Bem vindos,

Caros amigos o blog Historiando: debates e ideias visa promover debates em torno de vários domínios de História do mundo em geral e de África e Moçambique em particular. Consta no blog variados documentos históricos como filmes, documentários, extractos de entrevistas e variedades de documentos escritos que permitirá reflectir sobre várias temáticas tendo em conta a temporalidade histórica dos diferentes espaços. O desafio que proponho é despolitizar e descolonizar certas práticas historiográficas de carácter eurocêntrico, moderno e ocidental. Os diferentes conteúdos aqui expostos não constituem dados acabados ou absolutos, eles estão sujeitos a reinterpretação, por isso que os vossos comentários, críticas e sugestões serão considerados com muito carinho. Pode ouvir o blog via ReadSpeaker que consta no início de cada conteúdo postado.

16 setembro 2012

ÁFRICA TEM DE SER MAIS DO QUE EXOTISMO E FOLCLORE CULTURAL


ÁFRICA TEM DE SER MAIS DO QUE EXOTISMO E FOLCLORE CULTURAL

… Ou Fonte de Matérias-Primas Baratas e Compadrios diplomático-financeiros. Ou os africanos agarram o seu destino ou continuarão na cauda de tudo…

Beira (Canalmoz) - Thabo Mbekhi não cunhou o termo Renascença Africana mas o trouxe à ribalta. Infelizmente sem muitas consequências. Ele próprio acabou sendo vítima das maquinações políticas enfermando a vida política de seu país. Não resistiu ao assalto e armadilhas que uma ala de seu partido, ANC, montou para se ver livre dele.
Uma mescla de étnico nacionalismo, conspurcado por várias novelas envolvendo órgãos da polícia de investigação criminal da África do Sul, inquinaram as possibilidades de reeleição de Mbheki e trouxeram um aspirante ao empoderamento económico negro para o poder, Jacob Zuma. Pouco dignificante para alguém que ocupa o mais alto cargo público de um país mas sua escolha pelo ANC passou e posteriormente a vitória eleitoral deixou de ser uma dúvida.
Estamos falando do país economicamente mais poderosos de África. Se onde existe uma das constituições mais democráticas do mundo há problemas de génese do poder político ou de que chega ao poder dá para imaginar qual é a situação do resto do continente.
Na essência em África, sob o olhar complacente, aparentemente desinteressado dos políticos de topo dos diferentes países do continente foi-se instalando e enraizando uma forma de estar e de governar neocolonialista.
Se as bandeiras e hinos nacionais passaram a ser uma realidade indiscutível já na arena económica não se põe dizer o mesmo. A condição de vida de milhões de africanos não se alterou embora as lideranças governamentais insistam em vender uma imagem de normalidade e de desenvolvimento.
De todos os quadrantes africanos chovem reclamações de os governos pouco ou nada estão fazendo por seus povos.
Ainda na África do Sul por causa dos combates que se avizinham pela candidatura às presidenciais alas do ANC se batem por protagonismo. Jacob Zuma veio a público afirmar que na economia tudo continua praticamente na mesma. A economia está virtualmente nas mãos dos brancos como era no tempo em que imperava a segregação racial do apartheid.
África, com participação efectiva de seus governantes, sofreu um golpe neocolonialista de grande envergadura. No essencial e fundamental as obras com durabilidade e onerosas continuaram a ser edificadas pelos mesmo que dirigiam os dossiers na era colonial. Os consórcios corporativos provenientes dos países antes potências coloniais imperam hoje como no passado.
Se hoje se observam novos intervenientes na esfera económica dos países é por aproveitamento das brechas que se abriram no contexto da cooperação bilateral e multilateral com os países ocidentais. Se há preocupações com a penetração chinesa em África é porque do ocidente se tem a clara noção de que espaços estão sendo perdidos a um novo actor que não tem reticências em entregar créditos financeiros avultados sem considerações de natureza política. Não há ligação entre democracia política e os créditos que Pequim aprova para os países africanos. Mas isso também não altera a natureza neocolonialista das relações entre África com China, Índia, ou Japão. A multiplicação de fóruns económicos entre o continente como um todo e os diversos países que emergem com intenções marcadamente dominadoras revela que África está sendo utilizada como fonte de matérias-primas baratas.
Os desafios e oportunidades são enormes para os cidadãos, para os governantes e para as organizações internacionais que se afirmam continuamente em defesa do progresso africano.
África em termos concretos tem sido espoliada numa concertação de agendas endógenas e exógenas. O que se passa no continente não pode ser atribuído unicamente a acção nefasta de corporações multinacionais interessadas no lucro como alguns governantes querem fazer crer.
Os que dizem que apoiam e aprovam o nosso desenvolvimento estão ao mesmo tempo envolvidos em negociatas que lesam verdadeiramente os interesses económicos e políticos dos africanos.
Há uma atitude e comportamento ambivalentes quando se toca nos assuntos africanos nalgumas capitais internacionais. Há como que um acordo de que é importante apoiar os esforços tendentes a melhorar a saúde pública e algumas questões sociais mas também há uma vertente clara de cobertura e apoio tácito de todas as acções postas em prática para atrasar o progresso democrático no continente.
Os diversos intervenientes na política económica africana, sabem e tem consciência de que uma democracia plena e vibrante em África, vai cortar o nível dos negócios com rendimentos chorudos que fazem actualmente.
A questão em África não é simples e quem supunha que a independência política em si resolveria todos os problemas enganou-se redondamente.
Tanto alarido informativo, concertação inter-governamental, cimeiras, bombardeamento televisivo e na imprensa internacional, em volta da crise financeira internacional, da dívida soberana dos países, sugerem que se trate de algo extraordinário. Sem dúvidas, que uma crise com as dimensões da actual, é assunto sério, que nenhum governo digno desse nome pode ignorar.
Mas será que tanto barulho se justifica?
É preciso que estamos perante uma avalanche de hipocrisia correspondente às concepções políticas e financeiras em voga.
Então o que se deve denominar da crise em vivem os milhões de africanos, asiáticos, e latino-americanos? Quantos milhões de pessoas vivem realmente com menos de dois dólares por dia no mundo? Os africanos já deveriam ter entendido que se não forem mais agressivos nas suas reclamações ninguém dará a importância devida ao assunto. Somos vítimas de arranjos e acordos que foram sendo estabelecidos há já muito tempo. Os que nos concederam ou aceitaram que proclamássemos as nossas independências não perderam tempo em conceber uma maneira de estar que não provocasse danos à sua estrutura económica e financeira. As lutas anti-coloniais, que tanto sangue inocente derramaram, face a realidade de hoje, perdem parte de seu fundamento. Os africanos que dirigiram tais lutas, uma vez no poder, se esqueceram rapidamente de que eram colonizados e oprimidos, que seus direitos políticos e económicos eram simplesmente ignorados pelos que os governavam. Numa repetição e decalque completo do que faziam os colonizadores, os governantes africanos são na verdade a vergonha do continente.
Gerações inteiras estão nascendo, crescendo e morrendo sob o signo da crise e vivendo nas condições mais abjectas que se podem imaginar, só merecem títulos de capa esporádicos da comunicação social internacional mais poderosa. Onde está a comiseração dos altruístas e filantropos mundiais? No seu elitismo característico é mais importante abordar e pesquisar o que Rupert Murdoch e o seu império dos mídias fez na Inglaterra do que tratar ou cobrir eleições africanas que podem ser de consequências muito importantes para milhões de africanos. Há boas novidades da parte de gente sentida e responsável, solidária e humana reveladas através de acções concretas visando debelar crises e promover o desenvolvimento humano em África.
Há acções de amplo significado e impacto em África que governos não estão conseguindo liderar nem promover. Sem o interesse genuíno de muitos filantropos em assuntos de saúde pública em África, os níveis de contaminação e mortes pelo HIV/SIDA serão bem maiores. Antes de alguns governos possuírem uma estratégia e meios para agir na frente da prevenção e terapia desta pandemia, já havia algumas organizações não governamentais actuando no terreno e trazendo soluções para obviar e diminuir o sofrimento de milhões de pessoas. A isso só se pode manifestar o nosso respeito e agradecimento.
Os tempos não são de continuar-se a pedir esmolas e correr de capital em capital a solicitar ajuda para financiar orçamentos nacionais. Há recursos e meios a disposição dos governos suficientes para promover acções que desenvolvam os países e dignifiquem os cidadãos.
África não pode continuar a ser aquele destino turístico a que os visitantes acorrem por causa de seu exotismo e folclore. A sua natureza bela como de outros continentes, deve ser um factor de desenvolvimento e em que quem governa seja responsabilizado democraticamente pelos resultados de suas acções. É inconcebível que um continente com as potencialidades naturais que lhe são conhecidas esteja na cauda do desenvolvimento mundial. Onde ainda até existe escravatura.
Os problemas de África não são insolúveis ou algo que os africanos através de seus governos e organizações da sociedade civil não possam abordar com êxito.
A crise antes de ser a actual propagandeada crise financeira internacional afectando uma meia dúzia de países na Europa é a crise existencial de África. Porque rebentou uma bolha imobiliária e porque bancos que viviam sacando lucros de créditos concedidos a agentes imobiliários tornaram-se problemáticos vemos toda uma série de organizações financeiras internacionais preocupadas em relançar as economias, estimular e impulsionar medidas de austeridade. Não se pode culpar os europeus por estarem preocupados em resolver os problemas que sentem com a crise que se instalou em seus países.  A atitude deve ser decididamente não ficar a espera de que alguém venha em nosso socorro. As trapalhadas que os governos africanos fazem quando chega a vez de trabalhar e organizar suas sociedades em moldes que promovam desenvolvimento sustentável e duradoiro são os questionamentos que os cidadãos devem fazer todos os dias.
Não se pode ficar eternamente a espera de que haja outros que façam o nosso trabalho e resolvam os nossos problemas.
Chegou a altura de abandonarem-se fórmulas aparentemente bem elaboradas oferecidas ou impostas pelas consultorias pagas por quem nos concede créditos e abraçar o trabalho com uma atitude renovada. Há espaço para que os africanos mostrem a sua criatividade e visão.
Os governantes devem deixar de merecer créditos pelo que não fazem. Ocupar a posição de governante deverá passar a ser um exercício de responsabilidade e de seriedade associada a graus de exigência cada vez maiores.
Falemos da crise dos outros mas não nos enganemos pois os africanos já vivem em crise há décadas.
Decerto que os países europeus actualmente afectados por crises de suas dívidas soberanas saberiam utilizar de outras formas os recursos naturais que os africanos possuem. (CanalMoz-17/09/2012-Noé Nhantumbo)



Nenhum comentário: