MUSEUS E O PATRIMÓNIO HISTÓRICO CULTURAL MOÇAMBICANO
Jorge
Fernando Jairoce
Neste artigo pretendo fazer uma reflexão em relação a situação dos museus e o
património histórico cultural no nosso país. O brasileiro Mário Chagas (2007), considera
o museu “como um espaço de trocas, de
relação e de preservação de documentos, que só possuem sentido se para eles
houver um uso social”(p.4).
A partir desta definição, podemos dizer
que o museu não é um espaço acabado, restrito a quatro paredes para existir, ou
seja, o local onde se depositam coisas velhas, gabinete de curiosidades, tal
como demonstram os museus moçambicanos. Os museus em Moçambique ainda são vistos
na perspectiva tradicional, ou seja, estáticos e fechados (restritos ao seu plano conceptual e
não prático). Os museus em Moçambique carecem de programas educativos e sociais
específicos. No estudo por mim efectuado em 2004, para avaliar a utilizaçao dos museus da Cidade
de Maputo pelos professores e alunos no ensino de História trouxeram dados
supreendentes. As escolas da Cidade de Maputo que estão próximos do museus
passam anos e anos sem visitá -los, o que vale referir que os professores mesmo
com os museus próximos da escola (Museu
da Revolução próximo da Escola Secundária Francisco Manyanga; o Museu de
História Natural e de Geologia próximo da Escola Comercial de Maputo e Escola
Secundária Josina Machel) não utilizam
como recurso educativo, o que contribui para o seu desconhecimento por
parte dos alunos.
Outra razão que contribui para o desconhecimento
dos museus tem a ver com a sua fraca divulgação e publicitação, uma vez que não
promovem o contacto com as escolas divulgando a sua realidade aos alunos e pior ainda não possuem serviços educativos
organizados. Os nossos museus carecem de profissionais formados que possam
acompanhar didácticamente os visitantes.
A preservação de alguns museus e os
acervos deixam a desejar, tal é como é o caso do Museu da Revolução em Maputo e
o Museu Nacional de Etnologia em Nampula só para citar alguns exemplos. Estes
museus carecem de uma restauração urgente. De uma forma geral, os museus do país
precisam de acompanhar a dinâmica do mundo culturalmente mais diverso, senão os
mass media cada vez mais criativos e
abrangentes acabarão substituindo o seu papel na divulgação do património
histórico cultural nacional. Os museus nacionais devem investigar cada vez mais, renovar os
seus acervos, promover círculos de interesse educativos e tornarem –se mais
interventivos com vista a preservação do
património histórico cultural indispensáveis para promoção do espírito
patriótico e de cidadania moçambicana. Considerando este último os museus
deviam ser geridos por instituições académicas
e de pesquisa e não por partidos políticos como se pretende com o Museu
da Revolução.
Quando referimos o património histórico
cultural estamos a incluir os seus
elementos constituintes que são os bens culturais materiais (florestas
sagradas, objectos arqueológicos, monumentos, livros, instrumentos musicais, etc)
e imateriais (tradições orais- contos,
danças, canções, provérbios, mitos, línguas, etc) indispensáveis para a promoção
da identidade cultural e preservação da memória colectiva.
Estes bens culturais constituem importantes
documentos históricos que merecem a sua valorização
e preservação para a construção da nossa história que ainda constitue uma
floresta virgem a ser desbravada. As nossas cidades capitais, ilhas, algumas
vilas, montanhas, edifícios antigos, etc, devem ser preservados, restaurados e
utilizados com vista ao desenvolvimento
do País, sobretudo através de promoção de actividades turísticas, educativas e
sociais.
Com vista a valorização e preservação do património histórico
cultural do país alguns passos foram dados com realização em Julho de 1978, da
1ª Reunião Nacional dos Museus na Ilha de Moçambique, onde foram discutidas questões
relacionadas a organização e
funcionamento dos museus bem como a necessidade da recolha e estudo do
património histórico cultural do país. Este encontro conduziu à realização de
campanhas de preservação e valorização cultural do património cultural em todo
país. Estas campanhas duraram cerca de 4 anos, ou seja, até 1982 quando foi
criado o então Serviço Nacional de Museus e Antiguidades que recolheu
informações e testemunhos sobre a História, manifestações artísticas, múmias e
danças, cerimónias e rituais, utensílios e instrumentos de produção, que deveriam ser legalmente protegidos pelo
Estado.
Foi então que, em 1988, como forma de
regulamentar a protecção do património cultural, o Conselho de Ministros aprovou
a lei 10/88 de 22 de Dezembro de 1988, relativa a protecção do patrimóno
cultural moçambicano. Esta lei, no seu capítulo III, artigo 4, atribui ao
estado a responsabilidade de incentivar a criação das instituições científicas
e técnicas como museus, bibliotecas, arquivos, laboratórios e oficinas de
conservação e restauro, necessárias à protecção e valorização do património
cultural. A lei estimula a utilização
dos meios do Sistema Nacional de Educação e orgãos de comunicação sociais para
educar os cidadãos sobre a importância do património cultural e a necessidade
da sua protecção.
Passados vinte anos após a aprovação desta
lei, os meios do Sistema Nacional da Educação continuam ineficientes na sua
acção educativa com a vista a valorização e protecção do património cultural
moçambicano. Aliás, este constitui um dos principais desafios enfrentados pelo
país no relacionamento prático da educação com a realidade sócio cultural da comunidade, o que seria extremamente importante
do ponto de vista afectivo e didáctico tendo em conta que a educação afigura-se
como o mecanismo mais adequado para a valorização e preservação do nosso
património histórico cultural, tal como foi reconhecido no I Conselho
Coordenador da Cultura realizada em 2000.
É interessante registar, entretanto, que
os conteúdos, transmitidos pelas nossas escolas
ao longo dos anos, têm privilegiado padrões de cultura importados, aplicados
sem a devida redução social, em conteúdos impostos de cima para baixo,
dissociados da realidade dos alunos, em escolas burocratizadas e distantes das
comunidades na qual estão inseridas. Então, é altura de valorizarmos estudos da
nossa realidade cultural e da nossa
memória histórica.
Perante esta situação urge reflectirmos
sobre a função educacional dos nossos museus (educação patrimonial), da nossa
política nacional da cultura e dos museus e o lugar do património histórico
cultural como elemento de desenvolvimento e da promoção da cidadania
moçambicana. Valorizando o património cultural nacional estaremos a valorizar a nossa história e
consequemente a promover a cidadania moçambicana.
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