e Almeida Santos empenharam- -se “em enfraquecer as ligações do MPLA à União Soviética através da abertura, ou reforço, de outros canais de apoio como a Zâmbia, a Jugoslávia, a Roménia e a Argélia”.
Outro elemento – bem menos conhecido – foi a entrega de armamento à UNITA, concretizada parcialmente pelo general Silva Cardoso, com a concordância de Melo Antunes e do Presidente Costa Gomes. Num almoço com o embaixador americano em Lisboa, Frank Carlucci, Almeida Santos disse que o MPLA era “um perdedor” e que Savimbi era “o líder angolano mais inteligente e que provavelmente chegaria ao topo”.
Melo Antunes pensaria o mesmo. Ao seu homólogo francês afirmou que o Governo de Lisboa “tinha cometido um grande erro ao apoiar o MPLA e que ia tentar reverter essa tendência se não fosse muito tarde”, acrescentando que Savimbi era o líder nacionalista que valia a pena apoiar”.
Cubanos entram em acção
Inserido num projecto de pós-doutoramento no Instituto Português de Relações Internacionais, o livro – editado pela portuguesa “Dom Quixote” – mostra como a descolonização de Angola foi “um produto da Guerra Fria”. A “Operação IAfeature”, nome de código do programa para Angola, representava, segundo o “New York Times”, “a maior operação secreta norte-americana com a excepção do caso do Vietname”.
Constituiu em três medidas associadas: apoio económico à FNLA e UNITA (numa verba que poderá ter atingido 81 milhões de dólares); fornecimento de equipamento militar; e recrutamento de mercenários para conselheiros daqueles movimentos. Dirigida pela CIA, a supervisão foi entregue a John Stockwell, e os mercenários foram recrutados em Portugal, Brasil, França e especialmente Reino Unido.
Os primeiros foram portugueses, “300 elementos por um valor total de 570 mil dólares”, que entraram pelo Zaire, em Agosto, em reforço do grupo de mercenários “liderado pelo coronel Santos e Castro já anteriormente recrutado pela FNLA”. Dos brasileiros tratou Werner Walters, enquanto da França o famoso Bob Denard forneceu 20 mercenários para apoio à UNITA.
A intervenção cubana iniciou-se na segunda metade de Julho de 1975. Chamada “Operação Carlota” e da iniciativa de Fidel Castro, viria a contar com o apoio soviético. Na ponte aérea entre Havana e Angola, vários aparelhos cubanos e soviéticos foram abastecidos nos Açores, no aeroporto de Santa Maria. O livro regista as datas dos voos e o número de passageiros transportados. A decisão cubana provocou em Kissinger “uma surpresa total”, como o próprio admitiu nas suas memórias.
À acção montada pela África do Sul foi dado o nome de “Operação Savannah”. Destinada a apoiar uma frente entre a FNLA e a UNITA, participaram no respectivo comando operacional quadros da extinta PIDE/DGS. Tiago Moreira de Sá sublinha que o envolvimento de Pretória afastou a China e a maioria dos países africanos da UNITA e da FNLA e acabou por legitimar a intervenção soviética e cubana.
Frente anti-FNLA
Uma das revelações mais interessantes do livro respeita ao encontro secreto, em 29 de Agosto, entre o MPLA e a UNITA, em Lisboa, visando a criação de uma frente anti-FNLA. Participaram nas negociações Lopo do Nascimento e Carlos Rocha, pelo MPLA, e José N’Dele e Fernando Wilson, pela UNITA, e decorreram “no Palácio de Belém com a mediação de Costa Gomes e o apoio do Executivo português”.
A fonte é a embaixada em Lisboa. Os EUA tudo fizeram junto de Savimbi para pôr cobro a este acordo. Como escreveu Stockwell, os EUA não queriam aliados “moles” na guerra contra a URSS e o MPLA.
O historiador teve ainda acesso aos diálogos sobre Angola entre Ford e Kissinger, por um lado, e Mao Tsé-Tung e Deng Xiaoping, por outro, em Dezembro de 1975. Para Pequim, “vale a pena gastar dinheiro neste problema. Porque é uma questão de importância estratégica-chave”.
O livro trata com algum pormenor da batalha de Quifandongo, na véspera do dia 11 de Novembro, a 20 quilómetros de Luanda. Espelho da Guerra Fria, de um lado estavam a FNLA, comandos do Zaire, mercenários portugueses, conselheiros da África do Sul e da CIA, do outro forças do MPLA, com apoio cubano e armamento soviético.
Vinda do Sul, a coluna Zulu, composta por tropas da UNITA e da África do Sul, foi impedida de prosseguir a 200 quilómetros da capital pela destruição de uma ponte sobre o rio Queve. A 11 de Novembro, dia da independência, era o MPLA quem controlava Luanda – e, “em África, quem controla a capital detém o poder”.

Publicado pelo Jornal EXPRESSO - 07/07/2011


04 julho 2012

CONSPIRAÇÃO CAPITALISTA

CONSPIRAÇÃO CAPITALISTA

É documentário importante para compreender a actuação dos maiores  bancos do mundo no controle da economia dos paises desenvolvidos e até da política internacional. Clica para o tamanho maior e seleccione a legenda na lingua preferida em cc.


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MUSEUS E ENSINO DE HISTÓRIA


MUSEUS E ENSINO DE HISTÓRIA


Jorge Fernando Jairoce

 Introdução
A relação museu, educação e ensino de História bem como as potencialidades educativas e afectivas da educação patrimonial são aspectos desenvolvidos neste artigo.

1.1. Evolução do conceito museu

O conceito museu evolui com o tempo. Tradicionalmente, os museus eram vistos como locais de preservação do património e da memória “os objectos do passado”, que podiam ser contemplados por uma certa elite já sensibilizada para a sua fruição, ou seja, as massas não eram consideradas públicos-alvo das instituições museológicas.

Mas, a partir de 1940, operaram-se transformações profundas na sociedade, nas concepções da cultura e nas ideologias, nas exigências da comunidade para com as instituições museológicas, ou melhor, os museus passam a considerar-se ao serviço da comunidade, deixando progressivamente a sua tradição elitista e minoritária. Estas mudanças redefinem o seu papel na acção educativa.

Por isso, hoje, de acordo com o Conselho Internacional dos Museus- ICOM, “... museu é considerado como uma instituição permanente sem finalidade lucrativa ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público e que realiza investigações que dizem respeito aos testemunhos materiais do homem e do seu meio ambiente, adquire os mesmos, conserva-os, transmite-os e expõe-nos especialmente com intenções de estudo, de educação e deleite” (Costa e Olofsson, 1997, p.1).

Considerando este conceito, o museu deixa de ser aquele espaço estigmatizado como local de coisas velhas, passando a ser espaço de discussão, difusão de informação e, sobretudo, de reflexão. Seguindo este raciocínio, o museu poderá ser utilizado como recurso pedagógico destinado ao ensino de várias áreas e, principalmente, da história devido a natureza documental dos acervos museológicos. O aluno pode participar através da visita ao museu na elaboração do conhecimento histórico, consolidar o conhecimento teórico, despertar o interesse pela história, despertar o espírito patriótico e sentir a história Pátria.

Mas para que o museu cumpra a sua função pedagógica deve relacionar as suas actividades à acção educativa. E sobre este último aspecto, Barreto (1985a) considera que a função educacional dos museus consiste em “dar ao indivíduo a consciência do património cultural de que é herdeiro e da capacidade de utilizá-lo e criá-lo. Esta consciência é adquirida basicamente pelo envolvimento sujeito/objecto cultural, pela aproximação e apropriação da sua função essencial e simbólica, assim como da sua trajectória”. (p.2)

Para que isso aconteça, o museu precisa de organizar os seus serviços educativos tendo em conta que a actuação do museu como agência cultural e educativa só pode ser alcançada por uma cuidadosa educação patrimonial.


1.2. Educação patrimonial

A educação patrimonial é “o ensino centrado em objectos culturais, na evidência material da cultura, ou, o processo educacional que considera o objecto como fonte primária de conhecimento” (Barreto, 1985b, p.4).

Partindo desta definição, podemos afirmar que a educação patrimonial possibilita situações não só de aprendizagem, através de objectos materiais e simbólicos da cultura sobre processos histórico-culturais passados, como também o de suscitar o gosto, o interesse em produzir e interagir racional e sensivelmente com experiências históricas tanto passadas quanto presentes, valorizando a importância da preservação das mesmas.

A educação patrimonial têm inúmeras potencialidades tais como: afectivas e pedagógicas.

1.2.1. Potencialidades afectivas da educação patrimonial

A educação patrimonial é um poderoso instrumento no processo de reencontro do indivíduo consigo mesmo, resgatando a sua auto-estima através da revalorização e reconquista da sua própria identidade cultural, ao perceber o seu redor e a si mesmo em seu contexto cultural como um todo, transformando-se em principal agente de preservação.

Para o caso moçambicano, a efectivação de uma educação patrimonial seria uma oportunidade para a divulgação dos valores culturais, criar uma identidade nacional e construir uma nação moçambicana com o intuito de promover o espírito de cidadania conforme as recomendações gerais saídas da 1ª Conferência Nacional sobre a Cultura realizada em 1993.

Através de acções voltadas para a preservação e compreensão do património cultural, a educação patrimonial torna-se num veículo de aproximação, de conhecimento, de integração e aprendizagem de crianças, jovens, adultos e idosos, com o objectivo de os mesmos (re) conhecerem, (re) valorizarem e se (re) apropriarem de toda a herança cultural a eles pertencente, proporcionando uma postura mais crítica e actuante na (re) construção da sua identidade e cidadania.

1.2.2. Potencialidades pedagógicas da educação patrimonial

O ensino centrado em bens culturais existentes no museu e na localidade têm múltiplas vantagens que devem ser destacadas para possibilitar ao indivíduo uma experiência concreta da evocação do passado. E, se não for assim, não há menor sentido em se acumular objectos em museus ou preservar os monumentos da sua destruição. O aprendizado através de objecto é diferente do aprendizado através de ideias e palavras. É um processo diverso e específico que apela mais para o sensível, o concreto, o visual, o táctil e o emocional que o intelectual.

Está provado que a visão desempenha um papel muito importante na memorização se for combinada com a explicação oral e a realização de exercícios pelos alunos. Por exemplo, João (1983, p.75) refere que 83% daquilo que aprendemos é através da visão. A observação directa de objectos no museu constitui uma mais valia, uma espécie de palavra oferecida que poderá servir de antídoto a uma educação, por vezes ainda muito livresca e demasiado abstracta.

Para reforçar estes aspectos Barreto (1985b, p. 4), identifica três categorias diferentes do ensino baseado em objectos culturais:

1ª Categoria: Os objectos são ilustrações para uma história desenvolvida de fontes predominantemente literárias (quando a cultura material deve ser a fonte principal). Relativamente a esta categoria, é necessário referir que o ensino meramente verbal sem evidência material cria insegurança nos alunos, é demasiado especulativo e até pode inibir a análise científica.

2ª Categoria: No ensino académico, a evidência material da cultura é utilizada pelo professor para testar interpretações já estabelecidas ou novas hipóteses baseadas em documentos ou dados estatísticos. Esta categoria revela–se como técnica de pesquisa bastante efectiva.

3ª Categoria: O ensino centrado em bens culturais provoca deliberadamente uma experiência que possibilita o indivíduo conhecer ou sentir o passado. Há uma grande preocupação com a criatividade, pois nesta técnica, o interesse usado não é tanto o passado em si, mas o que pode provocar na mente a contemplação do visitante ou do estudante. Trata-se aqui de se considerar os objectos como ideias e não apenas como realidades superficiais.

Estas três categorias tomam os objectos e expressões do património cultural como ponto de partida para actividade pedagógica, observando-os, questionando-os e explorando todos os seus aspectos, que podem ser traduzidos em conceitos e conhecimentos. Estas três categorias também são referenciadas no trabalho de Matola (1996, p.8) que considera que o ensino centrado em bens culturais permite ao aluno entrar em contacto afectivo sensorial, físico, cognitivo com o passado, e que na sua opinião, quando o ensino se faz através do concreto, permite ao aluno iniciar-se na produção do seu conhecimento histórico e simultaneamente chegar ao estágio de maior aceitação e gosto pela disciplina de História.


Conclusão

Nos estudos por mim efectuados desde 2004 á 2010, permitiram-me constatar que os conteúdos de História, leccionados nas nossas escolas, têm privilegiado padrões de cultura importados, aplicados sem a devida redução social, em conteúdos impostos de cima para baixo, dissociados da realidade dos alunos, em escolas burocratizadas e distantes das comunidades na qual estão inseridas. Então, é altura de valorizarmos estudos da nossa realidade cultural e da nossa memória histórica. O ensino de História baseado na utilização dos bens culturais serviria como opção metodológica para mudar a prática do ensino em vigor e torná-lo mais interessante e atractivo para os alunos visto que possibilita  múltiplas vantagens afectivas e pedagógicas. .


 Bibliografia

BARRETO, Maria de Lourdes Parreiras Horta. Educação Patrimonial. In: Boletim nº 5 do Programa Nacional Pró-memória. Rio de Janeiro: Ministério da Cultura. 1985ª.


__________Educação Patrimonial. In: Jornal de Letras – 1º Caderno. Abril de 1985b. p.4.


COSTA, Alda, OLOFSSON, Elizabeth. Política Nacional de Museus (Proposta). In: Seminário regional de capacitação dos directores distritais da Cultura, Juventude e Desportos da Zona Sul. Maputo: Novembro de 1997.

JAIROCE, Jorge Fernando. As potencialidades educativas e pedagógicas  do Museu Nacional da Moeda no ensino de História em Moçambique. (Trabalho de Diploma para obtenção do grau académico de Licenciatura em ensino de História e Geografia pela Universidade Pedagógica, Faculdade de Ciências Sociais, Departamento de História. 2005.60p.)


JAIROCE, Jorge Fernando. As conexões entre a História Local, Nacional e Global no ensino de História no nível básico em Moçambique. (Dissertação para obtenção do grau académico de Mestrado em Educação/Ensino de História pela Universidade Pedagógica, Faculdade de Ciências Sociais, Departamento de História. 2010.90p.)


JOÃO, Maria Isabel. Didáctica de História. Maputo:UEM, Faculdade de Educação, Departamento de História. 1989.


MATOLA, Laurindo Joaquim Ferreira. A utilização dos bens culturais no ensino de História em Moçambique. (Trabalho de Diploma para obtenção do grau académico de Licenciatura em ensino de História e Geografia pela Universidade Pedagógica, Faculdade de Ciências Sociais, Departamento de História. 1996.68p.)


MOÇAMBIQUE. MINISTÉRIO DA CULTURA. Recomendações gerais da 1ª Conferência Nacional sobre a Cultura. Maputo:  16 de Julho de 1993. (doc.30/CNC/93).

HISTÓRIA SOCIAL E O ENSINO DA HISTÓRIA LOCAL EM MOÇAMBIQUE


HISTÓRIA SOCIAL E O ENSINO DA HISTÓRIA LOCAL EM MOÇAMBIQUE



Jorge Fernando Jairoce


 

Introdução

Este artigo pretende analisar o alcance da nova abordagem da História Social, que se enquadra na perspectiva da abordagem da História Nova no ensino de História em Moçambique, ou seja pretende contribuir para uma proposta de ensino de História mais inclusivo (considerando os papéis dos grupos sociais desfovorecidos) nas escolas moçambicanas.



I. Abordagem de História Social

A História Social visa reflectir sobre construções de conhecimento histórico voltada para mudança social, um conhecimento histórico relacionado com as práticas sociais e culturais dos indivíduos no dia a dia. A História Social preocupa-se com as desigualdades sociais, pobreza, a marginalização do indivíduo, etc e reflecte o indivíduo inserido num determinado contexto sócio-cultural que precisa ser compreendido. Tal metodologia de análise coloca o aluno diante de factos próximos da sua realidade, portanto, gerando maior curiosidade e consequentemente promovendo conhecimento.



A História Social, delimita a cultura enquanto campo privilegiado do sentido de viver e da reflexão histórica e empreender criticamente a reavaliação das referências teóricas e metodológicas, académicas e políticas assumidas neste processo” (Maciel, 2006, p.10).



Assim sendo esta nova abordagem histórica abre-se aos objectos mais variados, como a cultura popular, a cultura letrada, as representações, as práticas discursivas partilhadas por diversos grupos sociais, os sistemas educativos, a mediação cultural através dos intelectuais, ou quaisquer outros campos temáticos atravessados pela polissêmica noção de “cultura” entendido como modos de vida. Esta proposta da História que toma a cultura como elemento central de análise histórica amplia as possibilidades de explicação, interpretação e perspectivas de investigação e de intervenção no social. É uma abordagem que valoriza a memória que não está apenas nas lembranças das pessoas, mas também nas marcas que a história deixou ao longo do tempo em suas avenidas, monumentos, equipamentos, ou seus espaços de convivência e várias linguagens utilizadas em História, imprensa, literatura, fotografia, cinemas e narrativas orais.

É uma análise do passado a partir da perspectiva do presente. É uma perspectiva de análise histórica que implica mudanças na prática do professor na sala de aula, no seu relacionamento com os alunos. É uma proposta que exige uma reformulação das metodologias de ensino; da organização curricular; dos manuais escolares, etc. Esta proposta sugere ao historiador que nas suas análises reflicta sobre a utilização das diferentes possibilidades de linguagens com vista a produção do conhecimento histórico. Exige um diálogo permanente do pesquisador com os documentos. É uma perspectiva de análise histórica, cuja compreensão só pode ser na totalidade histórica. Em suma é uma perspectiva de análise histórica voltada ao olhar político, que significa por outras palavras, a tomada de atitude crítica em relação aos problemas da sociedade (Sarlo, 1997).

A partir desta perspectiva histórica pode-se explorar as potencialidades da história local no ensino básico em Moçambique. A análise sócio-cultural da História encontra em Edward Thompson um aliado científico e metodológico de relevo, conforme demonstra-se na sua obra “A miséria da teoria: um planetário de erros” que têm influenciado os estudantes de História em várias universidades da Europa e do Brasil .



II. Breve comentário sobre a obra de Edward Thompson

Na obra de Edward Thompson, com o título “ A miséria da teoria: um planetário de erros” ele trava um acirrado debate contra o estruturalismo marxista.

O abandono, pelo marxismo estruturalista, da noção de “ experiência” que era material de demonstração de discursos históricos, implicaria inúmeros problemas de ordem teórica e prática, pois, ao priscindir do diálogo necessário entre o “ser social” e “consciência social”, o materialismo histórico perderia suas referências princípais. Contudo, apesar de reinvidicar o lugar da  experiência na história, e portanto, no materialismo histórico Thompson não está invalidando o papel da teoria ou mesmo proclamando o “empirismo” como a forma mais correcta de se lidar com a história. Pelo contrário, o procedimento adequado para o trabalho

com materiais históricos, dizia Thompson, pressuporia um método que articulasse o diálogo permanente entre teoria e prática, entre hipóteses e evidências. A experiência surgiria, compondo uma espécie de “dialéctica de conhecimento histórico”.

Para Thompson, a história conheceria causas necessárias, mas nunca suficientes, “pois as leis” (ou, a lógica ou as apreensões) do processo social e económico estão sendo continuamente infrigidas pelas contigências, de modo que invalidaram qualquer regra nas ciências experimentais.

A análise histórica de Thompson valoriza muito a cultura e experiência. Aliás, temos que recordar que foi Thompson que procurou dar significado a categoria de “classe”, retirando-a do campo “essencialista” da estrutura e inserindo-a no campo das identidades e relações constituídas historicamente.

Para ele, nenhuma categoria histórica foi mais incompreendida, atormentada, des-historicizada do que a categoria de classe social; uma formação histórica autodefinidora, que homens e mulheres elaboram a partir da sua própria experiência de luta foi reduzida a uma categoria estática, das quais os homens não são autores, mas vectores.

Ele construíu uma metodologia de análise histórica que trabalha materiais históricos, em que se recortavam, no fundamental, as classes sociais em um permanente processo de fazer-se. Daí se abstrairiam a experiência, a cultura, a política – tudo aquilo que no marxismo dogmático era deixado de fora. Em torno da pesquisa Thompson considerava que a mesma não pode ser fechada, finita, acabada, absoluta, mas sim um conhecimento em operações, se considerarmos que o campo de historicidade é aberta, problemática que exige uma investigação flexível e permanentemente aberta.



III. Relação da abordagem teórica da História Social, perspectiva teórica de Edward Thompson e o ensino de História em Moçambique

A abordagem teórica da História Social e visão apresentada pelo E. Thompson acima referido inspirou-me a pensar seriamente no sistema educacional moçambicano, concretamente no tipo de ensino de História que ministramos nas nossas escolas, desde o ensino básico até o nível médio geral. O ensino de História em Moçambique, considerando os diferentes níveis continua pautado na memorização e repetição oral de textos escritos, isso significa dizer que a História é ensinada numa concepção cronológica e linear. Um ensino com finalidade de perpetuar a história dos “heróis” da classe dominante da considerada “nomenclatura política’’, deixando no anonimato outros sujeitos que construiram o quotidiano das relações sócio-culturais, económicas e políticas.

É um tipo de ensino que têm revelado os resquícios da cultura historiográfica ainda centrada num paradigma conservador. Os professores trabalham os conteúdos da forma fragmentada baseada numa concepção de História cronológica. Muitos deles ou quase a maioria utiliza o livro didáctico como referencial para o seu trabalho pedagógico sem fazer uma adaptação a realidade do meio onde o aluno está inserido. É um tipo de ensino dependente dos programas e currículos baseados em modelos culturais europeus, ou seja, é um ensino cujo centro é a história da Europa. Daí que a periodização adoptada é a tradicional baseada em épocas sucessivas “ história antiga, medieval, moderna e contemporânea”. Em relação aos conteúdos sobre a história de Moçambique e de África, a sua análise é a partir de experiência europeia, que é considerado como modelo de desenvolvimento, provocando uma abordagem centrada nas ausências, ou seja, naquilo que falta nestas sociedades em relação à Europa, tal como referiu Cabrini (2000).

É um tipo de ensino com predominância da noção linear de desenvolvimento das sociedades que anula a acção dos indivíduos na história, pois o processo histórico toma um sentido único e irreversível, duma trajectória que não depende da realidade concreta dos sujeitos históricos comuns, uma vez que suas acções não são consideradas (Fonseca, 2003).

As nossas práticas escolares no ensino de História fragmentam as diversas dimensões que constituem  a realidade social. A divisão didáctica da sociedade é feita em níveis (social, político, económico e cultural) como se pode observar nos manuais e programas da (4ª a 10ª Classe). Nesta divisão em categorias estanques, normalmente com o predomínio do político e/ou económico, rompe com a ideia da totalidade histórica, a qual a história deveria se ocupar de construir ideia que permite pensar na possibilidade de aproximação da história a partir de qualquer tema, objecto ou personagem. Este ensino exclui os sujeitos, acções e lutas sociais.

Analisando a situação do ensino de História em Moçambique comparando com os pontos de vista da historiografia social inglesa defendidos por Edward Thompson e Raymonds Williams, remete-nos a pensar num tipo de ensino que aposta a recuperação de diferentes experiências vividas por diversos sujeitos históricos comuns, numa perspectiva da história vista de baixo e romper com a linearidade e determinismo e onde a história se apresenta como um campo de possibilidades.

É neste contexto educacional que proponho um tipo de ensino de História que se baseia na realidade local do aluno.

O estudo de temas locais oferece sérias possibilidades de análise histórica. Daí que para a mudança da concepção de ensino de História atrás referido, devemos tomar em conta as diferentes instituições, lugares e linguagens de História, ou seja, analisarmos museus, bibliotecas e famílias (instituições), história de vida, bairro, cidade e testemunhos de pessoas (linguagens) que viveram factos históricos num passado recente e que são fontes vivas do quotidiano vivido por estas comunidades.

Os estudos da História local revelam-se extremamente motivadores para os alunos porque lhes permitem realizar actividade sobre temas que lhes despertam o interesse, pela sua relação com o passado do que ainda reconhecem os mais variados vestígios. A motivação deve contudo ultrapassar a satisfação de simples curiosidade para fomentar um verdadeiro trabalho de investigação (Ibid., p.158).

A história local dá possibilidade para questionar o tipo de História que ensinamos nas nossas escolas, porque ela põe o aluno em contacto directo com dados empíricos de pesquisa e factos concretos, reais, possibilitando um aprendizado de maior interesse da sua parte (Fonseca, 2003). Ao estudar temas de localidade, de sua aldeia, princípio de concreto, pode-se articular na esfera do particular a sua preocupação singular em conexão com o universal. A história forma consciência de inserção dos educandos na sociedade e no mundo, construir identidade (além de tomar consciência da sua própria identidade e de outras), a consciência social tal como referiu Thompson (1978).

É de realçar que no ensino básico, o Ministério de Educação e Cultura de Moçambique orienta que os professores aproveitem 20%, reservado para o trabalho com o Currículo Local, o que constitue uma óptima oportunidade para a exploração da História Local. Porém, existe uma dissociação entre o que é proposto e o que é desenvolvido nas escolas com vista a formação das crianças. Isto deve-se a vários factores que a seguir mencionamos:

• Valorização excessiva de aspectos políticos como heróis, figuras políticas pertencentes às elites locais;

• Não existem fontes de estudo e documentos em geral disponíveis aos professores. As existentes são, muitas vezes, produzidos por orgãos administrativos locais, o que as transforma em expressão de difusão e de preservação de memória dos grupos do poder político e económico das elites locais. São documentos com restrito rigor científico. Quase sempre reflectem uma construção que nega o movimento de fazer humano e da dialética da sociedade. Portanto há escassez de recursos didácticos. O livro didáctico é o recurso mais utilizado pelos professores nas aulas de História;

• Falta de preparação didáctico-pedagógica dos professores primários em Metodologia de abordagem do Currículo Local.

• Falta de criatividade e desmotivação de alguns professores em explorar a realidade social local nas suas aulas.



Conclusão

Face ao exposto e a partir da proposta da História Social e de Edward Thompson abre-se o espaço para a pesquisa sobre o ensino de História em Moçambique desde o período da dominação colonial até a actualidade considerando as finalidades de ensino em cada período no sentido de perceber a noção de conceitos da classe social, consciência social, práticas culturais, identidade, cidadania, sujeitos históricos comuns e o lugar da História Local no ensino de História e diferentes fases da história de Moçambique. Por fim proponho uma revisão dos conteúdos dos programas de História de diferentes níveis com vista a ter um ensino de História que respeita os valores culturais da sociedade. Uma proposta que inculca o aluno como sujeito histórico activo no movimento da História. Uma história que valoriza a realidade social do aluno, que o ajuda a entender a sociedade onde vive. Um ensino de História que visa afastar-se da abordagem linear, cronológica, política, hegemónica, elitista, antidemocrática, parcial da realidade.



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CONCEPÇÕES DA HISTÓRIA LOCAL, NACIONAL E GLOBAL E POSSÍVEIS CONEXÕES


CONCEPÇÕES DA  HISTÓRIA LOCAL, NACIONAL E GLOBAL  E POSSÍVEIS CONEXÕES


Jorge Fernando Jairoce

            Introdução

Este artigo analisa as concepções da História Local, Nacional e Global e mostra as possíveis conexões que se podem estabelecer entre estas áreas históricas. Neste artigo destaca-se também a concepção e importância da História Local, visto que na era da globalização é necessário resgatar a memória histórica que é importante na preservação das  identidades locais que actualmente estão sendo ameaçados pelo processo da globalização.



1.1. Concepções da  História Local, Nacional e Global


O antropólogo Clifford Geertz e o filósofo Michel Foucault, apesar de não serem académicos de História, deram um grande contributo científico e metodológico na investigação histórica, sobretudo na área da Micro-história. Esta área está representada nos trabalhos antropológicos de Clifford Geertz e no modelo alternativo da escrita da história das culturas de Michel Foucault (Sengulane, In: Revista Síntese (V), 2007, p. 30)

Geertz   (1998) na sua obra “Interpretação das culturas” chama atenção para que os estudos de realidades sociais tomem em consideração o aspecto cultural e particular da mesma, permitindo assim uma descrição densa do fenómeno social a investigar. Nesse sentido propõe o estudo de fenómenos particulares e localizáveis.

A mesma ideia viria a ser desenvolvida e aprofundada numa outra obra publicada pelo mesmo autor (1997) cujo título é “Saber Local: novos ensaios em antropologia interpretativa ”. Já Foucault (1979) na sua obra “Microfísica do poder” chama atenção ao estudo das instituições particulares ligadas a vida do indivíduo tais como: prisões, escolas, hospitais, psiquiatria, asilos e outros. A abordagem do Foucault abre espaço para o estudo dos espaços locais que se enquadram perfeitamente na História Local.

Geertz  e Foucault, abrem assim espaço para ocorrência de uma modalidade da História escrita a partir das realidades particulares. Para consubstanciar as ideias acima referenciadas, Vendrascolo e Gandra apud Bossi (1994) referem que:



Sustentar a defesa do estudo da história  local (...) significa optar por temática  ligadas ao espaço e ao quotidiano das comunidades específicas que por certo, ficariam  sem atenção nas abordagens genéricas. O estudo dos temas locais opera, assim, em escala de observação específica, com possibilidade de experiências próximas aos documentos, bibliotecas e testemunhos  de pessoas que viveram factos históricos num passado recente e que são fontes vivas do quotidiano vivenciado por essas comunidades” (p.30).



            O estudo da História Local constitui uma mais valia actualmente, visto que  vivemos numa era da globalização onde a circulação de pessoas, mercadorias e informação é rápida e o contacto entre os diferentes continentes constitui uma realidade constante, o que afecta de certa forma as identidades culturais dos povos. Perante estas afirmações seria de questionar até que ponto é importante o estudo da História Local. Poderiamos responder de imediato que a História visa o Homem e que a vida de cada homem  desenvolve- se nos pequenos espaços. É nestes espaços que cada um se insere e se realiza, integrado numa família e numa comunidade. Por isso o amor à terra pode constituir uma boa razão para o estudo da  História Local, porque o amor é mais perfeito e mais forte, quando se apoia  no conhecimento. Quem conhece a História da sua terra pode amá-la com mais consistência.

            Mas essa resposta deixa-nos de certa forma insatisfeitos, porque não ultrapassa o tal horizonte aparentemente limitado que é o do nosso pequeno mundo.

Afirmaremos à partida, que o conhecimento da História Local é indispensável para a construção da História Nacional. Esta não é forçosamente a que é feita  na capital e escrita na perspectiva da capital, mas a que interpreta com fidelidade o sentir, o pensar e o viver de um povo – neste caso o povo de Moçambique. Moçambique que não é uma entidade abstracta mas que resulta concretamente da entrosagem das suas diversidades culturais. Nesta perspectiva  a História Nacional de Moçambique podemos considerar como aquela que tem vigência no território nacional e inclui vários elementos como a população, mercadoria, moeda, hino, bandeira, governo, constituição, cultura, religião, história, formas de organização social e técnica de trabalho, façanhas, heróis, santos, monumentos, ruínas, etc. Mas também podemos considerar a História Nacional como um agregado de histórias locais diferenciadas de um terrítório considerado Nação[1].

A História Global é aquela que pensa o mundo como uma sociedade global, como por exemplo  as relações, os processos  e as estruturas económicas, políticas, demográficas, históricas, culturais e sociais, que se desenvolvem a escala nacional. Esta história liga localidades distantes de tal maneira que acontecimentos históricos locais são modelados para eventos que ocorrem a longa distância. O que ocorre hoje numa cidade pode ser fruto do que ocorre no local distante resultante da dinâmica global. Portanto podemos concluir que o local e global estão distantes e próximos.

De qualquer modo, pode afirmar-se que o gosto pela História Local em Moçambique ainda é incipiente apesar do Novo Currículo do Ensino Básico recomendar a abordagem de estudos locais – através do  Currículo Local. Esta inovação representa grande desafio para autoridades da educação em Moçambique duma forma geral e para as escolas do Ensino Básico, em particular. Os programas concentram-se no nacional e no global e dificilmente fazem a conexão destas três dimensões de saberes.



1.2. Razões para a valorização da História Local no ensino de História no nível básico em Moçambique

História Local é um campo da pesquisa histórica que se preocupa com a questão da identidade cultural[2]. Actualmente o processo da globalização está a provocar impactos culturais com reflexos negativos sobre as identidades culturais. Para consubstanciar esta afirmação Woodward (2000) refere que:



A globalização..., produz diferentes resultados em termos de identidade. A homogeneidade cultural promovida pelo mercado global pode levar ao distanciamento da identidade relativamente à comunidade e  à cultura local. De forma alternativa, pode levar a uma resistência que pode fortalecer e reafirmar algumas identidades nacionais e locais ou levar ao surgimento de novas posições de identidade.  (p. 21)



A ideia do autor acima referenciado pode ser reforçada por Ianni (1997),  quando afirma que uma das características da globalização é a perda das referências, é a destruição do passado. A globalização não respeita a biodiversidade e a diversidade cultural. Perverte as referências reais e simbólicas dos contextos locais.

Para Hobsbawn (1995), esta destruição foi um dos fenómenos mais tristes do final do século XX. O crescimento dos jovens vem ocorrendo numa forma de presente constante, sem relação orgânica com o passado da época em que vivem. Então os historiadores com a missão de lembrar o que é esquecido tornam-se muito importantes  na preservação da memória e resgate da História Local.

Por isso que a Ossana apud Schmidt (2000) refere que:



o trabalho com a história local no ensino de História pode ser instrumento idóneo para a construção de uma história mais plural, menos homogénea, que não silencie as especificidades. O local ou regional, instituídos como objectos de estudo, podem ser contrastados com outros âmbitos e indicar a pluralidade  em dois sentidos: na possibilidade de outras história micro, partes, todas elas, de alguma outra história que as englobe e, ao mesmo tempo, que reconheça suas particularidades” (p.214)



A citação acima chama-nos à atenção que a História Local não pode ser estudada de uma forma isolada de outras histórias regional, nacional e a global. Há uma necessidade de que as pessoas gradualmente se tornem mais cidadãs do mundo sem perderem  as suas raízes culturais e continuando a desempenhar um papel activo na vida do seu país e da sua comunidade, daí que nas aulas de História deve-se procurar sempre que possível estabelecer as conexões entre a História Local, Nacional e Global. Podemos usar a metáfora de que o interesse pela árvore não dispensa a atenção pela floresta para justificar a ideia de que a valorização da História Local não dispensa a História Nacional, Regional ou Global. Não é por acaso que Schmidt e Cainelli (2004) afirmam que para o uso da História Local no ensino de História é necessário observar duas questões fundamentais:



Em primeiro lugar, é importante observar que uma realidade local contém, em si mesma, a chave de sua própria explicação, pois os problemas culturais, políticos, económicos e sociais de uma localidade explicam-se, também, pela relação com outras localidades, outros países e, até  mesmo por processos históricos mais amplos. Em segundo lugar, ao propor o ensino de história local como indicador da construção de identidade, não se pode esquecer de que, no atual processo de mundialização, é importante que a construção de identidade tenha marcos de referência relacionais, que devem ser conhecidos e situados, como o local, o nacional....e o mundial” (p.112).



A afirmação acima chama-nos atenção de que é preciso observar a dinâmica da sociedade, porque o contexto da globalização, o movimento das pessoas é intenso e a circulação da informação acompanha esta dinâmica, daí ser possível encontrar na localidade aspectos do regional, do nacional e do global que de uma ou de outra forma influencia o local. Ao se articular os conteúdos da História Local com a História Nacional e Global permite o aluno desenvolver a consciência histórica[3].

  Para o caso do Ensino Básico em Moçambique a exploração do ambiente local – fontes orais sobretudo dada pelos mais velhos, arquivos locais e escolares, museus, florestas sagradas, livros, manuscritos, as datas históricas, a história das vilas e cidades e outros bens culturais tangíveis e intangíveis, enfim o vasto património cultural nacional moçambicano constituem excelentes laboratórios e pontos de partida para o estudo da História Local para em seguida relacioná-los com a História Nacional e Global.

    A História Geral de um país não pode descer às particularizações e aos pormenores que são próprios da Historia Local. Por isso, mais uma vez, entendemos que o gosto  pela História Geral favorecerá por  extensão o gosto pela História Local. Para que as conexões da História Local, Nacional e o Global se efective com consistência é necessário observar alguns desafios dentro da escola tal como aponta Knauss (1999) ao referir que:



O trabalho dentro da escola ainda representa a parte central da aprendizagem mas, em volta dele, devem aglutinar-se actividades significativas dentro da comunidade em que a Escola está inserida e a aquisição de conhecimento relevante sobre o mundo em geral. Deste modo, será desejavelmente possível preparar melhor a geração jovem para as suas vidas futuras como seres individuais e actores sociais responsáveis, permitindo-lhes encontrar o seu lugar no mundo do trabalho e tornando-os cidadãos de pleno direito nas comunidades a que pertencem, nos seus países e num mundo do futuro, o qual tal como Jacques Delors prediz: será “dominado pela globalização”. (p. 21)



Portanto, o estudo da História Local exige uma colaboração permanente da Escola com as comunidades locais, caso contrário a escola continuará a ser uma entidade isolada. Exige também que a escola prepare e motive os professores para esta colaboração.



1.3.  Fundamentação legal para a abordagem da História Local no Ensino Básico em Moçambique

O MINED de Moçambique, iniciou em 2002, a introdução de Novo Currículo para o Ensino Básico. O plano reformula o currículo que foi introduzido em 1983 pelo lei nº 4/83, de 23 de Março, e revoga a que foi reformulada em 1992 pela lei nº 6/92, de 6 de Maio. A elaboração do Novo Currículo foi coordenada pelo Instituto Nacional do Desenvolvimento da Educação (INDE).

O Novo Currículo introduziu várias inovações, uma das quais é a introdução do Currículo Local[4], que na visão do INDE representa uma componente do Currículo Nacional correspondente a 20%  do total do tempo previsto para a leccionação de cada disciplina. “Esta componente é constituída por conteúdo localmente como sendo relevantes, para integração da criança na sua comunidade” (Castiano, 2003, p.20).

De facto, a introdução do Currículo Local constitui uma inovação no actual Sistema Nacional da Educação em Moçambique, se partirmos do pressuposto de que a história da educação no país desde o período colonial até a instituição da lei n° 6/92 (que corresponde a lei do Novo Sistema Nacional da Educação em substituição da lei do Antigo Sistema Nacional de Educação de 1983), não tomaram em conta a valorização dos saberes locais. Por exemplo, sobre o objectivo da educação no período colonial Santos (2009) diz que:



“... sob o pretexto da “missão civilizadora”, o projecto da colonização procurou homogeinizar o mundo, obliterando as diferenças culturais  ... Com isso, desperdiçou-se muita experiência social e reduziu-se a diversidade epistemológica, cultural e política do mundo .... Na medida em que sobreviveram, essas experiências e essa diversidade foram submetidas à norma epistemológica dominante: foram definidas ... como saberes locais e contextuais apenas utilizáveis em duas circunstâncias: como matéria para o avanço do conhecimento científico; como instrumentos do governo indirecto, inculcando nos povos e nas práticas dominadas à ilusão credível de serem autogovernadas. A perda de uma auto-referência genuína não foi apenas uma perda gnosiológica, foi também, e sobretudo, uma perda ontológica; saberes inferiores próprios de seres inferiores” (p.10)



Atendendo a definição do INDE que parte do pressuposto de que o Currículo Local ajuda a integrar a criança na sua comunidade, então, o ensino da História Local, encontra o seu espaço de actuação, com  inúmeras vantagens pedagógicas  e afectivas  que vale a pena  mencionar:

- Pode criar a motivação dos alunos para o estudo de história e para a construção do conhecimento histórico;

- Possibilita aos alunos aproximarem os acontecimentos históricos do seu quotidiano, da sua família, dos conhecidos, enfim, da sua comunidade com os processos históricos mais amplos, que permite fazer contextualização e construir  relações.

- Pode estimular os adolescentes a demonstrarem apego à sua localidade, estudando a história de maneira mais apaixonada, diferentemente da história tradicional ensinada em muitas escolas, onde o estudo não vai além do livro didáctico, numa rotineira repetição dos saberes produzidos, que inibem a aprendizagem activa e limitam as possibilidades do conhecimento.

- Fazendo e refazendo a História Local da comunidade, desenvolve-se a consciência cívica da necessidade de integração e intervenção na vida da comunidade;

- Na medida em que se descobre e valoriza aspectos comum à outras comunidades, valoriza-as de certa forma e por essa via pode diminuir-se as rivalidades cultuarais entre elas;

- Conhecendo a sua própria identidade, descobrindo os aspectos menos positivos ou até reprováveis (tal como na vida dos indivíduos, na das sociedades, nem tudo é digno de elogio) reconhecendo o valor dos intercâmbio, tendo como referência uma matriz comum que é uma matriz nacional, afasta o localismo fanático;

- A História Local desperta o amor inteligente à terra, ajuda a explicar o sentido profundo das coisas e atitudes.

O estudo da História Local opera em escala de observação pontual, com possibilidades de contactos empíricos com documentos, museus, bibliotecas e testemunhos de pessoas que viveram os factos históricos num passado recente e que são fontes vivas do quotidiano vivido por estas comunidades. Se a Micro-história ainda é vista com certo desprezo pelos analistas dos sistemas macro-sociais, é certo que ela contribui substancialmente para despertar a consciência histórica e para redefinir o ofício do historiador (Bloch, 2001, p.20).

A História Local coloca o aluno diante de factos próximos da sua realidade, portanto, gerando maior curiosidade e consequentemente, promovendo o conhecimento, paralelo ao eficaz trabalho do professor enquanto mediador do conhecimento. Não há como desvincular o local do universal, ou seja, os elementos da História Local constituem particularidades que dão sustentação a História Global. O estudo da História das comunidades locais, quer enfoquem  a inserção do ser social no meio físico, articulações sociais, estruturas produtivas, circuitos comerciais, geografia de poderes ou manifestações culturais, tendem a possibilitar análises mais abrangentes e aprofundadas do conjunto multifacetado da História Nacional.

O uso da história oral  para a descoberta da História Local é fonte capaz de fazer com que os estudos de História Local “escapem das falhas dos documentos, uma vez que a fonte oral é capaz de ampliar a compreensão do contexto, de revelar os silêncios e as omissões da documentação escrita, de produzir outras evidências, captar, registrar e preservar a memória viva.” (Fonseca, 2003, p.155)

O estudo da Histórial Local pode trazer muitos aspectos positivos, do ponto de vista didáctico-pedagógico, no sentido de que:



os estudos da história local revelam-se extremamente motivadores para os alunos porque lhes permitem realizar actividades sobre temas que despertam o interesse, pela sua relação com o passado do que ainda reconhecem os mais variados vestígios. A motivação deve, contudo, ultrapassar  a satisfação da simples curiosidade, para fomentar um verdadeiro trabalho de investigação (Fonseca, 2003, p.158)



Ao estudar temas da localidade, da aldeia, princípio do concreto, pode-se articular na esfera do particular, a sua preocupação singular em conexão com o universal. Em se tratando da espacialidade, a Micro-história busca o local, a aldeia, o bairro, o círculo da vizinhança, a casa, a região, o município. Tais dados funcionam como as referências gerais mais nítidas de um estudo micro-analítico (Vainfas, 2002). O enquadramento da História Local no currículo escolar do nível básico em Moçambique,



“…oferece novas óticas de análise ao estudo de cunho nacional, podendo apresentar todas as questões fundamentais da história (como os movimentos sociais, a ação do Estado, as actividades económicas, a identidade cultural, etc, a partir do ângulo de visão que faz aflorar a específico, o próprio, o particular. A historiografia nacional ressalta as semelhanças, o regional lida com as diferenças, a multiplicidade (Ibid, p.222).



Neste sentido, Caimi et al (2002) ressaltam que para a construção curricular na área de História, é preciso tomar o cuidado de não cair apenas na base de recortes tradicionais,  o que para os autores, resultaria em fragmentos de história regional, despojada da sua singularidade  e de suas articulações externas. Salienta-se, é preciso insistir, numa construção curricular em que que se preze pela articulação das continuidades e rupturas do processo histórico.

            A motivação dos alunos para o estudo da História Local e para a construção do conhecimento histórico têm profunda relação com a possibilidade que ele tem de aproximar os acontecimentos históricos do seu quotidiano, da sua família, dos conhecidos, enfim da sua comunidade com os processos históricos mais amplos, que permitem fazer contextualizações e construir relações. Estimulados pela curiosidade, concebe-se que os adolescentes, por possuírem anseios pelas suas origens, demonstrem apego à sua localidade, estudando a História de maneira mais apaixonada, diferentemente da história tradicional leccionada nas nossas escolas onde o estudo não vai para além do livro, numa rotineira repetição de saberes produzidos que  limitam as possibilidades de conhecimento.

Há que considerar entretanto que a História Local não deve servir para cimentar rivalidades ou descobrir superioridades e motivos para gerar divisões na comunidade maior (Nacional). Não  deve servir para oportunismo de qualquer espécie e para ressuscitar ódios e divisões.

Na abordagem da História Local, apesar de suas inúmeras vantagens pedagógicas não significa uma superioridade sobre a História Nacional e Global em termos epistemológicos, apenas são diferentes escalas de observação ou pontos de observação. Por isso é que Cardoso e Vainfas (1997) enfatizam que “combinar abordagens distintas talvez seja o ideal, resguardadas das diferenças e até a oposição de paradigmas  (p.449).

A relação entre a História Local, Nacional e Global não deve ser vista como campos antagônicos.  Daí  Revel (1998)  afirmar categoricamente que:



                        “... não existe portanto hiato, menos ainda oposição, entre  história local e global. O que a experiência de um indivíduo, de um grupo, de um espaço permite perceber é uma modulação particular da história global. Particular e original, pois o que o ponto de vista micro-histórico oferece à observação não é uma versão atenuada, ou, parcial, ou mutilada, de realidades macrossociais: é ... uma versão diferente (p.28).”



Nestes termos, podemos concluir que a ênfase sobre a História Local não se opõe a História Nacional e Global. O recorte sobre a História Local apenas designa uma delimitação temática mais ou menos inclusiva, em função das redes de interdependência e sociabilidade entre determinados actores, no espaço social escolhido.

Entretanto o mesmo Vainfas em outra obra (2002), refere que no caso da História Global, corre-se o risco do apego demasiado à lógica global e a pouca ênfase ao singular, face as dinâmicas generalizadas. Por outro lado, no caso de micro-análise, corre-se o risco de empirismo, da ênfase a casos específicos, escapando a olhar o macro-analítico, mas seja como for,



ás escalas macrossocial e microanalítico são muito diferentes e alcançam realidades distintas do tecido social. Podem ser vistas como complementares, o que não significa que a conjugação seja fácil. Ambas possuem limitações e se poderia mesmo dizer que uma oculta o que a outra alcança e vice-versa” (Vainfas, 2002, p.149)

           

        A eleição da História Local não diminui ou reduz ou simplifica o número de aspectos de uma realidade social. No recorte do local cada detalhe mais ou menos aparente pode adquirir significação própria, o que não ocorre em uma abordagem centrada em planos mais macroscópicos de análise. Portanto ao se proporem os conteúdos escolares da História Local, não se trata apenas de entendê-los na história do presente ou de determinado passado, mas de procurar identificar a dinâmica do lugar, as transformações do espaço, e articular esse processo às relações externas, a outros lugares. É preciso ter em conta que o lugar possui história própria que não pode ser explicada por si mesma, apesar da singularidade de cada espaço, por isso a pesquisa da História Local deve evocar suas condições mais amplas, regionais, nacionais e até globais.



Conclusão

É necessário que nesta relação se invista na formação do cidadão do mundo que,  mantendo suas raízes, adquira o conhecimento do mundo, actue activamente na vida do país e da comunidade, buscando a construção de uma aldeia global. O Currículo Local ora em vigor no Ensino Básico em Moçambique  constitui uma oportunidade ímpar se ela for devidamente explorada.


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[1] O termo Nação no contexto do trabalho, refere-se um território com fronteiras artificiais definidas,  com culturas diversificadas como é o caso de Moçambique. Portanto é uma concepção objectiva da Nação.
[2] Identidade, é portanto, na minha acepção, o sentimento de afinidade, de pertença à um determinado grupo ou sociedade que reconhece algo em comum entre os seus indivíduos. A  sua construção dá-se no interior de contextos sociais específicos, o que significa também pertencer e partilhar das mesmas visões e factores tais como o lugar, a história e memória social.
[3] Rüsen apud Schimidt e Caineli (2004, p.194) considera consciência histórica relacionada ao ser (identidade) e dever (acção) em uma narrativa significativa que torna os acontecimentos do passado com o objectivo de dar identidade ao sujeito a partir de suas experiências individuais e colectivas e de tornar intelígivel o seu presente confirmando uma expectativa futura a esta actividade actual. A consciência histórica tem uma função prática de dar identidade aos sujeitos e fornecer a realidade em que eles vivem uma direcção temporal, uma orientação que pode guiar a acção, intencionalmente, por meio de mediação da memória histórica.
[4] Outras inovações introduzidas pelo  Novo Currículo são: os ciclos de aprendizagem; o ensino básico integrado; a distribuição dos professores; a promoção semi-automática; a introdução dos idiomas moçambicanos no ensino; a introdução do inglês, de ofícios, da educação musical e cívica (INDE, 2003, p. 26-36)
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